Comissão de Avaliação de Tecnologias de Saúde - avaliação farmacoeconómica -

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Transcrição:

Comissão de Avaliação de Tecnologias de Saúde - avaliação farmacoeconómica - Julian Perelman Escola Nacional de Saúde Pública Universidade Nova de Lisboa

Comissão de Avaliação de Tecnologias de Saúde Avaliação para decisões de financiamento/comparticipação Comissão independente, integrada no INFARMED Emissão de pareceres, apoio à decisão política Composição Presidente: José Vinhas Vice-presidentes: António Melo Gouveia, Julian Perelman 97 peritos (11 farmacêuticos, 77 médicos, 9 economistas)

Comissão de Avaliação de Tecnologias de Saúde

Avaliação farmacoterapêutica Etapa prévia: definição das medidas de eficácia, do comparador, das sub-populações/indicações Eficácia: mortalidade, morbilidade (sintomas e complicações), duração da doença, qualidade de vida, segurança, outros

Avaliação farmacoterapêutica Avaliação da qualidade de evidência para cada outcome através do sistema GRADE Qualidade alta/moderada/baixa/muito baixa Risco de viés, imprecisão, inconsistência, evidência indireta Valor Terapêutico Acrescentado

Pertinência Recursos escassos, necessidades inúmeras Custo de oportunidade das despesas em saúde Eficiência económica/alocativa: determinar a partir dos recursos disponíveis o maior ganho possível Value for money (vantágem económica): determinar o valor acrescentado obtido através de usos alternativos A saúde tem preço

1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 Pertinência Despesas em saúde, % PIB (Portugal) % 12.00 10.00 8.00 6.00 4.00 2013 OCDE: 8,9% PIB PORTUGAL: 9,1% PIB 2.00 0.00 Anos Portugal Média OECD Fonte: OCDE (2015)

Pertinência Fonte: OCDE (2010)

Pertinência Fatores determinantes do crescimento da despesa per capita em saúde, 1990-2003: 46,5% crescimento do PIB: elasticidade-rendimento 26,3% aumento preços relativos: doença de Baumol 10,1% envelhecimento 17,1% progresso tecnológico Fonte: Relatório para a Sustentabilidade (2008)

Pertinência Novas tecnologias: elemento central do aumento da despesa Como determinar se a nova tecnologia tem de ser implementada, na ausência de mecanismos de mercado? Papel da avaliação económica em saúde: medição ex ante do custo social e da utilidade

Custo A Tratamento A Consequências A Escolha Análise sistemática das alternativas relevantes Ponto de vista assumido: sociedade, SNS, hospital Análise quantitativa Tratamento B Custo B Consequências B

Técnicas de análise Consequências: Mortalidade e morbilidade Análise custo-efectividade Quality-adjusted life years (QALY) Análise custo-utilidade Ganhos em termos monetários Análise custo-benefício

Perspectiva do estudo Sociedade Custos indirectos Custos para o doente e família Custos sociais Estado Custos médicos SNS

Plano de custo-efectividade Diferença de custo Limiar Não existe VTA Diferença de efectividade Não existe VTA Dominância

Qual é o problema? Avaliação farmacoterapêutica: define se existe valor terapêutico acrescentado Avaliação económica: define se o custo-efetividade é aceitável = comparticipação MAS... Qual é o custo-efetividade aceitável? Quanto estamos disponíveis a pagar para um ano de vida com qualidade? O preço deve refletir o máximo que estamos dispostos a pagar? E este valor garante sustentabilidade?

O problema da evolução dos preços Estudo de Howard et al (Journal of Economic Perspectives 2015): 58 medicamentos oncológicos aprovados entre 1995 e 2013 Avaliação dos ganhos baseada nos RCTs Avaliação dos custos baseada nas despesas do Medicare Os preços aumentaram de 12% por ano A sobrevivência global aumentou de 0,005 anos (não significativo)

O problema da evolução dos preços Aumento: 10% por ano Fonte: Howard et al, J Econ Persp 2015, 29(1), p.148 The cost of the new generation of drugs is getting out of all proportion to the added benefit (Cavalli, The Lancet 2013)

Contexto do mercado Patentes e ausência de concorrência = poder de mercado Cobertura universal, comparticipação de 100% Elasticidade muito baixa quando existem copagamentos (0,01 de acordo com Goldman et al, Health Affairs 2006) EUA: Medicare não pode negociar preços, por lei, nem toma decisões com critérios de custo/custo-efetividade

Porquê aumentam os preços? Preços de referência nos EUA (...), price often seems to follow a simple formula: start with the price for the most recent similar drug on the market and price the new one with 10-20 percent of that price (usually higher) (Howard et al, p.154) Consequência inesperada dos descontos: negociação mais agressiva na Europa terá aumentado os preços nos EUA Consequência: pela primeira vez, fala-se em problema de acesso aos medicamentos em países de rendimento alto, que ameaçam a sustentabilidade dos sistemas desaúde

Como definir os preços? Value-based pricing: o preço do medicamento é o máximo que estamos disponíveis para pagar para a mais-valia terapêutica Se medicamento permite ganhar um ano de vida com qualidade (QALY), e a população considera que um QALY vale 30.000 : preço = 30.000 Pediatra trata pneumonia em criança de um ano de idade, e permite ganhar 80 anos de vida com qualidade: preço deveria ser 2,4 milhões de euros, se assumirmos disponibilidade para pagar de 30.000 /QALY Justifica-se financiar em função de resultados (value-based care). Será que se justifica definir o preço em função do valor (value-based pricing)? Lamata et al, 2015

Como definir os preços? Value-based pricing: o preço do medicamento é o máximo que estamos disponíveis para pagar Ineficiência económica: alocação de recursos que poderiam ser alocados a outras necessidades Através dos impostos, redistribuição dos pobres para os ricos A concorrência permitiria eficiência económica: preço=custo marginal Lamata et al, 2015

Os problemas do Value-Based Pricing (VBP) Justifica-se financiar em função de resultados (value-based care). Justifica-se definir o preço em função do valor (valuebased pricing)? Custo do I&D: 2.500 M (Di Masi et al, 2014) ou 110 M (Light & Kantarjian, 2013)? Financiamento a 50% por fundos públicos (WHO, 2012) Sem lucros elevados não haveria investigação? Lamata et al, 2015

Quais outras soluções? Refletir sobre um limiar de custo-efetividade adequado para Portugal, e que tenha em conta a necessidade de escolhas Reforçar os mecanismos de avaliação farmacoterapêutica: financiamento da inovação com resultados major (não marginais) Negociação de preços centralizada Diminuir custos da investigação: peso da regulação, intermediários, etc. Managed entry agreements (partilha de risco): descontos escondidos. Temos capacidade para implementar? Efeitos adversos?