Rev Bras Cardiol Invas 2006; 14(1): 63-70. Gottschall CAM, et al. É Possível Prever a Reestenose Após o Implante de Stents Coronarianos Convencionais? Proposta de um Escore Artigo Original É Possível Prever a Reestenose Após o Implante de Stents Coronarianos Convencionais? Proposta de um Escore de Risco Baseado em Variáveis Obtidas Antes do Procedimento* Carlos A. M. Gottschall 1, Alexandre S. Quadros 1, Rogério Sarmento-Leite 1 RESUMO Histórico: A capacidade de estimar uma nova taxa de revascularização do vaso-alvo (RVA), após o implante de stents coronarianos convencionais, é uma questão importante, pois o uso sistemático de stents farmacológicos ainda é limitado pelo seu alto custo. Objetivo: Criar um escore preditivo de novas RVA, após o implante de stents coronarianos convencionais. Método: As características clínicas e angiográficas de uma coorte prospectiva de 848 pacientes submetidos ao implante de stents coronarianos foram analisadas e os preditores independentes de RVA em um ano foram identificados por análise multivariada. O teste de Hosmer-Lemeshow goodness-of-fit foi utilizado para identificar o modelo que mais se adequava à amostra, e o escore foi construído atribuindo-se pontos de acordo com a taxa de risco relativo para RVA em um ano. Resultados: O índice de RVA no período de um ano para os 848 pacientes foi de 7,4%. Por análise multivariada, o diâmetro de referência, a extensão da lesão e diabete melito foram mantidos no modelo final (Hosmer-Lemeshow=2,339; p=0,969). Em um ano, o aumento das taxas de RVA foi quase linear para cada nível do escore (0= 1,4%, 1= 4,5%, 2= 7,1%, 3= 10,4% e 4/5= 15,7%; r=0,90; p < 0,001), sendo que o valor de p no teste do quiquadrado foi < 0,0001. Conclusões: O escore de risco sugerido foi capaz de estratificar pacientes com taxas de RVA bastante baixas ou altas, e pode ser utilizado como uma ferramenta clínica simples para a predição de um novo procedimento de revascularização na prática diária. DESCRITORES: Angioplastia transluminal percutânea coronária. Contenedores. Reestenose coronária. SUMMARY It is Possible to Predict Restenosis After Bare Metal Coronary Stent Implantation? Proposal of a Risk Score Based on Pre-Procedure Variables Background: The ability to estimate the rate of a new target vessel revascularization (TVR) after bare metal coronary stenting is an important issue, as the systematic use of drug eluting stents is still limited by its high costs. Objective: To create a predictive score for the possibility of a new TVR after bare metal stenting. Clinical and angiographic characteristics of a prospective cohort of 848 patients were included in a dedicated database. Independent predictors of 1-year TVR were identified by multivariate analysis, and the score points were assigned according to the relative risk ratio of 1-year TVR. Results: The 1-year TVR rate in the 848 patients was 7.4%. By multivariate analysis, reference diameter, lesion length and diabetes mellitus were retained in the final model (Hosmer-Lemeshow goodness-of-fit test = 2.339; p=0.969). The increase in 1-year TVR rates was almost linear with each score level (0= 1.4%, 1= 4.5%, 2= 7.1%, 3= 10.4% and 4/5= 15.7%; r=0.90; p < 0.001), with p in chi-square test was < 0.0001. Conclusions: This score can stratify patients with very low and high TVR rates and can be used as a simple clinical tool for the prediction of a new revascularization procedure in daily practice. DESCRIPTORS: Angioplasty,transluminal percutaneous coronary. Stents. Coronary restenosis. 1 Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul / Fundação Universitária de Cardiologia, Porto Alegre, Brasil. * Este artigo baseia-se em estudo publicado originalmente no J Invasive Cardiol 2006;18:22-6. Correspondência: Dr. Alexandre Quadros, Unidade de Pesquisa do IC/FUC. Av. Princesa Isabel, 370 - Santana - Porto Alegre, RS. CEP 90620-001 - Fax: (51) 3219-2802 / Ramais: 22-23-24 E-mails: editoracao-pc@cardiologia.org.br / alesq@terra.com.br Recebido em: 30/11/2005 Aceito em: 01/03/2006 Os stents farmacológicos com eluição de fármacos reduzem significativamente a necessidade de novas revascularizações do vaso-alvo (RVA) após as intervenções coronarianas 1-4, mas seu uso difundido ainda é limitado pelo alto custo 5-7. Os stents farmacológicos são atualmente utilizados em mais de 70% das intervenções coronarianas percutâneas (ICP) nos Estados Unidos, mas em menos de 50% dos procedimentos na maioria dos países. As razões para esta aborda- 63
gem seletiva não são apenas os altos custos dos stents farmacológicos, quando comparados àqueles dos stents convencionais, mas também a idéia de que a reestenose pode ser razoavelmente prevista por características clínicas e angiográficas identificadas antes do implante do stent. Na verdade, a predição da reestenose após as ICP é um dos assuntos mais estudados na cardiologia intervencionista 8-13. Em um trabalho anterior, sugerimos um escore angiográfico preditivo de reestenose após angioplastia por cateter-balão, que foi capaz de identificar subgrupos de pacientes com índices de reestenose muito baixos (abaixo de 5%) ou muito altos (ao redor de 80%) 14. Alguns modelos preditivos para reestenose após implante de stents também já foram desenvolvidos, mas os resultados não têm sido homogêneos nos diferentes estudos 12,13. Assim, nosso principal objetivo é descrever um novo escore preditivo de RVA após o implante de stents convencionais, que seja simples e fácil para uso na prática clínica diária. MÉTODO Pacientes Todos os pacientes submetidos à ICP com stents coronarianos como tratamento para cardiopatia isquêmica em nossa instituição, no período de junho de 1997 a dezembro de 2001, eram potenciais candidatos a participar do estudo. Os critérios de exclusão foram pacientes em choque cardiogênico, com reestenose intra-stent ou com insucesso clínico. Insucesso clínico foi definido como insucesso angiográfico [estenose residual significativa (>30%) ou diminuição do fluxo coronariano (TIMI 0 a 1) ao final do procedimento ou procedimentos associados a eventos cardiovasculares maiores (ECVM)] durante a hospitalização. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Instituição, e todos os dados foram registrados de maneira prospectiva em um banco de dados Access e analisados pelo software SPSS para Windows 11.0. Apresentação clínica As seguintes definições foram utilizadas para caracterização da síndrome coronariana: 1) Angina estável: manutenção do padrão da angina nos últimos dois meses antes da intervenção; 2) Angina instável: piora na intensidade e/ou freqüência do padrão da angina no prazo de dois meses a partir do procedimento; 3) Infarto agudo do miocárdio (IAM): dor torácica intensa e constante, acompanhada de elevação do segmento ST, e que necessitou de revascularização percutânea da artéria relacionada ao infarto. As indicações para o implante de stent incluíram procedimentos eletivos, stent provisional e de salvamento. Os procedimentos eletivos foram aqueles planejados. Os procedimentos de stent provisional foram realizados por resultados subótimos da angioplastia coronariana (por exemplo, dissecções extensas nãooclusivas, lesões residuais maiores que 50% ou recolhimento elástico). Os procedimentos de resgate (salvamento) foram aqueles realizados durante um episódio de oclusão aguda após angioplastia coronariana. Um procedimento de implante de stent foi considerado com sucesso quando não esteve associado com ECVM (óbito, IAM ou nova revascularização miocárdica) durante a hospitalização. Procedimento de implante Todos os pacientes estavam recebendo ácido acetilsalicílico (100-200 mg) e ticlopidina (250 mg 2x/dia), no momento do implante de stent. Para os casos urgentes, esses fármacos eram administrados durante o implante ou imediatamente após. A heparina intravenosa em bolus foi administrada rotineiramente durante o procedimento. As lesões foram tratadas pelo uso de técnicas padrão 15. Na maioria dos casos, o tratamento envolveu dilatação com balão, seguida pela colocação do stent. As decisões sobre o tipo e o número do stent, o uso ou não de alta pressão, e ainda se outros dispositivos ou glicoproteína IIb/IIIa seriam necessários ficaram a cargo dos operadores. Análise angiográfica A análise angiográfica foi realizada em duas projeções ortogonais e por operadores experientes, utilizando sistema de calibração digital (Phillips DCI-S) ou paquímetros manuais. O diâmetro de referência do vaso tratado foi definido como o diâmetro médio dos segmentos proximais e distais à lesão. A gravidade da estenose foi medida em duas projeções ortogonais, e a extensão da lesão foi medida ombro a ombro. Lesões longas foram consideradas como uma só quando houvesse um segmento normal menor que 10 mm entre elas. As estenoses foram classificadas de acordo com os critérios estabelecidos pelo American College of Cardiology (ACC) 16. Seguimento dos pacientes A avaliação dos pacientes em um ano foi realizada por consultas ambulatoriais, por contatos com o médico assistente ou por contato telefônico. Angiografia de controle foi realizada somente quando sintomas ou sinais de isquemia miocárdica recorrente estivessem presentes, e por indicação do clínico assistente. A indicação de RVA no período de um ano após o procedimento de implante do stent também foi realizada por indicação dos médicos assistentes, e sua ocorrência foi registrada no banco de dados. Da mesma forma, todos os ECVM que ocorreram durante o período de hospitalização, fora do hospital, e no primeiro ano após o implante do stent foram também incorporados ao banco de dados. 64
Análise estatística As variáveis categóricas foram expressas em percentis, as variáveis contínuas foram expressas como média ± desvio padrão (DP). As diferenças entre os pacientes com ou sem um novo procedimento para RVA foram avaliadas pelo teste χ 2 (variáveis categóricas) e pelo teste t de Student (variáveis contínuas). Foram comparadas as características clínicas, angiográficas e de procedimentos dos pacientes com ou sem uma nova RVA no acompanhamento clínico de um ano. As variáveis com significância estatística na análise univariada ou aquelas com reconhecida associação com a reestenose em estudos prévios (diabete melito) foram incluídas em um modelo de regressão logística múltipla a fim de se identificarem os preditores de RVA do período de um ano. Em seguida, foram criados e comparados modelos separados pelo teste de Hosmer-Lemeshow goodnessof-fit para determinar-se qual deles melhor se adequaria aos dados (por exemplo, que modelo tinha o valor mais baixo para χ 2 e o mais alto para p, o que indica semelhança entre os valores observados e calculados) 10,17, e o modelo com melhor calibração foi escolhido. As variáveis contínuas foram transformadas em categóricas, e os pontos de corte foram determinados de acordo com a análise de histogramas de freqüência. Os pontos no escore de risco foram definidos proporcionalmente aos riscos relativos de uma nova RVA. RESULTADOS Pacientes Durante o período do estudo, 876 pacientes consecutivos preencheram os critérios de inclusão, sendo que 97% dos pacientes tiveram seguimento em um ano. Assim, esse estudo relata apenas os 848 pacientes com acompanhamento clínico em um ano completo, que foram submetidos a 895 implantes de stent. Não se registraram diferenças estatisticamente significantes referentes às características clínicas, angiográficas e de procedimentos entre os pacientes com ou sem acompanhamento clínico em um ano. A incidência de RVA no período de um ano foi 7,4%, sendo que uma nova ICP foi realizada em 5% dos pacientes e revascularização cirúrgica em 2,8% dos casos. A taxa de IAM em um ano foi 2,9%, a taxa de óbito foi 2,4%, e a taxa de ECVM (óbito, IAM e RVA) foi 9,2%. Os pacientes com uma nova RVA (n=63) eram significativamente mais jovens que aqueles que não tiveram nova RVA (n=785) (56,56 ± 11,73 anos vs 60,27 ± 10,70 anos; p=0,009), e houve uma tendência à maior proporção de homens neste grupo (81% vs 71%; p=0,08). O diabete melito mostrou-se mais freqüente em pacientes submetidos à nova RVA (30% vs 22%), porém esta diferença não atingiu significância estatística (p=0,21). A síndrome coronariana aguda, com ou sem elevação do segmento ST (87% vs 76%; p=0,03) e a angioplastia coronariana prévia (17% vs 8%; p=0,02) mostraram-se também mais freqüentes em pacientes com uma nova RVA (Tabela 1). Características angiográficas e dos procedimentos Os pacientes com RVA no primeiro ano após o implante de stent foram tratados para lesões ostiais com mais freqüência do que aqueles sem RVA (4% vs 1%; p=0,01). A extensão da doença arterial coronariana, o vaso-alvo que sofreu a intervenção e as características da lesão não se mostraram estatisticamente diferentes entre os grupos. A maioria dos pacientes sob estudo foi submetida a implante de stent eletivamente (60% vs 58%; p=0,85). Na grande maioria dos casos, os stents implantados foram: Multilink Tristar ou Tetra (33%), Tenax ou Teneo (28%) ou BX Velocity (10%). Não se registra- TABELA 1 Características clínicas dos pacientes (n=848), de acordo com a necessidade de uma nova RVA Característica RVA (n=63) Sem RVA (n=785) p Idade, anos 56,56 ± 11,73 60,27 ± 10,70 0,009 Homens,% 81 71 0,08 Hipertensão,% 56 65 0,16 Fumantes,% 37 43 0,39 Dislipidemia,% 43 46 0,64 Diabete melito,% 30 22 0,21 História médica,% CRM 8 10 0,57 ICP 17 8 0,02 Infarto do miocárdio 17 25 0,17 Fração de ejeção < 40%,% 0 4 0,24 Síndrome coronariana aguda,% 87 75 0,05 RVA= Revascularização de Vaso-Alvo; CRM= Cirurgia de Revascularização do Miocárdio; ICP= Intervenção Coronariana Percutânea. 65
ram diferenças estatisticamente significantes com relação ao tipo de stent usado nos dois grupos. O diâmetro médio do vaso-alvo mostrou-se significantemente inferior em pacientes com RVA em comparação ao grupo controle (3,18 ± 0,32 mm vs 3,32 ± 0,43 mm; p=0,001), e a média da extensão da lesão foi significativamente maior nos pacientes com RVA (11,70 ± 5,67 mm vs 10,08 ± 4,54 mm; p=0,03). A pressão do implante, a extensão do stent e o diâmetro luminal mínimo antes do implante do stent, assim como o porcentual de estenose, não se mostraram estatisticamente diferentes entre os dois grupos. O diâmetro luminal final mostrou-se inferior em pacientes que necessitaram de nova RVA (3,20 ± 0,33 mm vs 3,35 ± 0,40 mm; p=0,003) - Tabelas 2 e 3. TABELA 2 Características angiográficas dos pacientes (n=895 procedimentos), de acordo com a necessidade de uma nova RVA Característica RVA (n=68) Sem RVA (n=627) p Extensão da doença,% 1 vaso 46 54 0,28 2 vasos 36 34 0,74 3 vasos 17 12 0,33 Vaso-alvo,% Tronco 1 1 0,96 Descendente anterior 53 53 0,98 Circunflexa 10 13 0,72 Direita 29 28 0,88 Enxerto venoso 7 5 0,53 Local da lesão,% Ostial 4 1 0,01 Proximal 58 63 0,43 Medial 31 32 0,93 Distal 7 4 0,24 Tipo de lesão (ACC),% A 3 6 0,57 B1 15 19 0,36 B2 56 53 0,74 C 26 22 0,49 Trombo,% 28 20 0,14 Cálcio,% 13 15 0,83 RVA= Revascularização de Vaso-Alvo; ACC= American College of Cardiology. TABELA 3 Características dos procedimentos (n=895 procedimentos), de acordo com a necessidade de nova RVA Característica RVA (n=68) Sem RVA (n=627) p Diâmetro de referência, mm 3,18 ± 0,32 3,32 ± 0,43 0,001 Extensão da lesão, mm 11,70 ± 5,67 10,08 ± 4,54 0,03 Pressão do implante, ATM 13,13 ± 2,60 13,20 ± 2,58 0,83 Comprimento do stent, mm 16,25 ± 5,7 15,84 ± 4,39 0,56 Diâmetro luminal mínimo, mm Pré-stent 0,54 ± 0,42 0,53 ± 0,36 0,77 Pós-stent 3,20 ± 0,33 3,35 ± 0,40 0,003 Estenose residual,% Pré-stent 83,26 ± 12,39 84,24 ± 10,53 0,53 Pós-stent -0,18 ± 7,89-0,60 ± 8,35 0,69 RVA = Revascularização de Vaso-Alvo; ATM = Atmosferas. 66
Análise multivariada As variáveis incluídas no modelo de regressão logística múltipla foram sexo, angioplastia prévia, idade, diâmetro de referência, extensão da lesão, síndrome coronariana instável e diabete melito (Tabela 4). A síndrome coronariana aguda, o diâmetro de referência, a extensão da lesão e diabete melito foram mantidos, e modelos separados foram construídos e compara- dos pelo teste de Hosmer-Lemeshow (Tabela 5). O diabete melito foi incluído porque diversos importantes estudos clínicos e experimentais já demonstraram que está fortemente associado à RVA. Os resultados demonstram que o modelo que mais se ajustou aos dados foi aquele que incluiu o diâmetro de referência, a extensão da lesão e diabete melito (Hosmer-Lemeshow = 2,339; p = 0,969). Deve-se ressaltar que quando a TABELA 4 Análise multivariada das variáveis candidatas associadas à RVA em um ano Coeficiente β Valor de p RC (IC 95%) Sexo -0,71 0,07 0,49 (0,23-1,05) ICP prévia 0,595 0,16 1,81 (0,79-4,18) Idade -0,025 0,08 0,98 (0,95-1,00) Diâmetro do vaso de referência -0,85 0,03 0,43 (0,20-0,93) Extensão da lesão 0,085 0,002 1,09 (1,03-1,15) Síndrome coronariana aguda 1,17 0,02 3,23 (1,25-8,36) Diabete melito 0,48 0,14 1,62 (0,85-3,06) Constante -0,31 0,845 0,73 Teste de Hosmer-Lemeshow goodness-of-fit: χ 2 = 4,991; p= 0,759). RVA= Revascularização de Vaso-Alvo; RC= Razão de Chance; IC= Intervalo de Confiança; ICP= Intervenção Coronariana Percutânea. TABELA 5 Comparação dos modelos multivariados pelo teste de Hosmer-Lemeshow Goodness-of-fit Variável Coeficiente EP Valor de p Modelo I Diâmetro de referência -0,85 0,39 0,028 Extensão da lesão 0,08 0,03 0,002 Síndrome coronariana aguda 1,11 0,48 0,02 Diabete melito 0,45 0,32 0,15 Constante -1,77 Teste de Hosmer-Lemeshow goodness-of-fit: χ 2 =2,859; p=0,943. Modelo II Diâmetro de referência -0,75 0,35 0,03 Extensão da lesão 0,07 0,025 0,005 Síndrome coronariana aguda 0,71 0,39 0,07 Constante -1,42 Teste de Hosmer-Lemeshow goodness-of-fit: χ 2 =6,839; p=0,554. Modelo III Diâmetro de referência -0,88 0,39 0,023 Extensão da lesão 0,09 0,03 0,001 Diabete melito 0,41 0,32 0,19 Constante -0,80 Teste de Hosmer-Lemeshow goodness-of-fit: χ 2 =2,339; p=0,969. 67
variável diabete melito foi retirada do modelo observou-se um aumento da estatística de Hosmer-Lemeshow (de 2,339; p = 0,969 a 6,839; p = 0,554), com conseqüente perda de calibração do modelo. Escore O diâmetro de referência foi estratificado em vasos abaixo de 3 mm, vasos com 3,0 a 3,5 mm e vasos acima de 3,5mm. A taxa de RVA aumentou proporcionalmente a cada tercil (<3,0mm= 4,3%, 3,0-3,5mm= 6,7%, e >3,5mm= 9,8%; p=0,02). A extensão da lesão foi estratificada em lesões abaixo de 10 mm, lesões entre 10 e 20 mm de extensão e lesões acima de 20 mm. A taxa de RVA aumentou a cada nível (<10mm= 6,0%, 10-20mm= 8,5% e >20mm= 15,6%; p=0,02). Estes pontos de corte foram escolhidos porque proporcionaram uma divisão adequada da amostra e um aumento proporcional nas taxas de RVA de cada subgrupo. Além disso, a presença ou não de diabetes foi considerada. O escore de risco foi calculado pela definição de um valor a cada variável, de acordo com a proporção do risco relativo do período de um ano de RVA: 1) Diabete melito: presente= 1 ponto; e ausente= 0 pontos; 2) Diâmetro do vaso de referência: <3,0 mm = 2 pontos; 3,0 a 3,5mm = 1 ponto; e > 3,5 mm = 0 pontos; e 3) Extensão da lesão: <10mm = 0 pontos; 10-20 mm = 1 ponto; maior que 20 mm = 2 pontos. Os resultados das taxas de RVA observadas no período de um ano de acordo com o escore estão demonstrados na Figura 1. Os pacientes com níveis 4 ou 5 no escore foram analisados conjuntamente devido ao fato de que somente dois pacientes tiveram um escore de 5/5 (nenhum deles foi submetido a novo procedimento de revascularização no acompanhamento de um ano). O aumento das taxas de RVA em um ano foi praticamente linear a cada nível de escore (0= 1,4%, 1= 4,5%, 2= 7,1%, 3= 10,4% e 4/5= 15,7%; r=0,90; p < 0,001), e o valor Figura 1 - Taxas de revascularização do vaso-alvo de acordo com o escore de risco. RVA= Revascularização de Vaso-Alvo. de p no teste de qui-quadrado para associação linear foi de < 0,0001. DISCUSSÃO Nossos resultados demonstraram que características clínicas e angiográficas obtidas antes do implante do stent podem ser utilizadas em um escore de risco para predizer as taxas de RVA em um ano. As variáveis incluídas neste escore (diâmetro de referência, extensão da lesão e diabete melito) também se mostraram consistentemente associadas à reestenose em vários outros estudos clínicos e experimentais 8-13,18-26. Acreditamos que a inclusão de variáveis obtidas antes do implante do stent seja de particular relevância, já que isso pode contribuir para a decisão do implante de um stent farmacológico ou convencional. Muitos estudos demonstraram que pacientes que têm evolução clínica favorável após ICP podem ser identificados com base em suas características angiográficas e clínicas. Nosso grupo relatou previamente um escore angiográfico preditivo de reestenose após angioplastia coronariana com balão, que incluía a extensão da lesão, a irregularidade da lesão, presença de névoa angiográfica após o procedimento e a estenose residual. Este escore foi capaz de estratificar subgrupos de pacientes com taxas de reestenose muito baixas (< 5%) ou muito altas (>80%) 14. Ellis et al. 12 relataram sua experiência com 5.239 pacientes consecutivos tratados com stents convencionais na Cleveland Clinic. A taxa de nova revascularização miocárdica em nove meses (no vaso tratado ou não) foi de 13,4%, sendo que seus preditores foram o diâmetro de referência, a extensão da lesão, angina instável e lesões ostiais. Nesse estudo, a taxa de reintervenção em pacientes sem angina instável e com lesões menores que 10 mm localizadas em vasos maiores que 3,5 mm foi menor de 3%. Greenberg et al. 6 desenvolveram um modelo analítico para predizer a reestenose clínica após o implante de stents convencionais, que incluiu a extensão da lesão, o diâmetro do vaso e a presença de diabete melito, com base em uma coorte de 4.227 pacientes sem angiografia de rotina. Neste estudo, o risco estimado de RVA em um ano para um paciente não-diabético com implante de stent, em uma lesão de 10 mm localizada em um vaso de 3,5 mm, foi de 5%, enquanto que um stent implantado em uma lesão de 20 mm de extensão em um vaso de 2,5 mm de um paciente diabético teria uma chance de reestenose clínica de 24%. Por outro lado, a análise de 1.312 pacientes incluídos no subestudo angiográfico do estudo PRES- TO demonstrou uma taxa de reestenose bem superior (46%) 13. Estes autores também exploraram a capacidade preditiva de variáveis candidatas em vários estudos disponíveis e também do estudo clínico PRESTO; porém, os escores desenvolvidos apresentaram modesto poder discriminatório para reestenose após ICP. É importante considerar que nossa taxa geral de 68
reestenose clínica foi baixa (7,4%), se comparada à dos estudos disponíveis na literatura, o que provavelmente está relacionado às características angiográficas dessa coorte: vasos calibrosos (3,31 ± 0,43 mm) e lesões curtas (10,20 ± 4,66 mm). Além disso, a ausência de seguimento angiográfico de rotina também esteve associada a baixas taxas de novos procedimentos de revascularização em estudos prévios 27. Assim, a taxa global de nova RVA deste estudo é compatível com aquelas previstas pelos modelos desenvolvidos por Greenberg et al. 6, e Serruys et al. 10 As implicações clínicas deste estudo estão relacionadas à predição de uma nova RVA após o implante de stents coronarianos convencionais com base nas características pré-procedimento, e podem auxiliar na tomada de decisão para o implante de um stent farmacológico ou convencional. Acreditamos que os pacientes com previsão de taxas baixas ou muito baixas de RVA (< 5%), com base no escore descrito, podem ser tratados com stents convencionais, já que o benefício adicional do implante de um stent farmacológico é pequeno. O uso sistemático de um stent farmacológico em pacientes de baixo risco estaria associado a custos altos e a uma relação custo-benefício desfavorável, conforme demonstrado previamente 6,28,29. Limitações do estudo Com relação à aplicabilidade clínica deste escore, ressaltamos que muitos pacientes da nossa coorte apresentavam vasos grandes e lesões curtas, o que influenciou a taxa global de RVA. Apesar do escore ter se ajustado bem a esta amostra, conforme demonstrado pelo teste de Hosmer-Lemeshow goodness-of-fit, deverá ser investigado se o seu desempenho também é adequado em subgrupos de mais alto risco (por exemplo, com vasos menores e lesões mais longas). Neste caso, talvez seja necessária a inclusão de outras classificações de subgrupos, como a de vasos menores de 2,5mm e lesões mais longas que 30 mm. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Souza JE, Costa MA, Abizaid AC, Rensing BJ, Abizaid AS, Tanajura LF et al. Sustained suppression of neointimal proliferation by sirolimus-eluting stents: one-year angiographic and intravascular ultrasound follow-up. Circulation 2001;104: 2007-11. 2. Morice MC, Serruys PW, Souza JE, Fajadet J, Ban Hayashi E, Perin M et al. A randomized comparison of a sirolimuseluting stent with a standard stent for coronary revascularization. N Engl J Med 2002;346:1773-80. 3. Moses JW, Leon MB, Popma JJ, Fitzgerald PJ, Holmes DR, O Shaughnessy C et al. Sirolimus-eluting stents versus standard stents in patients with stenosis in a native coronary artery. N Engl J Med 2003;349:1315-23. 4. Stone GW, Ellis SG, Cox DA, Hermiller J, O Shaughnessy C, Mann JT et al. 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