LESÕES SUPERFICIAIS NA PRATICA CIRÚRGICA AMBULATORIAL Lia Ali Maicon P Cigolini Andressa S Eidt Daniel Weiss Vilhordo Ricardo Breigeiron UNITERMOS CIRURGIA AMBULATORIAL; CISTO EPIDÉRMICO; LIPOMA; ABSCESSO; CARCINOMA DE CÉLULAS ESCAMOSAS; NEVO; CARCINOMA BASOCELULAR; MELANOMA. KEYWORDS AMBULATORIAL SURGERY; EPIDERMAL CYST; LIPOMA; ABSCESS; CUTANEOUS SQUAMOUS CELL CARCINOMA; NEVUS; CARCINOMA; BASAL CELL; MELANOMA. SUMÁRIO Lesões superficiais são frequentes na prática clínica e geralmente não demandam ambientes hospitalares ou materiais cirúrgicos elaborados para sua resolução. O objetivo dos autores é apresentar a conduta nas principais lesões superficiais de interesse cirúrgico. SUMMARY Superficial lesions are common in clinical practice and its treatment generally does not require elaborate surgical material or hospital care. The central aim in this chapter is to present the management for the main superficial lesions in surgery concerning. CISTO SEBÁCEO OU EPIDERMÓIDE Ocorre quando o conduto de uma glândula sebácea é ocluído e gera acúmulo de secreção com consequente formação de cisto de retenção. É mais frequente no adulto nas regiões de couro cabeludo, orelha, pescoço e face. A apresentação habitual é de lesão subcutânea abaulada, pouco consistente, arredondada, de crescimento lento e tamanho variável. Frequentemente apresenta pequeno orifício, através do qual pode haver eliminação de material resultante da desintegração das células sebáceas. 1 As lesões podem permanecer
estáveis ou aumentar progressivamente. Infecção secundária pode ocorrer, inclusive com celulite adjacente, formação de abscesso e ruptura espontânea. 2 A indicação do tratamento baseia-se em aspectos estéticos, desconforto ou presença de infecção; e a conduta varia dependendo se há presença de infecção ou não: Cisto infectado (abscedido): caso a lesão não esteja madura, isto é, apresente-se ainda endurecida, idealmente deve-se indicar calor local e combinar revisão em 24 a 48 horas. No caso de lesões maduras, isto é, com sinais flogísticos e consistência amolecida, a opção é a drenagem no ponto de maior flutuação, sem exérese do cisto, pois o processo inflamatório torna difícil a remoção completa da lesão e aumenta a chance de recidiva. Além disso, a tentativa de retirada de toda a cápsula pode romper as barreiras defensivas da pele havendo propagação da infecção. Anestésicos locais têm seu efeito diminuído, porém podem ser utilizados em doses habituais. A pele sobre a lesão deve ser incisada, o material purulento drenado e a ferida mantida aberta. Em casos selecionados, o material pode ser enviado para análise microbiológica. A presença de celulite adjacente à lesão pode indicar necessidade de antibioticoterapia, que não é utilizada rotineiramente. O agente mais freqüente é o Staphylococcus aureus. 1 Deve-se esperar de quatro a seis semanas para o tratamento definitivo do cisto (excisão) 2 explicado a seguir. Cisto não infectado: está indicada a exérese. A técnica inclui anestesia local com bloqueio de campo ou infiltração entre a cápsula do cisto e os tecidos circunjacentes. Após, procede-se incisão linear da pele sobre a lesão e dissecase cuidadosamente o cisto separando-o dos tecidos adjacentes com o auxílio de afastadores ou ganchos, atentando para não romper a cápsula. A remoção completa do cisto íntegro (ou de qualquer vestígio de cápsula, no caso de lesões rotas) é necessária para evitar recidiva. Se houver extravasamento de material sebáceo, o tecido subcutâneo deve ser exaustivamente lavado. Tecidos devem ser aproximados, evitando espaço morto. LIPOMA Lipomas são tumores benignos de células adiposas maduras e representam a neoplasia benigna do tecido subcutâneo mais comum, localizada no subcutâneo. 3 Ocorrem principalmente nas regiões do pescoço, dorso, nádegas e porção proximal das extremidades. 1,4 Usualmente podem ser removidos à nível ambulatorial. Excluindo prejuízo estético, raramente causam sintomas. Entretanto, se presentes, pode haver dor leve, hipersensibilidade, desconforto ou compressão de estruturas adjacentes. 1 Apresenta-se como nódulo subcutâneo de crescimento lento, único ou múltiplo, arredondado ou multilobulado 1 e de tamanho muito variado, consistência amolecida, plano de clivagem bem definido em relação ao tecido adjacente, 5 Usualmente, é ligado à
pele que o recobre por feixes de tecido fibroso e que, quando pressionado, dá à pele um aspecto característico de casca de laranja. 1 Excepcionalmente, exames de imagem podem ser necessários, como em massas suspeitas, acima de 5 cm, irregulares ou manifestações miofasciais. 5 Após degermação e colocação e campos estéreis, anestesia local é realizada para iniciar o procedimento. É indicado marcar o perímetro da lesão previamente à cirurgia, pois a infiltração poderá distorcer as margens brandas do tecido. 4 Deve-se incisar sobre o lipoma, respeitando as linhas de força da pele. A incisão deve ser suficiente para a remoção completa da lesão. 5 Após a abertura da pele com o bisturi, utiliza-se pinça hemostática ( ) ou tesoura para separar o tumor do tecido adjacente. O plano de clivagem, via de regra, é encontrado facilmente. O dedo do cirurgião pode facilitar a dissecção. Geralmente, o sangramento é discreto, com exceção da região profunda do lipoma, por onde entram os vasos que o nutrem. Vasos maiores devem ser ligados. Após a remoção do lipoma, espaço subcutâneo residual deve ser fechado com pontos em U invertido de fio absorvível 3-0 ou 4-0. A pele é suturada com fio monofilamentar. 1 Lipoma versus lipossarcoma bem diferenciado: a análise histopatológica evita que lesão maligna (lipossarcoma), embora rara, passe despercebida e sem tratamento adequado. Lipossarcoma bem diferenciado ( lipoma-like lipossarcoma) pode ser confundido com lipoma, e habitualmente o comportamento biológico é de recidivas sucessivas. ABSCESSO CUTÂNEO Abscesso é coleção de tecido inflamatório purulento causado pela supuração dentro de tecido ou órgão. Das bactérias piogênicas infectante mais comum é Staphylococcus. 6 Na clínica, deve-se procurar história de quebra de barreira (picada por inseto, mordedura, trauma, etc) e, no exame físico, lesão com sinais flogísticos. Abscessos maduros apresentam-se macios e flutuantes, e os não maduros, eritematosos e endurecidos. Drenagem espontânea eventualmente pode ser identificada. Aspiração com agulha na suspeita de abscesso pode facilitar o diagnóstico quando o exame físico é duvidoso. 7 Entretanto, hematomas decorrentes de trauma não devem ser liberalmente explorados ou puncionados na ausência de alta suspeita ou clara definição de infecção. Abscessos maiores e profundos devem ser manipulados no centro cirúrgico. 8 Abscessos cervicais devem ser cuidadosamente avaliados pelo risco de mediastinite descendente. Em áreas do corpo onde há preocupação estética (face, mamas, pescoço) ou áreas como palma das mãos, planta dos pés e dobra nasolabial, avaliação de cirurgião plástico é apropriada. 9 Sinais de gravidade
incluem extensa área de celulite adjacente, febre e presença de múltiplos abscessos. Na maior parte dos casos, incisão e drenagem sob anestesia local é o tratamento de escolha. Em lesões extensas ou pacientes graves, o procedimento deve ocorrer no bloco cirúrgico. Para o abscesso sem flutuação, calor local reduz a dor e promove vasodilatação, acelerando a maturação. Repouso, elevação do segmento atingido e proteção do local são recomendáveis. 4 Abscesso com flutuação deve ser drenado prontamente. Abscessos perianais e anorretais fogem a esta regra devendo ser imediatamente drenados, mesmo sem flutuação, pelo risco de evolução para infecção perineal extensa. Ao utilizar anestésico local, deve-se considerar que, no baixo ph tecidual do abscesso, o efeito é menos satisfatório. Antibioticoterapia empírica é reservada para imunocomprometidos ou pacientes com extensa área de celulite, toxemia ou linfangite. 7 Após antissepsia, anestesia local é realizada de forma troncular ou por infiltração intradérmica direta da área de incisão, incluindo ou não o perímetro da lesão. Incisão deve ser realizada no ponto de maior flutuação, respeitando as linhas de força. É prudente cobrir a área com gaze, visto que o abscesso está sob tensão, podendo haver pequena explosão de seu conteúdo. 8 É fundamental explorar a cavidade com pinça hemostática ( ), para a quebra das loculações. Realiza-se compressão manual para drenagem do conteúdo purulento e, após, irrigação copiosa com solução fisiológica. Uso de dreno (Penrose) não é rotineiro, mas pode ser necessário em lesões maiores, devendo ser fixado com ponto simples e removido pelo médico em 24 a 48 horas. É prática comum, ao se optar por não drenar, projetar a extremidade de uma gaze no interior da cavidade residual, mantendo-a até a primeira troca de curativos. Curativo deve ser realizado e trocado diariamente e a limpeza deve incluir soro fisiológico. A cicatrização se dará por segunda intenção. 8 NEVOS São lesões cutâneas constituídos por células névicas ou células maduras podendo ter depósito de pigmento melânico com coloração variada decorrentes de hiperplasia de estrutura epidérmicas. Tais lesões acometem tanto partes cutâneas quanto mucosas e têm morfologia e dimensões bastante variáveis. Estão presentes ao nascimento (nevos congênitos) ou surgem posteriormente (nevos adquiridos). A maioria dos nevos tem como tratamento a excisão cirúrgica. A excisão segue o seguinte padrão: anestesia local, incisão elíptica sem margens ao redor da lesão (margens de incisão justapostas às margens da lesão), retirada econômica de tecido subcutâneo, sem aprofundar. A sutura é simples ou intradérmica com fio de nylon. O curativo é feito com micropore.
LESÕES SUSPEITAS DE MALIGNIDADE Uma lesão é considerada suspeita de ser maligna quando se enquadra em critérios característicos de crescimento irregular, diferentemente dos nevos que em sua maioria apresentam-se como manchas simétricas e homogêneas. A prioridade nas lesões suspeitas de malignidade é o diagnóstico histopatológico. Em lesões não sugestivas de melanoma e não ulceradas, a margem deve ser de 0,5 a 1,0cm e, nas ulceradas,de 1,0 a 1,5cm. No caso de lesões suspeitas de melanoma, o primeiro passo é a biópsia excisional sem margem ampla. Conforme a análise histopatológica, profundidade da invasão dos estratos da pele e outras variáveis, pode ser necessária ampliação maior ou menor. Considerações sobre o tratamento oncológico definitivo do melanoma estão além do escopo deste capítulo. 1,4,10 A seguir são relatadas características das principais lesões cutâneas malignas. Carcinoma basocelular: Neoplasia de origem epidérmica, acomete áreas como face e pescoço. Caracteriza-se por lesão de evolução indolente, friável, facilmente sangrante, que não cicatriza por completo. Manifesta-se clinicamente como pápula ou nódulo brilhante ou perolado com telangiectasias arboriformes (vasos sanguíneos subepidérmicos dilatados e proeminentes). Carcinoma espinocelular (epidermoide): Tumor mais invasivo, apresentase normalmente sobre lesão pré-cancerosa. A localização mais frequente é na cabeça, pescoço e lábio inferior. Quando in situ, pode se apresentar como placa eritematosa, escamosa e bem definida; na fase invasiva, pode progredir para lesão nodular com produção de queratina. Tende a formar úlcera com superfície irregular, sangrante, com restos necróticos e possível infecção secundária. Melanoma: Neoplasia maligna agressiva originária de transformação atípica de melanócitos presentes em pele, meninges, trato uveal e mucosas ectodérmicas. Localiza-se preferencialmente nas regiões torácica, palmar, plantar, facial e couro cabeludo. A mnemônica ABCD é útil para o diagnóstico, sendo descrita a seguir: A assimetria; B borda irregular; C cor heterogênea; D diâmetro maior que 6mm. 1,4,10 Conclusão Lesões superficiais são presentes na prática clínica e apresentam-se em suas mais variadas formas. Podem ser de simples manejo e na maioria das vezes não demandam ambiente hospitalar ou materiais cirúrgicos elaborados para sua resolução. REFERÊNCIAS
1. Rocha PRS, Tostes ROG. Tumores da pele e tecido celular subcutâneo. In: Fonseca FP, Rocha PRS, organizadores. Cirurgia ambulatorial. 2ª.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1987. p.235-67. 2. Goldstein BG, Goldstein AO. Overview of benign lesions of the skins. [Database on internet]. 2013 Jul [updated 2013 Ago 1; cited 2013 Jul 30]. In: UpTodate. Available: http://www.uptodate.com/contents/overview-of-benign-lesions-of-the-skin. Release: 21.6 - C21.96 3. Brunicardi FC, editor. Schwartz s principles of surgery. 8th.ed. New York: McGraw-Hill; 2004. 4. Almeida HC, Guimarães JR, organizadores. Manual de cirurgia ambulatorial. 2ª.ed. Porto Alegre: UFRGS; 2006. 5. Pandya KA, Radke F. Benign skin lesions: lipomas, epidermal inclusion cysts, muscle and nerve biopsies. Surg Clin North Am. 2009 Jun;89(3):677-87. 6. Kumar V, Abbas AK, Fausto N. Robbins e Cotran: patologia: bases patológicas das doenças. 7ª.ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2005. 7. Halvorson GD, Halvorson JE, Iserson KV. Abscess incision and drainage in the emergency department: part I. J Emerg Med 1985;3(3):227-32. 8. Amato ACM. Drenagem de abscesso cutâneo. In: Procedimentos médicos: técnica e tática. São Paulo: Roca; 2008. p.307-13. 9. Fitch MT, Manthey DE, McGinnis HD, et al. Videos in clinical medicine. Abscess incision and drainage. N Engl J Med 2007;357(19):e20. 10. Rotta O, coordenador. Guia de dermatologia: clínica, cirúrgica e cosmiátrica. Barueri: Manole; 2008.