UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU FACULDADE INTEGRADA AVM



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Transcrição:

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU FACULDADE INTEGRADA AVM MODULAÇÃO DOS EFEITOS TEMPORAIS NAS DECISÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA Por: Jaqueline Bastos Carvalho Orientador Prof. Anselmo Souza Rio de Janeiro 2011

2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU FACULDADE INTEGRADA AVM MODULAÇÃO DOS EFEITOS TEMPORAIS NAS DECISÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito Público e Tributário. Por: Jaqueline Bastos Carvalho

3 AGRADECIMENTOS Aos amigos e parentes por todo apoio.

4 DEDICATÓRIA Dedico aos meus pais e namorado por toda confiança, apoio e amor.

5 RESUMO Trata dos efeitos temporais das decisões de inconstitucionalidade proferidas pelo Supremo Tribunal Federal. Aduz a ação direta de inconstitucionalidade, suas principais características, sendo a mais relevante a inovação trazida pelo art.27 da Lei nº 9868/99, assim como os efeitos decorrentes da sentença proferida neste tipo de ação. Relaciona os efeitos da pronúncia de inconstitucionalidade em âmbito tributário, ressaltando a importância da aplicação do princípio da proporcionalidade na solução dos conflitos. Por fim, demonstra os principais aspectos da Ação de Repetição de Indébito e conclui que a aplicação da exceção à regra da retroatividade dos efeitos da lei inconstitucional está condicionada à observância da ponderação de interesses entre os sujeitos da relação tributária..

6 METODOLOGIA Tendo em vista a grande discussão acerca do tema e, principalmente, no que tange ao artigo 27 da lei 9868/99 que prevê exceção à regra, conferindo a possibilidade de aplicação efeito ex nunc para as decisões proferidas em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade em razão de segurança jurídica ou relevante interesse social e, mediante a deliberação de 2/3 dos membros do STF, fizeram-se necessárias para a pesquisa deste tema controvertido, a utilização das técnicas de pesquisa como Revisão Bibliográfica e Análise Documental. Através da revisão bibliográfica compilou-se toda a doutrina referente ao assunto em tela, concentrando a pesquisa em artigos publicados, principalmente, nos manuais sobre a matéria e de forma subsidiária em artigos publicados na internet. Por fim, analisou-se fatos documentados em processos, ou seja, a posição jurisprudencial a respeito das controvérsias pertinentes aos efeitos temporais das decisões de inconstitucionalidade em matéria tributária.

7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 8 CAPÍTULO I - A AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE COMO CONTROLE CONSTITUCIONAL 11 CAPÍTULO II - EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA 29 CAPÍTULO III - AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO E O DIREITO À RESTITUIÇÃO 39 CONCLUSÃO 44 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 46 ÍNDICE 52 FOLHA DE AVALIAÇÃO 54

8 INTRODUÇÃO A Constituição é a mais alta expressão jurídica da soberania popular e nacional, além de ser o instrumento seguro para a manutenção do Estado de Direito. Está situada no ápice do sistema jurídico do país e nela encontram-se os compromissos jurídicos de um povo, a estrutura e as normas fundamentais do Estado que a sedia. O Estado é soberano e, no exercício de sua soberania, institui tributos, visando recolher os recursos de que necessita. Acontece, porém, que o Sistema Tributário Brasileiro alicerça-se em regras e princípios constitucionais, buscando garantir a defesa do contribuinte contra o arbítrio do poder estatal. A relação de tributação não é simples relação de poder, mas sim uma relação jurídica, pois sujeita as normas às quais estão submetidos os contribuintes e o Estado. A Carta Maior é expressa ao estabelecer que nenhum tributo será instituído, nem aumentado, a não ser através de lei conforme preceitua o artigo 150, inciso. I. A necessidade de criação ou majoração de tributos mediante lei, em sentido formal, elaborada e aplicada conforme os ditames constitucionais constitui a proteção de propriedade e liberdade dos contribuintes. É certo que a premissa de todo Estado de Direito é a presunção de constitucionalidade de todos os atos estatais. Porém, esta presunção não é absoluta, já que os poderes políticos são limitados. Assim, deve-se buscar a nulidade de atos estatais que estejam em desacordo com a Constituição e seus princípios, afim de evitar o abuso de poder. Neste sentido, o Controle de Constitucionalidade está diretamente ligado à idéia de Supremacia da Constituição, pois realiza o exame da conformidade ou não da norma criada com a Constituição, procedendo à sua eliminação em caso de conflito. A declaração de inconstitucionalidade de lei ou de atos normativos em tese inconstitucionais é obtida por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade, ADIN, regulada pela lei 9868/99. A referida lei

9 estabelece o procedimento da ADIN e regula, dentre outras matérias, os efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade. A decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal gera efeitos no plano normativo, destinado a toda sociedade e, como regra geral, estes efeitos retroagem ao momento do surgimento da lei ou ato normativo tido como inconstitucional. Entretanto, art. 27 da lei 9868/99 prevê exceção a esta regra, estabelecendo que, em caso de segurança jurídica ou relevante interesse social e, mediante a deliberação de 2/3 dos membros do STF, poderá ser conferida eficácia irretroativa, ou seja, a decisão produzirá efeitos ex nunc. Ocorre que a admissão de eficácia irretroativa implica o reconhecimento de validade da lei viciada e, por isso, o dispositivo em questão gera inúmeras discussões, especialmente em matéria tributária. A partir da aceitação de vigência de norma inconstitucional, ainda que por um curto espaço de tempo, teremos implicações no que diz respeito aos limites constitucionais, concessão de benefícios e recolhimento de tributo, bem como repetição de indébito com base em lei posteriormente declarada inconstitucional. Como o Código Tributário Nacional não prevê a pronúncia de inconstitucionalidade no que tange à restituição de tributo indevido, será utilizado para fundamentar tal entendimento princípios extraídos do ordenamento jurídico objetivando construir soluções para os problemas referentes à eficácia temporal das declarações de inconstitucionalidade em matéria tributária. Assim, no primeiro capítulo, se tratará da Ação Direta de Inconstitucionalidade, seu conceito, a discussão no que tange à sua natureza jurídica, características. Serão também abordados os efeitos da declaração de inconstitucionalidade no sistema concentrado e a possibilidade de manipulação dos efeitos da norma inconstitucional pelo STF, mediante aplicação de juízo de valor, nos casos de segurança jurídica e interesse social relevante. No segundo capítulo será analisada a importância da observação dos limites constitucionais, a aplicação lei. 9868/99, bem como a exceção prevista no art.27 da referida lei. Cuidará também a exceção à regra da retroatividade, além dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade em matéria

10 tributária. Neste tópico, será abordado a possibilidade ou não da admissão dos efeitos retroativos de leis inconstitucionais que concedem isenções, bem como daquelas que criam ou majoram tributos, além das hipóteses de excepcional atribuição de efeitos prospectivos a fim de evitar a menor oneração dos cofres públicos nos casos de tributo com caráter de contribuição social. Ressaltada será a importância da ponderação de interesses na utilização do referido instituto. Por fim, no último capítulo, haverá apresentação dos aspectos gerais da ação de repetição de indébito em virtude de tributo pago indevidamente, além dos pressupostos para a sua proposição e prazo prescricional para seu exercício. Tem o presente trabalho objetivo de analisar a modulação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade na norma tributária e suas eventuais consequências no que diz respeito às garantias constitucionais dos contribuintes. Neste aspecto, defende-se a idéia de que o critério para a definição de eficácia da decisão de inconstitucionalidade deve levar em conta os efeitos favoráveis e desfavoráveis que serão impingidos ao cidadão. Para tanto, será feita uma abordagem dos institutos constitucionais e tributários, bem como a utilização do Princípio da Proporcionalidade a fim de buscar a ponderação de interesses entre o indivíduo e o Estado, além de se criticar a utilização da exceção prevista no art.27 da lei 9868/99 como forma de buscar uma maior arrecadação por parte do fisco.

11 CAPÍTULO I A AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE COMO CONTROLE CONSTITUCIONAL A ação de inconstitucionalidade é um meio de controlar a constitucionalidade das leis, haja vista, que se uma norma não está em consonância com a Carta Maior ela tem sua eficácia suspensa tendo sua invalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal. Neste caso, a validade das leis e atos normativos é aferida em tese, tendo, portanto, a ação direta de inconstitucionalidade como objeto elidir a presunção de constitucionalidade que toda norma possui. Além da ADIN, existem outros meios de se fazer a filtragem da constitucionalidade de uma lei ou ato normativo. Uns podem ocorrer no curso da criação do ato normativo ou no curso de uma ação, outros podem ser feitos através da não recepção da norma incompatível com a Constituição nova. Mas, todos têm um objetivo comum que é defender a Constituição de leis ou atos normativos que contrariem seus preceitos fundamentais. 1.1 O Fenômeno da Recepção versus Fenômeno da Inconstitucionalidade O Poder Constituinte é a manifestação soberana da Suprema vontade política de um povo, social e juridicamente organizado. 1 Tal manifestação é exercida por uma Assembléia Constituinte, que, através da representação, manifestará a vontade do povo. Desta forma, o Poder Constituinte Originário, exercido pela Assembléia Constituinte, estará presente tanto no surgimento de uma primeira Constituição, como na elaboração de qualquer outra posterior e possui como características: ser inicial, ilimitado, autônomo e incondicionado. 1 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 11. ed. São Paulo ; Atlas. 2002. p. 54.

12 O referido Poder não encontra limitação no direito anterior, logo não tem que respeitar os limites postos pelo direito positivo antecessor, o que resulta na revogação das leis anteriores que se oponham ao disposto na Carta Magna vigente. Isto porque o Supremo Tribunal Federal tem decidido que o processo de Controle de Constitucionalidade abstrato de normas destina-se, fundamentalmente, à aferição de normas pré-constitucionais. Na Suprema Corte prevalece o entendimento de que o conflito estabelecido entre norma ordinária pré-constitucional e pós-constitucional é resolvido através da aplicação do Princípio lex posteriori derrogat priori. O princípio anteriormente mencionado cuidará para que a norma ordinária anterior contrária à Constituição seja revogada, isto é, não recepcionada e não ingresse no ordenamento. Sendo assim, observa-se que o Supremo Tribunal Federal não aceita a tese de inconstitucionalidade superveniente, por entender que a Constituição sobrevinda não torna inconstitucionais as leis com ela conflitantes, apenas revoga-as. Todavia, existem defensores de posição contrária, que admitem a possibilidade de se exercer um controle de constitucionalidade préconstitucional. Nesta corrente não se utiliza o Princípio lex posteriori derrogat priori, visto que a idéia nuclear reside na Superioridade da lei Constitucional frente às demais leis. A corrente que defende a inconstitucionalidade superveniente sustenta que a inconstitucionalidade é o resultado de um juízo de incompatibilidade entre duas normas, de modo que sua realidade jurídicoformal não depende do tempo da produção das normas e preceitos. Sustentam, ainda, que a inconstitucionalidade superveniente apresenta vantagens em relação à revogação, uma vez que permite a solução da controvérsia constitucional, oferecendo segurança e certeza jurídica através da ação direta com efeitos erga omnes. É verdade que ambas as posições encontram fundamento em seus defensores, sendo que, no Brasil, o Supremo Tribunal Federal optou pela revogação da norma ordinária pré-existente à Lei Maior, limitando, assim, o numero de ações diretas.

13 1.2 Controle difuso e controle concentrado O controle de constitucionalidade representa um sistema adotado pelas Constituições rígidas que tem por objetivo defender a Supremacia Constitucional contra situações eivadas de vícios que poderiam ferir a lei fundamental. 2 Denomina-se Constituição rígida aquela que defende processos, solenidades e exigências formais especiais, diferentes e mais difíceis para sua modificação. Sua vantagem está na capacidade de definir, com alguma exatidão, a competência dos poderes governamentais e prevenir a possibilidade de transformação decorrente de mero capricho repentino da opinião pública. 3 A Constituição Brasileira é rígida, conforme podemos comprovar, nas palavras de Michel Temer: 4 A Constituição Brasileira é rígida. Revela essa rigidez o confronto do art. 60 com art. 47 da Constituição. Aquele prevê processo especial para criação de Emenda à Constituição. Exige: a) no tocante à iniciativa, mediante proposta de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, do Presidente da República, de mais da metade das Assembléias legislativas das unidades da Federação, manifestando-se cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros; b) no tocante à discussão e votação, será discutida e votada em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos; c) quanto ao quorum de votação, considerando-se aprovada se obtiver em ambos, 3/5 dos votos dos respectivos membros. No Brasil o Controle de Constitucionalidade repressivo judiciário é misto, ou seja, é exercido tanto de forma difusa quanto de forma concentrada. 5 Sendo assim, passar-se -a uma breve análise dos dois modelos de Controle. No controle judicial difuso, todos os órgãos do Poder Judiciário, desde o juiz singular de primeira instância, até o tribunal de superior instância, 2 GAMA, Patrícia Calmon Nogueira da. Breves Anotações sobre Controle abstrato de Constitucionalidade à luz da lei 9868/99. Revista dos Tribunais. São Paulo, ano 89, v.778, agosto de 2000. p. 91. 3 BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. A Teoria das constituições rígidas. In: José Bushatsky. Princípios Gerais de Direito Administrativo. 2. ed. São Paulo: Forense, 1980. v.1. p. 67. 4 TEMER, Michel M. Lulia. Elementos de Direito Constitucional. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 27.

14 que no caso brasileiro será o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, poderão apreciar e decidir matéria constitucional. Esta manifestação ocorre na análise de casos concretos, quando a os órgãos do Judiciário irão dar pronunciamentos em situações de presumida violação concreta de direitos constitucionais. Neste modelo de controle, o efeito da declaração de inconstitucionalidade da norma ofensiva ao direito da pessoa, terá efeitos apenas para aqueles que figuram no processo e retroagem os efeitos da decisão desde o momento quando o autor do processo começou a sofrer prejuízos, com a violação de seu direito. Entretanto, quando ocorrer que, em grau de recurso a inconstitucionalidade levantada, no caso concreto, chegar até o Supremo Tribunal Federal, através de Recurso Extraordinário, a decisão definitiva do STF implicará em comunicação ao Senado Federal, para que promova a suspensão da eficácia da norma inconstitucional, Assim, os efeitos alcançarão todos aqueles que tenham seus direitos violados pela referida norma inconstitucional, sendo que o efeito para os que não figuram no processo deverá ser ex nunc, ou seja, a partir do momento da suspensão da norma. Isto porque, a Constituição da República, em seu artigo 52, X, estabelece que compete privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, da lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. Doutrinariamente existem discussões acerca da obrigatoriedade ou não da suspensão da executoriedade da lei declarada inconstitucional pelo Senado Federal. Porém, tanto o STF quanto o Senado Federal entendem que este não está obrigado a proceder à edição da resolução suspensiva do ato estatal cuja inconstitucionalidade, em caráter irrecorrível foi declarada pelo Supremo Tribunal Federal. 6 Neste sentido dispõe Paulo Brossard: 7 5 MORAES, Alexandre de. Op. cit. p. 586 6 Ibid. p. 592 7 BROSSARD, Paulo. O Senado e as leis inconstitucionais. Revista de informação legislativa. Brasília, ano 13. n.50, 1976. p.55.

15 Tudo está a indicar que o Senado é o juiz exclusivo do momento em que convém exercer a competência, a ele e só a ele atribuída, de suspender lei ou decreto declarado inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribuna Federal. No exercício dessa competência cabe-lhe proceder com equilíbrio e isenção, sobretudo com prudência, como convém a tarefa delicada e relevante, assim para os indivíduos, como para o ordem jurídica. Assim, entende-se que a edição da resolução suspensiva é uma discricionariedade do Senado Federal. Ressalte-se, ainda, que depois de editada a referida resolução, não há possibilidade de modificação da mesma. Do exposto anteriormente, cabe ressaltar que atualmente existe uma forte tendência de mudança de entendimento do Supremo Tribunal Federal quanto à eficácia de suas decisões quando proferidas pelo Pleno, em sede de controle difuso de constitucionalidade. Tem-se entendido que tais decisões têm eficácia erga omnes e não inter partes. Ademais, no que tange ao artigo, 52, X, da CRFB defende-se que o mesmo atribuiu apenas competência ao Senado Federal para dar publicidade à suspensão da execução da norma e não a competência para suspender a execução da lei declarada inconstitucional. Este foi o entendimento do Ministro Eros Grau que acompanhou o voto do ministro relator Gilmar Mendes no julgamento de uma Reclamação 8 ajuizada contra decisões do Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco-AC no qual alega-se na espécie ofensa à autoridade da decisão da Corte no HC 82959/SP,DJU de 1.9.2006, em que foi declarada a inconstitucionalidade incidental do 1 do art. 2º da Lei 8.072/90. No entanto, há que se frisar que esta é uma tendência de mudança de entendimento que ainda não está consolidada, haja vista não ter ocorrido o fim do julgamento da Reclamação. Além do sistema de controle difuso, o ordenamento brasileiro conta com o controle concentrado, que busca a declaração de inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em tese, independentemente da existência de um caso concreto, visando à obtenção da invalidade da lei, a fim de garantir-se a 8 STF, Recl. n 4335, Rel: min.gilmar Mendes, DJU 27.04.2007

16 segurança das relações, que não podem ser baseadas em normas inconstitucionais. 9 O controle concentrado é reservado a um único tribunal, no caso, o Supremo Tribunal Federal, que detém competência para anular a validade da lei reconhecida como inconstitucional em relação a todos os casos a que a lei se refira. 10 Trata-se de uma forma abstrata de controle. No presente estudo será abordado o controle concentrado de constitucionalidade em matéria tributária, exercido através da Ação Direta de Inconstitucionalidade, que será visto a seguir. 1.3 A ação direta de inconstitucionalidade O art. 102 da Constituição da República estabelece no inciso I, a: Art. 102, CR. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal. Afirmar que cabe ao Supremo Tribunal Federal a guarda da Constituição implica dizer que a mais alta corte jurisdicional do país não suportará nenhum comportamento contrário ao conteúdo da Carta Magna. Esta função apresenta três desdobramentos principais: a guarda do conteúdo da Constituição (material), da ordem constitucional (instituição) e da efetividade da Constituição (pragmática) e será exercida através de controle de constitucionalidade das leis e atos normativos. A ação direta de inconstitucionalidade é uma das espécies de controle concentrado contempladas pela Constituição Federal e tem como objetivo declarar inconstitucionalidade de lei ou ato normativo a fim de retirar do ordenamento jurídico a norma submetida ao controle direto de inconstitucionalidade. Haverá cabimento da referida ação para declarar a 9 MORAES, Alexandre de. Op. cit. p. 606. 10 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes,1985.p. 288-290.

do tempo. 11 Quanto aos efeitos da declaração de inconstitucionalidade no 17 inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual, federal ou distrital e o seu processo e julgamento compete ao Supremo Tribunal Federal. A legitimação para propositura da ADIN é concorrente previsto no artigo 103 da Carta Magna, sendo legitimados: o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa da Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o governador do Estado ou do Distrito Federal, o Procurador-geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional e confederação sindical ou entidades de classe em âmbito nacional. A ADIN tem natureza declaratória e, por isso não se sujeita à observância de qualquer prazo de natureza prescricional ou de caráter decadencial, pois os atos inconstitucionais jamais se convalidam pelo decurso sistema concentrado, estes serão tratados a seguir. 1.3.1 Efeitos da declaração de inconstitucionalidade no sistema concentrado De acordo com tudo que foi acima dito, o sistema de controle concentrado busca a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo que estejam em desconformidade com a Constituição, independentemente da existência de um caso concreto. Por se tratar de um controle abstrato, as decisões proferidas pela Suprema Corte terão efeitos erga omnes, com eficácia vinculante e, dependendo do caso, efeitos retroativos ou prospectivos. 1.3.1.1 Efeitos Erga Omnes 11 MORAES, Alexandre de. Op. cit. p. 620.

18 Entende-se por eficácia erga omnes das decisões proferidas em controle de constitucionalidade abstrato, a extensão dos efeitos da aludida decisão a todos aqueles que se encontram sob a jurisdição de lei ou ato normativo tido como inconstitucional. Nas palavras de André Ramos Tavares: 12 Trata-se de efeito implícito às decisões de STF quando proferidas no desempenho da função de tribunal constitucional. Realmente, se se pronuncia a inconstitucionalidade em abstrato, se reconhece o descumprimento, independentemente de uma situação concreta litigiosa, se o autor das ações de controle abstrato age em nome da sociedade e da ordem constitucional, e não em nome próprio e em busca de interesse pessoal seu, tem-se, naturalmente, de reconhecer que a decisão deve contar com força geral, no sentido de alcançar a todos. Por se tratar de um processo objetivo, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal a todos beneficia ou prejudica. Ocorre, porém, que a eficácia exclusivamente erga omnes não tem o condão de impedir a formação da coisa julgada, na medida em que outros órgãos do Poder Judiciário não ficam impedidos de adotar posição diversa da proferida pelo Tribunal Constitucional. Por isso, torna-se necessário o acoplamento de outra eficácia ao controle de constitucionalidade, qual seja aquela alusiva ao efeito vinculante da decisão definitiva de mérito proferida pelo STF na ação de inconstitucionalidade. 13 1.3.1.2 Efeito Vinculante Diz-se vinculante a decisão que impede a formação de coisa julgada com base na lei ou ato normativo objeto de apreciação judicial por parte do 12 TAVARES, André Ramos. Tratado de argüição de preceito fundamental: Lei 9.868/99 e Lei 9.882/99. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 382. 13 SANTOS, Caio Augusto Silva dos. Os efeitos das decisões no controle concentrado de constitucionalidade: Ação direta de inconstitucionalidade, Ação declaratória de constitucionalidade e argüição de descumprimento de preceito fundamental. Revista dos tribunais. São Paulo, ano 94, v.831, janeiro de 2005. p. 97.

19 STF, de forma a complementar a eficácia erga omnes, trazendo-lhe contornos que não possuía. 14 O objetivo do efeito vinculante é impedir julgamentos em sentido contrário à decisão proferida no controle de constitucionalidade abstrato pelo STF e cujo desrespeito ensejaria desde logo e a qualquer tempo o acesso à Suprema Corte por meio de reclamação para o resgate da autoridade de sua decisão. 15 Assim, uniformiza-se os julgamentos, de modo a evitar a imprecisão e incerteza quanto aos efeitos jurídicos das condutas tomadas em sociedade, bem como obstar a indesejável repetição de processos sobre matéria idêntica. Desse modo, não será possível a qualquer juiz ou tribunal conhecer e julgar qualquer causa que diga respeito à pretensão contrária àquela proferida pelo Supremo Tribunal Federal, impedindo, assim, a formação de coisa julgada baseada em decisão diversa. A decisão proferida pela Suprema Corte tem eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública Federal, Estadual e Municipal. A censura da decisão vinculativa proferida pelo STF não opera perante o Poder Legislativo, posto que este não fica impedido de alterar ou revogar a norma que foi julgada constitucional, nem de retirar o ato julgado inconstitucional. Porém, cabe ressaltar que existem autores que defendem que o legislador não poderá editar normas com preceitos idênticos aos declarados inconstitucionais, que derroguem a decisão do Supremo Tribunal Federal ou convalidem atos nulos praticados com base na lei considerada inconstitucional. 16 Verifica-se, portanto, que se trata de questão processual, que se resolve com a teoria da coisa julgada material oponível a todos os órgãos, inclusive ao que proferiu a decisão. 17 A decisão proferida pelo STF é irrecorrível e não rescindível e vincula a Administração e o Poder Judiciário, 14 Ibid. p. 98. 15 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 6. ed. ver e atual. São Paulo: Saraiva,202. p. 49-50. 16 CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa anotada. 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora,1993. p. 1044. 17 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18.ed. São Paulo: Malheiros, 2000.p. 63.

20 inclusive o próprio STF, que não poderá conhecer de processo em que se pretenda algo em contrário à decisão proferida. 1.3.1.3 Efeitos Repristinatórios Conforme foi anteriormente estudado, o conflito de leis no tempo é resolvido pelo princípio geral lex derrogat priori, de forma que, operada a revogação, a lei deixa de existir no mundo jurídico e não ressuscita, mesmo quando a lei que a eliminou do mundo jurídico também deixa de existir. 18 A restauração da lei revogada pela perda de vigência da lei revogadora denomina-se Repristinação, positiva no 3º do artigo 2º da Lei de Introdução do Código Civil, que dispõe que, salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência. O tema em questão torna-se motivo de divergência quando a lei que operou a revogação da lei anterior é declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, com efeito erga omnes e tal fato ocorre porque o sistema brasileiro comina de nulidade o ato normativo incompatível com a Constituição. Assim, a decisão de nulidade desfaz o ato inconstitucional e, com ele, todos os seus efeitos. Conforme ensina Marcelo Rebelo de Souza: 19 Uma conseqüência primária da inconstitucionalidade é, em geral, a desvalorização da conduta inconstitucional, sem a qual a garantia da Constituição não existiria. Para que o princípio da Constitucionalidade, expressão suprema e qualitativamente mais exigente do que o princípio da Legalidade em sentido amplo, vigore, é essencial que, em regra, uma conduta contrária à Constituição não possa produzir cabalmente exatos efeitos jurídicos que, em termos normais, lhe corresponderiam. A não admissão dos efeitos produzidos pela norma declarada inconstitucional implica na aceitação da Repristinação da norma revogadora. Caso contrário, estar-se-ia admitindo a produção de efeitos pela norma inconstitucional, que inovaria a podem jurídica, revogando a norma anterior, 18 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 90. 19 SOUZA, Marcelo Rebelo de. O valor jurídico do ato inconstitucional. Lisboa: Lisboa, 1988.p. 50.

21 contrariando o posicionamento anteriormente mencionado. Além disso, objetiva evitar o efeito prático de um vácuo legal e depende de expressa referência do Supremo Tribunal Federal. Deste modo, a declaração de inconstitucionalidade remove do ordenamento a manifestação estatal inválida e todas as conseqüências dela decorrentes, restaurando a eficácia das leis e das normas afetadas pelo ato declarado inconstitucional, convertendo a Suprema Corte em verdadeira legislador negativo. 20 Cabe observar, porém que revogar um ato legislativo é característica da função legislativa. Tecnicamente, o que ocorre é a declaração de invalidade da norma pelo STF e a cassação de seus efeitos pretéritos, completamente, inclusive o efeito que toda lei tem de revogar a legislação anterior e contrária. 1.3.1.4 Efeitos Retroativos e Prospectivos A doutrina nacional, assim como o Supremo Tribunal Federal, adotou a posição majoritária, que defende a natureza declaratória das decisões proferidas no âmbito das ações diretas de inconstitucionalidade. Tal posicionamento é fundado no direito norte-americano clássico, que sustenta a nulidade da forma inconstitucional desde a sua origem, ou seja, os atos praticados com base na norma nula também os são, não podendo gerar direito nem obrigações. 21 Pertence à tradição do Direito Brasileiro o dogma da nulidade da lei inconstitucional, 22 e, embora a Constituição não possua dispositivo que atribua expressamente eficácia ex tunc às decisões proferidas no controle de constitucionalidade, a doutrina e a jurisprudência pátrias reconhecem o caráter 20 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADI-MC 652. Relator: Min. Celso de Mello. Maranhão, 18 de dezembro 1991.RTJ- Revista Trimestral de Jurisprudência, Brasília. v.146, p. 461, abril 1993. 21 SCALZILLI, João Pedro. A Eficácia temporal das decisões de inconstitucionalidade no controle abstrato. Doutrina Adcoas, Rio de Janeiro, ano IV, n. 12, junho de 2005.p. 222. 22 MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição constitucional. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 249.

22 retroativo das referidas decisões, nele vislumbrando um verdadeiro princípio constitucional implícito. Nestes termos, sustenta Leda Boechat Rodrigues: 23 A Constituição é a lei Suprema e a lei que a contraria é nula. Tal teoria está essencialmente ligada a uma constituição escrita e consequentemente, deve ser considerada por esta Corte como um dos princípios fundamentais da nossa sociedade. Não deve, por isso, ser perdida de vista na ulterior consideração deste assunto. Se uma lei do Congresso, contrária à Constituição é nula, obriga, apesar de sua invalidade, os tribunais, e devem estes dar-lhes efeito? Ou, em outras palavras, embora não seja lei constitui regra operante, como se lei fosse? Admiti-lo corresponderia a negar, de fato, o estabelecido na teoria; e pareceria ao primeiro golpe de vista, absurdo tão grosseiro que sobre o mesmo é desnecessário insistir. Sendo assim, declarada a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo, a referida decisão terá efeitos retroativos, de modo que todas as conseqüências dele derivadas devem ser desfeitas, buscando-se, assim, a reconstituição integral das situações jurídicas existentes antes da vigência da norma inválida. Ainda neste sentido, dispõe Alfredo Buzaid: 24 O fundamento da doutrina e brasileira está, pois, em que, no conflito entre a lei ordinária e a Constituição, esta sempre prepondera sobre aquela. Se a lei inconstitucional pudesse adquirir validade, ainda que temporariamente, resultaria daí uma inversão na ordem das coisas, pois durante o período de vigência da lei, se suspende necessariamente, a eficácia da Constituição. Ou, em outras palavras, o respeito à lei ordinária significa desacato à autoridade da Constituição. Entretanto, deve-se ressaltar que existem vozes que defendem posição diversa, com fulcro na doutrina de Hans Kelsen, que opta pela anulabilidade da norma viciada. Segundo este posicionamento, a sentença que declara a inconstitucionalidade da norma possui natureza constitutiva, de forma que a eficácia do pronunciamento de inconstitucionalidade opera para o futuro, com efeitos a partir da anulação de norma. 23 RODRIGUES, Leda Boechat. A corte suprema e o direito constitucional americano. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1992. p. 37. 24 BUZAID, Alfredo. Da ação direta de inconstitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1958. p. 100.

23 Para os que se filiam à doutrina dos mestres clássicos do direito norte-americano, reconhecer apenas os efeitos desconstitutivos da decisão que declara a inconstitucionalidade de uma norma importa no reconhecimento de validade dos efeitos da lei inconstitucional, produzidos até o advento da decisão. Tal sistemática contraria o princípio da Supremacia da Constituição, pois permite que, durante um certo período, uma norma infraconstitucional se sobreponha aos ditames da Constituição. 25 Porém, na prática, a aplicação indiscriminada do dogma da nulidade das leis inconstitucionais, através da eliminação retroativa de normas vigentes no ordenamento, pode gerar situações de caos jurídico, ocasionando insegurança para aqueles que pautaram seus atos pela lei inconstitucional. O problema se agrava, tendo em vista a imprescritibilidade do vício de ilegitimidade constitucional. Visando a preservar importantes princípios constitucionais, tais como o da nulidade da norma inconstitucional, Supremacia da Constituição, segurança jurídica, boa-fé, entre outros, a lei 9868/99 possibilitou, pelo disposto no deu artigo 27, que se adotasse um caminho intermediário, através da manipulação dos efeitos temporais de declaração de inconstitucionalidade. 26 1.3.1.4.1 Lei nº 9868/99 A lei 9868/99 dispõe sobre o processo e julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade e Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, que antes da aprovação da referida lei, eram previstos no Regimento Interno da Suprema Corte. Sendo assim, podemos observar inúmeras inovações no controle de constitucionalidade abstrato, especialmente no que diz respeito aos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 25 SARMENTO, Daniel ( Coord.). O Controle de constitucionalidade e a lei 9868/99. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2001.p 28. 26 SCALZILLI, João Pedro. Op.cit. p. 222.

24 Como novidade, a lei em questão indica os requisitos necessários para o processamento de julgamento das causas de índole constitucional, dentre outros procedimentos que visam facilitar o esclarecimento dos fatos. Desta forma, confere ao relator a possibilidade de indeferir liminarmente as petições ineptas, as não fundamentadas e aquelas manifestamente improcedentes. Outrossim, conferiu caráter pluralista ao controle abstrato das normas ao permitir que o relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, possa, por despacho irrecorrível, admitir a manifestação de outros órgãos ou entidades, 27 positivando, assim, a figura do Amicus Curiae. Entretanto não se admite intervenção de terceiros, devido à natureza objetiva do processo. Outra novidade está na previsão infraconstitucional do procedimento a ser observado na medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade e na possibilidade de medida cautelar em ação declaratória de constitucionalidade. No que se refere à decisão na ação direta de inconstitucionalidade e na ação declaratória de Constitucionalidade, tratada em um único capítulo, preservou-se a orientação, constante de norma regimental do Supremo Tribunal Federal, que estabelece que o julgamento dessas ações somente será efetuado se presentes na sessão pelo menos oito ministros, devendo-se proclamar a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo questionado se num ou noutro sentido se tiverem manifestado pelo menos seis ministros, ou seja, maioria absoluta. Verifica-se, ainda, que a decisão proferida nas referidas ações são irrecorríveis e não rescindíveis. Tal providência rende homenagem à segurança jurídica e à economia processual, permitindo o imediato encerramento do processo e evitando a interposição de recursos de caráter notadamente protelatório. Ainda no que tange à decisão de inconstitucionalidade, tem-se como uma das principais inovações aplicação do artigo 27 da lei 9868/99, que trata 27 MORAES, Alexandre de. Op. cit. p. 622.

25 sobre os efeitos de declaração de inconstitucionalidade. Em regra, os efeitos da declaração de inconstitucionalidade são retroativos, porém o referido artigo prevê possibilidade de exceção, ou seja, a aplicação de efeitos prospectivos na decisão proferida pela Suprema Corte. 1.3.1.4.2 Artigo 27 da Lei 9868/99 Com o objetivo de evitar com que a declaração de inconstitucionalidade da lei cause danos de grande proporção àqueles que serão atingidos por seus efeitos, a lei 9868/99 inovou ao permitir que o Supremo Tribunal Federal limite os efeitos da referida declaração, estipulando o momento em que a mesma passará a produzi-los. Estabelece o artigo 27 da lei 9868/99: Art. 27, lei 9868/99. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado. Primeiramente, cabe observar que, para que possa ocorrer a manipulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, é necessária a presença da decisão da maioria de dois terços dos membros o Tribunal, sendo este requisito formal, além da presença de razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social, requisito material. No que diz respeito ao requisito formal exigido para a restrição da eficácia da decisão de inconstitucionalidade, Paulo Robert Lyrio Pimenta 28 entende que o dispositivo em questão é inconstitucional. Segundo o referido autor, a Magna Carta, em seu artigo 97 estabelece o quorum necessário à produção da norma invalidante e, por conseguinte, seu âmbito de validade temporal, exigindo a maioria absoluta dos membros de Tribunal. Dessa forma, entende o autor supra citado, que não poderia o legislador ampliar este quorum porque o âmbito temporal forma com a norma 28 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. Op.cit. p. 100.

26 invalidante uma unidade incindível, que não pode ser separada. Logo, o quorum para a produção de norma invalidante, bem como seu âmbito de validade temporal, seria um só: maioria absoluta dos votos. Outro requisito de fundamental importância é a presença de razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social. Isto porque, a justificativa para afastar a radicalização dos efeitos retroativos absolutos da decisão está na manutenção de uma enormidade de relações que tenham se constituído ao longo do período em que a lei ou ato normativo pairava no ordenamento jurídico sob o prisma da presunção de inconstitucionalidade. Observa-se que os dois primeiros requisitos do artigo 27 da lei 9868/99 são alternativos, ou seja, devem existir razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social, enquanto o terceiro requisito, a maioria de dois terços dos membros do STF, é cumulativo com os dois primeiros. Verificados os requisitos para aplicação do referido artigo, cumpre analisar os efeitos produzidos pelo mesmo. Segue o padrão para os efeitos das decisões em sede de ação direta de inconstitucionalidade: em regra, os efeitos devem retroagir até a data de edição da norma viciada. Como primeira exceção, há a eficácia ex nunc, ou seja, os efeitos somente serão produzidos a partir do trânsito em julgado da decisão e, por fim, tem-se a segunda exceção, que estabelece efeitos pro futuro, ou seja, a partir da fixação de termo diverso entre a edição da norma e o trânsito em julgado da sentença. 29 As decisões com efeito ex tunc são a regra para as ações de inconstitucionalidade e, neste sentido, todos os atos constituídos sob a sua égide devem ser nulos, de forma que a sentença apenas reconhece a existência da lei constitucional. Trata-se de ato meramente declaratório. Assim, a declaração alcança atos pretéritos, de modo que, em matéria tributária, por exemplo, o tributo criado por lei que for declarada inconstitucional deverá ser repetido aos contribuintes. O dispositivo da lei 9868/99, que possibilita a restrição de efeitos da pronúncia de inconstitucionalidade, conferindo força predominantemente constitutivas à decisão proferida pelo STF, visa a evitar que a declaração de 29 SCALZILLI, João Pedro. Op.cit. p. 222.

decisão. 31 Embora a lei inconstitucional seja ato nulo, Teori Albino Zavascki 32 27 inconstitucionalidade da lei cause danos de grande proporção àqueles que serão atingidos por seus efeitos, aí compreendidos tanto os particulares como o Poder Público. 30 A vantagem deste dispositivo está na garantia de certeza e estabilidade das relações e situações jurídicas, além de evitar que o Tribunal Constitucional deixe de declarar a inconstitucionalidade de uma lei apenas levando em consideração as conseqüências jurídicas que poderiam advir desta afirma que a mesma pode ser mantida em virtude de fatores extravagantes e acrescenta que, ao manter atos originados de normas viciadas, o Supremo Tribunal Federal não está declarando que os mesmos foram válidos, mas fazendo juízo de valor. Vale lembrar, ainda, que a teoria da eficácia ex nunc é amparada na clássica doutrina de Hans Kelsen, que sustenta que a lei inconstitucional é anulável e não nula. Por fim, cabe destacar a possibilidade de produção de efeitos a partir de outro momento que venha a ser fixado entre a entrada em vigor da norma e a publicação da sentença que declarou a sua ilegitimidade. A eficácia pro futuro dá uma larga margem de discricionariedade ao STF e visa impedir a lacuna legislativa, que, em algumas hipótese, pode vir a ser danoso que a manutenção de norma inconstitucional. A partir do exposto, verifica-se que o artigo 27 da lei 9868/99 possibilita que a Suprema Corte faça um juízo de valor ao estabelecer os efeitos de sua decisão no controle concentrado de constitucionalidade, Assim, sendo, o Tribunal Constitucional deve zelar pela Supremacia da Constituição, sem deixar de lado, porém, os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Cumpre por fim dizer, que o dispositivo em tela é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2154-DF 33, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil sob o argumento de que os atos 30 Loc. cit. 31 MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 3. ed. Coimbra: Coimbra, 1991. p. 500. 32 ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácias das sentenças na jurisdição constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 51. 33 STF, ADIN nº 2154, Rel.Min. SEPÚLVEDA Pertence, DJU 27.2.2007

28 inconstitucionais são, por isso mesmo, nulos e destituídos, em conseqüência de qualquer carga de eficácia jurídica. A declaração de inconstitucionalidade de uma lei alcançaria, inclusive, os atos pretéritos com base nela praticados, eis que o reconhecimento desse supremo vício jurídico, que inquina de total nulidade os atos emanados do poder público, desampara situações constituídas sob sua égide e inibe ante sua inaptidão para produzir efeitos jurídicos válidos a possibilidade de invocação de qualquer direito. Tal ADIN encontra-se em andamento, e no que tange ao art. 27 da Lei 9868/99 o julgamento encontra-se suspenso.

tributária. 34 O contribuinte atua de acordo com os comandos estatais, que 29 CAPÍTULO II EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA Após verificar-se o compromisso constitucional com a teoria da nulidade do ato normativo declarado inconstitucional e a hipótese de exceção à regra da retroatividade dos efeitos da pronúncia de inconstitucionalidade, cumpre questionar se a referida retroatividade pode aproveitar ao Estado que produziu a norma inconstitucional. Para tanto, serão analisadas algumas hipóteses de decisão de inconstitucionalidade no âmbito tributário, levando-se em conta os princípios constitucionais e tributários, demonstrando os casos em que se entende cabível a aplicação da eficácia ex nunc ou ex tunc nas referidas decisões, além de fazer uma pequena apresentação da Ação cabível no caso de uma norma que cria ou majora tributos ser considerada inconstitucional. 2.1 Inconstitucionalidade de lei tributária mais benéfica ao contribuinte A lei tributária pode conceder inúmeros benefícios ao contribuinte, tais como: isenções, reduções, estímulos fiscais ou simplesmente a alteração de alguns aspectos da hipótese de incidência, de forma a reduzir a carga regulam a relação jurídico-tributária, pautado na presunção de constitucionalidade das normas. Como exemplo, pode ser formulada a hipótese de concessão de um determinado benefício, por parte de um Estado, 34 PONTES, Helenilson Cunha. Coisa Julgada Tributária e Inconstitucionalidade. São Paulo: Dialética, 2005. p.85.

30 a uma grande empresa para que esta se instale em um determinado local, gerando em contrapartida, empregos e riquezas para a região. Assim, pautado pela boa-fé e confiança, o contribuinte cumpre os requisitos estabelecidos para a aquisição do referido benefício e, algum tempo depois, a lei que estabeleceu o benefício em questão vem a ser declarada inconstitucional por decisão do Supremo Tribunal Federal. Em tal caso, deve se reconhecer a operância retroativa da declaração de inconstitucionalidade, arrastando, com a proclamação da nulidade absoluta, os atos praticados sob a égide da lei inconstitucional? Entende-se que, no caso em questão, deve-se levar em conta os princípios da boa-fé e confiança, que representam o valor jurídico positivo da intenção do agente manifestada no sentido do cumprimento da ordem jurídica. 35 O Poder Público não pode aproveitar da pronúncia de inconstitucionalidade do ato que ele mesmo produziu para se beneficiar, ou seja, não pode pleitear o recolhimento do montante tributário que, baseado na presunção de constitucionalidade da lei, o contribuinte não recolheu. Logo, nas hipóteses de pronúncia de inconstitucionalidade de lei mais benéfica ao contribuinte, os efeitos da referida decisão devem retroagir, ou seja, devem ser atribuídos efeitos ex nunc, por entender-se que não pode o contribuinte ser obrigado ao recolhimento do montante equivalente à desoneração ou redução que a lei lhe concedeu. O critério para definição da eficácia da decisão de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo deve levar em conta razões de segurança jurídica, bem como respeitar o princípio da legalidade, visto que o estrito cumprimento da lei não pode gerar conseqüências indesejáveis para quem age em sua conformidade. Além disso, embora a pronúncia de inconstitucionalidade, via de regra, seja dotada de eficácia retroativa, não pode atuar de forma maligna, autorizando o ressurgimento de obrigações tributárias já extintas. E neste sentido versa Constituição da República, em seu artigo 150, III, a, ao impedir a 35 Ibid. p. 88.

31 cobrança de tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado. Hugo de Brito Machado 36 assim dispõe: Quando o restabelecimento da norma que fora revogada pela lei declarada inconstitucional implica gravame para o contribuinte, atribuir efeitos retroativos à decisão que declara a inconstitucionalidade é o mesmo que admitir a retroatividade de lei que institui ou majora tributos. Verifica-se que, embora a eficácia retroativa da declaração de inconstitucionalidade possua efeitos repristinatórios restaurando a vigência da norma que regula o mesmo tema antes do surgimento da norma inválida, a restauração da vigência da norma anterior não retroage para atingir os fatos jurídicos tributários anteriores à sua vigência. Ademais, o tributo apresenta-se como custo de produção, de modo que admitir a exigência da obrigação tributária já extinta no passado, manifesta regra confiscatória, tendo em vista que o contribuinte teria que invadir seu patrimônio para dele recolher um tributo que não repassou ao mercado no momento adequado por se pautar na obediência à lei vigente no momento do fato gerador. 37 Pelo exposto, observa-se que, apesar do ordenamento jurídico se basear na retroatividade dos efeitos da decisão de constitucionalidade, esta regra pode ser quebrada em função do interesse social de que a lei deve inspirar confiança aos jurisdicionados. Não se deve admitir que a referida eficácia retroativa seja ilimitada, de modo que, deve-se assumir como premissa o princípio segundo o qual a inconstitucionalidade não deve aproveitar a quem lhe deu causa. 2.2 Inconstitucionalidade da lei que cria ou majora tributos De tudo já exposto anteriormente, pode-se observar a que a regra adotada no Brasil é a retroatividade dos efeitos da declaração de 36 MACHADO, Hugo de Brito. Declaração de inconstitucionalidade e Direito intertemporal.revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 57, junho, 2000. p. 86-87. 37 PONTES, Helenilson Cunha. Op. cit. p. 92.