ESCLEROSE MÚLTIPLA EM PESSOAS ENTRE 20 A 40 ANOS

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154 investigated, performed by means of literary research in books, articles and websites concerning the subject presented. The inclusion criteria defined for the search of the contents were published covering the period 1990 to 2010, with articles written in Portuguese and English and having the key words: multiple sclerosis, demyelination and immunopathology. We found nine books and two papers. Keywords: Multiple sclerosis. Demyelination. Immunopathology. INTRODUÇÃO Este trabalho apresenta os principais aspectos da imunopatologia, Esclerose Múltipla (EM). Essa doença é a disfunção neurológica mais comum do adulto jovem entre vinte e quarenta anos, de acordo com Smeltzer (2005) e Bare (2005). É uma doença inflamatória crônica de causa ainda desconhecida que acomete o Sistema Nervoso Central (SNC), ela é também chamada de desmielinizante, pois destrói a mielina que envolve os axônios dos neurônios cerebrais e medulares (ALBUQUERQUE, 2005). Os diversos problemas enfrentados por pessoas que desenvolveram a imunopatologia EM podem ser tanto fisiológicos como a dormência, dificuldade na coordenação, distúrbios visuais, atrofia muscular, entre outros; quanto psicossociais dos quais se destaca a depressão, doença desenvolvida decorrente dos obstáculos enfrentados pelo portador da EM, os quais criam uma barreira ao redor do paciente impedindo-o de ter uma vida social normal. As alterações psicossociais no paciente são de grande impacto, pois os sintomas da EM aparecem na fase mais produtiva de um jovem. Esta pesquisa tem por objetivo geral promover o entendimento da EM enfocando o tema Vulnerabilidades transmitindo uma visão geral sobre a implicação da imunopatologia podendo, assim, esclarecer os sintomas e tratamento da patologia. METODOLOGIA Este estudo caracteriza-se por uma pesquisa exploratória, que busca maiores informações sobre o assunto investigado, realizada por meio de pesquisa literária em livros, artigos e sites referentes à temática apresentada. Os critérios de inclusão definidos para a busca dos conteúdos foram as consultas das publicações abrangendo o período de 1990 a 2010 em artigos escritos em Português e Inglês tendo como palavras-chave: Esclerose múltipla, Desmielinização e Imunopatologia. Foram consultados nove livros e dois artigos científicos.

155 Foi incluído no trabalho um caso fictício de EM com a finalidade de auxiliar a reflexão do problema na vida real. A ESCLEROSE MÚLTIPLA E SUAS CAUSAS A EM é uma doença de causa desconhecida, definida clinicamente pelos sintomas, sinais e progressões neurológicas típicas sendo ainda caracterizada por áreas disseminadas de inflamação, desmielinização e patologia axonal que afeta o cérebro, os nervos ópticos e a medula (CECIL, 2005, p. 2713). A desmielinização refere-se à destruição da mielina, um material gorduroso e protéico que circunda determinadas fibras nervosas no cérebro e na medula espinhal resultando no comprometimento da transmissão dos impulsos nervosos. A EM acomete tipicamente adultos jovens entre 20 a 40 anos de idade, afetando as mulheres com maior freqüência que os homens (BOYDEN, 2000). A causa da EM é uma área de pesquisa contínua. A atividade auto-imune resulta em desmielinização, mas o antígeno sensibilizado não foi identificado. Múltiplos fatores desempenham uma função no início do processo imune (SMELTZER; BARE, 2005). A pré-disposição genética é indicada pela presença de um agrupamento específico (haplotipo) dos antígenos leucocitários humanos (HLA) na parede celular. A presença deste haplotipo pode promover a suscetibilidade aos fatores, como os vírus, que deflagram a resposta auto-imune ativada na EM. Não foi identificado um vírus específico capaz de iniciar a resposta auto-imune. Acredita-se que o DNA no vírus mimetize a seqüência de aminoácidos da mielina, resultando em uma reação cruzada do sistema imune defeituoso (BOYDEN, 2000). A PARTIR DE UMA HISTÓRIA QUE PODERIA SER REAL Como a EM é um problema mais comum do que se pensa, decidiu-se imaginar como seria na prática o enfrentamento da patologia por uma jovem. Não há pretensão de desenvolver aqui um estudo de caso, mas apenas refletir sobre as teorias, a partir de uma possibilidade real. Foi criada uma personagem, que ajudará na reflexão sobre a EM e seus aspectos diversos no decorrer do artigo. Quando se verifica as conseqüências reais do problema, alguns aspectos se destacam, conforme ensina Albuquerque que:

156 A depressão é um sintoma emocional que se encontra associado à EM. Acomete de 27 a 54% dos pacientes, e discute-se se ela é uma condição psicológica secundária a uma doença crônica e grave ou um sintoma neurológico. Embora os estudos não sejam conclusivos, há provavelmente uma base multifatorial para a sua manifestação, com o envolvimento de fatores biológicos, psicológicos e genéticos (2005, p. 58). Destaca-se o aspecto da depressão porque este foi um dos principais problemas que a personagem enfrentou. No imaginário sobre a EM destacam-se todos os aspectos possíveis desde o recebimento da notícia até o enfrentamento do problema e, então, se ressaltam de antemão a preocupação se a sociedade em geral e até, mais especificamente, os profissionais de saúde têm condições de tratar o problema na íntegra, que é a reflexão do ser humano integral, que não pode ser fragmentado e tampouco descontextualizado. A personagem é Laura Rodrigues de Oliveira uma jovem de 24 anos, e segue sua história: Quando Laura recebeu a notícia de que tinha EM relatou: "Minha vida, como eu tinha planejado, acabou ali. Em 1998 apareceram os primeiros sintomas: teve paralisia facial parcial do lado direito, sem motivo aparente durante quase 24 horas. Os médicos não identificaram o problema, que acabou sendo amenizado. Ela só foi saber o que estava acontecendo quando foi diagnosticada como portadora de EM, em 2001. Laura estava em uma festa comemorando o aniversário de uma amiga, quando começou a se sentir mal. Durante as 48 horas seguintes ela ficou completamente paralisada do pescoço para baixo. Levada às pressas ao hospital, precisou enfrentar uma maratona de exames na tentativa de obtenção do diagnóstico. Até então, havia a desconfiança que se tratava de uma hérnia de disco. Um neurologista foi chamado. Nunca vou esquecer essa cena, conta. Ele pegou minha perna, soltou e ela caiu. Era uma perna morta. Olhou para mim e disse: esclerose múltipla. O diagnóstico precisou ser confirmado por exames, como a ressonância magnética. Na hora do último exame, quando foi constatada a patologia, Laura ainda teve que enfrentar um trauma. A médica que retirava o líquido céfalo raquidiano (LCR) de sua coluna comentou: você poderá até sentar novamente, mas é melhor se acostumar visto que vai passar a vida em uma cadeira de rodas. Laura após ouvir o diagnóstico da médica acreditou que realmente tudo estava acabado. Durante uma nova crise, em 2003, outro médico identificou o local da lesão que causou a paralisia em 2001 e a tranqüilizou dizendo que no seu futuro passaria longe de cadeiras de rodas. Nem cadeira de rodas, nem bengala, nem nada, você vai sair daqui andando, disse ele. A partir desse dia Laura viu que todo seu tratamento para a depressão tinha sentido e com isso amenizou o quadro. Passei anos em uma cadeira de rodas sem estar em uma cadeira de rodas, conta. Sua aposentadoria forçada aos 28 anos, devido às limitações da doença, causou um sério impacto na vida social de Laura. Planejei minha vida inteira de outra forma. Tem quem diga que o destino é você quem faz. Não acredito nisso, por que às vezes as coisas saem do seu controle, afirmou. Um dos aspectos da doença é que ela se instala justamente quando o indivíduo está iniciando sua vida afetiva, profissional e familiar. Há neste momento, uma perda da auto-estima associada ao medo do futuro, das dificuldades econômicas, da perda da independência e da posição que ocupa como membro da família e da sociedade. Laura agora com 38 anos, já se acostumou a conviver com a EM e também com a sociedade. No começo foi uma convivência difícil: EM sociedade e ela. Laura disse ainda que a sociedade é desinformada em relação a EM, já que a sociedade associa a EM com demência. Laura só se libertou do medo da patologia depois de fazer terapia. Hoje, se considera uma mulher mudada. Aprendi a me valorizar. Sou bonita, inteligente, faço trabalho voluntário. Sou uma pessoa especial. Resolvi aproveitar a vida, comentou. do tema. A história de Laura ajudará no desenvolvimento do trabalho, para melhor compreensão

157 DESENVOLVIMENTO DA EM FISIOPATOLOGIA As células T tipicamente sensibilizadas atravessam a barreira hematoencefálica com a função de verificar a presença de antígenos no SNC. Na EM, as células T sensibilizadas permanecem no SNC e promovem a inflamação de outros agentes que lesam o sistema imune. O ataque do sistema imune leva à inflamação que destrói a mielina (que normalmente, isola o axônio e acelera a condução dos impulsos nervosos) e as células da oligodendróglia que são produtoras de bainha de mielina no SNC (SMELTZER; BARE, 2005). As placas de tecido esclerótico aparecem nos axônios desmielinizados, interrompendo ainda mais a transmissão dos impulsos nervosos resultando em diversas manifestações, dependendo de quais nervos que são afetados. Os axônios afetados se dispõem de maneira irregular por todo o SNC (SMELTZER; BARE, 2005). As áreas mais freqüentes afetadas são os nervos presentes nos tratos ópticos, no tronco cerebral, no cerebelo e na medula espinhal. Mais adiante, os próprios axônios começam a se degenerar, resultando em lesão permanente e irreversível (BASHIR; WHITAKER, 2002; HALPER, 2001). No caso da paciente, os nevos afetados foram os da face direita, trazendo a tona os primeiros sintomas da patologia. Mais tarde, Laura apresentou paralisia decorrente do envolvimento das principais vias motoras da medula espinhal. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A evolução da EM pode assumir muitos padrões diferentes. Em alguns casos, a doença segue um curso benigno, com um aspecto de vida normal e sintomas tão brandos que os pacientes não procuram os cuidados e tratamentos de saúde (SMELTZER; BARE, 2005). De 80 a 85% dos casos, começam com uma evolução de recidiva-remissão, com a recuperação completa entre as exacerbações sintomáticas definidas (NOSEWORTHY et al, 2000). Pode-se dizer que Laura é uma paciente com evolução recidiva-remissão, pois teve o primeiro sintoma em 1998 e outros somente três anos depois, comprovando então a patologia. Essa forma da doença não progride entre as recidivas, embora a maioria dos casos com esse tipo inicial de evolução mude para uma evolução secundária progressiva depois de alguns anos (HALPER, 2001). A EM secundária progressiva começa como uma doença de recidivaremissão, porém muda para um curso em que não existe recuperação plena, mas em lugar disso, a progressão contínua entre as recidivas definidas. De 10 a 20% dos pacientes apresentam um curso progressivo primário (NOSEWORTHY et al, 2000), no qual os sintomas progridem durante toda a doença com incapacidade crescente. A patologia progressiva primária caracteriza-

158 se por declínio contínuo, com o desenvolvimento potencial da quadriparesia, disfunção cognitiva, perda da visão e síndromes do tronco cerebral (SMELTZER; BARE, 2005). Os sinais e sintomas da EM são variados e múltiplos, refletindo a localização da lesão (placa) ou combinação das lesões. Os sintomas primários mais comumente reportados são fadiga, depressão, fraqueza, dormência, dificuldade na coordenação, perda do equilíbrio e dor. Os distúrbios visuais decorrentes das lesões nos nervos ópticos ou em suas conexões podem incluir a turvação da visão, diplopia, cegueira em placa (escotoma) e cegueira total (SMELTZER; BARE, 2005). A fadiga compromete a melhor resposta do paciente durante todo o curso da doença. A fadiga é exacerbada quando há doença febril, banhos quentes ou ritmos circadianos normais durante a tarde que elevam a temperatura do corpo. A depressão pode relacionar-se com a fisiopatologia ou pode ocorrer como uma reação ao diagnóstico. A dor que ocorre em 66% dos pacientes que têm a patologia pode ser causada pela desmielinização das fibras de dor, estresse mecânico sobre os músculos, ossos e articulações decorrentes da própria incapacidade ou das medidas de tratamento (MALONI, 2000). A espasticidade 3 dos membros e a perda dos reflexos abdominais são decorrentes do envolvimento das principais vias motoras (tratos piramidais) da medula espinhal. A ruptura dos axônios sensoriais pode produzir disfunção sensorial (parestesias, dor). Os problemas cognitivos e psicossociais podem refletir o envolvimento do lobo frontal ou parietal. Alguns graus de alterações cognitivas, como perda de memória e nível de concentração diminuída, ocorrem em cerca de metade dos pacientes, porém são raras as alterações cognitivas graves como demência 4. O envolvimento do cerebelo ou dos gânglios de base pode produzir ataxia 5 e tremores. A perda das conexões de controle entre o córtex e os gânglios de base pode acontecer e provocar a labilidade emocional e euforia. São comuns as disfunções da bexiga, intestino e sexual (SMELTZER; BARE, 2005). As complicações secundárias da EM incluem as infecções do trato urinário, úlceras de pressão, deformidades em contratura, edema dependente no pé, pneumonia, depressão reativa e massa óssea diminuída. Os problemas emocionais, sociais, conjugais, econômicos e vocacionais também podem ser uma conseqüência da doença (SMELTZER; BARE, 2005). 3 Hipertonicidade muscular, musculatura rígida. 4 Distúrbio mental orgânico progressivo. 5 Coordenação comprometida dos movimentos.

159 DIAGNÓSTICO A região sudeste do Brasil apresenta o maior número de pacientes diagnosticados. Em estudo realizado na população da capital do Estado de São Paulo, em julho de 1997, obteve-se um índice de 15 pacientes por 100 mil habitantes (CALLEGARO, 2001). A Ressonância magnética é o principal instrumento diagnóstico para visualizar placas, documentar a atividade da doença e avaliar o efeito do tratamento. A paciente Laura realizou uma série de exames após a desconfiança médica quanto ao diagnóstico, entre eles a ressonância magnética. A eletroforese do LCR identifica a presença da faixa oligoclonal (várias faixas de imunoglobulina G interligadas, indicando uma anormalidade do sistema imune). Os estudos do potencial evocado podem ajudar a definir a extensão do processo patológico e monitorar as alterações. A disfunção vesical subjacente é diagnosticada através de exames urodinâmicos. Os testes neuropsicológicos podem estar indicados para avaliar o comprometimento cognitivo (SMELTZER; BARE, 2005). Dois erros comuns confundem o diagnóstico da EM: o primeiro é quando um diagnóstico alternativo claro não é considerado ou avaliado de modo apropriado, especialmente porque uma característica que é atípica foi negligenciada. As duas bandeiras vermelhas mais úteis para sugerir um diagnóstico alternativo são sinais e sintomas que podem ser explicados por uma lesão única no SNC e a ausência de remissão clínica. A ressonância magnética é o procedimento de triagem diferencial mais sensível e presentemente elimina a necessidade de uma tomografia computadorizada ou de mielografia, em quase todos os casos. Já o segundo erro diagnóstico mais comum ocorre nos pacientes sem doenças neurológicas definíveis. Os pacientes comumente adquirem um diagnóstico falso-positivo de EM por conta de sintomas neurológicos inespecíficos, como fraqueza, fadiga ou formigamento, às vezes acompanhado por alterações inespecíficas mínimas de sinal na ressonância magnética do cérebro. A ausência de sinais objetivos em qualquer momento, padrões de fraqueza ou perda sensitiva que não estão de acordo com os sistemas neuroanatômicos conhecidos e também a incapacidade desproporcional aos achados clínicos objetivos levantam a suspeita de doença psicogênica. Entretanto, como a EM pode começar com sintomas sensitivos, é necessário acompanhar o paciente durante algum tempo antes que um diagnóstico possa ser feito (CECIL, 2005). TRATAMENTO MÉDICO Não existe cura para a EM. Um programa de tratamento individualizado, organizado e racional está indicado para aliviar os sintomas do paciente e para fornecer o suporte continuado,

160 principalmente para os indivíduos com alterações cognitivas (50%), os quais podem precisar de mais estrutura e suporte. Os objetivos do tratamento consistem em retardar a progressão da doença, controlar os sintomas crônicos e tratar as exacerbações agudas. Muitos pacientes com EM apresentam doença estável e precisam apenas de tratamento intermitente, enquanto outros experimentam progressões contínuas da doença. Os sintomas que exigem intervenção englobam a espasticidade, fadiga, disfunção vesical e ataxia. As estratégias de tratamento visam os vários sintomas motores e sensoriais e os efeitos da imobilidade que podem ocorrer (SMELTZER; BARE, 2005). Laura não se curou da doença, porém houve uma regressão da patologia onde ela nunca precisou de cadeira de rodas. O ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA Após a compreensão científica do que é EM, volta-se ao caso de Laura, sobre o enfrentamento da doença e o modo como os profissionais trataram o caso. Em Bioética, o enfrentamento do problema passa principalmente pela relação do profissional de saúde com o paciente, pela forma como se dá uma notícia, seja ela mais ou menos grave. Nos princípios de como lidar com um paciente que possui doenças como a de Laura, tem que se levar sempre em consideração todos os aspectos, não apenas da doença, mas o próprio contexto em que ela se encontra. Na prática médica, a ética não pode estar desvencilhada do relacionamento do profissional com a sociedade e com os indivíduos, com destaque neste aspecto para o princípio da autonomia. A importância da ética é que além de orientar a sociedade para a tolerância e a convivência pacífica, ela suscita o maior respeito aos interesses de cada indivíduo (MONTE, 2002). Tendo em vista estas teorias, pensa-se o quanto a médica que retirava o LCR de Laura foi antiética ao falar que ela iria passar o resto da vida em uma cadeira de rodas. O profissional de saúde engajado, contextualizado, apenas pensaria na cadeira de rodas como uma possibilidade. Ressalta-se que o tratamento integrado é feito de acordo com o que cada paciente necessita, e mesmo dentro de uma padronização necessária, não pode haver um padrão rígido que enquadre todos os pacientes. As adaptações dependem de cada um, individualmente, com sua condição própria, sua história e seu contexto (ALVES, LIMA, 2010).

161 CONSIDERAÇÕES FINAIS A EM é uma doença de caráter geralmente progressivo, na qual a inflamação e desmielinização da substância branca do SNC resultam em vários sintomas neurológicos. Após 10 anos do início dos sintomas, 50% dos pacientes poderão estar inaptos para fazer atividades profissionais mesmo às domésticas. (CALLEGARO, 2001). A Federação Internacional de EM divulgou pesquisa que mostra que existem cerca de 2,5 milhões de pacientes portadores da patologia em todo o mundo. No Brasil, a Associação Brasileira de Esclerose Múltipla (ABEM) estima que são mais de 30 mil portadores, sendo que desse total apenas cinco mil recebem tratamento adequado devido à demora no diagnóstico. A EM é uma doença incurável e de causas desconhecidas que gera crises imprevisíveis em adultos jovens na época mais produtiva de suas vidas, ocasionando no portador da doença mudanças de comportamento e sentimentos como tristeza, ansiedade e até o desejo de morte. Essa instabilidade emocional é gerada devido à imprevisibilidade da doença. O impacto da EM afeta vários níveis de relacionamento entre eles o individual do paciente, o familiar, profissional, social e econômico. (ALBUQUERQUE, 2005). Os objetivos propostos no presente estudo foram alcançados na medida em que se demonstrou a EM por meio da descrição da fisiopatologia, desenvolvimento, diagnóstico e tratamento. REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, Márcia Aparecida de. Esclerose Múltipla: aspectos psicológicos da doença. 2005. Dissertação (Mestrado em Psicologia). Universidade Católica de Dom Bosco, Campo Grande, 2005. ALVES, Maria Aparecida; LIMA, Reginaldo Ramos de. Esclerose Múltipla. Disponível em: https://neuropsicologiaonlin.websiteseguro.com/index.php?optio n=com_content&view=article&id=57:esclerose-multipla&catid=3:ar. Acesso em: 10 nov. 2010. ANASTASIOU, Léa das Graças Camargo; ALVES, Leonir Pessate (Org). Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalhos em aula. 5. ed. Joinville: Univille, 2005. BOYDEN, K. The pathophysiology of demyelination and the ionic basis of nerve conduction in multiple sclerosis: an overview. Journal of Neuroscience Nursing, 2000. CECIL, Russell L. Tratado de medicina interna. 22. ed. Elsevier, 2005. HALPER, J. Meeting the challenge of multiple sclerosis. Part II. New strategies, new hope. American Journal of Nursing. p. 39-45, 1998.

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