INTERDISCIPLINARIDADE, TANGRAM E INCLUSÃO SOCIAL E: HISTÓRIA, DESENHO, MATEMÁTICA E ARTE NUMA TURMA DE PEDAGOGIA COM ALUNOS SURDOS Maria de Fátima Neves Cabral FACHO fatima_cabral@bol.com.br Josinalva Estacio Menezes - UFRPE/DE/PPGEC/LACAPE jomene@ufrpe.br Vladimir Lira Veras Xavier de Andrade - DFM/UFRPE vladiandrade@click21.com.br RESUMO Atualmente, as diretrizes para o ensino estão apontando para a inclusão social, a interdisciplinaridade e a contextualização nas atividades. Neste sentido, algumas instituições de ensino já estão buscando se preparar para incluir, nos seus quadros discentes, pessoas com necessidades especiais, com auxílio de profissionais habilitados para isso. No artigo em questão o objetivo é apresentar os efeitos do ensino de matemática com o uso de jogos em interdisciplinaridade com a história, o desenho, a informática e a arte numa turma de Pedagogia com alunos surdos. Assim, realizamos uma oficina de Tangram com uma turma de 18 alunos do curso de Pedagogia de uma instituição de ensino superior, sete dos quais sendo surdos, com atividades relacionadas a desenho, matemática, informática e arte. Após apresentarmos informações históricas sobre a origem do jogo, fizemos a construção do mesmo em papel, depois alguns encaminhamentos matemáticos relativos a área e frações, depois a composição de figuras no computador utilizando um programa livre, em seguida uma discussão sobre alguns aspectos de composição artística. A partir de algumas silhuetas de Tangram, os alunos criaram e expuseram para a turma um painel em papel com silhuetas ou outras por eles criadas. Finalmente, solicitamos uma avaliação informal e verbal dos alunos sobre o trabalho. Não observamos, além da necessidade de falarmos mais pausadamente para a turma, já que havia uma intérprete, outras dificuldades nos trabalhos. Dois alunos surdos e um aluno não-surdo se destacaram nas atividades. Informalmente, os alunos consideraram a atividade interessante, motivadora, útil para o seu futuro trabalho como pedagogos, solicitaram mais tempo e mais material informativo posterior. Assim, sendo, consideramos válido o trabalho interdisciplinar com o Tangram, como uma proposta de alternativa metodológica para a sala de aula, procurando, dentro do processo ensinoaprendizagem, desenvolver no aluno a criatividade, associada a conteúdos de geometria e
aritmética. Palavras-chave: interdisciplinaridade, jogos matemáticos, arte, desenho, ensino. ABSTRACT Nowadays, the guidelines for teaching are appearing for the ativities social inclusion, the interdisciplinarity and the contextualization. In this sense, some teaching institutions are trying to prepare to include, in their casting students, people with special needs, helped by qualified professionals. In this article, our the objective is to present the impressions on the mathematics teaching through games in a interdisciplinary perspective besides history, draw, computer science and art in a group of Pedagogy with deaf students. Such as this, we accomplished a tangram workshop with a group of 18 students of Pedagogy of a higher education institution, seven of them being deaf, with activities related to draw, mathematics, computer science and art. After we present historical information on the origin of the game, we made its construction in paper, later some mathematical data about area and fractions, later the composition of illustrations in the computer using a free program, soon afterwards a discussion on some aspects of artistic composition. After this, we distributed a text with some tangram silhouettes, and the students created and they exposed for the group a panel in paper with silhouettes or another that they created and requested that the groups described their art. Finally, we asked them to make an informal and verbal evaluation about the work. We didn't observe, besides the need of we speak more slowly for the group, since there was an interpreter for the deaf, other difficulties in the works. Besides, two deaf students and a no-deaf student stood out in the activities, so that we considered viable that work type. Informally, the students considered the interesting activity, motivating, useful for their future work as educators, they requested more time and more subsequent informative material. Like this, being, we considered valid the interdisciplinary work using Tangram, as a proposal of methodological alternative to the classroom, searching, inside of the process teachinglearning, to develop the student s creativity, in association with geometry and arithmetic contents. Key-words: interdisciplinarity, mathematical games, art, drawing, teaching. 1 Introdução A desigualdade de oportunidades sociais evidenciadas no país ao longo de sua história, contribui para a estruturação de uma grande dívida social, com reflexo em diversas áreas.
Em certos grupos da sociedade, ainda existe o complexo de superioridade em relação aos portadores de necessidades especiais. As pessoas que apresentam deficiências precisam ultrapassar barreiras, desde sua infância, quando existe a necessidade da inclusão dentro de um contexto social, até a sua idade adulta. A educação especial é uma forma de perspectiva de integração social com abordagem interativa por parte de seus educandos, conforme contempla o texto da LDBEN (Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Lei nº 9394/96) em seu Art. 58: Entende-se por educação especial, para efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. Prossegue no seu 2 : O atendimento educacional será em classes, escolares ou serviços especializados, sempre que, em função de condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. Os princípios constitucionais estabelecem que a educação é um direito de todos e um dever do estado e da família. Deverá ser: Promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa ao seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (Constituição Brasileira Art. 205). O cumprimento da lei nem sempre é um fato, pois precisa da conscientização da sociedade como um todo, para a sua plena realização. Diante deste cenário legal de inclusão social, a Faculdade de Ciências Humanas de Olinda FACHO se insere com uma proposta educacional baseada nos princípios norteadores de sua missão e, materializando a sua proposta pedagógica, a FACHO vem inserir e incentivar a educação dos surdos de uma forma mais ampla na sociedade, através do ingresso destes alunos no Curso de Pedagogia. Assim sendo, a Habilitação em Educação Especial para Deficientes Auditivos do Curso Pedagogia foi implantada em 1976, objetivando formar um profissional que domine o conhecimento de técnicas especificas para atender aos educandos com necessidades especiais (deficiências em áudio comunicação), tendo sido concretizado o binômio teoria/prática com a criação da Escola de Aplicação para crianças surdas, vinculada ao curso de Pedagogia da FACHO. Em 2003, a FACHO abriu inscrição no seu vestibular para alunos Surdos, no Curso de Pedagogia. Foram classificados no processo seletivo dez (10) Surdos para cursar o 1º período letivo, com o apoio constante de um intérprete de Língua Brasileira de Sinais-LIBRAS e apoio pedagógico especializado. Essa iniciativa traz uma contribuição ao processo de inclusão social no sentido de proporcionar igualdade de oportunidades às pessoas Surdas e Ouvintes do Curso de Pedagogia utilizando a transdiciplinariedade na disciplina de metodologia do ensino da matemática, além de construir e utilizar recursos visuais para favorecer o processo ensino aprendizagem. Conforme sabemos, hoje é orientação dos PCN para o ensino, o recurso à
contextualização e à interdisciplinaridade, sendo uma das atividades mais propícias para isso, o ensino com jogos. Trabalhos e pesquisas já realizados neste sentido têm apresentado resultados positivos para o processo de ensino-aprendizagem (BRITO e MENEZES, 2004). No contexto da inclusão social, consideramos pertinente realizar um trabalho com surdos nessa perspectiva. Assim, objetivamos apresentar as impressões sobre o ensino de matemática com o uso de jogos em interdisciplinaridade com a história, o desenho, a informática e a arte numa turma de Pedagogia com alunos surdos. 2 Revisão Bibliográfica O Tangram foi trazido da China para o Ocidente por volta da metade do século XIX e em 1818 já era conhecido na Alemanha, França, Itália, Áustria e América, onde se tornou muito popular. A origem e significado da palavra Tangram possui muitas versões. Mesmo não a origem do nome Tangram, não é muito clara, mas todas as correntes concordam num ponto: A origem chinesa do Tangram. O nome chinês é Chi-Chiao, que significa "Os sete pedaços inteligentes", ou "o quebra-cabeça de sete sabedorias". A versão principal diz que um chinês chamado Tam deixou cair uma tábua quadrada de argila, a qual teria se partido em sete pedaços. Enquanto tentava juntá-los para formar novamente o quadrado, teria composto várias outras formas. Independente de qual a versão para origem do Tangram é a verdadeira, desde há muito tempo centenas e centenas de formas têm sido registradas em vários livros. O desafio do quebra-cabeça é recompor estas formas mudando as sete peças de posição. O Tangram tornou-se bastante popular no fim do século XVIII e no inicio do século XX. É interessante observar, que na mesma época da expansão para o Ocidente, a revista Leipziger Magaziner publicou o seguinte, sobre o Tangram: novas demonstrações matemáticas euclidianas que se tornam claras e acessíveis aos jovens através das peças triangulares que fazem parte do quebra-cabeça chinês. (W. William). As regras desse jogo consistem em usar as sete peças em qualquer montagem colocando-se lado a lado sem sobreposição, com quais é possível criar e montar cerca de 1700 figuras entre animais, pessoas, objetos, letras, números, figuras geométricas entre outros (ELFFERS, 1976). Apesar das figuras do Tangram darem a impressão de simplicidade, a sua montagem exige reflexão, sutileza e imaginação. O jogo ainda pode utilizado tanto individualmente como em grupo. O Tangram, não só auxilia os professores a introduzir os conceitos geométricos de uma maneira agradável e desafiadora, mas também é um excelente instrumento mediador no que dizem respeito a questões que desenvolvam a visualização de figuras geométricas planas. Assim, é importante que o professor estimule seus alunos na busca de soluções que, neste caso, não são padronizadas. Isto contribui para o
desenvolvimento do raciocínio e da criatividade e favorece a construção do conhecimento matemático. O Tangram pode contribuir, também, como recurso didático principalmente em conteúdos como fração, área, medidas de figuras geométricas, ângulos, perímetro, proporção, semelhança, simetrias e na percepção de formas geométricas. 3 Tangram e interdisciplinaridade O Tangram é formado por sete peças sendo 02 triângulos grandes - 02 triângulos pequenos - 01 triângulo médio - 01 quadrado 01- paralelogramo. Podemos utilizar o Tangram em geometria a partir de suas formas geométricas, explorando os conceitos de básicos de geometria (segmento, vértices, ângulos, superfícies, triângulos, quadrados, paralelogramos, etc.), podemos também explorar medidas de áreas, perímetros, frações etc. As peças do Tangram formam diversas figuras, as quais utilizaremos em outras disciplinas como Ciências, História, Artes, Matemática. 3.1 Ciências 3.2 História Na figura 1, apresentamos alguns exemplos de representação de animais com o Tangram. Estas representações podem ser utilizadas nas aulas de ciências. O tangram pode ser utilizado na representação de fatos e personagens históricos ou para ilustrar a descrição de fatos ocorridos. Na figura 2, temos alguns exemplos de uso do Tangram com esse fim. 3.3 Artes No ensino de artes podemos utilizar o Tangram (figura 3). 3.4 Matemática Podemos utilizar o tangram no ensino de frações, através de sua construção. Inicialmente, dividimos o quadrado em duas partes iguais (figura 4.a), mostrando que cada parte equivale à fração ½; em seguida, dividimos novamente cada parte em duas partes
iguais, obtendo quatro partes correspondendo cada uma a ¼ (figura 4a); depois, dividimos a meio o quadrado, com isso obtemos 8 partes que correspondem a 1/8 (figura 4b); em seguida, efetuamos mais duas divisões obtendo 16 partes que correspondem a 1/16 (figura 4c); por ultimo efetuamos algumas divisões de modo a obter as dobras que definem as linhas do Tangram (figura 4d). A partir da construção, podemos fazer algumas atividades como equivalência de frações tomando partes de formas diferentes da figura 4 com mesma área, adição e subtração de frações acrescentando ou retirando um pedaço de outro, equivalência de áreas comparando figuras geométricas de áreas equivalentes, além de outros conteúdos. 4 Desenvolvimento do trabalho Realizamos uma oficina de Tangram com uma turma de 18 alunos do curso de Pedagogia de uma instituição de ensino superior, sete dos quais sendo surdos, com atividades relacionadas a desenho, matemática, informática e arte. Como ministrantes estava presente o grupo de pesquisadores, que incluía uma das professoras daqueles alunos, além de uma intérprete de LIBRAS que atua no curso de pedagogia (figura 5). O trabalho foi feito na instituição onde os alunos estudam. Iniciamos o trabalho num laboratório de informática. Para registrar as atividades, fizemos filmagem e fotografias da oficina, algumas das quais apresentaremos mais adiante. Após apresentarmos informações históricas sobre a origem do jogo, fizemos a construção do mesmo em papel, depois fizemos alguns encaminhamentos matemáticos relativos a área e frações. Passamos então à composição de figuras no computador utilizando um programa livre, orientando os alunos sobre os comandos do mesmo incluindo o auxílio da intérprete e sugerindo outros programas semelhantes. Depois disso, passamos a uma sala de aula, e realizamos uma discussão sobre alguns aspectos de composição artística, tais como equilíbrio de forma e cor incluindo simetria. Em seguida, distribuímos uma folha com algumas silhuetas de Tangram, a partir das quais os alunos criaram (figura 6) e expuseram para a turma um painel em papel (figura 7) com as silhuetas ou outras por eles criadas e solicitamos que os grupos descrevessem sua arte. Finalmente, solicitamos uma avaliação informal e verbal dos alunos sobre o trabalho. Com relação à presença de alunos com necessidades especiais na sala, não observamos, além da necessidade de falarmos mais pausadamente para a turma, uma vez que havia uma intérprete para os surdos, outras dificuldades nos trabalhos. Além disso, no tocante ao desempenho dos alunos surdos em comparação aos não surdos, dois alunos surdos e um não-surdo se destacaram nas atividades, de modo que consideramos viável esse tipo de trabalho, no qual não observamos diferenças significativas de desempenho. Informalmente, os alunos consideraram a atividade interessante e motivadora. Os alunos
ainda solicitaram mais tempo e mais material informativo posterior. Selecionamos para destaque um trecho dos depoimentos, que descrevemos abaixo: Isso ai só vai contribuir, enriquecer e qualificar a pratica da gente na sala de aula. Porque realmente tanto trabalha a questão da criatividade, como trabalha a questão da Matemática, no português. A integração dentro de uma sala de aula. Assim sendo, consideramos, alunos e pesquisadores que uma atividade como essa pode ser útil para ajudar a subsidiar o futuro trabalho daqueles alunos como pedagogos, de modo que foi válida a oficina interdisciplinar com jogos em turmas contendo alunos com necessidades especiais. 5 Considerações finais Diante dos resultados obtidos, consideramos válido o trabalho interdisciplinar com o Tangram, como uma proposta de alternativa metodológica para a sala de aula, procurando, dentro do processo ensino-aprendizagem, desenvolver no aluno a criatividade, associada a conteúdos de geometria e aritmética. 6 Agradecimentos À professora Neila, intérprete da LIBRAS durante a oficina; À Faculdade de Ciências Humanas de Olinda FACHO, que autorizou a realização do trabalho, disponibilizando todo material necessário para a viabilização do mesmo; Aos alunos que participaram da oficina. 7 Referências BRITO, Josivaldo de Souza e MENEZES, Josinalva Estacio. Tangram com interdisciplinaridade. Mini-curso. In: Anais do VIII Encontro Nacional de Educação Matemática. Recife: UFPE-SBEM, 2004. ELFFERS, Joost. Tangram: the ancient chinese shapes game. London: Peguin Books, 1976. LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Lei nº 9394/96. FACHO. Plano de desenvolvimento institucional. Olinda: FACHO, 2002-2006. BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Congresso Nacional,1988.
Figura 1. Exemplo de aplicação do Tangram no ensino de ciências. Fonte: Elffers, 1976. Figura 2. Exemplos de aplicação do Tangram em aulas de História. Fonte: Elffers, 1976. Figura 3. Aplicação do Tangram em aulas de Arte. Fonte: Elffers, 1976. Figura 4. Aplicação do Tangram no estudo de frações. Fonte: Elffers, 1976.
Figura 5. Intérprete de LIBRAS Foto: Vladimir Andrade Figura 6. Montagem dos painéis Foto: Vladimir Andrade
Figura 7. Apresentação dos painéis Foto: Vladimir Andrade