ALOENXERTO CIRCUNFERENCIAL DE FÊMUR PROXIMAL EM CIRURGIA DE REVISÃO DE ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL: RELATO DE CASOS COM SEGUIMENTO MÍNIMO DE 20 ANOS

Documentos relacionados
ALOENXERTO CIRCUNFERENCIAL DE FÊMUR PROXIMAL EM CIRURGIAS DE REVISÃO DE ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL

O enxerto ósseo homólogo de banco em cirurgia de revisão com prótese total de quadril não cimentada*

Femoral revision total hip arthroplasties with aseptic loosening and periprosthetic fractures. Analysis of 49 cases treated with Wagner stem

Revisão de artroplastia total do quadril com prótese modular não-cimentada de fixação distal tipo ZMR. Análise clínica e radiográfica de 30 casos.

Complicações após artroplastia total de joelho: fratura periprotética após transplante do mecanismo extensor

Fraturas do fêmur no seguimento de artroplastias do quadril *

Revisão do Componente Femoral

FRATURAS TROCANTÉRICAS ESTADO DA ARTE

Prótese isoelástica: avaliação clínica e radiográfica *

Artroplastia total em quadris displásicos luxados com reconstrução acetabular e encurtamento femoral

Proposta de tratamento com enxerto ósseo cortical homólogo para a fratura distal do fêmur pós-artroplastia total do joelho

ORTHOGEN. Determinações Humano (%) IC 95% Bovino (%) IC 95% Água 7,93-7,75 - Gordura 0,06 0,1 0,1 0,1. Nitrogênio 4,3 0,1 4,3 0,1

Fraturas periprotésicas em artroplastias da anca

Haste Femoral não Cimentada de Revisão com Fixação Distal VEGA Técnica Cirúrgica

Artroplastia unicompartimental do joelho Oxford Phase 3 - resultados a médio prazo

Uso de cone de metal trabecular tântalo para tratamento de defeitos ósseos na artroplastia de revisão do joelho

Enxerto homólogo estrutural para tratamento do defeito ósseo durante artroplastia de revisão do joelho

Pseudartrose pós-osteotomia do trocanter maior nas artroplastias totais do quadril *

Síntese de 25 Anos de Experiência com Hastes Retas Cuneiformes

Luxação em Prótese Total do Quadril

Escoliose Idiopática no Adolescente: Utilização de Auto-enxerto e Homoenxerto no Tratamento Cirúrgico Posterior

Luxação Congênita do Quadril (Displasia Acetabular) Doença de Legg-Perthes-Calvet Epifisiólise. Prof André Montillo UVA

DR. GUSTAVO ROBERTO PEREIRA CRM/SC: 8307 RQE: 4672

Tratamento das fraturas de fêmur com haste intramedular retrógrada não fresada

Artroplastia total do quadril com uso de próteses híbridas

Is it really necessary to restore radial anatomic parameters after distal radius fractures? Injury, Int. J. Care Injured 45S(2014) S21-S26

Revisões e Trocas de Próteses Componente Femoral

Radiografia, cintilografia

TUMOR DE CÉLULAS GIGANTES DO COLO DO FÊMUR

VEGAMAXX HASTE FEMORAL NÃO CIMENTADA DE REVISÃO COM FIXAÇÃO DISTAL. Técnica Cirúrgica

PRÓTESES ARTICULARES ANCA E JOELHO

Fraturas Proximais Do fêmur. Isaac Rotbande

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ MUNIF AHMAD HATEM

Programa de Especialização em Reconstrução e. Alongamento Ósseo - ASAMI (R4)

DEFEITOS ÓSSEOS ACETABULARES EM RECOLOCAÇÕES ARTROPLÁSTICAS DA ANCA

Dispositivo centrador distal das hastes femorais cimentadas: eficácia e proposta de classificação *

Revisão de artroplastia total de quadril utilizando haste femoral de Wagner *

RESUMO DOS 120 ANOS DA EEAP OSTEOSSARCOMA DE FÊMUR DISTAL COM FRATURA DE ENDOPRÓTESE NÃO CONVENCIONAL: REVISÃO DE LITERATURA E RELATO DE CASO

FRATURA DE MANDÍBULA SECUNDÁRIA À DOENÇA PERIODONTAL EM CÃO: RELATO DE CASO

Revisão de artroplastia total do quadril com prótese

Técnica de redução aberta minimamente invasiva e fixação da fratura transtrocantérica

Uso de enxerto ósseo autólogo associado à osteossíntese de suporte nas falhas ósseas tibiais marginais em prótese total de joelho

Traumatologia e Ortopedia

Avaliação radiográfica e densitométrica das próteses totais não cimentadas do quadril *

Seu médico vai decidir qual será o melhor tipo para seu caso, conforme o tipo de osso, idade e tipo de desgaste ou da doença.

Fraturas subtrocantéricas do fêmur tratadas com placa condilar 95 AO

Anquilose da Anca Tratamento Cirúrgico

PALAVRAS-CHAVE: Fratura-luxação de Monteggia; Classificação de Bado; Complicações.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ BANCO DE OSSOS INÁCIO FACÓ VENTURA VIEIRA

Desgaste do polietileno nas artroplastias do quadril

LESÕES ÓSSEAS POR ESTRESSE NO ATLETA. Daniel Zimmermann Stefani

Artroplastia de Ombro TRATAMENTO POR ARTROPLASTIA NAS FRATURAS DO ÚMERO PROXIMAL INDICAÇÃO. partes? rachadura da

Fixação com parafuso canulado em epifisiólise femoral proximal estável

RETALHOS ÂNTERO-LATERAL DA COXA E RETO ABDOMINAL EM GRANDES RECONSTRUÇÕES TRIDIMENSIONAIS EM CABEÇA E PESCOÇO

Avaliação da fixação da cunha de metal trabeculado em pacientes submetidos à revisão de artroplastia total de quadril

GUIA TÉCNICO FIXADORES EXTERNOS

Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital da Força Aérea do Galeão (HFAG) Rio de Janeiro RJ

[ESTUDO REFERENTE À ENCF - JOELHO]

EFETIVIDADE DA ASSISTÊNCIA FISIOTERAPÊUTICA NO PACIENTE EM PÓS-OPERATÓRIO DE RECONSTRUÇÃO DE COLO FEMORAL

OSTEOINTEGRATION OF IMPACTED LYOPHILIZED GRAFTS

Artroplastias primárias da anca

Análise de falha em haste cimentada de artroplastia total de quadril

CO-10. haste femoral modular não cimentada - titânio liga. Técnica Cirúrgica

Artroplastia total de quadril com prótese Biomec: 20 anos de seguimento

Prof André Montillo

Revisão de solturas assépticas acetabulares em artroplastias totais do quadril *

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESDADO DO RIO DE JANEIRO - UNIRIO Hospital Universitário Gaffrée e Guinle - HUGG. Revisão Ortopedia

Acta Ortopédica Brasileira Instituto de Ortopedia e Traumatologia ISSN (Versión impresa): BRASIL

PROTOCOLO FISIOTERAPÊUTICO DE PÓS- OPERATÓRIO INICIAL DE CIRURGIA LOMBAR. Local: Unidades de Internação

Residência em Ortopedia e Traumatologia

Análise crítica de possíveis falhas em osteossíntese de fraturas transtrocanterianas

Fraturas subtrocantéricas

Artrodiastase para o tratamento da rigidez do quadril na artrite reumatoide juvenil (ARJ): resultados preliminares

Artroplastia total de quadril não-cimentada: avaliação das causas de revisão em pacientes com seguimento pós-operatório mínimo de 10 anos *

SIMPÓSIO DE CIRURGIA GERAL

Keywords Bone Banks; Allograft; Bone Transplantation; Orthopedic Surgery

Existem indicações para utilização do fixador occipi,0to-cervical em detrimento de outras técnicas de artrodese posterior?

DR. ANDRÉ AUGUSTO CASAGRANDE CRM/SC: 7582 RQE: 3762

Tratamento Cirúrgico da Instabilidade Patelo-femoral Indicações do Tratamento Cirúrgico

Artroplastia total do quadril em pacientes

Valor da avaliação radiográfica pré-operatória dos defeitos ósseos no joelho nas revisões de artroplastia

Data: 20/08/2014. Resposta Técnica 01/2014. Medicamento Material Procedimento X Cobertura

TÉCNICA PERCUTÂNEA PARA ALINHAMENTO DE CAVILHA ENDOMEDULAR NA CORREÇÃO DE DEFORMIDADES ANGULARES DO FÉMUR

ARTIGO DE ORIGINAL. Francisco Fontes Cintra¹, Anthony Kerbes Yepéz¹, Marcos Gilbert Sucena Rasga¹, Marcelo Abagge², Paulo Gilberto Cimbalista Alencar³

FISIOTERAPIA NO PÓS OPERATÓRIO DE ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL CIMENTADA EM MULHERES IDOSAS

Artroplastia de resurfacing

Programa de Especialização em Ortopedia Infantil e. Reconstrução (R4)

Correção de pé cavo pela técnica de Japas

Desenho quadrangular auto bloqueante com longo recuo de resultados clínico.

16º Imagem da Semana: Radiografia do Joelho

ARTRODESE DA ANCA: UMA SOLUÇÃO QUASE ESQUECIDA

Imagem da Semana: Radiografia

Stress shielding : avaliação radiográfica após seguimento a longo prazo *

OSTEOSSÍNTESE FEMORAL MODIFICADA ASSOCIADA À COLOCEFALECTOMIA NO TRATAMENTO DE LUXAÇÃO COXOFEMORAL E FRATURA COMINUTIVA RELATO DE CASO

ARTROPLASTIA TOTAL DO QUADRIL DE SPOTORNO

Trilliance. Haste de Quadril Polida Triplo Cônica. Aesculap Ortopedia

IMPLANTAÇÃO DE EXOPRÓTESE FIXA EM TÍBIA DE FELINO: RELATO DE CASO

FORMULÁRIO PARA O CADASTRO E VISTORIA DOS SERVIÇOS DE TREINAMENTO EM ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA- SBOT

Transcrição:

RELATO DE CASO ALOENXERTO CIRCUNFERENCIAL DE FÊMUR PROXIMAL EM CIRURGIA DE REVISÃO DE ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL: RELATO DE CASOS COM SEGUIMENTO MÍNIMO DE 20 ANOS CIRCUMFERENTIAL PROXIMAL FEMORAL ALLOGRAFTS IN REVISION SURGERY ON TOTAL HIP ARTHROPLASTY: CASE REPORTS WITH A MINIMUM FOLLOW-UP OF 20 YEARS Bruno Dutra Roos 1, Milton Valdomiro Roos 2, Antero Camisa Júnior 1 Resumo Dentre as opções para reconstrução femoral em cirurgias de revisão de artroplastia total do quadril (RATQ) em defeitos circunferenciais extensos está a utilização de aloenxerto de fêmur proximal. O seu uso permite a correção do mecanismo abdutor do quadril e da discrepância de comprimento dos membros inferiores, além de apresentar potencial osteocondutivo. Os autores relatam os achados clínicos e radiográficos de dois casos de RATQ com uso desta técnica, em seguimento mínimo de 20 anos. Descritores - Artroplastia de Quadril/métodos; Fêmur/cirurgia; Transplante homólogo/efeitos adversos; Falha de prótese Abstract Among the options for femoral reconstruction in total hip arthroplasty (THA) revision procedures, in cases of extensive circumferential defects, is the use of proximal femoral allografts. This technique makes it possible to correct the hip abductor mechanism and the leg length discrepancy, as well as presenting osteoconductive potential. The authors report the clinical and radiographic results from two cases of THA revision using this technique, with a minimum follow-up of 20 years. Keywords - Arthroplasty, Replacement, Hip /methods; Femur/surgery; Transplantation, Homologous/adverse effects; Prosthesis Failure INTRODUÇÃO As cirurgias de revisão de artroplastia total do quadril (RATQ) em defeitos ósseos femorais extensos representam um enorme desafio. Nesses casos, a utilização de técnicas cirúrgicas convencionais não obtém resultados satisfatórios (1-2). Encontram-se inúmeros métodos de tratamento cirúrgico descritos na literatura para superar esse problema, porém ainda não há consenso em relação à melhor técnica a ser aplicada. Aloenxerto circunferencial de fêmur proximal ou distal, enxerto ósseo fragmentado associado a telas de sustentação, enxertia óssea estrutural cortical, endopróteses e hastes femorais de fixação distal são algumas das alternativas existentes (1-3). O uso de aloenxerto de fêmur proximal permite a correção do mecanismo abdutor do quadril e da discrepância de comprimento dos membros inferiores, além de apresentar potencial osteocondutivo, na medida em que permite substituição gradual por osso hospedeiro, com consequente reposição do estoque ósseo (1-3). 1 Cirurgião de Quadril do Grupo de Cirurgia e Reconstrução do Quadril do Hospital Ortopédico de Passo Fundo (HOPF); Instrutor do Programa de Residência Médica em Ortopedia e Traumatologia do HOPF Passo Fundo, RS, Brasil. 2 Chefe do Grupo de Cirurgia e Reconstrução do Quadril HOPF; Chefe do Programa de Residência Médica em Ortopedia e Traumatologia do HOPF Passo Fundo, RS, Brasil. Trabalho realizado no Hospital Ortopédico de Passo Fundo, Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo Passo Fundo, RS. Correspondência: Av. Sete de Setembro, 817, Centro 99010-121 Passo Fundo, RS, Brasil. E-mail: brunodroos@gmail.com Trabalho recebido para publicação: 15/02/2011, aceito para publicação: 22/06/2011. Os autores declaram inexistência de conflito de interesses na realização deste trabalho / The authors declare that there was no conflict of interest in conducting this work Este artigo está disponível online nas versões Português e Inglês nos sites: www.rbo.org.br e www.scielo.br/rbort This article is available online in Portuguese and English at the websites: www.rbo.org.br and www.scielo.br/rbort

ALOENXERTO CIRCUNFERENCIAL DE FÊMUR PROXIMAL EM CIRURGIA DE REVISÃO DE ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL: RELATO DE CASOS COM SEGUIMENTO MÍNIMO DE 20 ANOS 385 Em revisão da literatura, não se observou relato de casos com a utilização desta técnica com seguimento semelhante. O objetivo do presente artigo é relatar dois casos de reconstrução femoral secundária a afrouxamento de artroplastia total do quadril (ATQ) com a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado, em seguimento mínimo de 20 anos. RELATO DOS CASOS Caso clínico 1 Paciente do sexo feminino, 46 anos, com queixa de dor intensa na região inguinal e coxa à direita durante movimentação ativa do membro inferior, com início há oito meses e piora do quadro há 15 dias. A paciente havia realizado uma ATQ do lado acometido há 11 anos e se apresentava previamente assintomática. Ao exame físico, evidenciou-se impossibilidade de marcha com apoio do membro inferior direito em razão do quadro álgico. Havia discrepância de comprimento dos membros inferiores, com o lado acometido encurtado em 3cm. Radiograficamente, observaram-se sinais de afrouxamento da ATQ (prótese de Muller), com verticalização do componente acetabular cimentado. Com relação ao implante femoral, evidenciaram-se sinais de afrouxamento do mesmo com grave comprometimento do terço proximal do fêmur, migração proximal do trocânter maior e fratura periprotética cominutiva no nível da prótese. Pela classificação adotada pela AAOS (4), o defeito femoral foi considerado tipo IV (Figura 1). Os marcadores laboratoriais de infecção apresentavam-se dentro da normalidade. A paciente foi submetida à RATQ com revisão do componente acetabular cimentado por um implante não cimentado e utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal não irradiado e componente femoral cimentado associado à estabilização da enxertia com placa e parafusos (Figura 2 A, B e C). Em ambos os casos utilizou-se gentamicina associada à cefazolina como antibioticoprofilaxia por 10 dias (durante o período de internação) e profilaxia tromboembólica mecânica e medicamentosa por 30 dias. Pós- -operatoriamente, foi permitido à paciente deambular com auxílio de muletas e sem apoio do membro inferior operado a partir do 10 o dia. Orientaram-se exercícios ativos de abdução e flexão do quadril às seis semanas e apoio do membro inferior com carga total aos três meses. Aos dois anos de seguimento pós-operatório do paciente, o Harris Hip Score (5) era de 89 pontos. Radio- Figura 1 Paciente, feminina, 46 anos, radiografia (Rx) com sinais de afrouxamento da ATQ (prótese de Muller), defeito acetabular tipo III e femoral tipo IV da AAOS (4). A B C Figura 2 (A) Aloenxerto circunferencial de fêmur proximal. (B) Rx anteroposterior (AP). Pós-operatório imediato. (C) Rx perfil, pós- -operatório imediato. graficamente, observaram-se implante estável, ausência de sinais de reabsorção da enxertia, consolidação do aloenxerto na junção enxerto-osso hospedeiro e ruptura dos fios de cerclagem. Aos 12 anos de seguimento pós- -operatório, observou-se radiograficamente migração do trocânter maior (1cm). Contudo, não houve alteração do padrão de marcha da paciente (Figura 3 A, B, C e D). Atualmente, aos 21 anos de seguimento pós-operatório, o Harris Hip Score (5) da paciente é de 76 pontos. Radiograficamente, evidencia-se implante estável e ausência de sinais de reabsorção da enxertia (Figura 4 A e B).

386 A B Caso clínico 2 Paciente do sexo feminino, 66 anos, com queixa de dor intensa na coxa direita à mobilidade ativa com início há três semanas, sem história de trauma. Estava impossibilitada de deambular em razão do quadro álgico. A paciente relatou fratura do colo femoral havia nove anos, quando foi submetida à artroplastia parcial do quadril e, subsequentemente, em seis anos, a duas novas revisões do implante. Ao exame físico, evidenciou-se discrepância de comprimento dos membros inferiores, com o lado direito encurtado em 2cm. Não foi possível avaliar o arco de movimento do quadril acometido em virtude da dor intensa. Radiograficamente, observou-se fratura por fadiga do implante femoral (prótese de Charnley), associada à severa deficiência óssea do terço proximal do fêmur, caracterizando um defeito femoral AAOS (4) tipo III. Com relação ao implante acetabular, não se observaram sinais de instabilidade do componente (Figura 5). Os marcadores laboratoriais de infecção apresentavam-se dentro da normalidade. A paciente foi submetida à RATQ, com revisão do componente acetabular cimentado por um implante não cimentado, e utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal não irradiado e componente femoral cimentado associado à estabilização da enxertia com placa e parafusos (Figura 6 A, B e C). C D Figuras 3 (A) Rx com dois anos de pós-operatório. (B) Rx com sete anos de pós-operatório. (C) Rx com 12 anos de pós-operatório. (D) Rx com 17a+1 de pós-operatório. A B Figuras 4 Rx AP (A) e perfil (B) com 21 anos de pós-operatório. Figura 5 Paciente feminina, 66 anos, sinais de afrouxamento e fratura por fadiga do componente femoral, defeito femoral tipo III da AAOS (4).

ALOENXERTO CIRCUNFERENCIAL DE FÊMUR PROXIMAL EM CIRURGIA DE REVISÃO DE ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL: RELATO DE CASOS COM SEGUIMENTO MÍNIMO DE 20 ANOS 387 Aos 12 anos de seguimento, o Harris Hip Score (5) era de 78 pontos. Radiograficamente, observaram-se implante estável, reabsorção da enxertia na zona II de Gruen (6), consolidação do aloenxerto na junção enxerto- -osso hospedeiro e migração do grande trocânter de 0,5 cm com ruptura dos fios de cerclagem (Figura 6 A, B, C). Aos vinte anos de seguimento pós-operatório, o estado geral da paciente encontrava-se severamente comprometido em virtude das complicações de doença cardíaca e pulmonar. Ela deambulava apenas em ambiente domiciliar sem queixa álgica e, eventualmente, com auxílio de suporte (andador). Radiograficamente, evidenciaram-se reabsorção da enxertia nas zonas I e II de Gruen (6) e sinais de instabilidade do implante femoral (sinal do pedestal) (Figura 7). Após 21 anos do procedimento cirúrgico, a paciente faleceu em razão do agravamento do seu quadro clínico. A B C Figuras 6 (A) Rx pós-operatória imediata. (B) Rx com 10a+1 pós- -op. (C) Rx com 17a+6 pós-op. Figura 7 Rx AP bacia, 20a+2 pós-op. DISCUSSÃO Inúmeros métodos de tratamento cirúrgico são descritos na literatura para a reconstrução femoral em RATQ; porém, poucas opções podem ser aplicadas em casos de defeitos ósseos circunferenciais extensos (maior que 5cm) (3). Nesses pacientes, as técnicas mais utilizadas são a endoprótese e o aloenxerto femoral circunferencial. O uso de aloenxertos femorais circunferenciais permanece controverso na literatura. Muitas das publicações sobre o tema apresentam um número pequeno de pacientes, com variadas técnicas cirúrgicas e tipos de aloenxertos utilizados, além de diferentes implantes. Somado a isso, poucos autores relatam seguimentos de médio a longo prazo (1-3,7-13). As indicações de utilização de aloenxerto femoral em cirurgias de RATQ não estão bem estabelecidas. Gross e Hutchison (13) recomendam o seu uso em defeitos femorais circunferenciais maiores que 3cm aferidos a partir do cálcar, alguns defeitos combinados e de descontinuidade femoral. Os autores, avaliando 63 quadris submetidos à reconstrução femoral com a utilização de aloenxerto femoral circunferencial associado a implante cimentado, constataram sobrevida da reconstrução de 86% em seguimento médio de 10 anos. Houve 13 complicações (21% dos pacientes), que exigiram nova intervenção cirúrgica (3). Haddad et al (8) relataram sobrevida da reconstrução do quadril com a utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal de 89% em 55 quadris avaliados, com seguimento médio de 8,8 anos. Houve um grande número de complicações, dentre as quais 22 pseudoartroses trocantéricas e seis casos de instabilidade. Porém, o artigo apresentou análise combinada de casos de implantes cimentados e não cimentados. Graham e Stockley (2) apresentaram os resultados de 25 quadris submetidos à reconstrução femoral utilizando aloenxerto circunferencial de fêmur proximal e implante cimentado, com dois casos de afrouxamento asséptico e um de infecção. O tempo de seguimento médio foi de 4,3 anos. A literatura descreve um grande número de complicações relacionadas ao uso deste tipo de enxertia, o que é inerente à gravidade e à complexidade dos casos (1-3,7-14). As que mais frequentemente requerem novo procedimento cirúrgico são: infecção, pseudoartrose, fratura do aloenxerto e instabilidade. Outra potencial complicação é a reabsorção do enxerto, que é descrita na literatura em

388 pacientes com seguimento de médio a longo prazo (1-3,7-14). Além disso, a utilização de enxerto homólogo apresenta risco potencial de transmissão de doenças, que é mínimo com os métodos atuais de captação, processamento e armazenamento dos tecidos musculoesqueléticos (15). A utilização de aloenxerto circunferencial de fêmur proximal permite a correção do mecanismo abdutor do quadril e da discrepância de comprimento dos membros inferiores, além de apresentar potencial osteocondutivo, na medida em que permite substituição gradual por osso hospedeiro, com consequente reposição do estoque ósseo (1-2). Por esses motivos, deve ser um método a ser considerado em RATQ associado a graves defeitos femorais, especialmente em pacientes jovens. REFERÊNCIAS 1. Haddad FS, Garbuz DS, Masri BA, Duncan CP. Structural proximal femoral allografts for failed total hip replacements: a minimum review of five years. J Bone Joint Surg Br. 2000;82(6):830-6. 2. Graham NM, Stockley I. The use of structural proximal femoral allografts in complex revision hip arthroplasty. J Bone Joint Surg Br. 2004;86(3):337-43. 3. Blackley HR, Davis AM, Hutchison CR, Gross AE. Proximal femoral allografts for reconstruction of bone stock in revision arthroplasty of the hip. A nine to fifteen-year follow-up. J Bone Joint Surg Am. 2001;83(3):346-54. 4. D Antonio J, McCarthy JC, Bargar WL, Borden LS, Cappelo WN, Collis DK, et al. Classification of femoral abnormalities in total hip arthroplasty. Clin Orthop Relat Res. 1993;(296):133-9. 5. Harris WH. Traumatic arthritis of the hip after dislocation and acetabular fractures: treatment by mold arthroplasty. An end-result study using a new method of result evaluation. J Bone Joint Surg Am. 1969;51(4):737-55. 6. Gruen TA, McNeice GM, Amstutz HC. Modes of failure of cemented stem-type femoral components: a radiographic analysis of loosening. Clin Orthop Relat Res. 1979;(141):17-27. 7. Duncan CP, Masri BA. Fractures of the femur after hip replacement. Instr Course Lect. 1995;44:293-304. 8. Haddad FS, Spangehl MJ, Masri BA, Garbuz DS, Duncan CP. Circumferential allograft replacement of the proximal femur. A critical analysis. Clin Orthop Relat Res. 2000;(371):98-107. 9. Martin WR, Sutherland CJ. Complications of proximal femoral allografts in revision total hip arthroplasty. Clin Orthop Relat Res. 1993;(295):161-7. 10. Mankin HJ, Doppelt S, Tomford W. Clinical experience with allograft implantation. The first ten years. Clin Orthop Relat Res. 1983;(174):69-86. 11. Gitelis S, Piasecki P. Allograft prosthetic composite arthroplasty for osteosarcoma and other aggressive bone tumors. Clin Orthop Relat Res. 1991;(270):197-201. 12. Wang JW, Wang CJ. Proximal femoral allografts for bone deficiencies in revision hip arthroplasty: a medium-term follow-up study. J Arthroplasty. 2004;19(7):845-52. 13. Gross AE, Hutchison CR. Proximal femoral allografts for reconstruction of bone stock in revision hip arthroplasty. Orthopedics. 1998;21(9):999-1001. 14. Head WC, Berklacich FM, Malinin TI, Emerson RH Jr. Proximal femoral allografts in revision total hip arthroplasty. Clin Orthop Relat Res. 1987;(225):22-36. 15. Roos MV, Camisa Júnior A, Michelin AF. Procedimentos de um banco de ossos e aplicabilidade dos enxertos por ele proporcionados. Acta Ortop Bras. 2000;8(3):122-7.