Sob a égide dos princípios da inclusão e de acordo com BRASIL (2008):

Documentos relacionados
Os Direitos da pessoa com TEA

SUMÁRIO I. CONTEXTO...1 II. ATENDIMENTO ÀS PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA NO IMMES...2

Material Para Concurso

A partir da década de 1990, no Brasil e no mundo, o paradigma tende a ser deslocado da integração para a inclusão. A Educação Inclusiva surgiu, e vem

I - Apresentação. II - Marcos históricos e normativos SÚMULA: POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Regulamento de auxílio as pessoas com transtorno espectro autismo.

AS ESPECIFICIDADES DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM DOS ESTUDANTES COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. Marcia Dolores Carvalho Gallo

Rodrigo Machado Merli Diretor Escolar da PMSP Pedagogo Didática de Ensino Superior PUC/SP Estudante de Direito

PREFEITURA MUNICIPAL DE BLUMENAU SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DIRETORIA DE PROGRAMAS E PROJETOS INTEGRADOS

PROGRAMA DE PROMOÇÃO À PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

PSICOPEDAGOGIA,INCLUSÃO E O ATENDIMENTO A PESSOA COM AUTISMO

C A D E R N O D E P R O V A

CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS

LEI Nº , DE 27 DE ABRIL DE 2015.

DECRETO 7611/2011 Dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providências

INCLUSÃO ESCOLAR DE EDUCANDOS COM TEA. Michele Morgane de Melo Mattos

Caderno de Prova 2 AE02. Educação Especial. ( ) prova de questões Objetivas. Auxiliar de Ensino de

CARTILHA DE ORIENTAÇÕES

O TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR: ANALISE, REFLEXÃO E FORMAÇÃO EM FOCO.

Material elaborado pela professora Tásia Wisch - PNAIC

EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA EM POLÍTICAS EDUCACIONAIS BRASILEIRAS

POLÍTICA DE ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO DO UNIBAVE

CAPÍTULO II NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS. Maristela Rossato

PROGRAMA DE DISCIPLINA

TG D Fon o t n e t : e : CID 10 1

Estado do Rio Grande do Sul Conselho Municipal de Educação - CME Venâncio Aires

AS BASES LEGAIS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL: UM PANORAMA NACIONAL

TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO TGD

MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA: FORMAÇÃO DOCENTE NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA REDE PÚBLICA DE MANAUS

Capacitação Multidisciplinar Continuada. EDUCAÇÃO INCLUSIVA e NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS (NEE)

A INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO DE CIÊNCIAS E A NECESSÁRIA FORMAÇÃO DE PROFESSORES. Emília Gomes Santos 1 Ana Cristina Santos Duarte 2

Algumas discussões relacionadas à educação inclusiva no contexto social e principalmente o escolar

Palavras-Chave: Direito à Educação; Inclusão Escolar; Direitos Humanos.

A inclusão dos portadores de necessidades especiais no atual contexto socioeducacional

COLEGIADO DE CURSOS FACULDADE UNA DE BETIM. Resolução nº 21 de 21 de novembro de 2016

DIREITO AO TRABALHO ASSOCIADO

DAS DIPOSIÇÕES INICIAIS

A INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR: ESTUDO DE CASO NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS, UNU-IPORÁ

Palavras-chave: Educação Especial/Educação Inclusiva, Atendimento Educacional Especializado e Políticas Públicas.

OS DESAFIOS DA INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM NECESSIDADES ESPECIAIS NO CONTEXTO ESCOLAR REGULAR

EDUCAÇÃO INCLUSIVA. Julho de 2018

INCLUSÃO E EXCLUSÃO NO ÂMBITO ESCOLAR

A MUDANÇA DE NOMENCLATURA NOS TÍTULOS DE ARTIGOS PUBLICADOS NA REVISTA BRASILEIRA DE DUCAÇÃO ESPECIAL

VIII ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PESQUISADORES EM EDUCAÇÃO ESPECIAL Londrina de 05 a 07 novembro de ISSN X

TÍTULO: A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA FACE AO DENOMINADO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

Palavras-chave: Educação Especial, Educação Infantil, Autismo, Interação. 1. Introdução

A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO INTERIOR DO RIO DE JANEIRO

CENTRO UNIVERSITÁRIO MONTE SERRAT CONSELHO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO RESOLUÇÃO Nº 14/2017

Anais do Simpósio de Iniciação Científica FACLEPP UNOESTE 1 RESUMOS DE PROJETOS...2 RESUMOS COM RESULTADOS...5

SALA DE AULA EM SITUAÇÃO DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA

10 Ensinar e aprender Sociologia no ensino médio

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA: RELATO DE EXPERIÊNCIA COM UMA CRIANÇA DIAGNOSTICADA COM AUTISMO INFANTIL

A EDUCAÇÃO ESPECIAL NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO NO PERÍODO DE 2007 A 2013

Caderno 2 de Prova AE02. Educação Especial. Auxiliar de Ensino de. Prefeitura Municipal de Florianópolis Secretaria Municipal de Educação

TRANSTORNO DE ESPECTRO AUTISTA

Política Nacional da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. Três Corações Minas Gerais Julho de 2011

TGD - O POSICIONAMENTO DA ESCOLA REGULAR NA INCLUSÃO DE ALUNOS COM AUTISMO. PALAVRAS - CHAVE: Autismo. Ações pedagógicas. Escola inclusiva.

EDUCAÇÃO INCLUSIVA SUPERANDO BARREIRAS. Kátia Marangon Barbosa

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAPÁ CONSELHO SUPERIOR UNIVERSITÁRIO RESOLUÇÃO N 022/2012-CONSU/UEAP

Associação Catarinense das Fundações Educacionais ACAFE PROCESSO SELETIVO PARA ADMISSÂO DE PROFESSORES EM CARÁTER TEMPORÁRIO 2017

DIREITOS HUMANOS. Direitos Humanos no Ordenamento Nacional. Instrumentos Normativos de Proteção aos Direitos Humanos Parte 1. Profª.

TDAH E A LEI DA INCLUSÃO 1 ADHD AND THE INCLUSION LAW. Isabela Albarello Dahmer 2

Cartilha de Orientação. O Transtorno do Espectro Autista (TEA) Abril/2018

TÍTULO: A EDUCAÇÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA- SURDOCEGUEIRA: UM DESAFIO EDUCACIONAL NO ESTADO DE SÃO PAULO.

Inclusão e Educação Infantil: perspectivas curriculares

ANÁLISE DAS PRINCIPAIS PUBLICAÇÕES SOBRE INCLUSÃO SOCIAL E FAMILIAR NO AUTISMO INFANTIL RESUMO

EDUCAÇÃO INCLUSIVA E DIVERSIDADE JUSTIFICATIVA DA OFERTA DO CURSO

Educador A PROFISSÃO DE TODOS OS FUTUROS. Uma instituição do grupo

Os Direitos das Pessoas com TEA após a Lei /12

Associação Catarinense das Fundações Educacionais ACAFE

EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA: CONSTRUINDO CONHECIMENTOS COM PROFESSORES DA REDE PÚBLICA FUNDAMENTAL DE ENSINO

A educação sexual como ação inclusiva

ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

DESAFIOS DA INCLUSÃO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E DULTOS: Uma reflexão sobre a inclusão de alunos com deficiência na modalidade da EJA.

MATERIAL DIDÁTICO: MÉTODO EDUCACIONAL PARA CRIANÇA COM TEA DA ESCOLA MUNICIPAL JOSÉ CASTRO DE CAXIAS-MA

PORTARIA INTERMINISTERIAL MS-SEDH Nº 02, DE 21 DE NOVEMBRO DE 2003

RELATO DO PROCESSO DE INCLUSÃO DE UM ALUNO COM AUTISMO EM UMA ESCOLA PÚBLICA DA REDE ESTADUAL DE ENSINO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

ESCOLA X AUTISMO PERCEPÇÃO DOS PAIS

POLÍTICA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA PARA ALUNOS COM NECESSIDADES

PREFEITURA MUNICIPAL DE ESPIRITO SANTO DO PINHAL-SP CONCURSO PÚBLICO EDITAL 001/2016

PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

DIREITO E INCLUSÃO, GARANTIA DO ACESSO DEMOCRÁTICO AO CONHECIMENTO ESCOLAR

Serviço Público Federal Ministério da Educação Universidade Federal Fluminense

O direito à Educação das pessoas com deficiência intelectual SAMIRA ANDRAOS MARQUEZIN FONSECA

RELATÓRIO CIRCUNSTANCIADO AÇÕES EDUCACIONAIS INCLUSIVAS

EDUCAÇÃO INCLUSIVA. Rosita Edler Carvalho

A EDUCAÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: QUESTÕES LEGAIS E PEDAGÓGICAS.

CRIANÇAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS: A BI DOCÊNCIA COMO ALTERNATIVA NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

CURSO PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO INCLUSIVA

ESTATUTO ESTUDANTE COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS DA ESCOLA SUPERIOR DE EDUCAÇÃO DE PAULA FRASSINETTI

A VISÃO DE LICENCIANDOS EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS SOBRE INCLUSÃO ESCOLAR

3º - A pessoa com Transtorno do Espectro Autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.

POLÍTICAS E LEIS QUE AMPARAM A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ

ACESSIBILIDADE ARQUITETÔNICA EM UMA ESCOLA PÚBLICA DE BRAGANÇA/PA

Transcrição:

321 A INCLUSÃO ESCOLAR PARA O AUTISTA NO MUNICÍPIO DE MANAUS: UM VIÉS PARA A EFETIVAÇÃO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA Raimunda Maria Moreira da Silva Universidade Federal do Amazonas Maria Almerinda de Souza Matos Universidade Federal do Amazonas Axon Moreira Miranda Universidade Federal do Amazonas Eixo temático: Políticas de inclusão/exclusão em educação Categoria: Comunicação Oral raimunda.ufam@hotmail.com Introdução A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva é fruto do amplo processo de discussão realizado por pesquisadores da área da educação especial. Publicada em janeiro de 2008 e inserida no contexto histórico onde grande parte dos países dedica-se a avaliar os avanços produzidos e os desafios na implementação de políticas públicas, definindo caminhos a serem percorridos pela educação especial em consonância com os princípios educacionais inclusivos. Sob a égide dos princípios da inclusão e de acordo com BRASIL (2008): A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, afirma como diretrizes para a construção dos sistemas educacionais inclusivos, a garantia do direito de todos à educação, o acesso e as condições de permanência e continuidade de estudos no ensino regular (p.1) Nesse sentido, o caminho percorrido pela educação brasileira vem se reestruturando a partir da configuração da Política Nacional, constatando seu reflexo diretamente no s Estados e Municípios. Entretanto, esse percurso ainda é um desafio, embora haja garantias legais, quando postas à prova no cotidiano escolar e ao aluno, mostram que o direito que garante o acesso escolar, não é o mesmo que garante o ensino de qualidade e tampouco a inclusão.

322 A nossa Constituição Federal (1988, Art. 205), afirma que "a educação é direito de todos e dever do Estado e da família", porém, não é "qualquer tipo de acesso ao saber que contempla o Princípio da Igualdade de Acesso e Permanência na escola" (CF, Art.206, Inc. I), e para captar a dimensão desse direito é preciso situá-lo primeiramente no contexto dos direitos sociais, econômicos e culturais, firmados como direitos fundamentais. As discussões realizadas que serviram de base para o processo da inclusão educacional orientaram também os estudos do Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, os quais foram realizados em todo o país e envolveram os municípios-pólo e as secretarias estaduais de educação, fato que contribuiu para romper com uma dinâmica social excludente que historicamente tem condicionado as ações na área. Esse programa constitui um avanço nas políticas públicas para a formação docente neste tempo de falta de compromisso do Estado para com as Políticas Sociais. O processo de democratização da educação brasileira também colocou em evidência os opostos inclusão/exclusão. A visão elitista da educação acabou por delimitar a escolarização como privilégio de um grupo, gerando uma exclusão que se apresenta legitimada nas práticas educacionais reproduzindo seus reflexos nas questões sociais. No entanto, a tendência da política educacional e social durante as duas últimas décadas foi a de fomentar a integração e a participação, e de lutar contra a exclusão. A integração e a participação são essenciais à dignidade humana e ao gozo e exercício dos direitos humanos. A reforma das instituições sociais não constitui somente uma tarefa técnica, mas depende, acima de tudo, de convicções, compromisso e boa vontade de todos os indivíduos, que integram a sociedade. O olhar crítico para a história da humanidade revela, com muita clareza, que nenhuma sociedade se constitui bem sucedida, se não favorecer, em todas as áreas da convivência humana, o respeito à diversidade que a constitui em todas as suas dimensões. Assim, o direito à educação garante não somente a consolidação da cidadania para o indivíduo, mas também lhe confere reais possibilidades de inserção no mercado de trabalho, considerando-

323 se que fica difícil falar em capacitação para o trabalho sem que se encontre suprida a necessidade da educação. A educação tem, nesse cenário, papel fundamental, sendo a escola o espaço no qual se deve facilitar, a todos os cidadãos, o acesso ao conhecimento, ou seja, a possibilidade de apreensão do conhecimento historicamente produzido pela humanidade e de sua utilização no exercício efetivo da cidadania. Como exercê-la, sem que o indivíduo tenha acesso à educação que tem como principal finalidade prepará-lo para tal? Afirmando essa premissa, pode-se destacar o artigo 3º da Conferência Mundial de Educação para Todos Jomtien (1990), quando propõe como objetivo universalizar o acesso à educação e promover a equidade orientando no sentido de que: A educação básica deve ser proporcionada a todas às crianças, jovens e adultos. Portanto, é necessário universalizá-la e melhorar sua qualidade, bem como tomar medidas efetivas para reduzir as desigualdades. Para que a educação básica se torne equitativa, é mister oferecer a todas as crianças, jovens e adultos, a oportunidade de alcançar e manter um padrão mínimo de qualidade de aprendizagem. (p.1). Portanto, quando garante a todos o direito à educação e o acesso à escola, a Constituição Brasileira, segundo Mantoan (2009), não usa adjetivos e, assim sendo, toda escola deve atender aos princípios constitucionais, não podendo excluir nenhuma pessoa em razão de sua origem, raça, sexo, cor, idade ou deficiência (p.36). Também, a Convenção Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiências celebrada na Guatemala, em maio de 1999 deixa claro, a impossibilidade de qualquer forma de discriminação ou diferenciação com base na deficiência quando afirma [...] que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento, o gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais (Art. 1º). Assim, a atenção pública aos serviços educacionais deve garantir que as especificidades das pessoas com necessidades especiais sejam atendidas através da efetivação de políticas

324 públicas voltadas para essa população, pois com a conquista de maior autonomia dos municípios brasileiros, a partir da descentralização do poder e tendo como parâmetros as políticas nacionais e estaduais, o Plano Municipal de Educação vem contemplar a atenção às necessidades educacionais especiais dos alunos. Mediante o exposto, o objetivo de nossos estudos foi conhecer a possibilidade de Inclusão Escolar para educando autista no município de Manaus. Nesse processo, observar como se engendram as Políticas Públicas de educação do município a partir da Política Nacional de Educação na Perspectiva Inclusiva. Nesse sentido, o município de Manaus avançou ao implementar uma política pública direcionada à pessoa com autismo, cuja Lei 1.495 de 26 de agosto de 2010, reconhece a pessoa com autismo como portadora de deficiência. Contudo, refletir acerca da inclusão escolar para o educando autista no contexto da Política Pública do município de Manaus, tendo como parâmetro os conceitos presentes na Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) estabelecido pela Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação (SEESP/MEC), deu-nos a possibilidade de perceber alguns conflitos conceituais que precisam ser repensados no sentido de atender efetivamente a proposta de inclusão das pessoas com autismo e suas especificidades, conforme orienta a própria política educacional. A Política Pública do Município de Manaus: Lei 1.495/2010 A proposta de educação inclusiva celebrada na Declaração de Salamanca (1994) declara que todos os alunos devem ter a possibilidade de integrar-se ao ensino regular, mesmo aqueles com deficiências sensoriais, mentais, cognitivas ou que apresentem transtornos severos de comportamento, inserindo-se nesse contexto educandos com transtorno global do desenvolvimento, caracterizado como autismo.

325 A partir dessa declaração, o autismo passou a integrar a categoria de portadores de Condutas Típicas na Política Nacional de Educação Especial do MEC, elaborada pela Secretaria de Educação Especial, com a seguinte designação: Manifestação de comportamento típicas de portadores de síndrome e quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos que ocasionam atrasos no desenvolvimento e prejuízos no relacionamento social, em grau que requeira atendimento educacional especializado (MEC/SEESP, p.14). As deficiências foram organizadas em um amplo espectro de diagnósticos, recortados e classificados com o apoio do saber médico, cuja classificação se encontra no texto do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais DSM, da Associação Psiquiátrica Americana (APA, 1995), sendo classificado como: Transtorno Autista, Transtorno de Rett, Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtorno de Asperger e Transtorno Global do Desenvolvimento sem Outra Especificação. No contexto educacional, com a implementação da Politica Nacional da Educação na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008 as pessoas que apresentam necessidades especiais passaram a integrar as seguintes categorias: deficiente, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Com base nessa conceituação, os alunos com transtornos globais do desenvolvimento são aqueles que apresentam alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de interesses e atividades restritos, estereotipados e repetitivos, inclui-se nesse grupo alunos com autismo (BRASIL, 2008). Estudos recentes no âmbito da educação especial ressaltam que as definições e uso de classifcações devem ser contextualizados, não se esgotando na mera especificação de categorias atribuída a um quadro de deficiência, transtorno, distúrbio, síndrome ou aptidão (BRASIL, 2008). Porquanto, as pessoas podem se modificar ao longo de sua existência e promover mudanças no contexto em que estão inseridas. No Brasil poucas iniciativas têm sido tomadas pelos sistemas educacionais, considerandose dificuldade das escolas e dos professores em lutarem com alunos que, para eles, são vistos como doentes, isolados, alheios ao mundo sem perspectivas de aproveitamento

326 pedagógico. Essa visão linear e homogeneizante nivela todos, com perturbações do espectro do autismo, a despeito da comprovada diferenciação entre eles. Os estudos sobre espectro do autismo têm sido relevantes nos últimos anos, tendo em vista seu reconhecimento como quadro clínico diferenciado de outros transtornos mentais. Estima-se que 1 em cada 150 crianças nascidos apresentam perturbações autísticas. A última década, em decorrência de movimentos em prol dos direitos humanos e pela intervenção ativa dos familiares de autistas, vem sendo criadas oportunidades educacionais para essa população específica. No âmbito federal, recentemente foi sancionada a Lei nº 12.764 de 27 de dezembro de 2012 que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista e estabelece diretrizes para sua consecução. O artigo 1º, Incisos I e II desta lei, considera pessoa com transtorno do espectro autista aquela portadora de síndrome clínica, caracterizado por: Deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação sociais, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento; II - padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos. 2o A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais (DOU. 2012). Vale ressaltar que somente o ato de instituir uma política não legitima sua efetivação; precisa ser assegurada e desenvolvida coletivamente, deve fazer parte de uma estratégia global da educação. De acordo com Azevedo (2004), sendo a política educacional parte de uma totalidade maior, deve-se pensá-la sempre em sua articulação com o planejamento global que a sociedade constrói como seu projeto e se realiza por meio da ação do Estado. Dessa forma, o Estado precisa assumir sua responsabilidade e atender as reivindicações, no sentido da atenção às pessoas com necessidades educacionais especiais, em particular aquelas que se enquadram nas características do espectro do autismo.

327 No âmbito municipal em Manaus, por exemplo, foi sancionada a Lei Municipal nº 1.495 de 26 de agosto de 2010 que reconhece a pessoa autista como portadora de necessidades especiais, podendo freqüentar escola regular. Todavia, se observa que esta lei enfoca a visão clínica, uma prática que ainda reflete o modelo médico de compreensão da deficiência, tendo como referência um conjunto de significados construídos sócio-historicamente, fundamentados em uma explicação médica das deficiências. Por conta das diferenças que apresentam os indivíduos com deficiência, dentro desse modelo, são discriminados como incompetentes para o exercício de atividades sociais como educação, lazer, trabalho desconsiderados em seus direitos e deveres, reconhecidos como indivíduos incompetentes para aprender, pensar e decidir; submetidos a um permanente estado de dependência em relação a outras pessoas. O processo de interação baseado no modelo médico pouco ou nada exige da sociedade no que se refere à mudança de atitudes, de espaços físicos, de objetos e de práticas sociais. A sociedade cruza os braços e aceita o deficiente desde que ele seja capaz de adaptar-se ao seu contexto social e as formas de desempenhar os papéis sociais necessários. De modo geral, nas interações educacionais e sociais realizadas tendo como referência este modelo de compreensão do fenômeno, as pessoas acabam se relacionando com o quadro etiológico da condição de deficiente e não com a pessoa deficiente. Sabemos que o modelo médico de compreensão da deficiência está muito arraigado na realidade da Educação Especial brasileira e isto, em parte, tem sido responsável pela resistência da sociedade em aceitar a necessidade de mudar suas estruturas e atitudes para inserir em seu meio, os indivíduos com deficiência, de modo a favorecer-lhes os desenvolvimentos pessoais, sociais, educacionais e profissionais.

328 Partindo do pressuposto de que a deficiência é um problema exclusivamente na pessoa deficiente, a sociedade sempre foi levada a crer que bastaria oferecer a esses indivíduos algum tipo de serviço Especializado e o problema estaria solucionado. Com base nesses pressupostos, observa-se que a política pública do município de Manaus carrega no seu bojo a visão médica, organicista, focalizando a deficiência no indivíduo e enfatizando o diagnóstico e prognóstico clínico e tem como objetivo fundamental classificar, comparar e normatizar. Tal política apenas reconhece a pessoa autista como portadora 47 de deficiência, porém não assegura e também não garante o atendimento a essa população específica. Portanto, cabe repensar que modelo de inclusão está assegurado para pessoas com transtornos globais do desenvolvimento nas Políticas Públicas implementadas pelos Municípios brasileiros? Considerações finais Há mais de uma década o Brasil é cenário de discussões sobre a inclusão. Porém, ainda nos encontramos nos primeiros passos para a efetivação dessa proposta. Garantir a efetivação de uma política de inclusão implica vencer inúmeros desafios, como as barreiras arquitetônicas, o despreparo dos profissionais, a falta de consenso na interpretação da legislação vigente, entre outros fatores que dificultam a mudança dessa perspectiva. Dispositivos Legais afirmam que a educação é direito de todos, porém as ações relativas à Educação Inclusiva fogem a esse discurso. Dessa forma, discutir a inclusão é tarefa, no mínimo, desafiadora, uma vez que implica em dizer o que já foi dito tantas vezes e aquilo que, entretanto, ainda resta por dizer. Em se tratando de inclusão, faz-se necessário pensar também, para além da esfera das Necessidades Especiais e avançar na discussão da relação 47 Termo utilizado na Política Nacional de Educação Especial de 1994, e extinto na Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da educação Inclusiva de 2008.

329 que a escola estabelece com o diferente, que se identifica a partir de um padrão previamente definido. A Lei 1.495/2010, embora sancionada recentemente em Manaus, apresenta um descompasso frente e Política Nacional, tendo em vista sua visão organicista voltada para a área médica, vendo o deficiente como uma pessoa doente, incapaz, sem possibilidade de desenvolvimento de suas potencialidades. Por estar direcionada para a área da saúde, inclusive sem dados organizados, vale uma reflexão sobre as reais possibilidades enquanto Política Pública e sua efetivação no campo pedagógico nas escolas públicas do município de Manaus. Referências Associação Psiquiátrica Americana Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. DSM-IV, 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 1995. AZEVEDO, Janete M. Lins de. A educação como política pública: polêmicas do nosso tempo. 3. Ed. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 2004. BRASIL Constituição da República Federativa. Brasília: República Federativa do Brasil.1988., Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei nº 9394/96. Brasília, DF, Brasil: Saraiva. 1996., Ministério da Educação. Convenção da Guatemala. Brasília: MEC/SEESP, 1999., Inclusão: Revista Educação Especial. Ministério da Educação, Brasília, v. 4, nº 1, p.7-17, jan/jun.2008., Lei Federal nº 12.764/2012. Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Disponível em: <http://planalto.gov.br/civil_03/_ato2011-2012. Acesso em: 17 de jan. 2012. MANTOAN, Maria Tereza Eglér. Inclusão Escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São Paulo: Moderna, 2009. MANAUS. Diário Oficial do Amazonas. Lei nº 1.495 de 26 de agosto de 2010. Ano XV Nº 2515. UNESCO. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas especiais. Brasília,CORDE, 1994. UNICEF. (1991) Declaração Mundial de Educação para Todos e plano de ação satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem. Conferencia Mundial de Educação para Todos. 1990.