FATORES CONDICIONANTES DA DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DE COMUNIDADES VEGETAIS NO PARQUE ESTADUAL DELTA DO JACUÍ, RIO GRANDE DO SUL. Maria de Lourdes Abruzzi Aragão de Oliveira, Museu de Ciências Naturais, Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, R. Dr. Salvador França, 1427, CEP 90.690.000- Porto Alegre; e-mail: delu@fzb.rs.gov.br Fone: 3320.2071 Maria Luiza Porto, Departamento de Ecologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul Área Temática: Biologia e Ecologia O trabalho foi apresentado no L Congresso Nacional de Botânica, 1999, Blumenau. Resumos. p. 250
FATORES CONDICIONANTES DA DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DE COMUNIDADES VEGETAIS NO PARQUE ESTADUAL DELTA DO JACUÍ, RIO GRANDE DO SUL. Maria de Lourdes Abruzzi Aragão de Oliveira - Museu de Ciências Naturais, Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, R. Dr. Salvador França, 1427, Cx. Postal 1188, CEP 90.690.000, Porto Alegre. E-mail: delu@fzb.rs.gov.br Maria Luiza Porto - Departamento de Ecologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. RESUMO O Parque Estadual Delta do Jacuí localiza-se na região metropolitana de Porto Alegre (RS), ocupando cerca de 210Km2, entre as coordenadas 29 53 e 30 03 S e 51 28 e 51 13 W. Constitui-se de ilhas, canais e sacos, incluindo também áreas nas planícies de inundação dos rios que formam o delta. Visando a identificação dos fatores ambientais que condicionam o padrão de distribuição espacial da vegetação realizou-se, no período de abril de 1995 a janeiro de 1996, levantamento fitos sociológico, nos diferentes tipos fisionômicos de vegetação que ocorrem na área, aplicando-se o método de quadrantes para a vegetação de porte arbóreo e arbustivo-arbóreo, e o método de pontos com agulha isolada para a vegetação arbustiva e herbácea, em 24 unidades amostrais de 30mx30m cada uma. Nestas coletou-se dados referentes à topografia do terreno, à profundidade do lençol freático, ph, carbono orgânico, nitrogênio total e fósforo total, além de aspectos texturais dos sedimentos. Para a análise dos dados empregou-se a abordagem multivariada, utilizando-se o programa MULVA 5, ordenando-se os dados através da Análise de Componentes Principais e da Análise dos Dados Difusos. Estas ordenações sugerem que a existência de um gradiente topográfico e o nível freático, vinculados ao hidroperíodo, são os principais fatores condicionantes da heterogeneidade da vegetação na área de estudo. As comunidades florestais, situadas sobre os diques marginais ou no interior das ilhas, ocupam a posição mais elevada no relevo, enquanto que as comunidades herbáceas e arbustivas localizamse nas cotas mais baixas, estando submetidas a maiores níveis de alagamento ou saturação do solo por períodos mais longos de tempo, durante o ano. A análise evidencia também a importância de aspectos do sedimento como textura, teor de carbono orgânico e de nitrogênio, no estabelecimento das diferentes comunidades vegetais. Palavras-chave: comunidades vegetais, áreas úmidas, fitos sociologia. INTRODUÇÃO O Parque Estadual Delta do Jacuí, por constituir-se em um remanescente representativo da paisagem das áreas úmidas da Depressão Central do Rio Grande do Sul, apresentando complexa heterogeneidade espacial, relacionada tanto a fatores ecológicos naturais muito dinâmicos quanto a perturbações antrópicas, constitui-se em uma área extremamente significativa para investigações que busquem a identificação dos padrões de distribuição das espécies, bem como os fatores que os determinam. Tentativas no sentido de melhor compreender a estrutura da vegetação, sua distribuição e as relações com o meio incluem a abordagem multivariada como instrumento de análise. Como hipótese inicial de trabalho admite-se que a principal tendência da variação florística e da heterogeneidade ambiental da área está condicionada a características edáficas, relacionadas a um gradiente topográfico e de umidade do solo, resultantes da dinâmica fluvial. METODOLOGIA Área dos Estudos Específicos Para o estudo das comunidades vegetais selecionaram-se, a ilha das Flores e Cabeçuda, como representativas da variabilidade da cobertura vegetal do Parque, por apresentarem, a maior
complexidade e articulação dos tipos de vegetação. A ilha das Flores, é a maior das ilhas do delta do rio Jacuí (1660,61 ha); a ilha Cabeçuda, com 45 ha, situa-se no curso inferior do rio Jacuí Levantamento fito sociológico No levantamento fito sociológico, realizado entre abril de 1995 e janeiro de 1996, foram amostradas 24 unidades amostrais de 900m² cada uma, referindo-se aos seguintes tipos vegetacionais: vegetação herbácea 1m : unidades amostrais de 1 a 4 ; vegetação herbácea 2m : unidades amostrais de 5 a 12 ; vegetação arbustivo-herbácea: unidades amostrais 13 e 14; vegetação arbustivo-arbórea: unidades amostrais 21 a 24; vegetação arbórea : unidades amostrais 15 20. Na amostragem da vegetação arbórea e arbustivo-arbórea foi utilizado o Método dos Quadrantes centrados em um ponto (Cottam & Curtis, 1956) modificado, a fim de obterem-se conjuntos de pontos quadrantes em cada quadro, ou unidade amostral. Para a amostragem das comunidades herbáceas 1m, herbáceas 2m e arbustivo-herbáceas, utilizou-se o Método de Pontos, com agulha isolada (Eden & Bond 1945 apud Mantovani & Martins, 1990), modificado e adaptado às condições da vegetação da área de estudo. Parâmetros abióticos Efetuou-se o registro da profundidade do lençol freático e dos parâmetros físicos e químicos dos sedimentos superficiais (0-20cm), nas unidades amostrais do estudo fito sociológico (Figs. 1 e 2), estes constituindo os descritores ambientais utilizados na análise estatística. Abordagem Estatística Calculou-se a densidade relativa para cada espécie amostrada, em cada unidade amostral, utilizando-se na análise estatística o Programa Mulva 5 (Wildi & Orlóci,1996). Utilizou-se como medida de similaridade a covariância, relacionando-se espécies, comunidades e fatores do meio pela ordenação indireta, através da Análise de Componentes Principais (PCA). Como técnica complementar de ordenação usou-se a Ordenação de dados difusos, optando-se pelo Método de Roberts (Roberts,1986). Foram feitas ordenações para unidades amostrais e para espécies, envolvendo todos os tipos de comunidades amostradas e separadamente para as comunidades herbáceas e arbustivas. RESULTADOS Parâmetros abióticos As Figuras 1 e 2 apresentam, respectivamente, os resultados da profundidade do lençol freático e a microtopografia do terreno, nas unidades amostrais estudadas. Figura 1: Profundidade do lençol freático (cm), nas unidades amostrais, nos dias 5 e 6 de março de 1996.
Figura 2: Topografia do terreno, tomando-se como zero o nível do lençol freático, em ponto central das unidades amostrais, medido no mês de março de 1996. Análise de Componentes Principais (PCA) Ordenação das unidades amostrais Na Fig.3 observa-se que 41,07% da variação da vegetação total é explicada no espaço definido pelos dois primeiros componentes, podendo-se inferir a existência de um complexo de gradientes ambientais relacionado às variações florísticas. Verifica-se, na distribuição em relação ao primeiro eixo (Eixo I = 23,48%), a influência de importantes fatores ambientais vinculados entre si, ou seja, o lençol freático e a topografia dos terrenos. Eixo II 17,59% -4.79E-01 1.43E-01 7.65E-01 ---.---.---.--0.---+---.---.---.---.---. 8.64E-01. 1 8.12E-01. 2 7.60E-01. 3 7.09E-01. 4 6.57E-01. 5 6.05E-01. 6 5.53E-01. 7 5.01E-01. 8 4.49E-01. +3 9 3.98E-01. +4 10 3.46E-01. 11 2.94E-01. 12 2.42E-01. 13 1.90E-01. +2 14 1.38E-01. +1 15 8.66E-02. 16 3.48E-02 15 17 20/19 23/22. 17-1.70E-02 +...+*..*..+24... 18 Eixo I 23,48% -6.88E-02 +16 + +21. +5 19-1.21E-01 18. +7 20-1.73E-01.12++6 21-2.24E-01.14+++11 22-2.76E-01. 8 +10 23-3.28E-01. 13++9 24 ---.---.---.--0.---+---.---.---.---.---. -4.79E-01 1.43E-01 7.65E-01 Fig. 3:Ordenação das unidades amostrais no primeiro e segundo componentes do PCA. O grupo de unidades amostrais que caracteriza as comunidades arbóreas e arbustivas arbórea (15 a 24) ocupa a condição de lençol freático menos elevado e de terrenos menos
deprimidos. Ficam em situação oposta as unidades ocupando áreas com lençol mais superficial, topograficamente mais deprimida e, conseqüentemente com tempo de permanência de inundações ou alagamentos maior. No que tange às comunidades arbóreas, pode ser apreciada a variação da composição florística em relação à distância do rio. As unidades amostrais 15 e 16, representativas da comunidade Sebastiania commersoniana - Mimosa bimucronata, localizadas no interior da ilha das Flores, encontram-se na extremidade esquerda sobre o Eixo I, seguindo-se as unidades localizadas mais próximas às margens (u.a.17-20), que correspondem à comunidade de Sebastiania commersoniana - Inga uruguensis. A sub-comunidade com predominância de Mimosa bimucronata (u.a. 21-24) ocorre sobre diques retrabalhados, na periferia da mata. A variação da vegetação expressada pelo segundo eixo (Eixo II = 17,59%) está muito provavelmente relacionada a aspectos texturais, demais características edáficas e à interferência humana. Na base do diagrama estão as comunidades herbáceas altas, principalmente o capinzal de Panicum grumosum (u.a. 9,10,11,12) que se assenta sobre solos com maior quantidade de silte. À medida que é incrementado o conteúdo de argila, instala-se a comunidade do sarandizal de Cephalanthus glabratus (u.a. 13,14), seguindo-se a comunidade do juncal de Cyperus giganteus (u.a. 5,6,7,8) e, finalmente, a comunidade do campo inundável (u.a. 1,2,3,4) sobre solos muito argilosos. Ordenação das espécies No diagrama da ordenação das espécies, onde os dois sentidos principais da ordenação são responsáveis por 42,06% da variação da vegetação (Eixo I = 24,13 % e Eixo II = 17,93%) ficam evidenciados os mesmos gradientes constatados na ordenação das unidades amostrais. No eixo I a topografia e o lençol freático são os principais fatores condicionantes da distribuição das espécies, sendo que seu arranjo no eixo II reflete principalmente a combinação de parâmetros do solo e a interferência antrópica. Ordenação das comunidades herbáceas e arbustivo-herbácea sem as comunidades florestais. Na ordenação das unidades amostrais os eixos I e II contêm 46,07% da variação total da vegetação. No primeiro eixo, que explica a maior parte desta variação (Eixo I = 31,99%) é possível reconhecer-se a relação entre o lençol freático e a composição florística. No segundo eixo (Eixo II = 14,07%) pode-se relacionar muito bem a variação da vegetação com o conteúdo de carbono orgânico e nitrogênio. A ordenação das espécies reflete os mesmos gradientes verificados na ordenação das unidades amostrais. Análise dos dados difusos ou fuzzy Procurou-se relacionar separadamente os parâmetros ambientais com a composição florística, testando as tendências de variação expressadas na análise de componentes principais. A profundidade, ou altura do lençol freático, explica 63% (r = 0,796) do gradiente da vegetação. CONCLUSÕES De modo geral os resultados obtidos nas ordenações vêm a confirmar as observações de campo, também se evidenciando, que o estabelecimento de diferentes condições ecológicas que determinam o desenvolvimento de distintas comunidades vegetais deve-se primordialmente ao lençol freático, e à ocorrência e permanência ou não de condições de anaerobiose no solo, em decorrência de um gradiente topográfico. Outros fatores não dimensionados como o fluxo horizontal de sedimentos e de nutrientes e os processos intrínsecos, como as inter-relações dinâmicas entre as populações, também devem ser considerados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COTTAM, G., CURTIS, J.T. The use of distance measures in phytosociological sampling. Ecology, Durham, v.37, n.3, p.451-460, 1956. MANTOVANI, W., MARTINS, F.R. O método de pontos. Acta Bot. bras., Brasília, v.4,n.2, p.95-122, 1990. ROBERTS, D.W. Ordination on the basis of fuzzy set theory. Vegetation, The Hague, v.66, p.123-131, 1986. WILDI, O., ORLÓCI, L. Numerical exploration of community patterns: a guide to the use of MULVA-5. 2.ed. Amsterdam: SPB Academic Publ., 1996. 171p.