ANOMALIAS DENTÁRIAS EM PACIENTES PORTADORES DE FISSURAS LABIOPALATINAS: REVISÃO DE LITERATURA

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Edited by Foxit PDF Editor Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004 For Evaluation Only. ANOMALIAS DENTÁRIAS EM PACIENTES PORTADORES DE FISSURAS LABIOPALATINAS: REVISÃO DE LITERATURA DENTAL ANOMALIES IN THE PATIENTS WITH CLEFT LIP AND PALATE: A LITERATURE REVIEW Ana Christina Claro Neves Mônica César Patrocínio Departamento de Odontologia da Universidade de Taubaté Karime Paes Leme Regina Tiemi Ui Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Paraíba RESUMO As fissuras labiopalatinas são malformações congênitas que causam em seus portadores além de comprometimento estético severo, distúrbios funcionais que vão desde a alimentação até a fonação. Visando estudar as anomalias dentárias presentes nesses pacientes foi realizada a revisão da literatura pertinente ao assunto. Observou-se que anomalias dentárias se evidenciam mais freqüentemente em pacientes portadores de fissuras labiopalatinas do que na população em geral e ocorrem com maior incidência na dentição permanente, na região da fissura. O incisivo lateral superior é o elemento dentário mais susceptível a injúrias e mostra maior incidência de anodontia. O diagnóstico precoce das anomalias dentárias é de fundamental importância para que sejam minimizados seus efeitos deletérios no desenvolvimento harmonioso da oclusão dentária e da estética, através de conduta clínica e ortodôntica adequada. PALAVRAS-CHAVES: fissuras de lábio, fissuras de palato, anomalias dentárias INTRODUÇÃO Os portadores de fissuras labiopalatinas, além de grave problema estético, apresentam distúrbios funcionais severos, de forma que se esta deformidade não for tratada convenientemente e a tempo, poderá causar também, problemas de ordem psicológica ao portador (REZENDE, 1997). Anomalias dentárias de número, tamanho, forma, desenvolvimento e erupção, são bastante freqüentes em fissurados labiopalatinos e a sua intensidade parece depender da severidade da fissura. Embora apareçam na dentição decídua, prevalecem na dentição permanente, e na maxila sua incidência é maior do que na mandíbula. Essas anomalias parecem ser determinadas embriologicamente, ocorrendo em fases diferentes do desenvolvimento dental; as anomalias de número se dão durante a formação inicial dos germes dentais, as de forma durante a morfodiferenciação e as de posição durante a erupção do dente. Embora a anodontia seja a anomalia dentária mais freqüentemente observada em portadores de fissuras de lábio e palato, afetando principalmente o incisivo lateral do lado da fissura, outras anomalias como dentes supranumerários, microdentes, erupção dentária ectópica, dentes natal, neonatal e intranasal, atraso na erupção e na formação dentária também são evidenciadas. REVISÃO DA LITERATURA Damante, Freitas e Moraes (1973) estudaram a incidência de agenesia dentária e de dentes supranumerários na área das fissuras de lábio e rebordo alveolar e de lábio - rebordo alveolar-palato, nas Rev. biociênc.,taubaté, v.8, n.2, p.75-81, jul.-dez.2002.

dentições decídua e permanente. Participaram da pesquisa 115 pacientes com idades variando entre 3 e 25 anos. Na dentição permanente, foi encontrada maior incidência de agenesia dentária do que de dentes supranumerários e, na dentição decídua, dentes supranumerários foram observados mais freqüentemente que agenesia. A incidência de dentes supranumerários era menor quanto mais complexa era a fissura e a incidência de agenesia parecia aumentar nesta mesma ordem. Ranta (1986) revisou a literatura referente as anomalias dentárias presentes em crianças com fissuras de lábio e palato e, segundo o autor, o incisivo lateral superior na área de fissura é o elemento dentário mais susceptível a injúrias nas dentições decídua e permanente, aumentando a prevalência de agenesia com a gravidade da fissura. Na dentição decídua, anodontia é encontrada mais freqüentemente na maxila, porém na dentição permanente, maxila e mandíbula são igualmente afetados. O tempo de formação da dentição permanente é maior em crianças portadoras de fissuras labiopalatinas que em crianças não fissuradas e parece aumentar com a gravidade da fissura. O tamanho dos dentes permanentes é menor em crianças fissuradas do que em crianças não fissuradas, com evidente desequilíbrio do tamanho coroa-raiz. Ranalli, Elliott e Zullo (1986) compararam a prevalência de erupção ectópica em 118 crianças, com média de idade de 9,3 anos, portadoras de fissuras de lábio e palato. Após análise radiográfica, 236 dentes mostravam erupção ectópica, sendo que 49 eram primeiro molar superior permanente, e destes, 38 haviam irrompido espontaneamente. Os autores concluíram que a erupção ectópica do primeiro molar superior permanente incide mais freqüentemente em portadores de fissuras labiopalatinas do que em indivíduos não fissurados, e que grande número de molares com erupção ectópica, entram em posição normal espontaneamente. Lopes, Mattos e André (1991) estudaram as anomalias dentárias de número em 86 portadores de malformação congênita de lábio e palato. Os autores observaram que anomalias dentárias de número são sete vezes mais prevalentes em pacientes com fenda labial e palatina do que na população não fissurada; anodontia se evidencia duas vezes mais freqüente que dentes supranumerários tanto em indivíduos não fissurados como naqueles com fissuras labiopalatinas e, a freqüência de dentes supranumerários é inversamente proporcional a complexidade da fenda. Silva Filho, Albuquerque e Costa (1993) pesquisaram a prevalência de erupção ectópica do primeiro molar permanente superior em pacientes com fissura de palato. Participaram da pesquisa 107 pacientes que haviam se submetido à cirurgia reparadora das fissuras nos primeiros anos de vida e, após análise das radiografias panorâmicas, foram evidenciados 22 pacientes com erupção ectópica dos primeiros molares. Bjerklin, Kurol e Paulin (1993), após análise da erupção ectópica dos primeiros molares permanentes superiores em 125 crianças com fissuras labiopalatinas, encontraram prevalência quatro vezes superior em crianças fissuradas que em crianças não fissuradas. Nas crianças com fissuras de lábio ou de palato e processo alveolar, a prevalência era de 15.4% e naquelas com fissuras palatinas, era de 28.8%. Segundo os autores, pacientes do sexo feminino apresentavam mais freqüentemente erupção ectópica do que os do sexo masculino e o achado mais notável do estudo foi a erupção ectópica do molar não ter sido observada no lado da fissura. Vichi e Franchi (1995) estudaram a prevalência de anomalias dentárias de número, tamanho e forma dos incisivos superiores decíduos e permanentes, em crianças portadoras de fissuras uni ou bilaterais, de lábio e processo alveolar, com ou sem envolvimento do palato. Foram analisados, através de exame clínico e radiográfico, 77 pacientes entre 3 e 16 anos de idade. Os resultados mostraram que os incisivos laterais eram os dentes mais freqüentemente ausentes no lado da fissura, sendo que em 8 casos estava ausente em ambas as dentições e em 25, somente na dentição permanente. Segundo os autores, a ausência congênita do incisivo lateral decíduo está sempre associada à ausência congênita do correspondente permanente; entretanto, a presença do incisivo lateral decíduo do lado fissurado pode estar também associada à ausência congênita do incisivo lateral permanente. O incisivo central permanente do lado fissurado estava ausente em 2,6% dos casos e os incisivos laterais supranumerários foram mais freqüentemente encontrados na dentição permanente do que na decídua. Em 28 pacientes o incisivo lateral permanente do lado fissurado apresentava algum grau de deformidade no tamanho ou na forma, e somente 4 pacientes apresentavam deformidades no incisivo central. Os autores concluíram que o reconhecimento precoce das anomalias dentárias na dentição decídua é de grande importância para o sucesso do tratamento interceptivo de problemas potencialmente severos. Oliveira, Capelozza e Carvalho (1996) após estudarem a freqüência de anomalias dentárias de desenvolvimento e sua correlação com os tipos de fissuras labiopalatinas, em 2511 pacientes fissurados,

encontraram maior freqüência de agenesia dental, dentes supranumerários e microdontia do incisivo lateral no lado da fissura. Agenesia do incisivo lateral superior se evidenciou mais freqüentemente nos pacientes com fissuras pré e transforame e, agenesia do segundo pré-molar inferior nos pacientes com fissuras pós-forame. O segundo pré-molar superior foi o elemento dentário retido mais comumente observado nos portadores de fissura pré-forame completa unilateral direita e, o segundo pré-molar inferior nos portadores de fissuras pós-forame. Almeida e Gomide (1996) analisaram a prevalência de dentes neonatal em 692 crianças portadoras de fissura unilateral completa e 367 com fissura de lábio e palato bilateral, com menos de 3 meses de idade e não operadas. Maior prevalência de dente neonatal foi encontrada nas portadoras de fissura bilateral completa (10.6%), e no grupo portador de fissura unilateral completa foi evidenciado 2,02%, sendo esses valores significativamente maiores do que os relatados em crianças não fissuradas. Peterka, Peterková e Likoviski (1996) investigaram o período de substituição da dentição decídua maxilar pela permanente em 163 portadores de fissuras labiopalatinas unilaterais completas (FLPUC), 82 de fissuras bilaterais (FLPB), e 97 de fissuras palatinas isoladas (FP). Os resultados foram comparados com um grupo controle constituído por 294 pacientes. Nos pacientes portadores de FLPUC, a erupção dos incisivos laterais e segundos molares permanentes foi mais lenta do lado da fissura; no lado não afetado não foi observado nenhum atraso na erupção dentária e se evidenciou erupção precoce do canino e dos primeiros e segundos prémolares superiores. Nos pacientes com FLPB, o maior atraso na erupção foi observado no incisivo lateral e primeiro molar superior e o canino e os pré-molares erupcionaram mais cedo do que no grupo de controle. Nos pacientes com FP, os incisivos centrais erupcionaram precocemente e os caninos e segundos molares superiores decíduos foram esfoliados mais cedo. Os autores concluíram que os distúrbios de desenvolvimento da maxila em pacientes com fissuras labiopalatinas estão associados com as alterações do período de substituição de dentes. Mattos et al. (1997) analisaram a assimetria do incisivo central superior em trinta indivíduos portadores de fissura labiopalatina unilateral, observando que os incisivos centrais superiores adjacentes à fissura não apresentavam redução significativa na largura mésio-distal de seu terço cervical, embora fossem significativamente menores nos terços médio e incisal quando comparados a seus contralaterais. Segundo os autores, isso possivelmente se deva a redução da borda incisal voltada para a fissura e a alterações de estrutura de esmalte. Lekkas, Latief e Kuijpersjagtman (1999) investigaram a ausência de caninos e pré-molares em 266 pacientes adultos portadores de fissuras labiopalatinas e não operados. Ausência de caninos e pré-molares não foi encontrada e anomalias dentárias de número só foram observadas em dentes localizados na região da fissura. Os resultados deste estudo sustentam a hipótese de que a cirurgia precoce para o fechamento do palato duro na infância, é o fator etiológico mais importante para a ausência de dentes fora da região da fissura. Shapira, Lubit e Kuftinec (1999) avaliaram 278 pacientes portadores de fissura labial, palatina ou ambas, objetivando determinar a freqüência da agenesia dos segundos pré-molares. Os autores observaram que a freqüência da agenesia em indivíduos com fissuras labiopalatinas era significativamente maior que a observada na população não fissurada, se mostrando três vezes mais freqüente na maxila do que na mandíbula. Segundo os autores, o diagnóstico da agenesia dos incisivos laterais e segundos pré-molares encontrados em indivíduos com fissuras labiais e palatinas, é extremamente importante para a determinação de um plano de tratamento adequado. Medeiros et al. (1999) estudaram a diferença de incidência de dentes intranasal em pacientes do sexo masculino e feminino, portadores de fissuras labiopalatinas. Foram analisados 815 pacientes com fissura de lábio e palato bilateral e 1495 com fissura de lábio e palato unilateral. Os resultados mostraram maior incidência de dente intranasal no sexo feminino, sendo 0.61%, as crianças que apresentavam fissuras de lábio e palato bilateral e 0.40%, as que apresentavam fissuras de lábio e palato unilateral. Segundo os autores, a união incompleta do processo embrionário parece ser a provável causa do deslocamento do germe dentário original. Cabete, Gomide e Costa (1999) analisaram o número de dentes presentes na dentição decídua de portadores de fissuras labiopalatinas, com e sem a presença de dente neonatal na região da fissura. A dentição decídua de 55 crianças com fissuras de lábio e palato uni e bilateral, com idade variando de 3 a 6 anos e que apresentavam dente neonatal foi clinicamente avaliada e comparada com a dentição decídua de 54 portadores de fissuras de lábio e palato uni e bilateral, sem dente neonatal. Os portadores de dente neonatal já tinham tido

estes dentes extraídos e, a falta do incisivo lateral na região de fissura era a anomalia mais prevalente. Segundo os autores a extração do dentes neonatal parece não alterar o número de dentes decíduos. Shapira, Lubit e Kuftinec (2000) utilizaram radiografias panorâmicas, periapicais e oclusais de 278 pacientes com fissuras labiais, palatinas ou ambas, para analisar a prevalência de agenesia, fora e na região da fissura, e a possível associação entre o lado fissurado e o lado da ausência dentária. Foi encontrada prevalência de anodontia de 77% (excluindo os terceiros molares) e este valor era significativamente maior, estatística e clinicamente, que o encontrado na população não fissurada e, consideravelmente maior que a relatada em estudos prévios. Os incisivos laterais superiores permanentes eram os dentes mais freqüentemente ausentes no lado fissurado seguido pelos segundos pré-molares superiores e segundos pré-molares inferiores. No lado não fissurado, os dentes mais freqüentemente ausentes eram os segundos pré-molares superiores, incisivos laterais superiores e segundos pré-molares inferiores. Anodontia foi mais evidenciada nas fissuras de maxila do que nas de mandíbula e nos casos de fissura unilateral era mais freqüente no lado da fissura. Segundo os autores, é de grande importância o diagnóstico precoce de dentes permanentes congenitamente ausentes e o conhecimento do tamanho e número dos dentes remanescentes, para que se possa estabelecer um plano de tratamento adequado. DISCUSSÃO A odontologia, através de suas diversas especialidades, tem conseguido notáveis resultados na reabilitação de indivíduos portadores de malformações congênitas labiopalatinas, no que se refere à estética, à função e à fonação (DAMANTE; FREITAS; MORAES, 1973). Anomalias de número, tamanho e forma dos dentes e alterações dos períodos de formação e sua erupção são freqüentemente observadas nestes pacientes, gerando não só problemas estéticos como também dificuldades na mastigação, respiração, deglutição e fonação. O diagnóstico precoce dessas anomalias permite que se estabeleçam condutas clínicas e ortodônticas preventivas, interceptativas e corretivas, visando à obtenção de uma oclusão mais favorável (OLIVEIRA; CAPELOZZA; CARVALHO, 1996). Pesquisas apontam que anomalias dentárias são significativamente mais prevalentes em pacientes portadores de fissuras labiopalatinas do que na população em geral e na região da fissura maior incidência é observada do que na região contralateral (RANALLI; ELLIOTT; ZULLO,1986; LOPES; MATTOS; ANDRÉ, 1991; BJERKLIN; KUROL; PAULIN, 1993; ALMEIDA; GOMIDE,1996; SHAPIRA; LUBIT; KUFTINEC,1999; SHAPIRA; LUBIT; KUFTINEC, 2000). Embora essas anomalias dentárias afetem as dentições decídua e permanente, sua incidência parece ser maior na dentição permanente (VICHI; FRANCHI, 1995). A incidência de anodontia e dentes supranumerários nas dentições decídua e permanente de portadores de fissuras labiopalatinas foi estudada por diversos autores (DAMANTE; FREITAS; MORAES, 1973; RANTA, 1986; LOPES; MATTOS; ANDRÉ, 1991; VICHI; FRANCHI, 1995; OLIVEIRA; CAPELOZZA; CARVALHO, 1996; LEKKAS; LATIEF; KUIJPERSJAGTMAN, 1999; SHAPIRA; LUBIT; KUFTINEC, 1999; CABETE; GOMIDE; COSTA, 1999; SHAPIRA; LUBIT; KUFTINEC, 2000) e, de acordo com Lopes, Mattos e André (1991), são sete vezes mais freqüentes nesses pacientes do que na população em geral, sendo a anodontia duas vezes mais freqüente que dentes supranumerários. Damante, Freitas e Moraes (1973) relataram maior incidência de anodontia do que de dentes supranumerários na dentição permanente e, maior número de dentes supranumerários na dentição decídua, entretanto, Vichi e Franchi (1995) observaram que incisivos laterais supranumerários são mais freqüentemente encontrados na dentição permanente. A incidência de dentes supranumerários parece diminuir e a de anodontia aumentar quanto mais complexa é a fissura (DAMANTE; FREITAS; MORAES, 1973; RANTA,1986; LOPES; MATTOS; ANDRÉ, 1991). Enquanto Ranta (1986) observou que o tempo de formação da dentição permanente é maior em crianças portadoras de fissuras labiopalatinas do que em crianças não fissuradas e este tempo aumenta com a gravidade da fissura, Peterka, Peterková e Likoviski (1996) relataram erupção mais lenta dos dentes permanentes apenas do lado da fissura. Em pacientes portadores de fissuras labiopalatinas o incisivo lateral superior, decíduo e permanente, localizado no lado da fissura, é o elemento dentário mais susceptível a injúrias (RANTA,1986; OLIVEIRA;

CAPELOZZA; CARVALHO, 1996), sendo os incisivos laterais permanentes superiores, os dentes mais ausentes (VICHI; FRANCHI,1995) nesses pacientes. Segundo Oliveira, Capelozza e Carvalho (1996), a agenesia e a impacção do segundo pré-molar inferior são mais freqüentemente evidenciadas nos portadores de fissura pós-forame e o segundo pré-molar superior parece ser o elemento dentário retido mais comumente encontrado nos portadores de fissura pré-forame completa unilateral direita. Shapira, Lubit e Kuftinec (1999), encontraram freqüência significativamente maior de agenesia do segundo pré-molar nos portadores de fissuras labiopalatinas do que a observada na população não fissurada, sendo evidenciada mais comumente na maxila do que na mandíbula e em portadores de fissuras unilaterais do lado esquerdo. Lekkas, Latief e Kuijpersjagtman (1999) não encontraram anodontia de caninos e pré-molares em 266 pacientes adultos portadores de fissuras labiopalatinas e não operados, sendo provavelmente a cirurgia precoce, realizada na infância, para o fechamento do palato duro, o fator etiológico mais importante da ausência de dentes fora da região da fissura. Contradizendo essa hipótese, está a anteriormente estabelecida por Bjerklin, Kurol e Paulin (1993), de que a ausência de dentes superiores fora da área da fissura se deve a fatores congênitos. Enquanto a prevalência de erupção ectópica do primeiro molar permanente vem sendo relatada entre 2 a 6% na população em geral, uma prevalência de 20 a 30% tem sido observada em portadores de fissuras labiopalatinas (SILVA FILHO; ALBUQUERQUE; COSTA, 1993). Ranalli, Elliott e Zullo (1986) evidenciaram erupção ectópica do primeiro molar permanente superior em 26,3% dos pacientes fissurados de lábio e palato, sendo a maior freqüência encontrada em portadores de fissuras de lábio e palato do lado esquerdo. Dentes natal e neonatal são definidos como dentes presentes na boca no nascimento e aqueles que erupcionam nos primeiros trinta dias de vida, respectivamente. Enquanto estas condições são raramente encontradas na população normal, uma alta incidência (10,6%) foi observada por Almeida e Gomide (1996) em um grupo de portadores de fissura bilateral de lábio/processo alveolar/palato, sendo os incisivos central e lateral decíduos superiores os elementos dentários mais descritos na literatura (ALMEIDA; GOMIDE,1996; CABETE; GOMIDE; COSTA, 1999). Dentes intranasal é um fenômeno raro na população em geral, assim como em portadores de malformação de lábio e palato e, embora sua etiologia seja desconhecida, a união incompleta do processo embrionário parece ser a provável causa do deslocamento do germe dentário original. (MEDEIROS, 1999). Baseados na revisão da literatura podemos afirmar que é extremamente importante o conhecimento das anomalias dentárias presentes em pacientes portadores de fissuras de lábio e palato, no sentido de permitir o diagnóstico precoce das mesmas e o estabelecimento de um plano de tratamento adequado. CONCLUSÃO a) Anomalias de número, tamanho e forma dos dentes e, alterações dos períodos de formação e erupção dos mesmos são mais prevalentes em portadores de fissuras labiopalatinas do que na população em geral. b) Embora as anomalias dentárias afetem as dentições decídua e permanente, sua incidência parece ser maior na dentição permanente, sendo o incisivo lateral superior do lado da fissura o dente mais susceptível a injúrias e o que apresenta maior freqüência de agenesia. c) As anomalias dentárias mais freqüentemente observadas em portadores de fissuras labiopalatinas são anodontia, dentes supranumerários, natal e neonatal, erupção ectópica e, atraso na formação e erupção dentária. d) O conhecimento das anomalias dentárias presentes em pacientes portadores de fissuras de lábio e palato é de fundamental importância no sentido de permitir seu diagnóstico precoce e o estabelecimento de um plano de tratamento adequado. ABSTRACT The cleft lip-palate are congenital malformations that cause in bearers severe aesthetic compromising and functional disturbances from the feeding to the phonetics. Seeking to identify the dental anomalies of number, shape, size, development and eruption that are frequently evidenced in those patient, the review of pertinent literature was accomplished to the subject. It was observed that those dental anomalies are more significantly frequent in patient bearers of fissures lip-palate than in the population in general, and, according to several

authors, it happens with larger incidence in the permanent teething, in the area of the fissure. Therefore, the maxillary lateral incisor is the dental element more susceptible to offenses, and it presents larger anodontia incidence. It is necessary to settles down a precocious diagnosis of these anomalies to minimize the deleterious effects in the harmonious development of the dental occlusion and of the aesthetics, through clinical conduct and suitable ortodontic. KEY-WORDS: cleft lip, cleft palate, dental anomalies REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, C. M.; GOMIDE, M. R. Prevalence of natal/neonatal teeth in cleft lip and palate infants. Cleft Palate-Craniofacial Journal, v. 33, n. 4, p. 297-299, 1996. BJERKLIN, K.; KUROL, J.; PAULIN, G. Ectopic eruption of the maxillary first permanent molars in children with cleft lip and/or palate. European Journal of Orthodontics, v. 15, n. 6, p. 535-540, 1993. CABETE, H. F.; GOMIDE, M. R.; COSTA, B. Evaluation of primary dentition in cleft lip and palate children with and without natal/neonatal teeth. Cleft Palate-Craniofacial Journal, v. 37, n. 4, p. 406-409, 1999. DAMANTE, J. H.; FREITAS, J. A. S.; MORAES, N. Anomalias dentárias de número na área da fenda, em portadores de malformações congênitas lábio-palatais. Estomatologia & Cultura, v. 7, n. 1, p. 88-97, 1973. LEKKAS, C.; LATIEF, B. S.; KUIJPERS-JAGTMAN, A. M. The adult unoperated cleft pacient: absence of maxillary teeth outside the cleft area. The Cleft Palate-Craniofacial Journal, v. 37, n. 1, p. 17-20, 1999. LOPES, L. D.; MATTOS, M. A.; ANDRÉ, M. Anomalies in number of teeth in patients with lip and/or palate clefts. Brazilian Dental Journal, v.2, n.1, p. 9-17, 1991. MATTOS, B. S. C. et al. Assimetria de incisivos centrais superiores permanentes em indivíduos portadores de fissura lábiopalatina unilateral. RPG, v. 4, n. 2, p. 141-145, 1997. MEDEIROS, A. S. et al. Prevalence of intranasal ectopic teeth in children with complete unilateral and bilateral cleft lip and palate. The Cleft Palate-Craniofacial Journal, v. 37, n. 3, p. 271-273, 1999. OLIVEIRA, D. F. B.; CAPELOZZA, A. L. A.; CARVALHO, I. M. M. Alterações de desenvolvimento dentário em fissurados. Revista da Associação Paulista de Cirurgiões-Dentistas, v. 50, n. 1, p. 83-86, 1996. PETERKA, M.; PETERKOVÁ, R.; LIKOVISKI, Z. Timing exchange of the maxillary deciduous and permanent teeth in boys with three types of orofacial clefts. Cleft Palate-Craniofacial Journal, v. 33, n. 4, p. 318-323, 1996. RANALLI, D. N.; ELLIOTT, M. A.; ZULLO, T. G. Comparative analysis of ectopic eruption of maxillary permanent first molars in children with clefts. Journal of Dentistry For Children, v. 53, n. 6, p. 433-435, 1986. RANTA, R. A review of tooth formation in children with cleft lip/palate. Am. J. Orthod. Dentofac. Orthop., v. 90, n. 1, p. 11-18, 1986. REZENDE, J. R. V. Fundamentos da Prótese Buco-Maxilo-Facial, São Paulo: Sarvier, 1997. p. 23-50. SILVA FILHO, O. G.; ALBUQUERQUE, M. V. P.; COSTA, B. Irrupção ectópica do primeiro molar permanente superior em pacientes portadores de fissura isolada de palato (fissura pós-forame incisivo). Revista de Odontologia da USP, v. 7, n. 1, p. 1-10, 1993.

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