Gonçalo Neto d'almeida Pedro Escada Gabriel Branco José Pratas Vital OINI111.11

Documentos relacionados
Dr. Bruno Pinto Ribeiro Residente em Cirurgia de Cabeça e Pescoço Hospital Universitário Walter Cantídio

Glomus timpânico : Três casos Três abordagens Glomus tympanicum : Three cases Three approaches

Carcinoma adenoide cístico de nasofaringe localmente avançado: Relato de caso

Estudo de Caso: Reabilitação Vestibular em paciente portador de glômus jugulo-timpânico

ADENOMA PLEOMÓRFICO: DESAFIOS DO TRATAMENTO A Propósito de Um Caso Clínico

Gaudencio Barbosa R4 CCP Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço HUWC - UFC

Jobert Mitson Silva dos Santos

Gaudencio Barbosa R3 CCP Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço Hospital Universitário Walter Cantído UFC

RETALHOS ÂNTERO-LATERAL DA COXA E RETO ABDOMINAL EM GRANDES RECONSTRUÇÕES TRIDIMENSIONAIS EM CABEÇA E PESCOÇO

TÍTULO: COLESTEATOMA DE CONDUTO AUDITIVO EXTERNO COMO DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DE PATOLOGIAS DA ORELHA EXTERNA

. Intervalo livre de sintomatologia até 12h (perda de consciência seguindo-se período de lucidez);

Critérios de Admissão e Alta Revisão 02

VIII Curso de Anatomia e Dissecção do Osso Temporal. Programação 16/10/2013 QUARTA FEIRA

Vestibular Schwannoma surgery or facial nerve preservation surgery?

irurgia Revista Portuguesa de Órgão Oficial da Sociedade Portuguesa de Cirurgia II Série N. 16 Março 2011

INFECÇÕES CERVICAIS PROFUNDAS ESTUDO RETROSPECTIVO

4ª Edición. Reabilitação Oral com Implantes Técnicas cirúrgicas para regeneração óssea. Curso prático em cabeça de cadáver

Casos MRI. Dr. Jorge Cueter Dr. Ênio Setogu5

Mastoidectomia Pediátrica. E3 Eduardo Lopes El Sarraf Hospital Cruz Vermelha Paraná Set/2013

Meduloblastoma. Denise Magalhães

Avaliação Angiográfica e Embolização de Tumores Cérvico-Cranianos Paragangliomas e Angiofibromas Juvenis da Nasofaringe

CIRURGIA DE TIMPANOMASTOIDECTOMIA. Termo de ciência e consentimento

GUIA INFORMATIVO CANCRO DO RETO. Centro de Referência Oncologia de Adultos

Universidade Federal do Ceará Faculdade de Medicina Liga de Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Jônatas Catunda de Freitas

NEUROCIRURGIA o que é neurocirurgia?

Tratamento de herniações meningoencefálicas do osso temporal no Hospital Egas Moniz

Projeto acadêmico não lucrativo, desenvolvido pela iniciativa Acesso Aberto

Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial Director: Dr. Luis Dias

RESOLUÇÃO Nº 26, DE 22 DE ABRIL DE 2019

Ministério da Saúde SECRETARIA DE ATENÇÃO À SAÚDE PORTARIA Nº 765 DE 29 DE DEZEMBRO DE 2005

Concurso Unifesp nº105 PROVA TEÓRICO-PRÁTICA MÉDICO/ OTORRINOLARINGOLOGIA PEDIÁTRICA

FORMA TUMORAL DA CISTICERCOSE CEREBRAL

Conceito e Uso do PET/CT em Cabeça e Pescoço. Carlos Eduardo Anselmi

Artigo Original TUMORES DO PALATO DURO: ANÁLISE DE 130 CASOS HARD PALATE TUMORS: ANALISYS OF 130 CASES ANTONIO AZOUBEL ANTUNES 2

TRAUMA CERVICAL - IMPORTÂNCIA. área restrita. vários sistemas. experiência individual pequena FCMSCSP - AJG

Fratura de osso temporal em pacientes com traumatismo crânio-encefálico

Vascularização do Sistema Nervoso Central

Cancro de Pâncreas Tumores localmente avançados /Borderline ressecáveis

CÂNCER LARINGE. UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ Hospital Walter Cantídio Residência em Cirurgia de Cabeça e Pescoço CÂNCER DE LARINGE

Matheus Rolim Mendes de Alencar Liga de Cirurgia de Cabeça e Pescoço

QUESTIONÁRIO SOBRE TRATAMENTO DA DOR AGUDA PÓS-OPERATÓRIA

Nervos VII, IX e XII. Miguel A. Xavier de Lima

Esvaziamento Cervical Seletivo em Pescoço Clinicamente Positivo

TC Protocolo de Mastoide. José Pedro Gonçalves TN Esp. em Radiologia

Anatomia da orelha media e interna

Acta Otorrinolaringológica Gallega

3º Curso Teórico Prático de ORL

2.1. Formação de Nível I ( corresponde a 36 meses do período de formação).

radiologia do TCE

TABELA DE PREÇOS DESCRIÇÃO PARTICULAR PART. C/ DESCONTO SINDSPAR OBSERVAÇÃO DENSITOMETRIA ÓSSEA, CARDIOLÓGICOS E NEUROLÓGICOS

Neuroimagiologia Estrutural no Primeiro Episódio Psicótico

CARCINOMA ESPINOCELULAR DO CONDUTO AUDITIVO EXTERNO: ESTUDO POR TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE SEIS CASOS*

TC Protocolo de Crânio. José Pedro Gonçalves TN Esp. em Radiologia

O PAPEL DA IMAGEM NOS MENINGIOMAS. Dr. Victor Hugo Rocha Marussi Neuroradiologista

ESTUDOS AVANÇADOS EM ANESTESIOLOGIA PARA NEUROANESTESIA

Avaliação de Serviço

Ministério da Saúde SECRETARIA DE ATENÇÃO À SAÚDE

Sarcomas de partes moles do adulto Estudo Populacional/Institucional Regiões do Alentejo e Algarve

Radiologia do crânio e face

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO

Centro de Referência de Cancro do Reto. Carteira de Serviços

Imagem da Semana: Tomografia computadorizada (TC) e Ressonância Magnética (RM)

Polipectomia e Sinusectomia

Tumores da base do crânio em pacientes idosos

PERCURSO DO DOENTE COM NEOPLASIA DA MAMA OPERADA

Neurorradiologia. Infografia da Especialidade

ANEURISMA CEREBRAL M A R I A D A C O N C E I Ç Ã O M. R I B E I R O

Joana Filipe Teresa Matos Helena Ribeiro Luís Tomás Paulo Borges Dinis

TESTE DE AVALIAÇÃO. 02 novembro 2013 Duração: 30 minutos. Organização NOME: Escolha, por favor, a resposta que considera correta.

TC e RM DOS SEIOS DA FACE

interventional & diagnostic medical competences Especialidades Cirúrgicas

Litíase da Via Biliar Principal: Terapêutica Cirúrgica

Clínica Universitária de Radiologia. Reunião Bibliográfica. Mafalda Magalhães Director: Prof. Dr. Filipe Caseiro Alves

Caso Clínico - Tumores Joana Bento Rodrigues

Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética. Infografia da Especialidade by

- O CENTRO DE ACESSOS VASCULARES-

Secretaria Municipal da Saúde Coordenação de Integração e Regulação do Sistema

Curso Continuado de Cirurgia Geral

Imagem da Semana: Tomografia Computadorizada

Projeto Cirurgia Segura Salva Vidas

AVALIAÇÃO POR RESSONÂNCIA MAGNÉTICA NUCLEAR DE FÍSTULAS PERI-ANAIS

Serviço de Medicina Paliativa CHCB - Hospital do Fundão Histórico

MEDICINA PÓS OPERATÓRIA UNIDADE DE DOR AGUDA

PRINCIPAIS CIRURGIAS NO PESCOÇO E BIÓPSIA DE LINFONODO

Gaudencio Barbosa R3 CCP HUWC 10/2011

área acadêmica Anatomia Anatomia radiológica do crânio e face

FEOCROMOCITOMA EM CRIANÇAS Aspectos clínicos e de imagem

CONSULTA DE ACESSOS VASCULARES. LUIS FREITAS Serviço de Nefrologia Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra Centro de Acessos Vasculares - Sanfil

Gaudencio Barbosa R4 CCP HUWC Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço

O QUE É? O RABDOMIOSARCOMA

Schwannoma de Forame Jugular: Relato de Caso

DEPARTAMENTO DE NEUROLOGIA

Neoplasias. Margarida Ascensão. Teresa Matias

TC e RM DOS SEIOS DA FACE

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ Hospital Walter Cantídio Serviço de C.C.P

Transcrição:

Paragangliomas jugulo-timonicos. Técnica cirúrgica e experiência do Hospital de Egas Moniz iugulotympanic paragangliomas. Surgical technique and experience of the Egas Moniz Hospital OINI111.11 Gonçalo Neto d'almeida Pedro Escada Gabriel Branco José Pratas Vital RESUMO Objectivos: Descrever a técnica cirúrgica e a experiência dos Serviços de Otorrinolaringologia e Neurocirurgia do Hospital de Egas Moniz no tratamento cirúrgico dos paragangliomas jugulo-timpânicos. Desenho do estudo: Descrição de técnica cirúrgica e estudo retrospectivo dos casos operados num período de 20 anos. Material e métodos: Foram incluidos no estudo 24 doentes operados por uma equipa otoneurocirárgica entre 1988 e 2007. A técnica utilizada foi a via da Fossa Infratemporal do tipo A de Fisch em todos os casos. Os dados foram obtidos a partir da observação recente dos doentes e da consulta dos processos clínicos. As variáveis avaliadas foram: as manifestações clínicas, a embolização pré-operatória e a técnica cirúrgica realizadas, a remoção tumoral, a mortalidade, a morbilidade e a evolução das lesões residuais. Resultados: A apresentação clínica foi semelhante a de outras series. A remoção total do tumor foi obtida ern 11 (45%) dos 24 casos. Na maior parte dos restantes a doença residual manteve-se controlada. Dois doentes morreram por pneumonia e a morbilidade foi sobreponivel a verificada em outras series. Conclusões: A via da Fossa Infratemporal do tipo A é a melhor técnica para tratar os paragangliomas jugulo-timpanicos, mas é im- GONÇALO NETO D'ALMEIDA Assistente Hospitalar Graduado de Neurocicurgia do Hospital de Fps Mordi, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental. PEDRO ESCADA chefe de Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital de Egas Moniz, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental GABRIEL BRANCO Assistente Hospitalar Graduado de Neurorradiologia do Hospital de Egas Moniz, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental JOSÉ PRATAS VITAL Ex-Director do Serviço de Neurocirurgia do Hospital de Egas Moniz, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental Correspondência: Gonçalo Neto d'almeida Serviço de Neurocirurgia, Hospital de Egas Moniz Rua da Junqueira, 126 1349-019 Lisboa T. 210432115 Mail: netodalmeidaagmail.com Trabalho apresentado no 55 Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial, Vilamoura, Maio de 2008 portante a concentração do tratamento da patologia em centros de referenciação diferenciados, com equipas otoneurocirúrgicas estáveis, para se controlar a doença com um minimo de mortalidade e morbilidade. Palavras-chave: Base do crânio; Cirurgia, Complicações pos-operatórias; Embolização terapêutica; Estudo retrospectivo; Osso temporal; Paraganglioma jugulo-timpanico; Resultados do tratamento; Tumor de glornus jugular. ABSTRACT Objectives: Describe the surgical technique and experience of the departments of Otolaryngology and Neurosurgery of the Egas Moniz Hospital in the surgical treatment of jugulotympanic paragangliomas. Study design: Description of the surgical technique and retrospective evaluation of the cases operated in a period of 20 years. Materials and methods: 24 patients were operated by an otoneurosurgical team between 1988 and 2007 and included in the study The surgical technique was the Infratemporal Fossa Aproach type A in all the cases. Data were obtained from a recent evaluation of the patients and review of the clinical records. The outcome measures were: clinical manifestations, preoperative embolization and surgical technique, tumor removal, mortality morbidity and evolution of residual lesions. Results: Clinical presentation was similar to other series. Total removal of the tumor was obtained in 11 (45%) cases. In the majority of the other cases residual disease remained controlled. Two patients died from pneumonia and morbidity was similar to other series. Conclusions: Infratemporal Fossa Aproach type A is the best surgical technique to remove jugulotympanic para gangliomas, but the treatment of this pathology should be concentrated in referral centers, where differentiated and stable otoneurosurgical teams can control the disease with the less morbidity and mortality Keywords: Glomus Jugulare Tumor: Jugulotympanic paraganglioma: Postoperative complications; Retrospective Studies; Skull base; Temporal Bone; Therapeutic embolization; Treatment outcome. ARTIGO DE f VOL 47 N'l MARCO 2009 25

N Gonçalo Neto d'almeicla, et al INTRODUÇÃO Os paragangliomas jugulo-timpanicos (PJT) ou tumores de glomus jugular são tumores reuroendócrinos com origem em células da paraganglia, que não são mais que elementos da crista neural'. Do ponto de vista histopatológico, estes tumores são benignos. Todavia, pelo crescimento agressivo e pela invasão e erosão do osso temporal, que são a regra, têm um comportamento local mais proximo dos tumores malignos, podendo ainda estender-se para la do osso temporal, em particular para a região cervical ou mesmo para a cavidade craniana'. O seu crescimento é lento e, devido a sua localização particular, podem atingir dimensões consideráveis antes de causar sintomas importantes, pelo que o diagnostico é difícil e por vezes tardio'. A cura destas lesões pelo tratamento cirúrgico, com um mínimo de morbilidade associada, so foi possível a partir da utilização da técnica cirúrgica designada de Via da Fossa Infratemporal do tipo A', descrita em 1977 por Ugo Fisch5'6. Actualmente é consensual que estes tumores devem ser tratados por equipas multidisciplinares que incluam otorrinolaringologistas e neurocirurgibes, capazes, no seu conjunto, de dominar a cirurgia do ouvido e do osso temporal, da região cervical, da base do crânio e do compartimento intracraniano relacionado, sendo ainda capazes de utilizar técnicas microcirúrgicas diferenciadas e técnicas de monitorização electrofisiológica per-operatória7. Historicamente, no Hospital de [gas Moniz a abordagem cirúrgica dos PJT foi desenvolvida pelo Prof. Pratas Vital (neurocirurgiao) e pelo Prof. João Olias (otorrinolaringologista), que começaram por ensaiar a técnica em cadaver, com vista a sua execução. Ao longo dos anos outros colegas participaram nesta actividade cirúrgica, tendo os autores deste trabalho conseguido constituir uma equipa otoneurocirurgica estável, que associada a neurorradiologia de intervenção, assegura actualmente a realização destas operações. O propósito deste trabalho é o de descrever a técnica cirúrgica e a experiência dos Serviços de Otorrinolaringologia e Neurocirurgia do Hospital de Fps Moniz no tratamento cirúrgico dos UT. do sexo feminino e 7 (29%) do sexo masculino. Não foram incluídos no estudo os doentes com tumores com esta histologia mas limitados à caixa do tímpano ou a caixa do tímpano e mastoide, mas sem envolvimento do foramen jugular, uma vez que estes tumores foram tratados por vias otorrinolaringológicas clássicas (timpanotornia ou timpanomastoidectomia). MÉTODOS Tratou-se de um estudo retrospectivo. Foram analisados os processos clínicos de todos os 24 doentes e foram observados numa data recente 8 doentes. As variáveis estudadas estão indicadas no Quadro 1. Manifestações clinicas pré-operatórias Embolização e tipo vascularização do tumor Técnica cirúrgica realizada Ressecção total ou parcial (subtotal) Mortalidade Paralisia facial Outras complicações intra ou pós-operatorias Evolução dos tumores residuais Quadro 1 I Variáveis de estudo RESULTADOS Os sintomas mais frequentes foram a hipoacusia, os acufenos pulsáteis e os défices no nervo facial e nos pares cranianos IX-X11. De salientar casos cujas apresentações clínicas são menos frequentes, como a otalgia isolada ou as epistaxis (Quadro 2). Hipoacusia Sintoma ou Sinai n (%) 8 (33')/0) Disfonia (paralisia X par) 7 (29%) Paralisia / paresia facial 6 (25')/0) Acufenos pulsáteis 5 (21%) Disfagia (paralisia IX e X pares) 5 (21%) MATERIAIS E MÉTODOS Paralisia / atrofia da hemilingua (XII par) 5 (21')/0) Lesão vascular no canal aiditivo externo 4 (17%) MATERIAIS Foram incluídos no estudo todos os doentes submetidos ao tratamento cirúrgico de PiT, no Hospital de Egas Moniz, num período de 20 anos, entre 1988 a 2007. Reuniram-se um total de 24 doentes, com idades compreendidas entre 28 e os 74 anos, sendo 17 (71%) Otorragia 3 (13%) Ptose do ombro (paralisia XI par) 2 (EP/o ) Otalgia 1 (4%) Epistaxis 1 (4a/o) Quadro 2 I Variáveis de estudo 26 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CERVICO-FACIAL

Foram submetidos a embolização pré operatória 22 doentes (92%), sendo as artérias faringea ascendente, occipital e palatina ascendente as responsáveis pela vascularização dos tumores. A técnica cirúrgica realizada foi a Via da Fossa Infratemporal do tipo A em todas as operações. A ressecção cirúrgica foi completa em 11 doentes (46%) e subtotal ou incompleta em 13 doentes (54%). A mortalidade foi de 2 doentes (8%), por pneumonia de aspiração. Mais de três quartos dos doentes apresentaram uma paralisia facial no pós-operatório imediato, mas o número dos doentes que mantiveram uma paralisia facial significativa (grau III-VI de House Brackman) para la dos seis meses a um ano reduziu-se para cinco (21%) Outras causas de morbilidade registadas foram a disfagia, a pneumonia de aspiração e a fistula de liquor, que no seu conjunto ocorreram ern 13 doentes (54c/0). Dos 24 doentes, cinco (21%) foram submetidos a urna segunda cirurgia, por recidiva ou evolução subsequente de tumor residual. Apenas um dos doentes foi submetido a radioterapia após remoção incompleta do tumor. magnética (RM) crânio encefálica com contraste endovenoso (Figura 2). Os diagnósticos diferenciais a incluir no estudo dos doentes sac os meningiomas, schwanomas, metastases, condrosarcomas e, mais raramente ainda, os tumores de células gigantes e os plasmocitomas". A discussão pré-operatória dos casos clínicos, que podem ser referenciados indiferentemente para o serviço de neurocirurgia (Dr. Gonçalo Neto de Almeida) ou para o serviço de otorrinolaringologia (Dr. Pedro Escada), é feita em consulta multidisciplinar de otoneurocirurgia e cirurgia da base do crânio (consulta não presencial). O papel do neurorradiologista na discussão e planeamento pré-operatórios é também fundamental. Actualmente, no Hospital de Egas Moniz, todos os doentes são submetidos a angiografia digital de subtracção caroticlea e cerebral, cerca de 4 a 6 dias antes da cirurgia, para diagnóstico e embolização pré operatória (Figura 3). O envolvimento da artéria carótida interna, a circulação ARTIGO D DISCUSSÃO A nossa serie é sobreponivel a outras séries publicadas no que respeita as manifestações clinicas, sendo a hipoacusia, os acufenos pulsáteis e os défices dos últimos pares cranianos os achados mais frequentes6,89. Para o estudo e planeamento pré-operatórios, foi sempre realizada tomografia computorizada (TC) crânio encefálica e do osso temporal (Figura 1), exame particularmente importante para o estudo da extensão ossea da doenças que envolvem o osso temporar. Outro exame imagiológico usado por rotina foi a ressonância FIG. 1 FIG. 2 FIG. 3 colateral e o tempo angiográfico venoso são as informações mais importantes que essa técnica disponibiliza, e a embolização permite na maior parte dos casos uma redução muito importante da vascularização do tumor no intra-operatório. A discussão circunstanciada dos riscos, possíveis complicações e sequelas do tratamento cirúrgico fundamental para a obtenção de um consentimento informado, única forma de ajustar as expectativas dos doentes aos resultados previsíveis, assim como de evitar quaisquer questões médico-legais. Em particular a discussão dos défices neurológicos dos pares cranianos envolvidos é fundamental. Por exemplo, o risco de pneumonia de aspiração é muito menor no doente que já apresente um défice importante no X par, com disfonia, disfagia e pequenos engasgamentos (aspirações) do que naquele doente que tenha essas funções conservadas na pré-operatório, e no qual o défice vai ter uma instalação abrupta. Todos os tumores pertenciam as classes C e D da classificação de Fisch (Quadro 3) e foram operados pela Via da Fossa Infratemporal tipo A. VOL 47 NI MARCO 2009 27

Gonçalo Neto d'almeida, et al Designação Classes Descrição Glomus timpanico Glomus timpanomastoideu Paraganglioma jugulotimpanico ou glomus jugular A B C* Cl C2 C3 Tumores limitados a caixa do timpano Tumores limitados a região tímpano-mastoideia sem destruição do osso infralabilintico (sem envolvimento do foramen jugular) tumores envolvendo o compartimento infralabrifrintico e com extensão ao apex petroso Envolvimento limitado do segmento vertical do canal caroticleo Envolvimento completo do segmento vertical do canal carotideo Envolvimento dos segmentos vertical e horizontal do canal carotideo sem extensão ao foramen lacero 04 Com envolvimento do foramen lacero e extensão ao seio cavernoso Dt Tumores com extensão intracraniana extra ou intradural (* C = carótida; td -. dura mater, esta classe pode ainda ser subdividida de acordo com as dimensões intracranianas do tumor) Quadro 3 I Classificação dos paragangliomas do osso temporal (Fisch. 19775) Sublinhe-se que esta série não inclui os doentes com tumores das classes A e B porque, como nestas classes os tumores estão exclusivamente situados na caixa do tímpano ou na mastoicie, não são considerados jugulotimpanicos (não há envolvimento do foramen jugular) e são operados por vias de abordagens otorrinolaringológicas clássicas. A Via da Fossa Infratemporal tipo A inclui a realização de uma incisão retroauricuio-cervico-temporal (Figura 4); o encerramento definitivo do canal auditivo externo em fundo de saco (Figura 5); a exposição do nervo facial na glândula parotida (Figura 6); a exposição dos grandes vasos e pares cranianos do pescoço (Figura 7); a petrosectomia subtotal seguida da transposição anterior permanente (rerouting) do nervo facial (Figura 8) e da exposição do foramen jugular e do canal carotídeo (Figura 9). Após a remoção do tumor, é realizado o encerramento, que inclui a obliteração da trompa de Eustáquio, a reconstrução da dura mater (se necessária) e a obliteração da cavidade com gordura (Figura 10). Utiliza-se sempre o microscópio cirúrgico excepto na incisão e na exposição inicial da região cervical. Na dissecção do trajecto intra-parotídeo do nervo facial utilizamos lupas cirúrgicas. Em todos os doentes se utiliza a monitorização electrofisiológica intra-operatória permanente do nervo facial, com o equipamento Nerve Integrity Monitoring (NIM)-2XL., da Medtronic Xomed. A abordagem e a exposição dos compartimentos e das estruturas anatómicas nela incluídas são geralmente morosas, demorando em média cerca de 5 a 6 horas, 28 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CERVICO-FACIAL

Uma vez que a remoção do tumor só vai ser iniciada depois de completada a exposição, e nessa fase os cirurgiões já revelam por vezes algum cansaço, optámos em alguns casos por diferir a exerese tumoral para um segundo tempo operatório, realizado entre uma a duas semanas depois do primeiro. Esta atitude permitiu iniciar com mais tranquilidade o tempo de exérese tumoral, propiciar a remoção completa da lesão e, cremos nos, reduzir a morbilidade intra-operatória. O pós-operatório imediato é realizado na Unidade de Cuidados Intensivos (72 horas), onde é necessária uma vigilância especial para o aparecimento de défices dos últimos pares cranianos, que podem originar pneumonias de aspiração e morte. E importante, na selecção pré-operatória dos doentes, avaliar bem as condições e função respiratórias, para prever as consequências de uma eventual lesão dos últimos pares cranianos decorrente do tratamento cirúrgico. Nos doentes idosos e com patologia pulmonar ou ma função respiratória, e em particular nos casos em que não ha défices no preoperatório, o risco de aspiração é muito elevado podendo aconselhar a não se optar pelo tratamento cirúrgico. Pensamos que um dos nossos falecimentos se deveu, não técnica cirúrgica, mas sim a uma consideração menos exaustiva destes riscos, mas aprendemos com a experiência, e pelo menos uma vez depois disso, já optámos por não operar um doente, e mantê-lo num programa de vigilância periódica sem tratamento. As fistulas de liquor foram todas resolvidas com a colocação de uma drenagem lombar durante 7 dias, associada a cobertura antibiótica profiláctica com cefazolina endovenosa. Nos casos de recidiva/doença residual, as reintervençoes devem também ser ponderadas cuidadosamente, pois a exploração cirúrgica da região quando exista fibrose e não se observem pianos de dissecção evidentes, aumenta a morbilidade do procedimento para valores que vão dos 80 aos 100%12. Nestes casos, e nos tumores de maiores dimensões, é de ponderar a citoredução intra tumoral (cirurgia) seguida de radiocirurgia. Nos tumores mais pequenos deve-se fazer apenas radiocirurgia. A elevada taxa de paralisia no pós-operatório imediato deve-se sobretudo a manipulação cirúrgica e ao comprometimento da vascularização do nervo, uma vez que a transposição anterior implica a esqueletização do nervo desde o gânglio geniculado ao orifício estilomastoideu seguida da sua mobilização desde o gânglio geniculado até a primeira bifurcação parotidea. A confirmação intra-operatória da integridade anatómica do nervo e da resposta positiva ao neuroestimulador são factores que fazem prever um bom prognostico para a paralisia do nervo facial. A reabilitação do nervo facial inicia-se ainda durante o internamento e prolonga-se, no minimo, por seis a oito meses. Como referimos, apenas 5 dos nossos doentes mantiveram no longo prazo (mais de 6 meses a 1 ano) paralisias faciais importantes (House-Brackman III-VI). Actualmente, no sentido de dispor de meios de reabilitação apropriados, contamos com a colaboração da Neurooftalmologia (Dr. Joao Costa) para a colocação de implantes palpebrais (no primeiro mês de pos-operatório), destinados a evitar a queratite de exposição. Da mesma forma contamos com a colaboração da Cirurgia Plástica e Reconstrutiva (Dr. Julio Matias) para a reabilitação da face paralisada, nos casos em o prognostico da paralisia, confirmado após os 12 meses por electromiograma, seja muito limitado. Recorde-se que a extensa fibrose pósoperatória impossibilita, muitas vezes, a realização de uma anastomose hipoglosso-facial". CONCLUSÕES Os serviços de Otorrinolaringologia e Neurocirurgia do Hospital de Egas Moniz têm uma experiência importante no tratamento cirúrgico dos PJT pela Via da Fossa Infratemporal do Tipo A, alcançada ao longo de 20 anos e VOL 47 N'l MARÇO 2009 29

Gonçalo Neto d'almeida, et al com resultados que são satisfatórios e semelhantes aos de outras séries publicadas. Para esta realização foi importante a constituição, desde o inicio, de uma equipa multidisciplinar que inclui medicos de otorrinolaringologia, neurocirurgia e neurorradiologia. A preocupação permanente da equipa é proceder a uma selecção criteriosa e prudente das indicações cirúrgicas, melhorar os resultados cirúrgicos aumentando a percentagem de ressecções tumorais completas com um mínimo de morbilidade, promover a reabilitação dos defices neurológicos eventuais e, se possível, transmitir os seus conhecimentos a uma nova geração de colegas, para que o trabalho realizado possa ter continuidade no futuro. REFERENCIAS 1. Gulya AT The glomus tumor and its biology. Laryngoscope. 1993,103(11 Pt 2 Suppl 60):7-15. 2 Escada It Capucho C, Penha R. Glomus tumor. In: Penha R, ed. Otorhinolaryngology - The Third Millennium. Lisboa; 1995. 3 Jackson CO. Glomus tympanicum and glomusjugulare tumors. Otolaryngol din North Am. 2001;34(5):941-70, Or 4 Escada e O'Neill A, Capucho C, Penha R. via da Fossa Intratemporal Tipo A. Indicações e Técnica. XII Congresso Nacional de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cervico-Facial. Macau; 1994. 5. Fisch U. Infratemporal fossa approach for extensive tumors of the temporal bone and base of the skull. In: Silverstein HI, Norrel H, eds. Neurological Surgery of the ear. Birmingham (England): Aesculapius; 1977:34-53. 6 Fisch U, Mattox D. Microsurgery of the skull base. New York: Thieme Medical Publishers, Inc.; 1988. 7 Escada P, Capucho C, Penha R. N./1as da fossa infratemporal de acesso â base do crânio. Artigo de revisão. Revista Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cervico-Facial. 1995;33(6)317-26. 8 Sanna M, Jain Y, De Donato Get al. Management of jugular paragangliomas: the Gruppo Otologico experience. Otol Neurotol, 2004;25(5).797-804. 9. Jackson CO, McGrew BM, Forest JA, et al. Lateral skull base surgery for glomus tumors: long-term control. Otol Neurotol. 2001;22(3):377-82. 10. Escada P, Capucho C, Silva JM, et ar Cavernous haemangioma of the facial nerve..1 Laryngol tor 1997;111(9):858-51. 11. Kaylie DM, O'Malley M, Aulino JM,et ai. Neurotologic surgery for glomus tumors. Otolaryngol Clin North Am. 2007;40(3):625-49, 12. Sekhar L, Janecka I. Surgery of cranial base tumors. New York: Raven Press; 1993. 13. Robertson J, Coakham H. Cranial base surgery. Management, complications and outcome. London: Churchill Livingstone; 2000. 30 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CERVICO-FACIAL