Aspectos clínico-patológicos da neoplasia da bainha de mielina no plexo braquial com infiltração do canal medular em um cão

Documentos relacionados
SCHWANNOMA MALIGNO CUTÂNEO EM CANINO

ASPECTOS ULTRASSONOGRÁFICOS DE NEOPLASIA HEPÁTICA EM PERIQUITO AUSTRALIANO (Melopsittacus undulatus): RELATO DE CASO

HEMIPARESIA E DÉFICITS NEUROLÓGICOS ASSIMÉTRICOS

DIAGNÓSTICO DE OSTEOSSARCOMA EM SACRO DE UM CÃO DA RAÇA COCKER SPANIEL POR EXAME CITOPATOLÓGICO: RELATO DE CASO

REVISTA CIENTÍFICA ELETRÔNICA DE MEDICINA VETERINÁRIA ISSN: Ano IX Número 18 Janeiro de 2012 Periódicos Semestral

Schwannoma do plexo braquial em cão. Relato de Caso/Case Report

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia. Aspectos cirúrgicos no tratamento de tumores hepatobiliares caninos: uma revisão

TECIDO NERVOSO. Substância cinzenta

SCHWANNOMA COM DIFERENCIAÇÃO CARTILAGINOSA EM NERVO INTERCOSTAL DE UM CÃO

CORRELAÇÃO ENTRE A CITOLOGIA ASPIRATIVA COM AGULHA FINA E HISTOPATOLOGIA: IMPORTÂNCIA PARA O DIAGNÓSTICO DE NEOPLASIAS MAMÁRIAS EM CADELAS 1

Semina: Ciências Agrárias ISSN: X Universidade Estadual de Londrina Brasil

CARCINOMA SÓLIDO DE GLÂNDULA MAMÁRIA COM METÁSTASE EM MEDULA ESPINHAL

ATLAS DE HISTOLOGIA TECIDUAL - MÓDULO II. Sandra Iara Lopes Seixas Terezinha J. Sirotheau-Corrêa

FIBROSSARCOMA EM CÃO RELATO DE CASO. RIBEIRO, Fabiana Pereira Discente do curso de Medicina Veterinária da FAMED-Garça

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia. Regeneração espontânea da lesão do plexo braquial no gato: Relato de caso

TUMORES DE PELE E TECIDO SUBCUTÂNEO EM CÃES E GATOS

Imagem da Semana: Ressonância nuclear magnética

Artigo Original TRATAMENTO DO CÂNCER DE CABEÇA E PESCOÇO NO IDOSO ACIMA DE 80 ANOS

ESTUDO RETROSPECTIVO DE ALTERAÇÕES ESPLÊNICAS EM CANINOS RETROSPECTIVE STUDY OF CANINE SPLENIC DISORDERS

ONCOLOGIA. Aula I Profª.Enfª: Darlene Carvalho (

NÓDULO PULMONAR SOLITÁRIO

Lesão neurológica pós-bloqueio periférico: qual a conduta?

Está indicada no diagnóstico etiológico do hipotireoidismo congênito.

HISTOLOGIA TECIDO NERVOSO

HISTOLOGIA TECIDO NERVOSO

Aluna: Bianca Doimo Sousa Orientador: Prof. Dr. Jaques Waisberg. Hospital do Servidor Público Estadual

FIBROLEIOMIOMA EM UMA CADELA DA RAÇA PASTOR ALEMÃO - RELATO DE CASO FIBROLEIOMYOMAS IN ONE BITCH OF GERMAN SHEPHERD BREED CASE REPORT

Imagem da Semana: Ultrassonografia, Tomografia Computadorizada

Prostatic Stromal Neoplasms: Differential Diagnosis of Cystic and Solid Prostatic and Periprostatic Masses

ESTUDO RETROSPECTIVO DAS NEOPLASIAS CANINAS DIAGNOSTICADAS EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO NO PERÍODO DE 2009 A 2010

MASTOCITOMA CANINO - ESTUDO RETROSPECTIVO DE 25 CASOS CANINE MASTOCYTOMA RETROSPECTIVE STUDY OF 25 CASES

ADENOCARCINOMA METÁSTICO CEREBRAL

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia. Ocorrência de Schwannoma na vulva de uma vaca

XVIII Reunião Clínico - Radiológica Dr. RosalinoDalazen.

TUMOR MALIGNO DA BAINHA NEURAL PERIFÉRICA COM DIFERENCIAÇÃO RABDOMIOBLÁSTICA (TUMOR DE TRITON MALIGNO) PÓS-RADIOTERAPIA

Tecido Nervoso. Profa. Dra. Constance Oliver Profa. Dra. Maria Célia Jamur

Tecido Nervoso. Neurônios

MELANOMA EM EQUÍDEOS: RELATO DE 11 CASOS MELANOMA IN EQUINE ANIMALS: REPORT OF 11 CASES. SOUZA, Rafael Rocha de

Caracterização de lesões Nódulos Hepá8cos. Aula Prá8ca Abdome 2

42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de Curitiba - PR

Unidade I Neurociência básica. Divisão do sistema nervoso: Citologia e histologia.

Avaliação do Índice Apoptótico em Adenomas Pleomórficos de Glândulas Salivares

Malignant Gastrointestinal Stromal Tumor: distribution, imaging features and pattern of metastatic spread

Universidade Federal do Ceará Faculdade de Medicina Liga de Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Jônatas Catunda de Freitas

DIAGNÓSTICO CLÍNICO E HISTOPATOLÓGICO DE NEOPLASMAS CUTÂNEOS EM CÃES E GATOS ATENDIDOS NA ROTINA CLÍNICA DO HOSPITAL VETERINÁRIO DA UNIVIÇOSA 1

SARCOMA EPITELIOIDE DE VULVA: REVISÃO DE LITERATURA. Palavras-chave: Sarcoma; Sarcoma epitelióide de vulva; Vulvectomia radical com reconstrução.

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia. Disponível em: <

Sessão de Neuro- Oncologia

MENINGIOMA VS LESÃO SECUNDÁRIA

DISCOPATIA TORACOLOMBAR

Emergências Neurológicas. Emergências Neurológicas. Emergências Neurológicas. Emergências Neurológicas. Emergências Neurológicas

Anatomia da Medula Vertebral

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia. Neoplasias de glândulas perianais em cães

Tronco Encefálio e Formação Reticular. Msc. Roberpaulo Anacleto

Tecido Muscular e Tecido Nervoso

Organização do sistema motor

REVISTA CIENTÍFICA ELETRÔNICA DE MEDICINA VETERINÁRIA ISSN: Ano X Número 19 Julho de 2012 Periódicos Semestral

IV - SISTEMA NERVOSO

Imagem da Semana: Tomografia Computadorizada (TC)

GRANULOMA EOSINOFÍLICO EQUÍNO - RELATO DE CASO EQUINE EOSINOPHILIC GRANULOMA - CASE REPORT

Tratamento cirúrgico de condroma extradural lombar em cão - relato de caso. Surgical treatment of lumbar extradural chondroma in a dog - case report

FISIOLOGIA DO SISTEMA NERVOSO HUMANO

Secretaria Municipal da Saúde Coordenação de Integração e Regulação do Sistema

SETOR DE ABDOME - JOURNAL CLUB

CARCINOMA TUBULOPAPILAR DE MAMA EM FELINO RELATO DE CASO

Métodos de imagem. Radiologia do fígado. Radiologia do fígado 12/03/2012

Caso Clínico. Paciente do sexo masculino, 41 anos. Clínica: Dor em FID e região lombar direita. HPP: Nefrolitíase. Solicitado TC de abdome.

USO DA TÉCNICA DE MICROARRANJO TECIDUAL NA CLASSIFICAÇÃO DAS GLÂNDULAS MAMÁRIAS CANINAS NORMAIS E NEOPLÁSICAS

NEWS: ARTIGOS CETRUS Ano V Edição 45 Maio 2013

Módulo: Câncer de Rim Metastático

Tomografia Computadorizada ou Ressonância Magnética qual a melhor opção para cada caso?

Qualidade diagnóstica da biópsia com agulha Super-core II de nódulos mamários de cadelas

Osteossarcoma craniano em um cão

ACERVO DIGITAL FASE II. Histologia do Sistema Urinário

MARCO AURELIO VAMONDES KULCSAR CHEFE DE CLINICA ICESP

UTILIZAÇÃO DE PET CT NO DIAGNÓSTICO DE NEOPLASIA PULMONAR

Sistema Nervoso Somático ou voluntário

Tumor maligno da bainha de nervo periférico em cães: relato de três casos

09/07/ Tromboembolismo Pulmonar Agudo. - Tromboembolismo Pulmonar Crônico. - Hipertensão Arterial Pulmonar

ESTUDO RETROSPECTIVO DE CIRURGIAS DESCOMPRESSIVAS DA COLUNA TORACOLOMBAR REALIZADAS APÓS RESSONÂNCIA MAGNÉTICA

Aspectos histoquímicos e imunoistoquímicos nos neoplasmas do sistema nervoso periférico

SISTEMA NERVOSO FUNÇÕES

OSTEOSSARCOMA APENDICULAR EM TÍBIA: RELATO DE CASO

AULA PRÁTICA 05. Tecidos Conectivos - Matriz e Classificação LÂMINA Nº 90 - DIFERENTES CORTES DE PELE - ORCEÍNA

Silvana Maris Cirio Médica Veterinária, Dr.ª, Prof.ª da PUCPR, São José dos Pinhais - PR.

CISTOS DA RETE OVARII EM CADELAS E GATAS SUBMETIDAS A CASTRAÇÃO ELETIVA CYSTS OF RETE OVARII IN DOGS AND CATS UNDERGOING ELECTIVE CASTRATION

A QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES LOCALMENTE AVANÇADOS TRATADOS COM RADIOQUIMIOTERAPIA É MELHOR DO QUE NAQUELES SUBMETIDOS A LARINGECTOMIA TOTAL?

Estamos Tratando Adequadamente as Urgências em Radioterapia?

Nódulos e massas pulmonares

Tumor maligno da bainha de nervo periférico envolvendo raízes nervosas do terceiro segmento medular lombar em um cão

AVULSÃO DO PLEXO BRAQUIAL EM CÃES - 2. BIÓPSIA FASCICULAR E HISTOLOGIA DOS NERVOS RADIAL, MEDIANO, ULNAR E MUSCULO CUTÂNEO 1

Debates prós e contras

Imagem da Semana: Ressonância magnética (RM)

RADIOTERAPIA ESTEREOTÁXICA CORPÓREA

XXII WORSHOP UROLOGIA ONCOLÓGICA Março 2017 Hotel Solverde, Espinho

PROJETO DE PESQUISA ASPECTOS ANÁTOMO-PATOLÓGICOS DE DOENÇAS DO SISTEMA NERVOSO E TUMORES MÚSCULO-ESQUELÉTICOS

Diagnóstico de Neoplasia Nasal em Felino por Tomografia Computadorizada

TECIDO NERVOSO QUAIS SUAS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS?

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA DO PACIENTE COM DHGNA VICTORINO SPINELLI TOSCANO BARRETO JCPM,

Transcrição:

Acta Scientiae Veterinariae, 2015. 43(Suppl 1): 83. CASE REPORT Pub. 83 ISSN 1679-9216 Aspectos clínico-patológicos da neoplasia da bainha de mielina no plexo braquial com infiltração do canal medular em um cão Clinical and Pathological Aspects of Peripheral Nerve Sheath Tumor of the Brachial Plexus with Spinal Cord Canal Infiltration in a Dog Bernardo De Caro Martins, Guilherme De Caro Martins, Rodrigo dos Santos Horta, Matheus Vilardo Lóes Moreira, Luana Rocha, Alexandre de Paula Nagem & Roselene Ecco ABSTRACT Background: Primary neoplasms of peripheral nerves are uncommon in domestic animals and are mainly represented by nerve sheath tumors. They occur especially in the peripheral nerves of the brachial plexus, and may occasionally invade and compress the spinal cord. Initial clinical diagnosis is challenging, since the main clinical sign is a progressive claudication, whose origin, neurogenic or musculoskeletal, is not usually defined. The objective of this report is to describe clinical, ultrasonographic, tomographic and histopathological findings in a peripheral nerve sheath tumor in the brachial plexus of a dog, to assist clinicians making an early diagnosis, so patients can attain longer survival. Case: A 9-year-old, male, intact, Dachshund was presented to a veterinary neurologist with a history of lameness of the right forelimb onset five months ago. The condition progressed slowly to right hemiparesis and proprioceptive ataxia. Clinical and neurological findings included right hemiparesis, proprioceptive ataxia and proprioceptive deficits with decreased flexor reflex and marked atrophy of the right forelimb. Palpation of the right axilla allowed identification of a firm 1 x 3 cm mass, with intense hyperesthesia. Ultrasound examination of the right axilla revealed hypoechoic tubular mass of 1.5 x 3 cm (Figure 1). Once the animal presented signs of ataxia and paresis to the right pelvic limb, it was indicated a computed tomography to observe a possible compression of the spinal cord. An expansive formation was observed in the right brachial plexus between C6-C7 vertebral bodies with isodense characteristic, ring-shaped, with dimensions of 3.82 x 1.56 cm compressing spinal cord. Due to poor prognosis and poor quality of life, euthanasia was elected. The gross changes of the spinal cord were characterized by a firm nodule with irregular surface at the brachial plexus with invasion and compression of C7-C8 spinal cord segment. The microscopic evaluation allowed a diagnosis of malignant sheath nerve tumor. Discussion: Peripheral nerve sheath tumors (PNST) arise from Schwann cells, perineurial fibroblastos or a combination of both cell types that surround axons of peripheral nerves. The diagnosis of PNST is more common in middle-aged to older dogs, of medium to large breeds, as observed in the animal of this report. PNST are more frequently found in the brachial plexus, which results in lameness and/or progressive forelimb paresis associated with neurogenic muscle atrophy. Palpation of a mass in the axillary region is possible in only 29.4% to 37% of cases, which can make diagnosis difficult, however, pain is easily triggered during palpation of the affected area, as noted in the dog of this report. Proprioceptive ataxia and paresis to the hindlimbs occur in 50% of cases and are observed whenever the spinal cord is under compression As signals are insidious, these patients are often evaluated for possible orthopedic conditions, which delays diagnosis of PNST, resulting in a poor prognosis. Ultrasound examination is fast and sensitive for identifying PNST while cross sectional imaging, such as computed tomography are recommended to define the extent of disease and therapeutic planning. However, definitive diagnosis can only be achieved from histopathological examination. The prognosis for animals with PNST is poor, especially when it is associated with invasion of the spinal canal. Early diagnosis, from a detailed clinical examination and imaging exams, must be associated with an aggressive surgical intervention or debulking surgery followed by radiotherapy, in order to improve prognosis, quality of life and survival of these patients. Keywords: dogs, oncology, neurology, neoplasm, peripheral nerve. Received: 15 November 2014 Accepted: 3 June 2015 Published: 24 July 2015 Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinárias, Escola de Veterinária (EV), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brazil. CORRESPONDENCE: B.D.C. Martins [bernardodcmartins@hotmail.com - Tel.: +55 (31) 9742-1242]. Av. Antônio Carlos n.6627, Bairro Pampulha. CEP 31270-901 Belo Horizonte, MG, Brazil. 1

INTRODUÇÃO As neoplasias primárias dos nervos periféricos são infrequentes nos animais domésticos e são representadas, principalmente pelas neoplasias da bainha de mielina [1,2,13]. Podem originar-se nos nervos cranianos, espinhais e, principalmente, nos nervos periféricos ou raízes do plexo braquial, na qual, ocasionalmente, infiltram no canal medular e comprimem a medula espinhal [1,9]. O diagnóstico clínico inicial é desafiador, visto que o principal sinal clínico observado é uma claudicação progressiva, cuja origem, neurogênica ou músculo-esquelética, é difícil de ser esclarecida [3,6]. Com isso, na maioria das vezes, o diagnóstico é tardio, tornando, geralmente, o prognóstico desfavorável. Exames complementares como ultrassonografia e tomografia computadorizada auxiliam no diagnóstico precoce [3,5,8-10]. O objetivo desse relato é descrever as alterações clínicas, ultrassonográficas, tomográficas e histopatológicas da neoplasia em bainha de mielina localizada no plexo braquial de um cão, visando auxiliar o clínico a realizar um diagnóstico precoce e possibilitar uma maior sobrevida aos pacientes. cm de largura, invadindo o canal medular na região da intumescência braquial (Figura 2). Figura 1. Imagem ultrassonográfica transversal da axila direita de um Dachshund de nove anos de idade. Observa-se grande formação tubular hipoecóica delineada pelos marcadores (+). CASO Um cão da raça Dachshund, de nove anos de idade, foi atendido com histórico de claudicação de membro torácico direito, a qual progrediu para hemiparesia direita e ataxia proprioceptiva. Segundo o proprietário, a condição teve inicio há cinco meses e não foi obtida resposta clínica a anti-inflamatórios não esteroidais. Ao exame clínico-neurológico observaram- -se hemiparesia direita e déficit proprioceptivo com diminuição do reflexo flexor e hipotrofia acentuada do membro torácico direito. Além disso, à palpação da axila direita, observou-se uma massa firme de 1 x 3 cm de diâmetro e intensa hiperestesia. Os exames de hemograma, perfil bioquímico hepático e renal não detectaram alterações significativas. O exame ultrassonográfico da axila direita revelou uma massa tubular hipoecóica de 1,5 x 3 cm de diâmetro (Figura 1). Como o paciente apresentava sinais de paresia e ataxia para o membro pélvico direito, foi indicado realização da tomografia computadorizada para confirmar uma provável invasão da medula espinhal. Foi observada uma formação expansiva em plexo braquial direito entre os corpos vertebrais C6-C7 com característica isodensa, bordas discretamente captantes (que realçam com contraste) e dimensões de 3,82 cm de comprimento e 1,56 Figura 2. Imagem tomográfica em corte transversal do segmento vertebral C6-C7 de um Dachshund de nove anos de idade com suspeita de neoplasia da bainha de mielina. Observa-se formação expansiva (M) de 3,82 x 1,56 cm em plexo braquial direito com características isodensas e bordas discretamente captantes invadindo o canal medular (seta). Devido ao diagnóstico tardio, infiltração neoplásica na medula espinhal e prognóstico desfavorável, o animal foi conduzido à eutanásia. Ao exame macroscópico observou-se formação nodular esbranquiçada, superfície irregular, infiltrativa e firme no plexo braquial direito com invasão do canal medular e compressão dos segmentos medulares C7-C8. Secções da neoplasia foram fixadas em 2

B.C. Martins, G.C. Martins, R.S. Horta, et al. 2015. Aspectos clínico-patológicos da neoplasia da bainha de mielina no plexo braquial com infiltração do canal medular em um cão. Acta Scientiae Veterinariae. 43(Suppl 1): 83. formalina a 10% tamponada e enviadas ao Setor de Patologia da Escola de Veterinária da UFMG para processamento pela técnica de rotina de inclusão em parafina e coloração pela hematoxilina e eosina. À histopatologia observou-se proliferação neoplásica de células mesenquimais disposta em feixes longitudinais e sustentadas por moderada quantidade de tecido fibrovascular. Em algumas áreas os feixes celulares estavam entremeados por abundante matrix extracelular fibrilar fracamente basofílica. A proliferação era infiltrativa e parcialmente envolta por uma cápsula de tecido conjuntivo fibroso (Figura 3A). As células eram alongadas, com citoplasma pouco definido, eosinofílico e vacuolizado. Os núcleos eram ovalados a alongados, de cromatina frouxa e nucléolo único e proeminente. Foram observadas raras figuras de mitose típicas por campo. Observou-se ainda intensa anisocitose, anisocariose e algumas áreas de hemorragia multifocal intensa com hemossiderose moderada, necrose de coagulação multifocal intensa e vasos com trombos oclusivos. Na periferia da neoplasia observou-se um nervo seccionado transversalmente, quase totalmente substituído por células neoplásicas com infiltração incipiente no perineuro. Degeneração axonal foi observada em alguns axônios remanescentes (Figura 3B). Nas áreas adjacentes havia alguns focos com discreto infiltrado inflamatório linfo-histiocitário. Esses achados foram compatíveis com neoplasia maligna da bainha de mielina dos nervos periféricos. A B Figura 3. Secções da massa tumoral do plexo braquial de um Dachshund de 9 anos de idade. A) Neoplasia maligna da bainha de mielina dos nervos periféricos caracterizada pela proliferação de células fusiformes parcialmente envolta por tecido conjuntivo fibroso. As células estão dispostas em feixes entremeados por material basofílico fibrilar. Hematoxilina e eosina. 100x. B) Secção transversal de um nervo quase totalmente substituído por células neoplásicas. Os núcleos são ovalados a alongados, possuem cromatina frouxa, nucléolos únicos ou múltiplos e citoplasma eosinofílico, de limites pouco definidos. Degeneração axonal (seta) pode ser observada em alguns axônios remanescentes [HE, 200x]. DISCUSSÃO O diagnóstico de NBMNP é mais frequente em cães de meia-idade a idosos, de raças médias a grandes, assim como o paciente do presente relato [2,7]. Quando malignos são classificados como um sarcoma de tecido mole, por apresentarem crescimento lento, comportamento localmente invasivo, elevada probabilidade de recorrência, mas baixo a moderado potencial metastático. Metástases podem ocorrer, tardiamente, no curso da doença, principalmente pela via hematógena [4,7]. Os sinais clínicos são relacionados à localização da neoplasia. Como, frequentemente, são encontrados no plexo braquial, claudicação e/ou paresia progressiva do membro torácico associada à atrofia muscular neurogênica As neoplasias da bainha de mielina dos nervos periféricos (NBMNP) originam-se das células que circundam os axônios dos nervos periféricos. Podem ser benignas ou malignas, embora, em cães, na maioria das vezes, apresentam comportamento biológico agressivo [7]. O tumor pode advir das células de Schwann (responsáveis pela formação da bainha de mielina no sistema nervoso periférico), fibroblastos (responsáveis pela produção dos tecidos que circundam as fibras, feixes e nervos), ou ambos os tipos celulares [7]. Assim, na ausência de marcadores imuno-histoquímicos celulares específicos, prefere-se utilizar uma terminologia mais genérica como NBMNP ao invés de Schwannoma, neurofibroma ou neurofibrosarcoma [2,7]. 3

são observadas [3,7,11]. A palpação de uma massa na região axilar é possível em apenas 29,4% [3] a 37% [2] dos casos, o que pode dificultar o diagnóstico. No entanto, hiperestesia é facilmente desencadeada durante a palpação da região acometida, conforme observado no paciente deste relato [3,7]. Ataxia proprioceptiva e paresia para os membros pélvicos ocorrem em 50% dos casos e são observadas quando há invasão do canal vertebral [8]. Como os sinais são insidiosos, é comum o diagnóstico errôneo de uma claudicação de origem músculo-esquelética, o que torna o diagnóstico de NBMNP tardio e o prognóstico desfavorável. O diagnóstico e tratamento precoce é extremamente importante para que os animais possam atingir uma maior sobrevida [8]. No presente relato, os sinais clínicos de neurônio motor superior para o membro pélvico, sugestivos de infiltração na medula espinhal, confirmada pela tomografia computadorizada, permitiram caracterizar a doença como avançada. Exames complementares como ultrassonografia e tomografia computadorizada podem ser utilizados para auxiliar no diagnóstico precoce. O exame ultrassonográfico é rápido e sensível para o diagnóstico de NBMNP [3,8-10]. Pode-se observar estrutura tubular hipoecóica que, geralmente, separa a artéria da veia axilar [6,9]. O exame de tomografia computadorizada permite visibilizar estruturas menores que um centímetro de diâmetro e verificar o acometimento do canal medular pela neoplasia [10]. A utilização de contraste iodado auxilia na diferenciação de estruturas vasculares, e geralmente revela captação de contraste em formato de anel ao redor da neoplasia [10]. Neste caso, a imagem ultrassonográfica permitiu a identificação da neoplasia e a tomografia foi realizada para confirmação da infiltração e compressão da medula espinhal, construindo dessa forma o prognóstico do paciente. Geralmente não existe tratamento curativo para NBMNP. A amputação do membro acometido é uma opção nos estágios iniciais e previne automutilação e injúrias em casos de parestesia [7,11,13]. Se houver invasão para o canal medular, é necessário laminectomia ou hemilaminectomia associada à durotomia e rizotomia para diminuir a compressão da medula espinhal [7]. No entanto, o índice de recorrência é extremamente alto e novas intervenções geralmente são necessárias. Em um estudo, observou-se diferença no prognóstico para cães com neoplasia situada em posição distal (> nove meses) ou proximal (um a 7,5 meses) [2]. O uso da radioterapia e quimioterapia é controverso, devido ao reduzido número de informações e baixa resposta dessas neoplasias aos quimioterápicos e à radiação, no entanto, pode beneficiar àqueles pacientes em que não foi possível a obtenção de margens cirúrgicas livres [4,7]. A quimioterapia metronômica com ciclofosfamida, utilizada após a ressecção cirúrgica incompleta, promoveu atraso na recorrência tumoral em cães com sarcomas de tecido mole, independente da localização tumoral [4]. O paciente desse relato foi encaminhado à eutanásia devido à gravidade dos sinais clínicos, no momento da avaliação neurológica, auxiliada pelas imagens da tomografia computadorizada, em que se observou invasão do canal medular. A avaliação histológica é importante para definição do diagnóstico, principalmente quando o resultado citológico é inconclusivo [11,12]. Histologicamente as neoplasias dos nervos periféricos são caracterizadas por feixes de células alongadas, em padrão compactado, em paliçadas; ou em células alongadas ou ovais frouxamente distribuídas em uma matrix extracelular abundante [11]. Quando há infiltração na medula espinhal, pode ocorrer destruição de substância branca e cinzenta caracterizada por degeneração axonal e necrose neuronal. O prognóstico para animais com neoplasias da bainha de mielina é desfavorável, principalmente quando ocorre invasão do canal medular. O diagnóstico precoce, a partir de um exame clínico detalhado e auxílio de exames de imagem, deve ser associado a uma intervenção cirúrgica agressiva, com o intuito de melhorar o prognóstico, a qualidade de vida e a sobrevida desses pacientes. Declaration of interest. The authors report no conflicts of interest. The authors alone are responsible for the content and writing of the paper. REFERENCES 1 Bagley R.S. 2010. Spinal Neoplasm in Small Animals. Veterinary Clinics of North America - Small Animal Practice. 40: 915-927. 2 Brehm D.M., Vite C.H., Steinberg H.S., Haviland J. & Van Winkle T.A. 1995. A retrospective evaluation of 51 cases of peripheral nerve sheath tumors in the dog. Journal of American Animal Hospital Association. 31: 349-359. 4

3 Da costa R.C., Parent J.M., Dobson H., Ruotsalo K., Holmberg D., Duque M.C. & Poma R. 2008. Ultrasoundguided fine needle aspiration in the diagnosis of peripheral nerve sheath tumors in 4 dogs. Canadian Veterinary Journal. 49: 77-81. 4 Elmslie R.E., Glawe P. & Dow S.W. 2008. Metronomic therapy with cyclophosphamide and piroxicam effectively delas tumor recurrence in dogs with incompletely resected soft tissue sarcomas. Journal of Veterinary Internal Medicine. 22: 373-1379. 5 Kraft S., Ehrhart E.J., Gall D., Klopp L., Gavin P., Tucker R., Bagley R., Kippenes H., DeHaan C., Pedroia V., Partington B. & Olby N. 2007. Magnetic resonance imaging characteristics of peripheral nerve sheath tumors of the canine brachial plexus in 18 dogs. Veterinary Radiology & Ultrasound. 48(1): 1-7. 6 McDonnell J.J., Platt S.R. & Clayton L.A. 2001. Neurologic conditions causing lameness in companion animals. Veterinary Clinics of North America - Small Animal Practice. 31: 17-38. 7 McEntee M.C. & Dewey C.W. 2013. Tumors of the Nervous System. In: Withrow S.J., Vail D.M. & Page R.L. (Eds). Withrow & MacEwen s Small Animal Clinical Oncology. 5th edn. Philadelphia: Saunders, pp.583-596. 8 Platt S.R., Graham J., Chrisman C.L., Collins K., Chandra S., Sirninger J. & Newell S. 1999. Magnetic resonance imaging and ultrasonography in the diagnosis of a malignant peripheral nerve sheath tumor in a dog. Veterinary Radiology & Ultrasound. 40(4): 367-371. 9 Rose S., Long C., Knnipe M. & Hornof B. 2005. Ultrasonographic evaluation of brachial plexus tumors in five dogs. Veterinary Radiology & Ultrasound. 46: 514-517. 10 Rudich S.R., Feeney D.A., Anderson K.l. & Walter P.A. 2004. Computed tomography of masses of the brachial plexus and contributing nerve in dogs. Veterinary Radiology & Ultrasound. 45: 46-50. 11 Sawamoto O., Yamate J. & Kuwamura M. 1999. A canine peripheral nerve sheath tumor including peripheral nerve fibers. The Journal of Veterinary Medical Science. 61: 1335-1338. 12 Silva C.M.O., Caldeira F.M.C., Melo E.G., Ocarino N.M., Silva A.E., Guedes R.M.C., Lavalle G.E. & Serakides R. 2007. Tumor maligno da bainha do nervo periférico em cães: relato de três casos. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinaria e Zootecnia. 59(3): 679-684. 13 Schulman F.Y., Johnson T.O., Facemire P.R. & Fanburg-Smith J.C. 2009. Feline peripheral nerve sheath tumors: histologic, immunohistochemical, and clinicopathologic correlation (59 tumors in 53 cats). Veterinary Pathology. 46: 1166-1180. www.ufrgs.br/actavet CR 83 5