Curso de Direito - Parte Especial - Livro III - Do Direito das Coisas - Prof. Ovídio Mendes - Fundação Santo André 1 / 7 DOS EFEITOS DA POSSE P A R T E E S P E C I A L LIVRO III DO DIREITO DAS COISAS TÍTULO I DA POSSE CAPÍTULO III DOS EFEITOS DA POSSE Art. 1.210 1.222 Conceitos: Efeitos da posse, Proteção possessória, Percepção dos frutos, Responsabilização pela perda, Indenização das benfeitorias, Ações possessórias, Má-fé Efeitos da posse Os efeitos da posse são em número de cinco, em conformidade com os artigos 1.210 a 1.222 e 1.238, todos do Código Civil: 1. Proteção possessória, que abrange a autodefesa e a invocação dos interditos; 2. Percepção dos frutos; 3. Responsabilização pela perda ou deterioração da coisa; 4. Indenização pelas benfeitorias e o direito de retenção; 5. Usucapião. Proteção Possessória Representação gráfica dos efeitos da posse A proteção possessória enquanto autodefesa configura-se na legitima defesa e no desforço imediato
Curso de Direito - Parte Especial - Livro III - Do Direito das Coisas - Prof. Ovídio Mendes - Fundação Santo André 2 / 7 (autotutela), quanto o possuidor pode defender ou restituir sua posse por méritos próprios. Não sendo possível a legítima defesa ou a autotutela, as ações possessórias (heterotutela manutenção, reintegração e interdito proibitório) são meios específicos para reintegrar a posse plena da coisa com auxílio do Judiciário. As ações possessórias (interditos) somente podem ser propostos por quem detém a posse; se tal não ocorre, então a via petitória deve ser utilizada. Possuidores diretos e indiretos estão legitimados a demandarem contra terceiros ou um contra o outro. A ação possessória instaura o juízo possessório, em que é discutida a posse autônoma ou formal (ius possessionis). Por outro lado, se o quê se discute é a tutela de direito real, então a posse causal (ius possidendi) é o foco da discussão. Se a coisa demandada perecer é cabível ação de indenização. Artigos do Código Civil Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado. 1 O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse. 2 Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa. Art. 1.211. Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de alguma das outras por modo vicioso. Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era. Art. 1.213. O disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões não aparentes, salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do prédio serviente, ou daqueles de quem este o houve. Classificação dos frutos quanto ao estado Frutos são utilidades periodicamente produzidos pela coisa. Percepção é o ato material pelo qual o possuidor se torna deles proprietário. Frutos consumidos: frutos utilizados (destruídos); Frutos estantes: frutos armazenados para venda; Frutos pendentes: frutos que se encontram unidos à coisa principal; Frutos percebidos: frutos colhidos e apropriados; Frutos percepiendos: frutos que deveriam, mas não foram colhidos. Má-fé A clássica definição hobbesiana os contratos são acordados para serem cumpridos (Thomas Hobbes, O
Curso de Direito - Parte Especial - Livro III - Do Direito das Coisas - Prof. Ovídio Mendes - Fundação Santo André 3 / 7 Leviatã, 1651) está representada, no Código Civil Brasileiro de 1916, por três princípios que norteavam as obrigações até o Código Civil de 2002: autonomia da vontade, supremacia da ordem pública e força obrigatória dos contratos. Com o Código de 2002, um novo princípio geral norteia o cumprimento das obrigações: o contrato deve apresentar utilidade econômica pela preservação do equilíbrio financeiro entre as partes, baseado na satisfação das expectativas de comportamentos ético e correto e voltados para o fim a que se destina a obrigação, tornando a autonomia da vontade e a força obrigatória dos contratos subordinados a esse princípio. Esse modelo adota a forma de justiça comutativa ao primar pelo equilíbrio obrigacional entre as partes. Para que essa justiça comutativa se revele efetiva, as partes devem exibir comportamentos subjetivos e objetivos que apontem para uma demonstração prática de vontade honesta, correta e em conformidade com as expectativas sociais percebidas de forma ampla e geral. Quando essa vontade não atende tais expectativas ou falha em sua verificação de correção, surge a má-fé, representada pela máxima comportamental levar vantagem em tudo, ainda que por meio de subterfúgios e simulações. Por isso, a má-fé exige o reconhecimento de um vício. Boa-fé x Má-fé Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos. Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação. Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia. Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio. Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa. Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais,
Curso de Direito - Parte Especial - Livro III - Do Direito das Coisas - Prof. Ovídio Mendes - Fundação Santo André 4 / 7 salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante. Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis. Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias. Art. 1.221. As benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao ressarcimento se ao tempo da evicção ainda existirem. Art. 1.222. O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo; ao possuidor de boa-fé indenizará pelo valor atual. Posse Precária Requisitos (cumulativos) a) Vínculo obrigacional válido entre proprietário e possuidor ou detentor; e b) Rompimento desse vínculo pela resistência na restituição do bem. Convalescimento da posse: é o ato de tornar o detentor em possuidor em relação ao antigo possuidor ou proprietário. Exemplo: Findo o contrato de locação, o locatário resolve continuar na posse do imóvel. A partir desse momento, a posse, antes justa e de boa-fé, transforma-se em precária em razão da obrigação não cumprida de restituir a coisa. Se o locador não oferecer oposição pelo uso dos meios jurídicos disponíveis e o locatário demonstrar animus domini (vontade de ser dono) exteriorizada pela conservação do imóvel, pagamento de impostos e demais obrigações, com o passar do tempo ocorre o convalescimento da posse precária, que é a transformação do detentor em possuidor em relação ao proprietário. Questões extraídas de concursos públicos (data do acesso: 13/04/2017). A reprodução das questões segue a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/1998), em especial os incisos III e VIII do artigo 46: "Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais: (...) III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra; (...) VIII - a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores." Concurso: Câmara Municipal de Poá Procurador Jurídico Ano: 2016 Caderno: 004 Prova Objetiva Questão: 32
Curso de Direito - Parte Especial - Livro III - Do Direito das Coisas - Prof. Ovídio Mendes - Fundação Santo André 5 / 7 Aplicação: Vunesp Disponível em: https://www.qconcursos.com/arquivos/prova/arquivo_prova/47837/vunesp-2016-camara-municipal-depoa-sp-procurador-juridico-prova.pdf A posse é um fato jurídico relevante ao Direito, que permite a alguém fruir de determinada coisa. Com base nessa assertiva, assinale a alternativa correta sobre tal instituto (A justificativa legal não constou da aplicação do concurso, sendo aqui solicitada para fins de desenvolvimento da experiência jurídica). A) Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de todos os poderes inerentes à propriedade. B) A posse do imóvel não faz presumir a das coisas móveis que nele estiverem. C) Quando transmitida a posse, ela perde o seu caráter original. D) A posse indireta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não torna nula outra posse direta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto. E) Se isenta de qualquer vício considera-se a posse como justa. Concurso: Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco Juiz Substituto Ano: 2015 Caderno: Tipo 004 Questão: 12 Aplicação: Fundação Carlos Chagas Disponível em: https://www.qconcursos.com/arquivos/prova/arquivo_prova/41961/fcc-2015-tj-pe-juiz-substituto-prova.pdf Sociedade Agrícola Laranjal, ao levantar cercas em imóvel de sua propriedade, em cuja posse se encontra, constatou que parte da área havia sido invadida por seu vizinho Agrário, que supunha pertencer-lhe, porque as cercas, anteriormente existentes, haviam sido destruídas em razão de intempéries e má conservação. Por isso, aquela pessoa jurídica moveu ação de reintegração de posse, todavia, sem obter liminar. Mesmo depois de citado, em 15/6/2014, Agrário continuou exercendo atos possessórios e, no dia 20/6/2014, colheu as laranjas que estavam maduras, bem como recebeu, pelo arrendamento da outra parte da área, na ordem de R$ 1.000,00 por mês, com vencimento no dia 30 de cada mês vencido, até 30 de setembro de 2014, porque, tendo a autora obtido liminar por força de agravo de instrumento, foi ela reintegrada na posse em 01/10/2014. Nesse caso, Agrário deverá indenizar Sociedade Agrícola Laranjal (A justificativa legal não constou da aplicação do concurso, sendo aqui solicitada para fins de desenvolvimento da experiência jurídica): A) Somente do que recebeu a título de arrendamento, após a decisão que deferiu a liminar de reintegração de posse. B) Somente das laranjas que colheu após a citação, se não puder entregá-las em espécie, mas não dos valores recebidos a título de arrendamento, os quais terão de ser cobrados do arrendatário, que pagou a quem não era proprietário do imóvel. C) Das laranjas que colheu após a citação, bem como do que recebeu a título de arrendamento, ainda que referente a período anterior à citação. D) De tudo o que recebeu a título de arrendamento e do que colheu, desde a data em que ingressou indevidamente na área vizinha.
Curso de Direito - Parte Especial - Livro III - Do Direito das Coisas - Prof. Ovídio Mendes - Fundação Santo André 6 / 7 E) De quinze dias do valor do arrendamento, no mês de junho e da integralidade dos meses subsequentes, bem como do valor correspondente às laranjas colhidas em 15/06/2014, se não puder entregá-las em espécie. Concurso: XV Exame de Ordem Unificado São Paulo Ano: 2014 Caderno: Tipo 1 - Branco Questão: 43 Aplicação: FGV Projetos Disponível em: https://fgvprojetos.s3.amazonaws.com/513/20141116074254-caderno_tipo_1_xv_exame.pdf Com a ajuda de homens armados, Francisco invade determinada fazenda e expulsa dali os funcionários de Gabriel, dono da propriedade. Uma vez na posse do imóvel, Francisco decide dar continuidade às atividades agrícolas sendo ali desenvolvidas (plantio de soja e de feijão). Três anos após a invasão, Gabriel consegue, pela via judicial, ser reintegrado na posse da fazenda. Quanto aos frutos colhidos por Francisco durante o período em que permaneceu na posse da fazenda, assinale a afirmativa correta (A justificativa legal não constou da aplicação do concurso, sendo aqui solicitada para fins de desenvolvimento da experiência jurídica). A) Francisco deve restituir a Gabriel todos os frutos colhidos e percebidos, mas tem direito de ser ressarcido pelas despesas de produção e custeio. B) Francisco tem direito aos frutos percebidos durante o período em que permaneceu na fazenda. C) Francisco tem direito à metade dos frutos colhidos, devendo restituir a outra metade a Gabriel. D) Francisco deve restituir a Gabriel todos os frutos colhidos e percebidos, e não tem direito de ser ressarcido pelas despesas de produção e custeio. Concurso: Concurso Público de Provas e Títulos para outorga de delegações de Notas e Registros do Estado de Minas Gerais edital 1/2016 Ano: 2017 Caderno: 1 Branco Questão: 26 Aplicação: Consulplan Disponível em: https://consulplan.s3.amazonaws.com/concursos/473/57_874295.pdf João Silva é detentor, como fâmulo [empregado] da posse de seu primo José Silva, de um imóvel rural (sítio de 5 hectares) há mais 20 anos, e quando foi notificado pelo proprietário que lhe pedia para devolver o imóvel, ingressou com uma ação de usucapião, alegando posse vintenária, ininterrupta e pacífica, portanto, segundo ele, com requisitos para fins da prescrição aquisitiva. Em relação a esse caso hipotético, é correto afirmar (A justificativa legal não constou da aplicação do concurso, sendo aqui solicitada para fins de desenvolvimento da experiência jurídica): A) Tendo ficado na posse pacífica e sem interrupção do imóvel por mais de 20 anos, é perfeitamente possível pedir a declaração de domínio via usucapião, quer por ação direita quer por via de exceção. B) Pelo princípio da função social da propriedade, ao ficar na posse do imóvel de forma pacífica e sem interrupção por mais de 20 anos, é viável arguir com êxito em ação direta ou em defesa a exceção de usucapião.
Curso de Direito - Parte Especial - Livro III - Do Direito das Coisas - Prof. Ovídio Mendes - Fundação Santo André 7 / 7 C) Como fâmulo da posse, tem mera detenção, de forma que não pode arguir usucapião, independentemente do lapso temporal da posse. D) Desde que não tenha João Silva nenhum outro imóvel em seu nome, tem ele o direito de usucapir o imóvel em questão em face da posse pacífica e sem interrupção. Concurso: Concurso Público de Provas e Títulos para outorga de delegações de Notas e Registros do Estado de Minas Gerais edital 1/2016 Ano: 2017 Caderno: 1 Branco Questão: 34 Aplicação: Consulplan Disponível em: https://consulplan.s3.amazonaws.com/concursos/473/57_874295.pdf Nos termos do Código Civil, a posse pode ser adquirida (A justificativa legal não constou da aplicação do concurso, sendo aqui solicitada para fins de desenvolvimento da experiência jurídica) A) Somente pela própria pessoa, já que se trata de direito pessoal próprio e fático. B) Somente pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante. C) Pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante e, ainda, por terceiro sem mandato, e sem maior formalidade, porque trata-se de questão eminentemente fática. D) Pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante e por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação. Concurso: Concurso Público de Provas e Títulos para outorga de delegações de Notas e Registros do Estado de Minas Gerais edital 1/2016 Ano: 2017 Caderno: 1 Branco Questão: 35 Aplicação: Consulplan Disponível em: https://consulplan.s3.amazonaws.com/concursos/473/57_874295.pdf Acerca da posse, nos termos do Código Civil, é correto afirmar (A justificativa legal não constou da aplicação do concurso, sendo aqui solicitada para fins de desenvolvimento da experiência jurídica): A) O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante. B) Ao possuidor de má-fé não serão ressarcidas as benfeitorias necessárias; mas lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, e pode levantar as voluptuárias. C) As benfeitorias não se compensam com os danos, e só obrigam ao ressarcimento se ao tempo da evicção ainda existirem. D) O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo; ao possuidor de boa-fé indenizará pelo valor da data da turbação ou esbulho.