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Transcrição:

Eliane Andrea Bender A IMPORTÂNCIA DA REVOLUÇÃO FRANCESA NA AFIRMAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E DO CONSTITUCIONALISMO MODERNO Monografia final do Curso de Graduação em Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ, apresentado como requisito parcial para a aprovação no componente curricular Metodologia da Pesquisa Jurídica. DEJ - Departamento de Estudos Jurídicos Orientador: Dr. Doglas César Lucas Ijuí (RS) 2013

Agradecimentos A Deus, que sempre me ilumina; Ao professor Douglas César Lucas, pela orientação e acompanhamento; Ao Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais, que esteve comigo nessa caminhada; Á Direção da Escola Estadual de Ensino Médio Antônio Padilha, pelo constante apoio; A meus familiares, amigos, colegas e a todos que prestaram sua contribuição para que eu alcançasse meus objetivos. Muito obrigada a todos!

São estes os preceitos do direito: viver honestamente, não ofender os demais e dar a cada um o que lhe pertence. Ulpiano

Resumo O presente trabalho monográfico propõe uma análise histórico-reflexiva sobre os impactos causados pela Revolução Francesa na história universal. Visa acentuar de que maneira prestou sua contribuição para o novo curso seguido pela humanidade após essa revolução, considerando o desencadear dos movimentos de cunho social e a conquista dos direitos, tal como conhecemos hoje. Através de uma abordagem histórica, pretende discutir a linha traçada pelo direito para se chegar aos direitos humanos e às constituições, envolvendo um Estado social de direito. Havendo, ainda, o questionamento sobre a plenitude dos direitos humanos frente à atual realidade social e ao mundo globalizado. Palavras-chave: Direitos humanos; Revolução Francesa; Constituição; direitos e globalização. Abstract This monograph proposes a reflexive historical analysis of the impacts caused by the French Revolution in world history. Aims to highlight how paid its contribution to the new careerguido for humanity after this revolution, considering the onset of social movements and the conquest of rights as we know it today. Through a historical approach, discusses the line drawn by the law to reach human rights and the constitutions, involving a social state of law. If there is still the question about the fulness of human rights against the current social reality and the globalized world. Keywords: Human rights; French Revolution; Constitution; rights and globalization.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO... 06 1 CONCEITO E ORIGEM DOS DIREITOS HUMANOS... 08 1.1 Problemática dos direitos humanos... 09 1.2 Direitos humanos e direitos fundamentais... 12 1.3 Desenvolvimento das idéias sobre os direitos humanos... 14 2 SIGNIFICADO DA REVOLUÇÃO FRANCESA NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE... 20 2.1 Antecedentes da Revolução Francesa... 20 2.2 Presença do movimento iluminista... 26 2.3 A Revolução e o marco de um novo período histórico... 30 2.4 A Europa após a Revolução... 32 3 REFLEXOS DA REVOLUÇÃO FRANCESA NO DIREITO INTERNACIONAL E NO BRASIL... 34 3.1 As constituições como a garantia dos direitos... 34 3.2 Desenvolvimento e fases dos direitos humanos... 36 3.3 O direito internacional e a globalização... 40 3.4 Influência da Revolução Francesa no ordenamento jurídico brasileiro... 43 CONCLUSÃO... 46 REFERÊNCIAS... 49

INTRODUÇÃO A pesquisa pretende analisar a influência da Revolução Francesa na história da humanidade, sua importância histórica e social para o desenvolvimento dos direitos humanos. Tem como objetivos verificar como a Revolução comandou as novas direções tomadas pela humanidade através de movimentos e novas formas de pensar. Ainda, pretende observar como suas ideias foram seguidas e determinaram a conquista dos direitos humanos e fundamentais. Tem caráter teórico e referencial, com abordagem histórica e reflexiva sobre os diferentes momentos pelos quais passaram os direitos para se chegar ao conceito atual. Propõe-se a divisão em três segmentos, na forma de capítulos, para explanar as proposições e, ao final, ser fornecida uma conclusão geral. Inicialmente, discutir-se-á o que significa o termo direitos humanos, qual sua finalidade e propósito. Junto a essa expressão, ainda há outras similares, como direitos fundamentais, essenciais, entendidos como básicos para a vida humana. Ao se falar em direitos humanos se questiona se há referência exclusiva ao ser humano ou a sua relação com o ambiente em seu todo. Ainda, coloca-se em questão quais são esses direitos e por que são imprescindíveis na vida dos sujeitos. Junto a isso, será abordada a origem dos direitos humanos e como se afirmaram como princípios institucionais. O segundo capítulo faz referência à própria Revolução Francesa, sua origem, repercussão, matrizes filosóficas e fatores que constituíram seu ponto culminante. Nesse, a proposta é uma análise histórica desse movimento, considerando sua importância para as novas direções que foram traçadas, conquistas e consequências para as nações como um todo. Pretende-se discutir até que ponto essa revolução foi tão determinante para os novos cursos da humanidade ou se é apenas um ícone da história, assemelhado a um mito que predominou. Ao se estudar a Revolução como marco da História Universal, se instigará a relação com o desenvolvimento dos direitos humanos. O terceiro capítulo pretende analisar e discutir a herança deixada pela Revolução Francesa nas instituições jurídicas em geral. Primeiramente, de que maneira teve início a organização das leis que foram consideradas como supe-

riores no direito de cada nação, como se formaram as primeiras constituições e o que seria fundamental para sua estrutura. Após a discussão sobre a Constituição e a garantia dos direitos, será exposto o desenvolvimento dos direitos humanos divididos em suas várias fases, ou gerações. Seguindo, se fará uma discussão sobre os direitos no âmbito internacional e a globalização e, por fim, a influência da Revolução no sistema jurídico brasileiro. Sendo a pesquisa histórica e analítica, tendo como base as referências citadas, não há pretensão de uma análise das leis constitucionais propriamente ditas. Apenas serão feitas considerações em meio às informações expostas, estabelecendo comparações e refletindo sobre a atual situação, principalmente no Brasil. Também, não se pretende fazer críticas ou trazer soluções, mas trazer, de forma discursiva, os fatos que envolveram a Revolução Francesa e de que forma comandaram os fundamentos que estruturaram as leis de diferentes nações.

1 CONCEITO E ORIGEM DOS DIREITOS HUMANOS A expressão direitos humanos parece ser tão comum que, muitas vezes, é pronunciada sem a devida importância. Os direitos humanos deveriam ser o guia para a elaboração de todo um ordenamento jurídico, de todas as leis e decisões. As nações em geral se dizem adeptas aos direitos humanos, mas, ao se observar os vários e diferentes conflitos que atingem a humanidade, percebe-se que há falhas nessa aplicação. Primeiramente cabe discutir o que são direitos humanos. Esse adjetivo remete a homem, mas se questiona se todos têm acesso a esses direitos e se todos são dignos desse acesso. Cabe, também, a pergunta se estão direcionados apenas aos seres humanos ou se podem ser contemplados todos os seres vivos em geral, a natureza como um todo. A própria qualidade de vida dos seres humanos depende de seu relacionamento harmônico com o meio natural, assim, se põe em questão quais os direitos humanos frente a outros seres. Questiona-se se os chamados direitos humanos são exclusivamente humanos e ilimitados ou se têm restrições nas relações tanto naturais como humanas e sociais. Direitos humanos, assim, não são unos e nem tão abrangentes, pois cada ser humano pode gozar dos que lhe são assegurados desde que respeite os do semelhante. Assim, acaba havendo choques, pois ideias e atitudes não são compatíveis, havendo pensamentos diferentes. Os conflitos enfrentados pela sociedade demonstram descontentamento, havendo grupos defendendo seus direitos contra outros que estão tentando negá-los. As lutas sociais se caracterizaram pela busca ao direito, à libertação dos que estavam sendo oprimidos. Os direitos humanos, embora mascarando outros interesses, sempre foram o ponto central de qualquer luta, o objeto expresso dos diferentes movimentos. Além de se questionar o que são os direitos humanos, também cabe a indagação de quais são esses direitos. Além da expressão direitos humanos, há outras, como, direitos fundamentais, universais, que acabam gerando confusão em seu entendimento, podendo ser sinônimos ou variações, em que uma expressão seria gênero das outras. Tais expressões podem ter se desenvolvido junto às próprias conquistas dos direitos, especificando tipos de direitos. As

9 lutas e as ideias voltadas ao bem da humanidade fizeram com que os direitos passassem por fases e por prioridades dependendo da época, das circunstâncias vividas e modos de pensar e de ver a realidade em cada momento histórico. 1.1 Problemática dos direitos humanos A conquista dos direitos humanos sempre esteve ligada às lutas, muitas delas sangrentas e com altos índices de destruição. Pode ser visto como contradição o fato de direitos, voltados para a humanidade, foram causa de tantos momentos de barbárie. Os direitos atuais não apenas são resultado de muitas lutas, mas continuam sendo, pois não basta os mesmo existirem, mas que estejam disponíveis e sejam eficazes a todos. Segundo Dalmo de Abreu Dallari (1998), direitos humanos são uma abreviação de direitos fundamentais da pessoa humana, sendo essenciais para a sobrevivência e assegurado a todos para se viver com dignidade. Todas as pessoas são iguais em condições de valor, mas devem ser respeitadas quanto a suas diferenças e a suas necessidades básicas. Para esse autor, os direitos humanos são uma faculdade e, assim sendo, os indivíduos podem ou não gozá-los. Estão associados a dignidade da pessoa humana, o que apenas acontece quando os direitos são respeitados, à cidadania, havendo direitos e deveres e à solidariedade. Havendo essa observância, poderá haver paz e, assim, se poder falar em justiça social. O autor cita como um dos principais direitos a vida, que é o bem principal de todos os seres humanos, não tendo ninguém o direito de tirar a vida de ninguém ou de tentar algo contra alguém que lhe seja nocivo, em qualquer circunstância. Apenas o Estado tem o dever de punir alguém, mesmo assim, dentro de determinados padrões, evitando guerras, genocídio e a pena de morte. O direito à vida é uma garantia às necessidades individuais. Todos os seres humanos têm o direito de exigir que respeitem sua vida. E só existe respeito quando a vida, além de ser mantida, pode ser mantida, pode ser vivida com dignidade.. (DALLARI, 1998, p. 22).

10 Além do direito à vida, também é citado o direito de ser pessoa, havendo o respeito a esse bem, à dignidade e à integridade física. A violência é uma aversão a esse direito, sendo uma agressão também moral. Por outro lado, não há apenas violência física, a discriminação e indiferença que uma pessoa pode passar e lhe faz se sentir diminuída, pode significar violência. Outro direito que aparece como principal é a liberdade, que é uma condição de todos desde o seu nascimento. As pessoas precisam ser livres para tomar suas próprias decisões, fazer escolhas, agindo de acordo com sua própria vontade. Ao lado da liberdade, está a igualdade, significando valor igual a todos e iguais oportunidades a todos. Continuando com a enumeração de direitos do autor, é citado o direito à moradia e à terra. A moradia é essencial não como espaço físico, mas como abrigo, acolhimento, sendo o local do repouso físico e espiritual. A terra é o local de trabalho para muitas pessoas, de onde tiram seu sustento e, como a casa, pode ser um lugar de apego. No Brasil, a Reforma Agrária é uma maneira de se fazer justiça com a terra. Seguindo, há o direito ao trabalho, mas em condições justas, onde há oportunidade do desenvolvimento intelectual e o convívio social, havendo retribuição compatível com o serviço prestado. As pessoas, também, têm o direito de participar das riquezas e das decisões do governo. Ainda, há o direito à educação, à saúde e ao ambiente sadio, devendo ser fornecido através das políticas públicas. O autor expôs que os direitos humanos constituem-se como uma faculdade, mas quanto ao direito à vida ninguém decide, nem mesmo quanto a sua própria vida. Mas, de qualquer forma, o que foi exposto significa que ninguém pode exercer atos que prejudiquem o outro, que comprometam a dignidade física ou pessoal de alguém. O poder público tem a obrigação de garantir a todos os seus direitos, fornecendo estrutura para isso e protegendo-os. Com o respeito mútuo ao direito de todos, com a igualdade de condições, se tem uma sociedade democrática, levando à cidadania. Essa é uma questão política, envolvendo os direitos e deveres, definidos pelo ordenamento de cada Estado. A cidadania, que no século dezoito teve sentido político, ligando-se ao princípio da igualdade de todos, passou a expressar uma situação jurídica, indicando um conjunto de direitos e deveres jurídicos. Na terminologia atual, cidadão é o indivíduo vinculado à ordem jurídica de um Estado. Essa vinculação pode ser determinada pelo local do

11 nascimento ou pela descendência, bem como por outros fatores, dependendo das leis do Estado [...] (DALLARI, 1998, p. 15). Costas Douzinas (2009) diz que os direitos humanos, na modernidade, chegaram a um ponto que pode se pensar que é o fim, ou a morte, mas o que acontece é que há paradoxos. No século XX foram declarados vários direitos aos seres humanos, mas, ao mesmo tempo em que esses foram concedidos, também foram violados, não havendo o devido respeito, o que pode ser exemplificado com as guerras, formas de tortura e discriminações que esse século assistiu. Junto a isso, há as condições de miséria a que uma grande parcela da humanidade está submetida. A concessão de direitos humanos acaba sendo uma utopia, pois os fatos reais contradizem o que é idealizado. O autor compara os direitos humanos da atual modernidade com os direitos naturais idealizados na Idade Moderna clássica, com o pensamento iluminista. Na verdade, os direitos naturais e os direitos humanos são um conjunto de ideias associadas a determinados padrões que começaram a surgir, em confronto com os que estavam vigorando. Na época clássica, os direitos naturais determinavam o que era certo e justo naquele momento histórico, indo ao encontro com aquele pensamento e, o mesmo acontece hodiernamente com os direitos que passaram a ser chamados de humanos. Esses podem ser uma ideia que confronta com as normas vigentes, estabelecendo novos padrões. [...] a possibilidade de julgar o real em nome do ideal só pode começar quando o que é correto por natureza confronta o que é legítimo por convenção ou prática passada [...] (DOUZINAS, 2009, p. 48). Os direitos humanos surgiram para assegurar a paz, com a finalidade de conceder a todos as mesmas oportunidades e tratamento com igualdade. Surgiram em um período conturbado justamente devido às necessidades, sendo preciso pensar em algo uniforme para cessarem os conflitos. Assim, pode-se dizer que os direitos humanos são frutos dos próprios conflitos, mesmo objetivando cessá-los. Na atualidade, podem ocasionar outros conflitos com o confronto de ideias, mesmo havendo a luta por esses direitos.

12 1.2 Direitos humanos e direitos fundamentais Considerando a etimologia direitos humanos e direitos fundamentais, pode-se considerar os primeiros como direitos dirigidos ao homem, à espécie humana. Fundamentais podem ser aqueles direitos que são básicos, sem os quais não se pode viver. No entanto, essa distinção deve considerar o que o ordenamento jurídico entende por ambos, já que é esse quem os determina e presta a garantia. Mas direitos humanos e fundamentais deveriam acontecer naturalmente, apenas pelo consenso, sem haver a necessidade de lei. No entanto, as relações sociais fizeram com que tudo ficasse registrado, havendo a aprovação de direitos e punição para o não cumprimento. O próprio conceito de direito é visto como algo semelhante à lei. Assim, antes de se falar sobre direitos humanos e fundamentais é preciso se pense na própria definição de direito. Roberto Lyra Filho (2004), comparando direito e lei, diz que a legislação abrange o direito e o antidireito. De maneira ideológica, o Estado faria a identificação entre lei e direito e, a legislação, deve ser analisada em qualquer nação. A forma de legislação vai depender da organização de cada Estado, podendo ser autoritário ou democrático. O direito que apenas considera a legalidade não vai ao encontro da legitimidade. Desde sempre, o direito se manifestou através das ideologias, que são apenas pensamentos, em que não há perfeição. A ideologia pode aparecer como crença, mostrando em que ordem de fenômenos mentais aparece; como falsa consciência, como crenças e deformações da realidade; e como instituição, tendo origem no social e em seus processos. O autor apresenta como concepções de direito o jusnaturalismo e o positivismo. O primeiro se refere ao direito natural, como uma ordem justa. O positivismo é relativo ao próprio direito positivo, dentro de uma ordem estabelecida, podendo ser legalista, voltado para a lei; historicista ou sociologista, voltado para as formações jurídicas preexistentes; psicologista, romântico e ideológico. A teoria dialética do direito não permite que nem o jusnaturalismo e nem o positivismo seja privilegiado. As duas concepções podem se complementar, sendo o positivismo o mais abrangente. Luiz Fernando Coelho (1991) diz que o direito como dogmática jurídica pode partir do senso comum e se chegar à organização social. O Estado mo-

13 derno possui como sistema econômico o capitalismo e, como filosofia jurídica, o positivismo, o que se contextualizou com as revoluções burguesas. A palavra direito pode significar a regra do que se determina o que é certo. A ideologia romana estabelecia direito como um conjunto de normas, dirigindo o que é certo, podendo ser objetivo, subjetivo e como lei. O positivismo é visto pelo autor como um fenômeno social, capaz de estabilizar o direito. O Estado é o órgão de criação do direito, uno e monista, que se consolidou e, junto a isso, deu-se a afirmação do direito como identificação às normas de organização estatal. O princípio da estabilidade pressupõe o Estado como condição necessária do direito. (COELHO, 1991, p. 263). A positividade do direito é uma característica do direito estatal, sendo o Estado o lugar da legitimidade. O direito de Estado é apenas uma espécie, sendo que o direito vem antes do Estado. O direito pluralista, da libertação parte de uma sociedade politicamente organizada, deixando de ser único para ser social, envolvendo a norma com a cultura. A estabilidade do direito também está ligada a sua racionalidade, formando um sistema de normas que forma o ordenamento, dentro dessa lógica racional. A racionalidade normativa implica a concepção de norma jurídica como racional em si; a ornamental implica a concepção do direito como ordem jurídica, ou seja, um conjunto de normas cuja articulação interna é racional, formando um sistema ; e a racionalidade decisional implica a imagem ideológica das decisões judiciais como racionais e, portanto neutra em relação ás partes envolvidas no conflito. (COELHO, 1991, p. 308). Lilith Abrantes Bellinho (2009) estabelece uma distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais. Inicialmente fala em direitos do homem, termo do jusnaturalismo, bastando a condição de ser homem para ter o direito e, também, o poder, de obtê-los. As críticas a essa terminologias se davam por se considerar que tais direitos eram apenas para quem fosse do sexo masculino, tendo que ser modificado, não contemplando a pessoa humana. Assim, passou-se a denominação de direitos fundamentais, expressão adotada pelas constituições, sendo do direito interno de cada ordenamento. O termo Direitos humanos passou a ser usado a nível internacional, considerando os direitos fundamentais, que deveriam ser atribuídos a todos os seres humanos, sem distinção.

14 [...] Os direitos fundamentais estão duplamente positivados, pois atuam no âmbito interno e no âmbito externo, possuindo maior grau de concretização positiva, enquanto que os direitos humanos estão positivados apenas no âmbito externo, caracterizando um menor grau de concretização positiva [...] (BELLINHO, 2009, p. 2). Flávio Maria Leite Pinheiro (2008) fala na legitimação universal dos direitos humanos, havendo proteção e garantia no âmbito internacional. Também, deve-se pensar na pessoa como um todo, na sua dignidade, devendo lhe ser assegurados todos os direitos para que se qualifique como cidadão. Assim, direitos universais podem ser vistos como aqueles dedicados a todos, partindo do princípio da igualdade, fazendo parte do direito universal. Por outro lado, podem ser vistos como direitos concedidos em sua integralidade, somando todos aqueles que são fundamentais para qualquer ser humano ser digno enquanto pessoa. Direitos humanos, quando foram pronunciados pela primeira vez, poderiam não se referir ao homem no sentido de gênero, tendo surgido em um período de adesão à igualdade. Mas sabe-se que a igualdade era relativa, havendo condições desiguais de diversas formas. No entanto, a expressão direitos humanos foi mais adequada, confirmando a abrangência dos direitos, a todos os seres humanos. Direitos fundamentais podem ser considerados aqueles que são elementares para que todos os seres humanos possam viver com dignidade, sendo citados na Lei Maior, como forma de garantia. Por fim, direitos universais passam a ideia de totalidade, protegidos internacionalmente e capazes de garantir a dignidade plena das pessoas. 1.3 Desenvolvimento das idéias sobre os direitos humanos Direitos existem desde que o homem assim se reconheceu, pois sempre houve direitos e todas as sociedades, mesmo as mais primitivas, tiveram sua organização, mesmo que precária. Poderia acontecer de alguns terem mais direitos do que outros, não havendo igualdade, mas separação entre os supostamente superiores e os inferiores. A preocupação com os direitos humanos, reconhecendo o princípio da igualdade, é recente, algo que se institucionaliza

15 no século XVIII. Passando por um caminho longo e conflituoso, se chegou à conquista dos direitos comuns a todos os seres humanos. Fábio Konder Comparato (2001), ao sintetizar a evolução dos direitos humanos, reforça a ideia de igualdade entre os homens, devendo isso ser reconhecido universalmente, não podendo nenhum ser considerado superior ou inferior aos demais. Todos os avanços e evoluções experimentados estavam a favor do homem, pois tudo gira em torno desse e em sua posição no mundo. Tanto as histórias religiosas como as teorias científicas e históricas procuraram justificar a origem e a existência humana, sempre posta como superior entre os demais seres. As leis começaram a existir já com a ideia de igualdade, mesmo que superficial e não valendo para todos, primeiramente de caráter religioso e, depois, natural. Com o pensamento voltado para a racionalidade, mais do que para a religiosidade, iniciado com os gregos, fluíam as ideias de autonomia e de ética. A biologia via o homem como um produto do meio, depois, o próprio evolucionismo admitiu a evolução não apenas biológica, mas cultural, do homem. A Grécia Antiga falava em democracia, fundada nos princípios da preeminência das leis e na participação popular, tendo as leis um caráter quase que religioso. A política grega limitava o poder dos governantes e lhe atribuía responsabilidades. Aristóteles citou espécies tradicionais de regimes políticos: monarquia, aristocracia e democracia. A república romana também teve poder limitado, com funções moderadas, que inspiraram Montesquieu. Na Baixa Idade Média, no século IV a.c., houve a instituição da vaga imperial que destruiu a democracia ateniense e a república romana. Na Alta Idade Média, é instaurado o feudalismo e, no século XI d.c., há a reconstrução da unidade política perdida junto à proclamação pelos direitos humanos, pela liberdade e benefício do Terceiro Estado. A Europa começa assistir a avanços na produção agrícola, na navegação e no comércio, voltando à limitação do arbítrio do poder político, formando-se os burgos novos, território da liberdade pessoal. Concomitantemente, entre o século XI e o século XIII, a Europa medieval viveu um período fecundo em inovações técnicas, que revolucionaram toda a estrutura produtiva. (COMPARATO, 2001, p. 45). Darcísio Correa (2002) estabelece uma relação entre direitos e cidadania através de uma abordagem histórica dos direitos humanos. A cidadania foi

16 um processo de inclusão social dentro dos diferentes modos de produção da vida social. Diz que o jusnaturalismo é uma doutrina que defende um estado, um direito natural, sendo a ideologia dos pensadores antigos e medievais. Foi apenas uma forma de idealização, fora do comportamento social. O direito natural, enquanto ideal, era externo ao espírito humano, sendo um dos fundamentos da mitologia grega. A identificação entre direito e justiça estaria ligada à vontade divina, que poderia estar a favor dos dominantes ou dos oprimidos. Heráclito via a lei divina como orientação para o cosmos e para os mortais. A vida dos homens era comandada pelos deuses, a divindade estabelecia a ordem social. Para os sofistas o direito natural estava a serviço da mudança social, sendo o direito um resultado das relações sociais. A ideia era de que todos nasciam iguais, mas as leis geravam desigualdade. Segundo Platão, o universo estava dividido entre o mundo sensível e o das ideias. O ser humano era portador de corpo e espírito. A justiça se configurava como uma ideia de harmonia, de equilíbrio, absoluto e imutável. Para Aristóteles era justo o direito natural, mas a natureza em seu todo, não apenas o homem, considerando seu aspecto físico e social. As leis naturais deveriam ser comuns a todos os povos. Os autores da Idade Média viam o direito como justiça, a natureza junto com a teologia. Santo Tomás de Aquino cristianizou o pensamento aristotélico, teorizando que existem três tipos de leis: a divina, proveniente de Deus; a natural, vinda de Deus, mas acessível aos homens; e a humana, produto dos homens em sociedade. Se uma lei social fosse injusta, não precisava ser obedecida. O jusnaturalismo antigo e medieval tinham como característica comum o conservadorismo e a convivência social era suporte absoluto, transpositivo e metafísico. Na Idade Média, o direito jusnaturalista era sinônimo de justiça e com fundamentos na natureza das coisas, a natureza física, cósmica e social, com instituições políticas. Os pensadores modernos consideravam a natureza do homem. Hugo Grócio representou a passagem da formulação teórica do direito natural e as regras passaram a ser ditadas pela razão, o direito passou a representar lei. A base do direito era o homem individual. O contratualismo partia da vontade dos indivíduos, sendo um acordo entre os indivíduos e o Estado.

17 [...] mudou o significado da palavra direito: não mais justiça, mas regra (lei). Mudou também seu fundamento: não mais a natureza enquanto ordem universal (incluídas nelas as instituições sociais e políticas), mas a natureza humana, abrindo a perspectiva do enfoque individualista da modernidade [...]. (CORREA, 2002, p. 46). O direito natural perdurou durante os séculos XVIII e XIX, tendo-se, em 1804, o Código de Napoleão. Com o feudalismo, houve a crise do cristianismo, estando o direito natural centrado na natureza do homem. A escola de direito natural moderno fundamentava o direito na razão e não na retórica, descobrindo o justo e o injusto pelas evidências, o que contrariava Aristóteles, que dizia que a voz de todos era a voz da natureza. Com o surgimento das teorias contratualistas, o direito passa pelo consentimento para ser direito positivo, havendo um contrato social no Estado de direito. O positivismo fundamentava as normas fixadas pelo poder estatal, objetivando um estado de direito. O sistema capitalista criou contradições para a justiça e para a própria cidadania. O autor diz que o ideal de uma sociedade de direito, e justa, sempre encontra obstáculos, havendo sempre opressão em uma sociedade que visa o lucro. Primeiramente, deve-se pensar no ser humano, pensando a justiça como definidora da ordem pública, dentro de uma concepção ético-política. O discurso dos direitos humanos surge ligado aos problemas de paz e de democracia. Ainda segundo Comparato, no século XVII, a Europa começou a viver a crise da consciência, dando-se questionamentos e incertezas sobre as verdades tradicionais. As novas formas de pensar e de representar o mundo provocaram revoluções artísticas, científicas e políticas. Jean Bodin e Thomas Hobbes teorizaram sobre a monarquia absoluta, tendo como cenário a fundação dos impérios coloniais ibéricos ultracolonizadores. A crise da consciência europeia também é dada pelo sentimento de liberdade e de perigo quanto ao poder absoluto, em que as liberdades pessoais beneficiavam o clero e a nobreza. O Parlamento seria uma forma de limitação do poder monárquico e garantia das liberdades na sociedade civil. Na Inglaterra, em que ascendia as ideias sobre liberdade, foi criada a Magna Carta e o Bill of Rights, como forma de garantia das liberdades pessoais e de poder representativo. As ideias de liberdade e limitação de poder, bem como a institucionalização dessas, foram influência para as revoluções e independências que se seguiram.

18 A instituição-chave para a limitação do poder monárquico e garantia das liberdades na sociedade civil foi o Parlamento. A partir do Bill of Rights britânico, a ideia de um governo representativo, ainda que não de todo o povo, mas pelo menos de suas camadas superiores, começa a firmar-se como uma garantia institucional indispensável das liberdades civis. (COMPARATO, 2001, p. 47). Segundo Evaldo Vieira (2004), a proteção dos direitos foi um processo de democratização do sistema internacional, vindo de uma necessidade de proclamar, fundamentar e proteger os direitos do homem. No entanto, uma significativa parte do mundo é excluída desses direitos. A soberania do cidadão foi trocada pela soberania do consumidor. O direito apenas existe quando há sua realização, o que não condiz com as guerras e massacres e nem com a globalização, que distancia ricos e pobres. [...] não ocorreu progressão constante no consentimento de direitos e de elementos de justiça social. (VIEIRA, 2004, p. 29). O direito social precisa acontecer junto a uma política social, formando uma totalidade que é necessária para a concretização dos direitos. Norberto Bobbio (1992) expõe que não há um fundamento absoluto para o direito, havendo dicotomia entre o direito que se tem e o que se quer. A própria expressão direitos humanos pode trazer definições vagas. Os fundamentos de direito precisam trazer condições para a realização de valores últimos. Os direitos humanos constituem uma classe variável, heterogênea e com estatutos diversos, não existindo direitos fundamentais por natureza. Os direitos individuais tradicionais consistem em liberdades e, os sociais, consistem em poderes. Aumentando os direitos dos indivíduos, também diminuem a liberdades desses mesmos. O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político.. (BOBBIO, 1992, p. 24). Os direitos humanos são o resultado de um processo histórico, tendo as influências de cada época. Em cada fase histórica se falou em direitos com ideia de democracia, talvez não da forma como a entendemos hoje, mas ao se pensar em direito, se pensava em uma ordem social com condições de sobrevivência. Tanto com o direito natural como com o positivismo não se pensou em direito sem dois denominadores básicos: o indivíduo e o Estado. Aquele seria o merecedor do direito, não tendo sentido elaborar leis sem haver um

19 destinatário, e o Estado seria o garantidor desses direitos e o responsável pela ordem social através do respeito às normas institucionalizadas. Os direitos naturais foram se positivando, pois a institucionalização das leis era uma garantia, uma forma de amparo. Os direitos fundamentais comandaram a formação dos ordenamentos, servindo como base do direito. São direitos pétreos e servem como princípios para a Lei Maior, não podendo ser desconsiderados nas leis infraconstitucionais sob pena de inconstitucionalidade. Direitos humanos fundamentais são consequência e resultado das falhas e incoerências do Estado, sendo conquistados através de conflitos. Direitos sempre existiram, mas o que sempre faltou foi sua plena universalidade, concedidos a todos e em sua totalidade.

2 SIGNIFICADO DA REVOLUÇÃO FRANCESA NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE A humanidade não teria sua história se não fossem os fatos que, em sua maioria, são descobertas e conflitos. Esses são consequências de descontentamentos dados por desvios na ordem natural e, causa, para movimentos maiores, que geraram revoluções que deixaram marcas profundas, alterando o destino de muitas nações. As guerras e revoluções trouxeram mudanças para formas de governo, sistema político e econômico e até para a identidade de muitos povos. Movimentos podem ser vistos como organizações que visam solucionar conflitos e, muitas vezes, criando outros, mas devido a um problema anterior, indo contra uma ideologia dominante. Guerras acontecem entre nações, sendo conflitos intensos com bombardeios. Revolução, por sua vez, seria uma mudança intensa nos povos envolvidos, iniciando com conflitos e chegando a o ponto culminante, que se assemelha a guerra. Evolução se refere a mudanças contínuas, direcionadas para a atualidade. Revolução pode ser vista como uma volta a algo que foi perdido. A revolução leva os povos para mudanças, mas podendo resgatar elementos passados. A Revolução Francesa foi uma das lutas burguesas, objetivando igualdade, devendo terminar as regalias da nobreza e o poder absoluto do Antigo Regime. Foi iniciada com lutas pela independência de nações em relação às metrópoles, sendo espalhada a ideia de direitos humanos, assegurados pelas constituições. Aparentemente, o mundo se encaminhava para uma nova direção, indo ao encontro do direito igualitário para todos os seres humanos. 2.1 Antecedentes da Revolução Francesa O início da história da humanidade se caracterizou pela evolução do ser humano. Da Pré-História à Idade Antiga, houve as mutações humanas até se chegar ao Homo sapiens, passando pelas idades da pedra e dos metais até chegar à descoberta da escrita. Os demais fatos que marcaram o fim e o início de uma nova Idade histórica foram revoluções, agora considerando as lutas que alcançaram seu auge, dando outra forma à sociedade. Desde a tomada de