COOKIES INTEGRAIS COM FARINHA DE RAIZ DE BARDANA (ARCTIUM LAPPA, L.): QUALIDADE TECNOLÓGICA C.M. Celegatti 1, T.M.A. Moro 1, G. C. Nascimento 1, M. Scarton 1, M.T.P.S. Clerici 1 1-Departamento de Tecnologia de Alimentos Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia de Alimentos CEP: 13083-862 Campinas SP Brasil, Telefone: 55 (19) 3521-4016 Fax: 55 (19) 3289-3617 e-mail: (thaisamoro@hotmail.com) RESUMO A raiz de bardana, rica em frutanos, tem sido pouco utilizada em produtos de panificação. Este trabalho objetivou elaborar biscoitos tipo cookies com 51% de farinha integral de trigo, substituir a farinha de trigo (49%) por farinha de raiz de bardana integral (FBI) em 0 (C0), 5 (C1) e 10% (C2) e avaliar as características físico-químicas e tecnológicas dos cookies. Todas as análises foram feitas no mínimo em triplicata para avaliação estatística comparativa entre médias com o teste de Scott-Knott (p<0.05). Os cookies C1 e C2 obtiveram aumento do teor de fibras, com: 7,8 e 8,5% de fibras totais quando comparadas ao C0: 7,0%. Além de apresentarem características tecnológicas, e estabilidade durante 30 dias de vida de prateleira semelhantes ao controle. A produção de cookies com até 10% de FBI gerou características físico-químicas e propriedades tecnológicas semelhantes à formulação controle, e poderá contribuir para diversificar o uso da bardana. ABSTRACT Burdock roots, rich in fructans, has been little used in bakery products. This research aimed to develop cookies with 51% of whole wheat flour, replace wheat flour (49%) by burdock root flour (BRF) in 0 (C0), 5 (C1) and 10% (C2) and evaluate its physicochemical and technological characteristics. All analyzes were performed at least in triplicate for statistical evaluation with the Scott-Knott test (p <0.05). The cookies C1 and C2 achieved increased fiber content, with: 7.8 and 8.5% of total dietary fiber compared to the C0 with 7.0% and also showed similar stability to control over 30 days of shelf life. Production of cookies until 10% of BRF generated physicochemical and technological properties similar to the control formulation, and may contribute to expand burdock root uses. PALAVRAS-CHAVE: bardana; secagem; biscoitos, fibra alimentar, saudabilidade. KEYWORDS: burdock; drying; biscuits, fiber, healthiness. 1. INTRODUÇÃO Os consumidores estão mais conscientes de suas escolhas alimentares e, por isso, buscam produtos com valor agregado, em geral alimentos mais nutritivos. Para isso, é necessário o desenvolvimento de novos produtos que sigam estas tendências (Brady et al. 2007; Villarroel et al. 2009). Devido ao tempo de vida de prateleira e à aceitabilidade pela população, os biscoitos, mesmo não sendo produtos básicos utilizados na alimentação, são amplamente aceitos pela população em geral e podem ter as características nutricionais melhoradas através da incorporação de compostos funcionais sem perder suas características tecnológicas (Hirose et al. 2010). A raiz da bardana (Arctium lappa. L.), utilizada desde a antiguidade para fins medicinais, é um alimento com características de alimento funcional devido a seu teor em fibras solúveis e
insolúveis (Lin et al. 1996). O processamento desta em farinha e sua aplicação como ingrediente alimentício estão presentes em trabalho publicado por Tae, Kim e Yook (2015), onde foram substituídos 0, 5, 10 e 15% de farinha de trigo por farinha de bardana na elaboração de pães de forma, demonstrando haver tendência à ampliação de seu uso como ingrediente funcional em produtos de cereais. O presente trabalho teve como objetivo elaborar biscoitos integrais do tipo cookies, com farinha de raiz de bardana, bem como avaliar as características físico-químicas e tecnológicas dos biscoitos elaborados, possibilitando futuro incentivo a novos usos da raiz de bardana. 2. MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 Materiais Para a obtenção da farinha de bardana integral (FBI), raízes frescas obtidas no comércio local foram sanitizadas, branqueadas e fatiadas. Em seguida levadas a estufa (Marconi, Piracicaba) com circulação de ar forçado em 57 C por 15 horas (até umidade inferior a 13%). Com as raízes secas, estas foram trituradas em moinho de facas e martelo (Trel, Rio de Janeiro) para a farinha alcançar granulometria inferior a 0,247 mm. A FBI foi embalada a vácuo e armazenada em freezer com temperatura de congelamento até a realização das análises e elaboração dos cookies. A farinha de trigo integral e farinha de trigo foram cedidas pelo moinho Anaconda Industrial e Agrícola de Cereais S.A. Os demais ingredientes de grau alimentício foram obtidos no comércio local. 2.2 Métodos 2.2.1 Caracterização físico-química da farinha de trigo integral, farinha de trigo e da farinha de bardana integral (FBI): A determinação de umidade, lipídios, proteínas, cinzas, fibra alimentar total e fibra alimentar insolúvel foi realizada de acordo com os métodos da AOAC (2006) e AACCI (2010). O teor de carboidratos totais foi calculado por diferença. A cor da FBI foi avaliada em colorímetro (HunterLab, EUA) utilizando-se o sistema CIELab, com luminante D65. 2.2.2 Elaboração de cookies integrais: Foi desenvolvida uma formulação controle (C0) e a partir disto, a farinha de trigo foi substituída pela FBI em 5 e 10% de acordo com a Tabela 1. Tabela 1 - Formulação dos cookies com farinha de raiz de bardana em substituição a farinha de trigo. Ingredientes C0 (0%) C1(5%) C2 (10%) Farinha de trigo de grão inteiro (FTI) 51 51 51 Farinha de trigo (FT) 49 39 29 Farinha da raiz de bardana integral (FBI) 0 5 10 Açúcar refinado (g)* 45 45 45 Óleo vegetal (g)* 40 40 40 Cacau (g)* 13 13 13 Leite em pó (g)* 10 10 10 Fermento químico (g)* 4 4 4 Bicarbonato de amônio (g)* 2 2 2 Lecitina de soja (g)* 1,5 1,5 1,5 Sal (g)* 0,4 0,4 0,4 Água filtrada (g)* 23 23 23 * Em relação aos 100% da mistura de farinhas.
2.2.3 Avaliação físico-química dos cookies: A composição centesimal e análise de cor foram realizadas segundo o ítem 2.2.1. 2.2.4 Avaliação da qualidade tecnológica dos cookies: Foram realizadas as seguintes análises de acordo com o método 10-54.01 da AACCI (2005) para cookies; diâmetro, espessura, crescimento horizontal e vertical, massa, volume específico, densidade, quebras e fissuras. A dureza dos cookies foi determinada em Newtons (N) através do texturômetro TA-XT2i (Stable Micro Systems, Inglaterra) com o probe 3-Point bending Rig. A vida de prateleira foi avaliada com a medição da atividade de água (Aa) através de higrômetro e presença de quebras e fissuras nos dias: 0, 5, 10, 15, 20, 25 e 30 de armazenamento em embalagem plástica com foto proteção e sob vácuo. 2.2.5 Análise Estatística: para avaliar os resultados, obtidos em três ou mais replicatas foi feita a análise de variância, seguida de teste de Scott-Knott (p<0,05) para comparação de médias utilizando o software estatístico Sisvar. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Caracterização físico-química farinha de trigo integral, farinha de trigo e da farinha de bardana integral (FBI) Na Tabela 2 estão descritos os resultados da análise de composição centesimal realizada para os três tipos de farinhas utilizados na elaboração dos cookies. Tabela 2- Composição centesimal em base seca das farinhas utilizadas na elaboração dos cookies 1. Análise Farinha de trigo Farinha integral de Farinha de trigo (FT) integral (FTI) bardana (FBI) Proteínas (%) 13,32 ± 0,52 12,68 ± 0,84 7,68 ± 0,51 Lipídios (%) 1,96 ± 0,16 1,42 ± 0,17 0,22 ± 0,02 Cinzas (%) 1,61 ± 0,02 0,68 ± 0,02 3,07 ± 0,07 Carboidratos (%) 2 : Digeríveis (%) 72,73 82,33 59,36 Fibras totais (%) 3 10,38 ± 1,31 2,89 ± 0,17 19,54 ± 0,34 1 Resultados expressos como média ± desvio padrão, Umidade: FTI: 9,97%; FT: 10,90% e FBI: 10,14%. 2 Calculado por diferença. 3 Fibras insolúveis da farinha de bardana integral: 13,90 ± 0,17 e solúveis, por diferença: 5,64 ± 0,38. A análise de cor realizada para a farinha de bardana integral teve resultados de L* = 66,69 ± 0,57, a* = 5,33 ± 0,08 e b* = 24,33 ± 0,27. O b* positivo indica que esta farinha possui como predominante a cor amarela. 3.2 Caracterização físico-química e tecnológica dos cookies Na Tabela 3 estão apresentados os resultados obtidos da caracterização físico-química e tecnológica dos cookies elaborados. Imagens dos mesmos seguem na Figura 2.
Tabela 3 - Composição centesimal, cor, dureza e caracterização de tamanho dos cookies C0 (controle), C1 e C2 1. Análises C0 (0%) C1 (5%) C2 (10%) Caracterização físico-química Umidade (%) 4,34 ± 0,19 n.s. 4,76 ± 0,25 n.s. 4,8 ± 0,6 n.s. Cinzas (%) 2,83 ± 0,02 n.s. 2,85 ± 0,01 n.s. 2,44 ± 0,68 n.s. Proteínas (%) 10,29± 0,04 n.s. 10,0 ± 0,27 n.s. 10,18 ± 0,12 n.s. Lipídeos (%) 20,94 ± 0,79ª 18,94 ± 0,24 b 19,98 ± 0,67ª Fibras (%) 2 7,02 7,77 8,51 Carboidratos (%) 3 58,92 60,44 58,89 Cor: L* 23,38 ± 0,40ª 22,41 ± 0,27 b 22,19 ± 0,19 b a* 8,03 ± 0,35ª 6,37 ± 0,23 b 6,46 b ± 0,13 b b* 6,25 ± 0,32ª 4,81 ± 0,08 b 5,05 b ± 0,08 b E (diferença de cor) - 2,40 2,31 Caracterização tecnológica Textura (N) 12,69 ± 5,29ª 24,83 ± 5,23 b 15,36 ± 4,01ª Volume específico (cm 3 /g) 1,36 ± 0,17 n.s. 1,25 ± 0,22 n.s. 1,07 ± 0,02 n.s. Densidade (g/cm 3) 0,76 ± 0,09 n.s. 0,83 ± 0,15 n.s. 0,94 ± 0,02 n.s. Massa (g) 5,46 ± 0,14ª 4,88 ± 0,39 b 5,45 ± 0,50ª DE antes e pós forno (%) 4 2,20 ± 0,40 n.s. 2,11 ± 0,36 n.s. 2,11 ± 0,42 n.s. DE vertical e horizontal (mm) 4 39,68 ± 0,66 n.s. 38,98 ± 0,75 n.s. 39,03 ± 0,71 n.s. DC horizontal (mm) 4 2,50n.s ± 0,79 n.s. 2,02 ± 0,86 n.s. 1,97 ± 0,85 n.s. 1 Resultados expressos como média ± desvio padrão. Letras diferentes, na linha, diferem entre si pelo teste de Scott-Knott (p<0,05); n.s: não-significativo. 2 O teor de fibras foi calculado baseando-se em informação de análise de fibras totais das farinhas. 3 Calculado por diferença. 4 Diferença das espessuras antes e pós forno, diferença na espessura vertical e horizontal e diferença do crescimento horizontal dos cookies. Figura 2- Imagem obtida a partir do escaneamento dos cookies C0, C1 e C2, a partir da esquerda respectivamente. Quanto ao teor de umidade, observa-se na Tabela 3 que não houve diferença significativa entre as amostras, as quais ficaram dentro do descrito por Sarantópoulos et al. (2001), já que apresentaram umidade que garante crocância (entre 2 e 8 %). Os cookies elaborados com FBI possuem maiores teores de fibra alimentar, como era esperado pelo elevado teor de fibra da farinha de raiz de bardana. A partir dos resultados de cor observa-se que os cookies com adição de FBI, possuem cor mais escura (menor L* se comparados ao controle, que pode ser devido à coloração mais escura da FBI em comparação a farinha de trigo refinada que foi substituída). O E, que expressa a diferença de cor em relação ao controle, foi maior em C1 que em C2, apesar da formulação C2 ter menor quantidade de farinha refinada. Segundo Moritz (2011), o E dos cookies com FBI se enquadram entre 1,5 e 3,0 indicando que têm diferença distinguível de cor a olho nu em relação ao controle.
Quanto à textura instrumental dos cookies, pode-se avaliar que os resultados deste trabalho se assemelham aos encontrados por Zucco et al. (2011) que elaboraram cookies com farinha de leguminosas de dureza 11,4 N quando comparada a seu controle (9,0 N). É possível notar na Tabela 3 apesar do C1 apresentar maior dureza em relação ao controle, a formulação C2 não se diferenciou do mesmo. O crescimento horizontal e vertical, o volume específico e a densidade dos cookies não variaram com a adição de FBI. Quanto a estabilidade ao armazenamento, a avaliação da atividade de água no período de 30 dias segue na Tabela 4. Tabela 4- Determinação de atividade de água 1. Dias C0 (0%) C1 (5%) C2 (10%) 0 0,34 ± 0,02 b,b 0,36 ± 0,01 a,a 0,35 ± 0,01 a,a 5 0,38 ± 0,00 a,a 0,35 ± 0,00 a,b 0,31 ± 0,00 b,c 15 0,35 ± 0,00 b,a 0,36 ± 0,00 a,a 0,33 ± 0,00 a,b 20 0,31 ± 0,00 c,n.s 0,31 ± 0,00 b,n.s 0,31 ± 0,00 b,n.s 25 0,34 ± 0,00 b,n.s 0,35 ± 0,03 a,n.s 0,31 ± 0,00 b,n.s 30 0,38 ± 0,00 a,a 0,32 ± 0,00 b,b 0,30 ± 0,00 b,c 1 Valores expressos como média ± desvio padrão. Letras minúsculas diferentes na coluna, e letras maiúsculas diferentes na linha, diferem entre si pelo teste de Scott-Knott (p<0,05); N.S: não significativo. Não houve diferença significativa quanto à atividade de água entre C0, C1 e C2 sugerindo que a atividade de água dos cookies elaborados ficou dentro da faixa de recomendação para esse tipo de produto. Os dados dessa análise estão de acordo com os descritos por Sarantópoulos et al. (2001), uma vez que a principal característica de biscoitos tipo cookies é sua baixa aw, a qual deve se situar entre 0,1 e 0,3, garantindo estabilidade ao armazenamento. Além disso, os cookies elaborados com FBI obtiveram melhores resultados do que o controle ao fim dos 30 dias, evidenciando a estabilidade favorável da farinha de raiz da bardana para produtos de panificação. 4. CONCLUSÕES A produção de cookies com até 10% de farinha de raiz de bardana integral (FBI) substituindo a farinha de trigo foi possível por apresentar características físico-químicas e propriedades tecnológicas semelhantes à formulação controle, sem FBI, além de contribuir com o aumento da fibra alimentar. Espera-se que a utilização de FBI em produtos de panificação seja vantajosa e viável, visto que sua introdução manteve a estabilidade e a vida de prateleira no tempo estudado. 5. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao PIBIC/Unicamp pela concessão de bolsas de iniciação científica, à CAPES pelas bolsas de mestrado e doutorado, à FAEPEX/Unicamp e ao CNPq pelo auxílio à pesquisa. Agradecemos também ao moinho Anaconda Industrial e Agrícola de Cereais S.A (São Paulo/SP) pelo fornecimento das matérias primas utilizadas neste trabalho.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A.A.C.C. I. - American Association of Cereal Chemists International (2005). Approved methods of the American Association of Cereal Chemists. 12a ed. St. Paul: Approved Methods Committee, v. 1 e 2. A.O.A.C. Official Methods of analysis of the association of official analytical chemists. (2006) Gaithersburg, MD, USA. AOAC International. (19. ed.) Brady, K. HO, C.; Rosen, R. T.; Sang, S. & Karwe, M. V. (2007). Effects of processing on the nutraceutical profile of quinoa. Journal of Food Chemistry., 100(3), 1209-1216. Hirose, Y.; Fujita, T.; Ishii, T. & Ueno, N. (2005). Antioxidative properties and flavonoid composition of Chenopodium quinoa seeds cultivated in Japan. Food Chemistry, London, 119(4), 1330-1306. Lin, C.C.; Lu J.M.; Yang J.J; Chuang S.C.; & Ujiie T. (1996). Antiinflammatory and radical scavenge effects of Arctium lappa. The American journal of Chinese medicine., 24(2), 127 37. Marangoni, A. L. (2006). Potencialidade de Aplicação de Farinha de Yacon (Polymnia sonchifolia) em Produtos à Base de Cereais. (Dissertação de mestrado). Universidade Estadual de Campinas, Campinas. Moritz, A. R. (2011). Existe cor em nossas vidas: A colorimetria aplicada em nossos dias. (1ª Ed.). Edição do autor: Braseq. Ragaee, S. & Abdel-Aal, El-S. (2006). Pasting properties of starch and protein in selected cereals and quality of their food products. Food Chemistry, 95, 9-18. Sarantópoulos, C.I.G.L.; Oliveira, L.M.; & Canavesi, E. (2001). Requisitos de Conservação de Alimentos em Embalagens Flexíveis. Campinas: CETEA/ITAL, 215. Tae, M. H.; Kim, K.-H. & Yook, H.-S. (2015). Quality characteristics of bread with burdock (Arctium lappa L.) Powder. Journal of the Korean Society of Food Science and Nutrition., 44(12), 1826 1831. Villarroel, M.; Huiriqueo, C.; Hazbun, J. & Carrillo, D. (2009). Desarrollo de una formulación optimizada de galletas para celiacos utilizando harina desgrasada de avellana chilena y harina de quinoa. Archivos Latinoamericanos de Nutrición, Caracas, 59(2),184-190. Zucco, F.; Borsuk, Y. & Arntfield, S. D. (2011). Physical and nutritional evaluation of wheat cookies supplemented with pulse flours of different particle sizes. LWT - Food Science and Technology., 44, 2070-2076.