ACESSO AOS MEDICAMENTOS ANTI-RETROVIRAIS: DESAFIOS EM PROPRIEDADE INTELECTUAL PARA OS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA



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Transcrição:

I Seminário Internacional de Propriedade Intelectual nos Países de Língua Portuguesa Rio de Janeiro, 30 de junho a 2 julho 2008 ACESSO AOS MEDICAMENTOS ANTI-RETROVIRAIS: DESAFIOS EM PROPRIEDADE INTELECTUAL PARA OS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA Secretaria de Vigilância em Saúde Programa Nacional de DST e Aids Cristina de A. Possas Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico

Dramatico cenário global Pandemia - 33 milhões de pessoas infectadas pelo HIV no mundo. Destas, cerca de 70% estão na África. A cada ano 2,5 milhões de pessoas ficam infectadas e 2 milhões morrem de AIDS (OMS/UNAIDS, 2007) Projeção Estima-se, nas estimativas mais otimistas, que até 2025 terão morrido na África 67 milhões de pessoas com AIDS (UNAIDS AIDS Africa Project, 2004)

Desafio: acesso ao tratamento questão de direitos humanos

Acesso: realidade excludente e perversa Acesso - em que pese os recentes avanços alcançados pela Iniciativa 3 by 5 (OMS/UNAIDS), 74% das pessoas vivendo hoje com HIV/AIDS no mundo em desenvolvimento não têm acesso à terapia ARV, capaz de salvar vidas (Relatório OMS, UNAIDS e UNICEF, 2007)

Este cenário contrasta com as inovações no setor farmacêutico Nova biotecnologia - avanços nos campos da biologia molecular e da engenharia genética. Desenvolvimento de novos processos e produtos em saúde- medicamentos, kits para diagnóstico e monitoramento AIDS Terapia anti-retroviral potente Coquetel Medicamentos com menos efeitos colaterais

Alcance limitado destas inovações, pois propriedade intelectual restringe acesso Monopólio temporário Impacto nos preços

Debate Internacional da Propriedade intelectual Direito à proteção da inovação: proteção do detentor da patente bens no mercado Versus Acesso Público ao Bem Comum: Saúde Pública a questão dos medicamentos

Brasil: caso paradigmático de políticas contraditórias Muito bem sucedida política de acesso universal ao tratamento ARV, internacionalmente reconhecida Ao mesmo tempo, adesão imediata ao TRIPS, com uma legislação de PI pouco flexível, considerada TRIPS Plus, que afetou a produção local, a competição dos genéricos e vem ameaçando a sustentabilidade desta política de acesso universal

Governança: equívocos na política e na regulação voltadas a insumos estratégicos (ARV e outros) 1. Política tecnológica e industrial (lacunas, ausência de PPP, problemas na implementação da Lei de Inovação) 2. Sistema regulatório (propriedade intelectual, vigilância sanitária, avaliação ética e de biossegurança)

Saúde Pública e Acesso Universal a Medicamentos ARV no Brasil A política de acesso universal aos ARV é assegurada por lei específica Lei n 0 9.313 de 13 de novembro de 1996, que dispõe sobre a distribuição gratuita de medicamentos aos portadores do HIV e doentes de AIDS Esta legislação é baseada nos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), com fundamento na Constituição Federal de 1988 para todas as pessoas vivendo com HIV/AIDS A legislação em vigor resultou da intensa mobilização política em torno da Reforma Sanitária Brasileira no início da década de 80

Programa Brasileiro: sucesso da cobertura universal dos ARVs ACENTUADO DECLÍNIO NA MORBIDADE E MORTALIDADE DESDE 1996 Nº ESTIMADO DE PESSOAS VIVENDO COM HIV: 600.000 ( 50% MENOS DO QUE AS PROJEÇÕES DE 1992 DO BANCO MUNDIAL: CERCA DE 1,2 MILHÕES DE PORTADORES DO HIV NO ANO 2000) CERCA DE 180 MIL PESSOAS EM TRATAMENTO ARV

IMPACTOS DA POLÍTICA DE ACESSO UNIVERSAL AOS ARV (1996-2002) Redução da Mortalidade 70% - 90.000 óbitos evitados Redução da Morbidade 80% - 58.000 novos casos evitados Aumento de mais de 300% na mediana de sobrevida (18 para 58 meses 95-97) Redução de internações hospitalares 70% - 358.000 internações evitadas (1997-2001) Economia: U$ 2.2 bilhões

A resistência primária é mais baixa no Brasil Principal crítica: a opção pelo tratamento universal levaria ao surgimento de novas cepas resistentes a todos os medicamentos. A realidade demonstrou que este argumento não tem fundamento. Ao contrário, os dados indicam elevada adesão ao tratamento e sugerem que a ampliação do acesso aos ARV tem dificultado o surgimento de capas resistentes EUA 15 a 26% Reino Unido 14% Espanha 23 a 26% França 10 a 17% Argentina 15,4% Brasil 6,6% Fonte: Tanuri, A., Aids 2003, 17:1063-9

Apesar destas conquistas, impasse! Apesar dos resultados da política de acesso universal aos anti-retrovirais, a inclusão nos esquemas terapêuticos de novas drogas protegidas por patentes, agravada pela drástica redução nas últimas décadas do investimento governamental nas empresas nacionais, afetando a competição dos genéricos, vem aumentando muito o gasto nacional com a aquisição dos ARV

Projeções: Drástico Crescimento dos Gastos do Brasil com ARV O Brasil distribui gratuitamente 17 medicamentos ARV, sendo oito nacionais e nove importados Embora tenha se observado expressiva redução do custo médio do tratamento/paciente/ano entre 1997 e 2004, com a entrada dos novos ARV em 2005 este custo se elevou de forma acentuada (de US$ 1,336.00 em 2004 para US$ 2,500.00 em 2005).

Aumento crescente no preço dos ARVs de segunda e terceira geração protegidos por patente Quatro dos 17 ARV distribuídos pelo respondiam em 2005 por cerca de 70% do gasto com ARV Efavirenz (Merck, Sharp & Dome) US$ 1,575/cápsula custo médio tratamento/paciente/ano: US$ 574.80 (*) Nelfinavir (Roche) US$ 0.468/ cápsula custo médio tratamento/paciente/ano: :US$ 1,537.00 (*) Lopinavir/ritonavir (Abbott) US$ 1.30/ cápsula custo médio tratamento/paciente/ano: US$ 2,847.00 (*) Tenofovir (Gilead Sciences) -US$ 7.68/cápsula - cápsula custo médio tratamento/paciente/ano: US$ 2,803.00 * Medicamentos com patentes pipeline

Redução da capacidade de negociação A indústria nacional de genéricos, apesar de suas dificuldades e limitações, possibilitava até 2005 o poder governamental de negociação (redução da ordem de 80% nos preços dos ARV com produção nacional) O enfraquecimento da indústria de genéricos com o TRIPS levou a um considerável aumento de gastos governamentais (custo médio do tratamento subiu de US$ 1359 em 2003 para US$ 2500 em 2005)

Ameaça à sustentabilidade da política de acesso universal aos ARV Vimos que a estratégia restrita à negociação para redução de preços de ARVs esgotou-se evidentemente no Brasil Caso outras estratégias não sejam adotadas a curto prazo, o acesso universal aos ARVs previsto em lei ficará comprometido.

Estratégias possíveis Utilização em caráter excepcional das flexibilidades já previstas no TRIPS e na Legislação brasileira de PI ( Lei 9.279 de 14/05/1996, e os Decretos 3.201/99 e 4830/03) - licença compulsória - recente Revisão do arcabouço legal brasileiro de PI para incorporar outras flexibilidades do TRIPS - importação paralela Fortalecimento da indústria nacional Mobilização Sul-Sul por maiores flexibilidades na legislação internacional de PI

Impactos da Legislação Internacional e Nacional de Propriedade Intelectual no Brasil Legislação de PI limitou o desenvolvimento da indústria farmacêutica nacional, na última década Crescente dependência de importações da China (princípios ativos) e India (genéricos) agora limitada pela adesão destes países ao TRIPS Na década de 90, como conseqüência de equívocos na política governamental, para o que contribuiu a legislação de PI, 1.700 unidades industriais farmacêuticas produtoras de intermediários foram fechadas (Orsi et al. 2003) PRINCIPAL CONSEQÜÊNCIA: Crescimento incontrolável dos preços os preços de ARVs de segunda e terceira geração são extremamente altos e tendem a crescer, limitando o acesso aos pacientes HIV/AIDS nos países em desenvolvimento como o Brasil

Obstáculos e restrições da lei brasileira de PI A Lei brasileira de PI reconheceu a patente dos medicamentos pipeline, aberração jurídica não exigida pelo TRIPS. Com isto, possibilitou a obtenção retroativa de patentes relacionadas aos produtos considerados não-patenteáveis pela Lei de Propriedade Industrial anterior. Embora os Tribunais venham recusando a absurda solicitação das empresas farmacêuticas multinacionais para extensão das patentes pipeline, estas ainda persistem como dispositivo legal. Somente em 2007, o gastou 730 milhões de reais com estes medicamentos pipeline (Abacavir, Amprenavir, Nelfinavir, Lopinavir/Ritonavir), além do Efavirenz (LC). A Lei de PI não contemplou a possibilidade de importação paralela, prevista no TRIPS

Caso brasileiro: impacto na indústria e capacitação nacional Em síntese, esta lei contrariou os interesses nacionais, reconhecendo muito prematuramente patentes para produtos farmacêuticos, com impacto extremamente negativo para o desenvolvimento da indústria nacional e para a capacitação nacional nesta área

Impactos dos monopólios temporários introduzidos pela legislação de PI nos preços Crescimento incontrolável dos preços Preços de ARVs de segunda e terceira geração são extremamente altos e tendem a crescer, limitando o acesso aos pacientes HIV/AIDS nos países em desenvolvimento

Brasil: várias tentativas de licença compulsória Portarias: atendendo ao disposto pelo Presidente da República em acordo com o então Ministro, foram elaboradas pelo PN-DST-AIDS no início de 2005, após ampla consulta a juristas, laboratórios e empresas, três propostas alternativas de Portaria ministerial para licença compulsória de 4 ARV (emergência, interesse público e emergência e interesse público). Por decisão ministerial posterior o processo não prosseguiu Finalmente, em maio de 2008, a licença compulsória do medicamento Efavirenz da Merck possibilitou ao governo brasileiro passar a pagar apenas 25% do que vinha pagando pelo medicamento (preço caiu de US$ 1,59 para US$ 0,45)

No entanto, países em desenvolvimento como o Brasil têm mostrado dificuldade de explorar esta e outras poucas flexibilidades existentes no TRIPS Como vimos, no caso do Brasil, a lei nacional de PI é ainda mais restritiva que o próprio TRIPS Em muitos países em desenvolvimento, os governos locais são frequentemente paralisados por pressões econômicas e políticas, incertezas legais e complexidade dos procedimentos para licença compulsória

Outros países licenças compulsórias para medicamentos ARV Country Grounds Licensee Exports Royalty Indonesia Emergency One.5% Manufacturer Malaysia Government One 4% offer use Importer Mozambique Emergency One 2% Manufacturer South Africa Competition Small number In Africa 5% Manufacturers Swaziland Emergency Open No remuneration Zambia Emergency One Manufacturer No 2.5% `

Acordos Bilaterais TRIPS Plus: impactos sobre acesso a ARV Acordos bilaterais dos EUA e UE com países em desenvolvimento podem representar significativo retrocesso com importantes implicações econômicas, sociais e epidemiológicas em escala global Reduzem espaço para licença compulsória Não prevêem importação paralela (permitindo aos detentores de patentes questionar legalmente a importação paralela) Aumentam o tempo da patente Restringem produtos genéricos

Tendências na Política Internacional de PI De um lado, pressões, especialmente de países em desenvolvimento por um regime mais flexível de PI De outro, movimentos internacionais no sentido de um regime de PI mais restritivo : acordos comerciais bilaterais assinados pelos EUA com países em desenvolvimento (TRIPS Plus) tais como Singapura, Marrocos e Jordania Questão: Quais destas tendências irão prevalecer?

Questões Como assegurar a sustentabilidade da inovação na pesquisa e desenvolvimento na área farmacêutica e ao mesmo tempo fortalecer a capacidade nacional para a produção de ARVs em países em desenvolvimento industrializados? Como estender acesso ao países mais pobres, respondendo às suas urgentes e crescentes demandas, particularmente aqueles na Africa?

Problema futuro: vacinas anti- HIV No Brasil, questões de propriedade intelectual e preços atrasaram a introdução no SUS de vacinas, como Hepatite B e HPV Preocupação: que isto não ocorra com uma futura vacina anti-hiv Outro problema: alegando falta de incentivos econômicos à inovação, a indústria farmacêutica multinacional concentra-se apenas na P& D de medicamentos ARV e destina somente 10% de seu gasto à P & D com vacinas anti-hiv

Incentivos alternativos à Inovação Fundos para Pesquisa e Desenvolvimento Argumento central das empresas farmacêuticas multinacionais: legislações de PI mais flexíveis e licenças compulsórias reduzirão o seu longo investimento em pesquisa e desenvolvimento e no processo inovativo Fundo de P & D - A remuneração seria dividida entre o pagamento direto ao detentor da patente e o investimento no Fundo de P & D (Love, 2005). De um royalty de 3.5 por cento 2 por cento para o detentor da patente 1.5 por cento para o Fundo de P & D O detentor da patente teria participação no Fundo Pools de patentes para licenciamento estratégia colaborativa para a gestão coletiva de direitos patentários Novo sistema de remuneração da inovação, onde mercado para produtos é separado do mercado para inovações: produtos disponíveis ao consumidor a preços genéricos, enquanto os inovadores se beneficiariam de um sistema separado (Medical Innovation Prize Fund)

Em síntese: há necessidade urgente de novo paradigma em PI Novo olhar para as restrições ao mercado de insumos estratégicos e emergenciais em saúde. Políticas governamentais orientadas para a capacitação nacional e maior flexibilidade na legislação de PI Levar em conta as especificidades nacionais evitar a camisa de força da harmonização Questão ética: Propriedade intelectual subordinada a critérios de saúde pública como estabelece a Declaração de Doha

Importância das Redes de Cooperação Sul-Sul Respeito às realidades e especificidades nacionais revisão das legislações de PI e respectivas políticas, concebendo regimes mais flexíveis Rede Internacional de Cooperação Tecnológica em insumos estratégicos, (medicamentos ARV, vacinas, microbicidas, kits para diagnóstico e monitoramento e preservativos, na XV Conferência de AIDS em Bangcoc, Tailândia, 2004, à qual aderiram o Brasil e outros países em desenvolvimento Cooperação científica e tecnológica entre os países de língua portuguesa- Capacitação Nacional dos Países e Reserva Estratégica de Insumos

Declaração Conjunta de Compromisso Os países se comprometem a: Ampliar o acesso ao tratamento HIV/AIDS; Ajudar a decisão de cada país de internalizar as flexibilidades em acordos internacionais de Propriedade Intelectual (Doha) na legislação; Avaliar a possibilidade de implementar regulações comerciais flexíveis com relação a produtos farmacêuticos em HIV/AIDS produzidos internamente visando sua exportação para os outros países da Rede; Promover acordos de parceria na cooperação técnica e científica, fortalecendo a capacidade local para apoiar a provisão de produtos essenciais ao tratamento do HIV/AIDS nos países do Sul

Conclusões Livre circulação do conhecimento é crucial, especialmente para tecnologias necessárias ao enfrentamento de pandemias globais como o HIV/AIDS Uma lei de PI excessivamente restritiva como a brasileira poderá diminuir o ritmo da inovação A tese de que o Sistema Global de PI é imperfeito e ineficiente, criando monopólios temporários com alto custo econômico e social, é defendida por notórios cientistas internacionais, como o Dr. Joseph Stiglitz, prémio Nobel de Economia (2001) Não só uma questão epidemiológica ou social, mas também econômica