A AVALIAÇÃO DOS RISCOS DA COPA DO MUNDO DE FUTEBOL DE 2014: UMA FERRAMENTA USANDO ANÁLISE DE MULTICRITÉRIO



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Transcrição:

A AVALIAÇÃO DOS RISCOS DA COPA DO MUNDO DE FUTEBOL DE 2014: UMA FERRAMENTA USANDO ANÁLISE DE MULTICRITÉRIO Rodrigo de Moares Gaudard (UnB) gaudard.rodrigo@gmail.com Ana Luisa Dias Ribeiro (UnB) aluisadr@gmail.com Edgard Costa Oliveira (UnB) ecosta@unb.br Joao Carlos Felix Souza (UnB) jocafs@unb.br Simone Borges Simao Monteiro (UnB) simone.borges@terra.com.br O artigo apresenta uma proposta de ferramenta de identificação, análise e avaliação de riscos de alto nível para gestores de áreas responsáveis pela viabilização da infraestrura dos jogos da Copa do Mundo de Futebol de 2014 na cidade de Braasília-DF. O trabalho partiu de um mapeamento de riscos prévio feito pelo governo do Estado de Minas Gerais, em que os riscos foram divididos em 9 áreas: transporte arterial, infraestrutura de eventos, serviços auxiliares e planejamento urbano, com seus respectivos sub-níveis de informação. A avaliação dos riscos teve como base a elaboração da ferramenta criada a partir da aplicação da metodologia de Análise de Multi- Critérios (AMC). Para a definição dos subcritérios em termos da percepção de risco, foi utilizado o método de Análise Hierárquica de Processos (AHP), na qual foi adaptada a escala de Saaty para a elaboração dos questionários. A análise e avaliação dos riscos das 9 áreas foi realizado por meio da análise de probabilidade e impacto, cujos nos critérios foram definidos em termos semi-quantitativos, seguindo uma escala que varia de 1 a 5, de baixo a alto. A ferramenta foi testada junto a um grupo de especialistas, por meio de análise de percepção de risco, com preenchimento das tabelas. O resultado do trabalho permitiu validar a ferramenta, o método utilizado, assim como identificar a gravidade do risco por áreas, cujo tratamento deve ser priorizado. Demonstrou que a AMC e AHP são muito úteis para a ponderação de riscos e sua automatização, por meio de tabelas, facilitando a identificação, análise e avaliação dos riscos que precisam ser gerenciados para que consequentemente sejam atingidos os objetivos de se realizar um grande evento como a Copa do Mundo de Futebol de 2014 no Brasil.

Palavras-chaves: Gestão de Riscos, Copa do Mundo, Análise Hierárquica de Processo, Análise Multicritério, AHP, AMC, Riscos, Copa, Brasília, DF, Gestão 2

1. Introdução A realização de megaeventos esportivos como a Copa do Mundo, gera aos países em que são sediados, oportunidades de investimentos e de obtenção de resultados objetivos, além de relevantes impactos sociais, econômicos e políticos a médio e longo prazo. Pode-se citar o caso da Alemanha, que teve um lucro operacional de 30% sobre o valor investido na Copa do Mundo de 2006. O país investiu cerca de 1,5 bilhões na construção e reforma de estádios, e injetou quase 3 bilhões na economia local. Foram 64 partidas de futebol realizadas e mais de 3,2 milhões de ingressos vendidos. Para a transmissão do evento a 213 países, cerca de 300 emissoras de televisão cobriram o evento e mais de 4,2 bilhões de pessoas acompanharam as transmissões, uma média de 500 milhões de espectadores por jogo, totalizando 33 bilhões durantes todos os 64 jogos. Além disso, foram publicados na mídia 22.822 artigos escritos em alemão e 3.500 artigos em língua estrangeira. Segundo dados oficiais, em 2005, ano anterior à realização da Copa, o turista que visitava o país gastava em média 174,10 por dia, enquanto que, no período do evento, os gastos subiram para uma média de 400 por dia, resultando em um faturamento no setor hoteleiro de 300 milhões que até hoje recebe os efeitos positivos do evento. O número de hóspedes estrangeiros subiu 2%, foram gerados 25 mil empregos duradouros na área de Turismo e, durante o torneio, mais de 50 mil empregos temporários (Ministério do Turismo, 2012). Os países que sediam um megaevento, a exemplo da Alemanha, tem a oportunidade de exposição proporcionada pela maior vinculação da mídia mundial, o que resulta em atração de público turístico, além de investimentos financeiros e principalmente, no caso do Brasil, o reforço e consolidação da sua posição econômica e política hegemônica na América do Sul. Segundo dados do estudo Brasil Sustentável Impactos socioeconômicos da Copa do Mundo 2014, realizado pela consultoria Ernest & Young (2010) em parceria com a Fundação Getúlio Vargas - FGV, serão injetados um total de R$ 142,39 bilhões na economia brasileira até 2014 para viabilizar a realização da Copa do Mundo no país, gerando 3,63 milhões de empregos/ano, R$ 63,48 bilhões de renda para a população, além de uma arrecadação tributária adicional de R$ 18,13 bilhões. A Copa do Mundo impactará diretamente o Produto Interno Bruto (PIB) que está sendo estimado em R$ 64,5 bilhões para o período 2010-2014. Esse valor corresponde a 2,17% do valor estimado do PIB para 2010, de R$ 2,9 trilhões. Os setores como construção civil, alimentos e bebidas, serviços prestados às empresas, serviços de utilidade pública (eletricidade, gás, água, esgoto e limpeza urbana) e serviços de informação serão os mais beneficiados com a realização do evento no país. A expectativa é de que, até a Copa, haja um aumento de 79% do número de turistas internacionais no Brasil, representando um aumento de 2,98 milhões de pessoas. Como se pode inferir dos dados apresentados, muitos investimentos estão sendo feitos, muitas promessas e expectativas estão sendo criadas. Resta saber o quão preparado está o país para sediar um evento de tão grande porte, mesmo com tantas dificuldades e desafios internos e estruturais. Um fracasso em um evento internacionalmente visado como a Copa do Mundo traz ao país sede muito mais do que prejuízos financeiros. Aqui, faz-se importante menção ao caso da Copa do Mundo de 1986, na qual o designado país para sede, a Colômbia, não atendeu às 3

exigências feitas pela Federação Internacional de Futebol (FIFA) e teve que cancelar o evento no país, gerando um grande desgaste de imagem e alocação de recursos do país. Surge aí a necessidade e a importância de se gerenciar os riscos existentes nos processos de preparação para realização de uma Copa do Mundo em território no Brasil. O objetivo deste trabalho é construir uma ferramenta que será utilizada no processo de avaliação de riscos para ser aplicado aos gestores envolvidos no planejamento do evento na cidade sede Brasília Distrito Federal. O resultado do processo de avaliação é a identificação dos principais riscos nas áreas de energia, transporte, segurança, infraestrutura, sistema hoteleiro, serviços auxiliares e planejamento urbano. Neste artigo apresentamos a técnica desenvolvida, apoiada pelo método MCDA (Multiple Criteria Decision Analysis), que tem como objetivo prover um padrão para a análise e avaliação de riscos da realização de jogos da Copa do Mundo de Futebol em 2014 em Brasília. A ferramenta pode ser aplicada tendo-se como base a percepção geral dos riscos referente aos trabalhos de preparo da infraestrutura urbana em Brasília, já mapeada e necessária para a plena realização dos jogos da copa. 2. Revisão da literatura 2.1. Gestão de riscos A gestão de riscos é um conjunto de atividades coordenadas voltadas para o alcance dos objetivos de um grupo social, uma organização, um país. O risco, para a norma 31000 (ABNT, 2009), é o efeito da incerteza nos objetivos. As atividades do processo de gestão de riscos são gerenciadas para se ter controle sobre os riscos, com o intuito de tratar e reduzir os riscos indesejados, assim como criar oportunidades de segurança e sucesso para alcance dos objetivos. De acordo com a figura 1, dentre as atividades do processo de gestão de riscos, segundo a norma ISO 31000, temos a comunicação e consulta, monitoramento e análise critica, o estabelecimento de contexto, o processo de avaliação de riscos e o tratamento de riscos. O processo de avaliação de riscos contém as atividades de identificação, análise e avaliação de riscos. Figura 1: Processo de gestão de riscos (ABNT, 2009) Ao se estabelecer o contexto da gestão de riscos, define-se tanto os objetivos que se pretende alcançar quanto quais serão os objetos alvo das análises de riscos, ou ativos, assim como os 4

critérios de avaliação dos riscos, que serão usados nas análises. A identificação dos riscos parte da definição de quais ameaças e vulnerabilidades existem no contexto em análise, respectivamente nos alvos, sejam eles locais, pessoas, tecnologias, processos, para que possam ter o risco analisado. A análise de riscos visa a compreensão da natureza do risco para se determinar o nível de risco existente. Ela permite então que as ameaças e vulnerabilidades sejam buscadas e se encontradas, tenham então a probabilidade e o impacto identificados por meio das partes interessadas (ABNT, 2009). O resultado da análise de riscos é avaliar as vulnerabilidades mediante o critério de riscos definido anteriormente. A análise, para ser efetiva, necessita de uma sistematização quanto ao processo de percepção dos riscos. A literatura internacional da gestão de riscos, consolidada recentemente em normas da família 31000, versa sobre técnicas para o processo de avaliação de riscos, que foram editadas na recém-lançada norma ISO 31010 (ISO, 2009). A avaliação permite contrastar o resultado da análise de riscos com os critérios de riscos estabelecidos, para determinar o grau de tolerância ou aceitabilidade do risco. A percepção do risco se dá por intermédio da avaliação e a análise de riscos, as quais podem ser feitas a partir de diversas técnicas existentes, sendo de escolha do gestor de riscos a que melhor se adequar ao contexto e complexidade da situação. Tanto podem ser escolhidas técnicas formais como Delphi, HAZOP, AHP, MonteCarlo, dentre outras, como também ser por meio de coleta de evidências, fotografias, descrição de cenários, entrevistas, dentre outros (ISO, 2009). No caso de entrevistas, busca-se a percepção dos riscos por parte das pessoas ou organizações envolvidas, as partes interessadas, e deve ter como base o envolvimento da pessoa entrevistada com o assunto em questão. As pesquisas de opinião, por exemplo, baseiam-se em percepções individuais sobre determinados assuntos. Na gestão de riscos, é importante que as análises tenham como base testemunhos de pessoas tecnicamente envolvidas com o risco, seja sob o enfoque do problema que gera o risco, seja sob o enfoque do controle que trata o risco para que ele seja gerenciado, reduzido e/ou eliminado. 2.1. Análise Multicritério (MCDA) Segundo Kou et al (2010), a metodologia MCDA (Multiple Criteria Decision Analysis) utiliza métodos que auxiliam na tomada da melhor decisão diante de múltiplos critérios que envolvem um determinado problema. Ela consiste na estruturação e ponderação de critérios que podem ser utilizados como uma ferramenta de suporte aos tomadores de decisões. Dentre os diversos métodos utilizados pela MCDA, destaca-se o AHP (Analytic Hierarchy Process), ou processo analítico hierárquico, que foi escolhido como o método utilizado na priorização dos riscos desse trabalho. Vargas (1989) define o AHP como uma técnica estruturada para analisar e apoiar tomadas de decisões complexas. O método AHP consiste em três etapas: decomposição dos critérios em uma estrutura hierárquica; comparação entre os critérios de mesmo nível; e conversão dos valores comparativos em valores numéricos normalizados. Construiu-se uma Estrutura Analítica de Riscos com o intuito de representar os contextos de gestão de riscos que envolvem a realização da Copa do Mundo em Brasília. Essa estrutura apresenta os objetivos a serem alcançados para a segurança do evento, os quais foram 5

utilizados para definir os critérios necessários, não, a princípio, para solucionar um problema ou tomar uma decisão, mas para avaliar a percepção de risco de uma possível situação indesejada. Desse modo, o presente trabalho utiliza as técnicas de decisão multicritério para sua resolução. A metodologia de análise multicritério pode ser utilizada em diversas áreas e pretende-se estendê-la para o uso de análise de critérios de priorização de riscos, especificamente no caso desse trabalho, para priorizar e avaliar os riscos na preparação da cidade de Brasília para a Copa de 2014. Os passos adotados podem ser resumidos em: a) definição de pesos para os critérios; b) normalização (Ramos, 2000). 2.1.1. Definição de pesos para os critérios Ramos (2000) coloca que não há um método consensual para a definição de pesos, mas várias propostas de procedimentos para este efeito podem ser encontradas na literatura (Von Winterfeltdt & Edwards, 1986; Malczewski, 1999). É possível agrupar os métodos de definição de pesos em quatro categorias: métodos baseados em ordenação de critérios (Stillwell et al., 1981), em escalas de pontos (Osgood et al., 1957), em distribuição de pontos (Easton, 1973) e comparação de critérios par a par (Saaty, 1977). O método aplicado neste trabalho é o de comparação par a par no contexto do processo de tomada de decisão denominado AHP. Esta técnica baseia-se numa matriz quadrada n x n, onde as linhas e colunas correspondem aos n critérios analisados para o problema em questão. Assim, o valor a ij representa a importância relativa do critério da linha i face ao critério da coluna j. Como esta matriz é recíproca, apenas a metade triangular inferior necessita ser avaliada, já que a outra metade deriva desta e a diagonal principal assume valores iguais a 1. Tabela 1 Escala para avaliação de riscos (adaptada da escala de Saaty) O estabelecimento de comparações par a par para todos os critérios necessita da definição de uma escala, destinada à normalização, no caso a escala adaptada de Saaty (1980). Os valores 2, 4, 6 e 8 representam opinões intermediárias às da tabela 1. 2.1.2. Normalização de critérios Este processo permite que valores de critérios não comparáveis entre si sejam normalizados para uma mesma escala, viabilizando a agregação entre eles. A maior parte dos processos de normalização utiliza o valor máximo e mínimo para a definição de uma escala. A forma mais simples é uma variação linear definida pela Equação (1) (Eastman, 1997), onde Ri é o valor a ser normalizado; Rmin o valor mínimo para o critério; e Rmax o valor máximo para o critério. Xi = (Ri Rmin) / (Rmax Rmin) (1) 6

O processo de normalização é na sua essência idêntico ao processo de fuzzification introduzido pela lógica fuzzy, segundo o qual um conjunto de valores pode ser expresso (convertido) numa escala normalizada (por exemplo, entre zero e um), tornando-os comparáveis. Para este processo existem várias funções fuzzy que podem ser utilizadas, sendo as mais conhecidas: sigmoidal, j-shaped, linear e complexa (Zadeh, 1965). 3. Metodologia Um pré-teste da ferramenta foi realizado com professores especialistas da Universidade de Brasília UnB por meio de uma pesquisa de percepção de riscos. A fim de contextualizar o problema, realizou-se um levantamento bibliográfico sobre a Copa do Mundo no Brasil em 2014, além de documentos e comparações com grandes eventos realizados em outros países. As principais bibliografias que embasaram a definição dos critérios para a avaliação da percepção dos riscos foram o estudo Brasil Sustentável Impactos socioeconômicos da Copa do Mundo 2014 (Ernest & Young, 2010) e o escopo do Programa Copa 2014 em Minas definido pelo governo de Minas Gerais (Governo de Minas Gerais, 2012). A figura 2 ilustra a Estrutura Analítica de Riscos (nível 1) que foi construída com o objetivo de organizar o contexto e/ou áreas potenciais para a gestão de riscos da Copa do Mundo em Brasília. O objetivo desse trabalho é identificar as áreas com maior risco para a realização da Copa do Mundo em 2014 no Distrito Federal. O nível 2 (critério de decisão) abrange as áreas energia, transporte arterial, infraestrutura de eventos, sistema hoteleiro, segurança, planejamento urbano, serviços auxiliares. Decompondo esses critérios, obtêm-se subcritérios ou chamados critérios de decisão nível 3 e alguns de nível 4. EAR - Estrutura Analítica de Riscos: Copa do Mundo 2014 Energia Transporte arterial Infraestrutura de eventos Sistema hoteleiro Segurança Serviços auxiliares Planejament o urbano Rodovias Estádios Alimentação Operações urbanas Aeroportos IBC/IMC Táxi Qualidade das vias urbanas Luz Fan Parks Comunicações Serviços de utilidade pública Água Telefonia Saúde Operações em condições adversas Limpeza urbana Comércio Transporte público Figura 2 - EAR - Estrutura Analítica de Riscos: Copa do Mundo 2014 7

Cada um dos critérios de decisão do nível 2 pode ser compreendido pela respectiva definição: - Energia: corresponde à segurança energética das cidades-sede. O risco está associado à possibilidade do não fornecimento (total ou parcial) de energia pelo sistema elétrico da cidade sede; - Transporte arterial: o risco está associado aos problemas de tráfego nas rodovias em relação ao fluxo de veículos, qualidade das vias, aos problemas de infraestrutura e capacidade limitada dos aeroportos. Os subcritérios (nível 3) desta área são as rodovias e os aeroportos; - Infraestrutura de eventos (estádios, IBC/IMCs, Fan Parks): o risco está associado a uma série de fatores, tais como a possibilidade do não atendimento aos prazos das obras, padronização e conformidade às exigências da FIFA para os estádios, IBC/IMC (Centros Internacionais de Transmissão e de Mídias) e Fan Parks (pontos de encontro para torcedores assistirem aos jogos, obrigatórios para todas as cidades-sede). Os subcritérios desta área são os estádios, IBC/IMCs e Fan Parks; - Sistema hoteleiro: o risco está associado à probabilidade da rede hoteleira não suportar a demanda; - Segurança: o risco está definido para a segurança pública e privada da população em geral, com a probabilidade de violência nos estádios; - Serviços Auxiliares: risco à probabilidade de problemas da ordem de dimensionamento, preço e demanda com a oferta de serviços de atendimento ao público, tais como alimentação, taxi, comunicações, saúde e comércio. Os subcritérios (nível 3) desta área são os serviços de alimentação, taxi, comunicações, saúde e comércio; - Planejamento urbano: corresponde ao risco em uma série de subcritérios, tais como operações urbanas, qualidade das vias urbanas, operações em condições adversas, transporte público e serviços de utilidade pública em geral (água, luz, telefonia, limpeza urbana). A avaliação dos riscos foi dividida em duas partes. A primeira consistiu na realização de uma pesquisa com os especialistas de cada um dos critérios definidos que possuíam subcritérios associados (transporte arterial, Infraestrutura de eventos, serviços auxiliares e planejamento urbano) para a identificação da percepção dos maiores riscos por parte dos mesmos, ou seja, cada especialista ponderou em sua área de conhecimento os subcritérios que, em sua opinião, possuíam os maiores riscos. Para a definição dos subcritérios em termos da percepção de risco, foi utilizado o método AHP, na qual foi adaptada a escala de Saaty para a elaboração dos questionários. A segunda parte para avaliação dos riscos consistiu na análise de probabilidade de ocorrência dos riscos x impacto que estes poderiam causar na realização da Copa do Mundo de 2014 no Distrito Federal. A análise de probabilidade x impacto nos critérios de nível 2 foi definida em termos semi-quantitativos, seguindo uma escala de 1 a 5 para cada um dos riscos relacionados conforme as tabelas 2 e 3. A definição dos riscos (tabela 2) foi feita por meio de reuniões com professores especialistas em gestão de risco. 8

Tabela 2 Riscos por critério Tabela 3 Escala de probabilidade e impacto Após a aplicação da ferramenta para a avaliação dos riscos, obtiveram-se os maiores riscos para cada critério, em termos de percepção, por parte dos especialistas. 4. Resultados No primeiro momento da aplicação do método foram analisados os riscos em cada um dos critérios que possuíam subcritérios associados (transporte arterial, Infraestrutura de eventos, serviços auxiliares e planejamento urbano). As tabelas 4, 5, 6, 7 e 8 mostram o resultado da pesquisa aplicados com base no método AHP para a identificação da percepção dos maiores riscos, neste caso os maiores vetores prioridade encontrados. As matrizes de comparação do modelo AHP utilizado apresentam em suas linhas e colunas os subcritérios que foram comparados, seguindo a lógica de comparação do elemento da linha para com o elemento da coluna, conforme a escala de Saaty adaptada apresentada na tabela 1. Na última coluna da tabela, temos o Vetor Prioridade (w) que indica o peso do subcritério em 9

relação aos demais comparados, neste caso o valor percentual dos maiores riscos encontrados para cada área. Ressalta-se que todas as matrizes apresentadas tiveram a sua consistência devidamente verificada, o que garante a qualidade dos resultados apresentados. A primeira matriz apresentada é referente ao critério de Transporte Arterial: Tabela 4 Matriz de comparação dos subcritérios de Transporte Arterial A tabela 4 mostra que a percepção dos especialistas sobre maiores riscos para o critério Transporte Arterial está em grande parte associada ao subcritério Aeroporto, ou seja, 67% dos maiores riscos em relação ao transporte arterial no DF estão nos aeroportos, segundo os especialistas da área. A tabela 5 apresenta a matriz de comparação dos subcritérios de Serviços Auxiliares. Tabela 5 Matriz de comparação dos subcritérios de Serviços Auxiliares Segundo a tabela 5, os maiores riscos para os serviços auxiliares no DF encontram-se na alimentação e na saúde, ambos com 35% dos maiores riscos. As tabelas 6, 7 e 8 apresentam as demais matrizes de comparação para os critérios de Planejamento Urbano, Infraestrutura de Eventos e Serviços de Utilidade Pública: 10

Tabela 6 Matriz de comparação dos subcritérios de Planejamento Urbano Tabela 7 Matriz de comparação dos subcritérios de Infraestrutura de Eventos Tabela 8 Matriz de comparação dos subcritérios de Serviços de Utilidade Pública De acordo com as tabelas 6, 7 e 8, a inferência é de que na infraestrutura dos eventos e no planejamento urbano do DF, os maiores riscos estão respectivamente nos estádios (75%), nas operações urbanas (20%) e nos serviços de utilidade pública (20%), sendo que neste último os maiores riscos estão associados à luz, água e limpeza urbana (29% cada). No segundo momento da aplicação do método, os resultados obtidos em relação à análise de probabilidade de ocorrência dos riscos x impacto para cada um dos critérios foram: 11

Tabela 9 Tabela de Probabilidade e Impacto dos Riscos Na tabela 9 encontra-se o Indicador de Risco para cada critério, que foi obtido, conforme a própria definição da norma ABNT ISO Guia 73, pelo produto entre a probabilidade e o impacto de cada um dos riscos analisados. Como consequência do indicador proposto, foi elaborada uma matriz de probabilidade x impacto dos riscos para os critérios analisados (veja figura 3). Figura 3 Matriz de Probabilidade x Impacto dos Riscos Os critérios à extrema direita na figura 3 indicam os de maior risco para a realização da Copa do Mundo de 2014 no DF, segundo a combinação de probabilidade x impacto (Indicador de Risco). Ou seja, as áreas de maior preocupação por parte das entidades responsáveis pela realização do evento deveriam ser transporte arterial, planejamento urbano e segurança, segundo a opinião dos especialistas. Em seguida, as áreas relacionadas aos serviços auxiliares e ao sistema hoteleiro, e por fim, teríamos os critérios de menor risco, infraestrutura de eventos e energia. Após a obtenção dos resultados, a Estrutura Analítica de Riscos (EAR) inicialmente apresentada foi atualizada (figura 4), obtendo-se uma visão holística de toda a análise 12

realizada com base percepção dos riscos segundo o modelo AHP adaptado, em conjunto com a análise realizada pela mensuração dos riscos por escalas de probabilidade x impacto para cada critério. Figura 4 EAR atualizada 5. Conclusões e sugestões para trabalhos futuros A área de gestão de riscos está em pleno desenvolvimento com ciência. Ainda carece de abordagens teóricas e metodológicas, principalmente no que se refere ao processo de avaliação de riscos. O trabalho apresentado neste artigo permitiu validar uma ferramenta que pode ser muito útil para a avaliação dos riscos no contexto dos jogos da Copa do Mundo. A prova de conceito foi utilizada com o objetivo de validar a ferramenta de identificação, análise e avaliação de riscos. Com base nos resultados apresentados, conclui-se que a ferramenta obteve sucesso na identificação da percepção de riscos. A ferramenta também possibilita que especialistas de várias áreas contribuam com a visão do risco de uma maneira ampla. O resultado do trabalho foi a identificação e a gravidade do risco por áreas, cujo tratamento deve ser priorizado. Demonstrou que a MCDA e o AHP são muito úteis para a ponderação de riscos e sua automatização. Por meio de tabelas pode facilitar a identificação, análise e avaliação dos riscos que precisam ser gerenciados para que consequentemente sejam atingidos 13

os objetivos de se realizar um grande evento como a Copa do Mundo de Futebol de 2014 no Brasil. Como sugestões para trabalhos futuros, propõe-se uma aplicação da ferramenta para outros grupos de gestores e profissionais envolvidos direta ou indiretamente nas demais áreas analisadas e no planejamento da Copa do Mundo de 2014 no Distrito Federal, buscando uma maior avaliação de riscos baseada na percepção de riscos dos profissionais. Ademais, a ferramenta deve permitir, em sua evolução, a inclusão de dados factuais sobre o andamento da realização do preparo da infraestrutura para os jogos. Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO/IEC 31000: Gestão de Riscos Princípios e Diretrizes, 2009. EASTMAN, J.R. IDRISI for Windows: User s Guide. Version 2.0. Clark University Graduate School of Geography, Worcester, MA, USA, 1997. EASTON, A. Complex Managerial Decision Involving Multiple Objectives. John Wiley & Sons, New York, NY, USA, 1973. ERNEST & YOUNG. Brasil Sustentável Impactos socioeconômicos da Copa do Mundo 2014, 2010. GOVERNO DE MINAS GERAIS. Gerenciamento do Programa Copa 2014 em Minas Gerais, 2011. ISO/IEC 31010. Risk management - Risk assessment techniques, 2009. ISO Guia 73. Gestão de Riscos: vocabulário, 2009. KOU, G.; SHI, Y.; WANG, S. Multiple criteria decision making and decision support systems Guest editor's introduction, 2010 Elsevier B.V. All rights reserved. OSGOOD, C.E.; SUCI, G.J. & TANNENBAUM, P.H. The Measurement of Meaning. University of Illinois Press, Urbana, IL, USA, 1957. O Turismo e as Copas. Brasília: Ministério do Turismo Brasil. Acesso em: 23 março de 2012. Disponível em:<http://www.copa2014.turismo.gov.br/copa/turismo_copas>. RAMOS, R.A.R. Localização Industrial Um Modelo Espacial para o Noroeste de Portugal. Braga Portugal. 299p. Tese (Doutorado), Universidade do Minho, 2000. SAATY, T.L. A Scaling Method for Priorities in Hierarchical Structures. Journal of Mathematical Psychology, 15(3), 234-281, 1977. SAATY, T.L. Analytical Hierarchy Process: Planning, Priority Setting, Resource Allocation. MCGraw-Hill, New York, NY, USA, 1980. SAATY, T.L. & VARGAS, L.G. Prediction, Projection and Forecasting. Kluwer Academic Publishers, Boston, MA, USA, 1991. STILLWELL, W.G.; SEAVER, D.A. & EDWARDS, W. A Comparison of Weight Approximation Techniques in Multiattribute Utility Decision Making. Organization Behavior and Human Performance, 28(1), 62-77, 1981. 14

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