PRODUÇÃO DE CONCRETOS COM CINZA LEVE DO BAGAÇO DE CANA-DE- AÇÚCAR

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Transcrição:

PRODUÇÃO DE CONCRETOS COM CINZA LEVE DO BAGAÇO DE CANA-DE- AÇÚCAR L.Y.C.P.HOJO Professora Mestre UEM Maringá, Brasil liriprieto@gmail.com C.H.Martins Professor Doutor UEM Maringá, Brasil chmartins@uem.br RESUMO O objetivo do trabalho foi analisar o comportamento mecânico de concretos produzidos com a substituição parcial de cimento pela cinza leve resultante da queima do bagaço de cana-de-açúcar. Forma analisados dois traços de concreto: um traço normal e um traço rico com consumo de cimento de 367,6 kg/m 3 e 393,6kg/m 3, respectivamente. Os corpos de prova ensaiados e as análises estatísticas indicaram a possibilidade de utilização de até 7,5% de substituição parcial, no traço normal, de cinza leve por cimento na produção de concretos sem perdas significativas da resistência à compressão, sendo que o consumo de cimento foi reduzido de 367,6 kg/m 3 para 339 kg/m 3. Para o traço rico as análises indicam que qualquer substituição parcial de cimento por cinza leve influencia nos resultados da resistência à compressão, mesmo a cinza leve tendo atividade pozolânica comprovada por ensaios. 1. INTRODUÇÃO O Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar do mundo, sendo sua produção destinada para açúcar e etanol. E, as indústrias desse segmento desenvolveram uma nova forma de gerar energia elétrica através da queima do bagaço de cana-de-açúcar o que produz eletricidade suficiente para suprir a demanda da usina devido a seu alto poder calorífico (Sales e Lima [1]). O processo de queima do bagaço nas caldeiras é responsável por gerar dois tipos de cinza, uma proveniente do fundo das fornalhas (cinza pesada) e outra do lavador de gases acoplado à chaminé (cinza volante ou leve). No caso, a cinza utilizada para o estudo é proveniente do lavador de gases. A geração de cinza leve na indústria que a forneceu variou de 96 a 330 ton/mês, sendo o total gerado no ano de 2012 de 2.449 toneladas. Sendo assim, estima-se que as indústrias sucroalcooleiras nacionais são responsáveis por gerarem 650 mil de toneladas de cinza leve de bagaço de cana-de-açúcar (CBC), um volume significativo de resíduos. Esse resíduo pode substituir a adubação química recomendada desde que aplicado em doses corretas, e, por ser rico em nutrientes pode ser aproveitado em solo com baixa fertilidade natural para melhorar as características físico-químicas (Feitosa et al [2]). Entretanto, quando a usina não consegue aplicá-lo integralmente no campo deve se ter cuidado com a sua disposição inadequada no meio ambiente, pois pode causar assoreamento nos recursos hídricos e também diminuir a vida útil dos aterros. 1

A Lei n 12.305:2010 [3] que instituí a Política Nacional de Resíduos Sólidos foi criada para a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental; não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e a disposição final ambientalmente adequada. Esses objetivos da legislação estimulam e obrigam as indústrias a adotar um plano de gerenciamento de resíduos sólidos, fazer a destinação correta dos rejeitos e desenvolver tecnologias para reutilizar, reciclar e/ou tratar esses resíduos. A aplicação desta Lei pode ser exemplificada por meio da seguinte citação, segundo Martins et al [4], uma das possíveis soluções para reduzir a poluição gerada na produção dos materiais de construção é a incorporação da CBC em substituição ao agregado miúdo (areia) e/ou ao cimento utilizado na fabricação de concretos de cimento Portland. A reciclagem da cinza será benéfica tanto para a indústria quanto para o meio ambiente, uma vez que, as usinas, ao fornecerem as cinzas, solucionam o problema da estocagem desse subproduto, que ocupa grande espaço no pátio, e a disposição em locais inadequados; e, o meio ambiente também é favorecido pois não receberá esse resíduo e reduzirá o consumo de matéria prima utilizada na fabricação do cimento. As pozolanas podem contribuir para o ganho de resistência mecânica e redução de água para a trabalhabilidade devido o efeito físico das partículas na distribuição granulométrica do sistema (Nita e John [5]). A reciclagem de resíduos tem sido aplicada com sucesso no setor da construção civil, diversos resíduos são utilizados na fabricação de argamassas, concretos, blocos cerâmicos e pavers. Enfim, este trabalho busca analisar a atividade pozolânica da cinza leve do bagaço de cana de açúcar de uma usina de co-geração de energia elétrica da região de Maringá - PR, para determinar a possibilidade da sua aplicação na substituição parcial do cimento Portland por essa cinza em concretos. 2. CINZA DO BAGAÇO DE CANA-DE-AÇUCAR A cinza do bagaço de cana-de-açúcar utilizada é proveniente de uma usina termoelétrica da região de Maringá. A usina gera dois tipos de resíduos, o primeiro é oriundo do multiciclone que retira as cinzas do fundo da caldeira (cinza pesada) e são dispostas diretamente no solo e, o segundo provém de um lavador de gases que está acoplado à chaminé e é disposto em uma lagoa de decantação (cinza volante), que foi o material utilizado e está apresentado na Figura 1. O material utilizado na pesquisa foi coletado no decantador, e a sua temperatura de queima foi de 800 C. Figura 1: Cinza leve na lagoa de decantação da usina A amostra coletada na lagoa de decantação tinha um aspecto de lodo, e, para o material ser armazenado sem perder suas características, ou seja, sem ser degrado ou sofrer alterações biológicas por fungos e bactérias, a amostra foi seca em temperatura ambiente por dois dias e depois seca em estufa à temperatura de 100 C±10 por 48 horas no laboratório de Materiais de Construção da Universidade Estadual de Maringá. Após a etapa de secagem, o material foi desgrumado com o auxílio de um almofariz. Essa cinza previamente seca foi armazenada em saco plástico dentro uma barrica de papelão para garantir que a umidade não danificasse e/ou provocasse a perda do material. A amostra coletada do tanque de decantação e a seca em estufa são representadas pelas figuras 2 e 3, respectivamente. 2

Figura 2: Cinza volante coletada Figura 3: Cinza volante seca em estufa 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 Caracterização dos Materiais O ensaio de granulometria foi realizado para os agregados miúdo e graúdo segundo a ABNT NBR NM 248 [6], a determinação da massa unitária para os agregados foi realizada segundo a ABNT NBR NM 45 [7], o ensaio de massa específica para o agregado miúdo foi realizado segundo a ABNT NBR NM 52 [8] e para o agregado graúdo foi utilizado a ABNT NBR NM 53 [9]. A análise granulométrica da CBC foi realizada de acordo com a ABNT NBR 7181 [10] e a massa específica da CBC foi determinada pela ABNT NBR NM 23 [11]. 3.2 Análise da Atividade Pozolânica da Cinza A atividade pozolânica foi determinada pelo Método de Chapelle modificado por Raverdy et al [12], seguindo a ABNT NBR 15895 [13], realizado pelo Laboratório de Materiais de Construção do IPT-SP (Instituto de Pesquisas Tecnológicas). 3.3 Moldagem dos corpos de prova Os ensaios de moldagem e cura dos corpos-de-prova foram realizados segundo a ABNT NBR 5738 [14]. A elaboração do concreto com substituições parciais do cimento pela cinza volante foi realizada para dois traços: o primeiro traço com consumo normal de cimento (367,6 kg/m 3 de concreto) e o segundo um traço rico (393,6 kg/m 3 de concreto). O primeiro traço em massa, denominado traço normal, foi realizado a partir do traço de referência desenvolvido por Nunes [15] : 1,000 : 2,060 : 2,940 : 0,555 (cimento : areia : brita : água), esse traço possui um consumo de cimento de 367,6 kg/m 3 de concreto. O segundo traço em massa, denominado traço rico, foi 1 : 1,85 : 2,65 : 0,55 (cimento : areia : brita : água). Esse traço tem um consumo de cimento de 393,6 kg/m 3 de concreto. Em seguida foram elaborados corpos-de-prova com cinza volante nas proporções de 0%, 2,5%, 5,0%, 7,5% e 10% para ambos os traços, foram moldados doze corpos-de-prova cilíndricos de 10 cm X 20 cm para cada substituição. Após a moldagem, os corpos-de-prova permaneceram em seus moldes por 24 h e, depois desse período, foram desmoldados e acondicionados em câmara úmida (temperatura 23 ± 2 C e umidade relativa 95 ± 5%) até a idade de ruptura de 3, 7 e 28 dias. Os ensaios de resistência à compressão foram realizados segundo a ABNT NBR 5739 [16], em uma prensa hidráulica de capacidade de carga de 100 toneladas. 3.4 Análise Estatística dos Resultados A análise estatística utilizada nos resultados de resistência à compressão foi realizada por meio da Análise de Variância (ANOVA) e o teste de Tukey. Foi utilizado o software estatístico STATISTICA 8.0 para a realização do estudo. 3

PORCENTAGEM PASSANTE (%) L.Y.C.P.Hojo e C.H. Martins, Produção de concretos com cinza leve do bagaço de cana-de-açúcar A ANOVA foi utilizada para verificar se existia diferença entre as médias das composições ou tratamentos, com determinado limite de confiança (95%), além de verificar a precisão das médias de cada composição ou tratamento (Montgomery e Runger [17]). Se a ANOVA mostrar que existem diferenças significativas entre as médias dos tratamentos, é necessário aplicar o teste de Tukey. Este teste é utilizado para verificar quais médias são estatisticamente diferentes entre sí ao nível de 5% de probabilidade. De acordo com o teste de Tukey, duas médias são diferentes entre si quando o valor absoluto da diferença entre eles for maior do que a diferença mínima significativa (d.m.s) calculada (Brito [18]). 4. RESULTADOS 4.1 Caracterização dos Materiais O agregado miúdo apresentou massa específica de 2,631 g/cm³, massa unitária no estado solto de 1,548 g/cm³, diâmetro máximo característico de 1,20 mm e módulo de finura de 1,90. Figura 4: Curva de distribuição granulométrica do agregado miúdo O agregado graúdo apresentou massa específica de 2,746 g/cm³, massa unitária no estado solto de 1,587 g/cm³, diâmetro máximo característico de 19,0 mm e módulo de finura de 6,830. A cinza apresentou massa específica de 2,49 g/cm 3. Figura 5: Curva de distribuição granulométrica do agregado graúdo 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Curva DIÂMETRO DOS GRÃOS (mm) Figura 6:. Curva granulométrica da cinza leve 4

4.2 Análise da Atividade Pozolânica da Cinza O índice de atividade pozolânica foi realizado segundo a ABNT NBR 15.895 [13] no IPT-SP e o valor obtido foi de 480 mg Ca(OH) 2 /g amostra, conforme laudo na figura 7. Esse resultado é maior que o valor mínimo exigido pela norma de 436 mg Ca(OH) 2 /g amostra. Portanto, este ensaio permite afirmar que a cinza leve possui atividade pozolânica. Figura 7: Laudo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) para a CBC 4.3 Resistência Mecânica dos corpos de prova O traço normal utilizado para analisar as propriedades mecânicas foi 1 : 2,06 : 2,94 : 0,55 (cimento : areia : brita : água) de Nunes [15]. Inicialmente foi realizado um traço de referência ou padrão" com 0% de substituição e, em seguida as substituições. O fator a/ag foi determinado pela relação da água com o aglomerante, já que a cinza está substituindo o cimento. A figura 8 ilustra os valores das resistências médias à compressão aos 3, 7 e 28 dias para cada uma das substituições. A tabela 1 mostra os resultados da análise ANOVA dos resultados obtidos aos 28 dias de cura para cada uma das substituições parciais de cimento por cinza leve. Figura 8: Resistência à compressão média dos corpos de prova do traço normal Tabela 1 - Análise ANOVA para a resistência à compressão dos corpos de prova aos 28 dias Fonte de Graus de Soma dos Média F Pvalor variação liberdade quadrados quadrática Tratamentos 4 8,27 2,07 3,84 0,020026 * Erro residual 18 9,70 0,54 Total 22 17,97 *Significativo ao nível de 5% de probabilidade (Pvalor < 0,05) 5

Os resultados mostram que os corpos de prova referência alcançaram uma resistênca média à compressão de 29,07 MPa aos 28 dias. Estatisticamente, o resultado da análise ANOVA mostrou que houve significância entre os 4 tratamentos (2,5 %, 5 %, 7,5 % e 10 % de susbstituição de cimento por cinza leve). Como o Pvalor apresentado na tabela 1 foi < (menor) do que 0,05, é válido afirmar que as médias de resistência à compressão são diferentes entre si ao nível de 5% de probabilidade, ou seja, pelo menos uma média é diferente entre si com um limite de confiança de 95%. Para saber quais médias são significativamente diferentes entre si, foi aplicado o teste de Tukey. A tabela 2 apresenta os valores médios de resistência à compressão para os corpos de prova referência e para os produzidos com 2,5%, 5%, 7,5% e 10% de de susbstituição parcial de cimento por cinza leve, bem como o teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade. Tabela 2- Teste de Tukey para a resistência à compressão aos 28 dias dos corpos de prova Tratamento Média (MPa) Referência 29,07 a 2,5% 29,53 a 5% 29,36 a 7,5% 29,23 a 10% 27,80 b Notas: Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si ao nível de 5% de probabilidade pelo Teste de Tukey É possível observar que não houve diferenças significativas entre os valores médios de resistência à compressão dos corpos de prova referência e aqueles fabricados com 2,5% a 7,5% de subsitutição parcial de cimento por cinza leve. Porém, a média de resistência à compressão com 10% de cinza mostrou-se inferior e significativamente diferente das demais num limite de confiança de 95%. Esses resultados indicam a possibilidade de utilização de até 7,5% de substituição parcial de cinza leve por cimento na produção de concretos sem perdas significativas da resistência à compressão, para o traço normal. É importante ressaltar que o traço normal com substituição de 7,5% de cinza leve foi produzido com um consumo de cimento de 339,5 kg/m 3 e alcançou resistência média à compressão de 29,23 MPa, valor um pouco acima do traço padrão com 0% de cinza, com consumo de cimento de 367,6 kg/m 3 e resistência de 29,07 MPa. Esses dados mostram que a substituição de cimento por cinza volante pode contribuir para redução no consumo de cimento nos concretos e argamassas, e também reduzir o impacto ambiental causado durante a fabricação do cimento. A seguir é apresentado os resultados obtidos para o traço rico. O segundo traço utilizado para analisar as propriedades mecânicas foi 1 : 1,85 : 2,65 : 0,55 (cimento : areia : brita : água). Inicialmente foi realizado um traço de referência com 0% de substituição e, em seguida as substituições parciais de cimento por cinza leve. A figura 9 apresenta a representação gráfica das resistências à compressão a 3, 7 e 28 dias para cada uma das substituições e a tabela 3 mostra os resultados da análise ANOVA. Figura 9: Resistência à compressão dos corpos de prova do traço rico 6

Tabela 3 - Análise ANOVA para a resistência à compressão dos corpos de prova aos 28 dias Fonte de Graus de Soma dos Média F Pvalor variação liberdade quadrados quadrática Tratamentos 4 15,11 3,78 3,66 0,032932 * Erro residual 18 13,41 1,03 Total 22 28,52 *Significativo ao nível de 5% de probabilidade (Pvalor < 0,05) Os resultados mostram que os corpos de prova referência alcançaram uma média de 32,36 MPa de resistência à compressão aos 28 dias. Estatisticamente, o resultado da análise ANOVA mostrou que houve significância entre os 4 tratamentos (2,5 %, 5 %, 7,5 % e 10 % de susbstituição de cimento por cinza leve). Como o Pvalor apresentado na tabela 3 foi < (menor) do que 0,05, ou seja, resultado análogo ao do traço normal. Para saber quais médias são significativamente diferentes entre si, foi aplicado o teste de Tukey. A tabela 4 apresenta os valores médios de resistência à compressão para os corpos de prova referência e para os produzidos com 2,5%, 5%, 7,5% e 10% de de susbstituição parcial de cimento por cinza leve, bem como o teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade. Tabela 4 - Teste de Tukey para a resistência à compressão aos 28 dias dos corpos de prova Tratamento Média (MPa) Referência 32,36 a 2,5% 31,20 b 5% 29,91 b 7,5% 30,48 b 10% 29,76 b Notas: Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si ao nível de 5% de probabilidade pelo Teste de Tukey É possível observar que houve diferenças significativas entre os valores médios de resistência à compressão dos corpos de prova referência e aqueles produzidos com subsitutição parcial de cimento por cinza leve. Dessa forma, podemos afirmar que para o traço rico qualquer substituição parcial de cimento por cinza leve influencia nos resultados da resistência à compressão dos corpos de prova. A análise da figura 9 permite afirmar que houve um aumento regular das resistências aos 3, 7 e 28 dias, porém houve uma diminuição nos valores médios da resistência mecânica do concreto aos 28 dias com a adição de cinza leve. Para o traço rico, o teste de Tukey evidencia que apesar da cinza leve ter atividade pozolânica comprovada, a sua influência na perda de resistência é maior no traço rico, uma vez que, comparando com o traço normal no qual o consumo de cimento é menor, a substituição do cimento no traço rico se torna mais sensível e isso se reflete na resistência mecânica à compressão desse concreto. 5. CONCLUSÕES Foi verificada que a substituição de até 7,5% no traço normal obteve uma resistência à compressão média de 29,07 MPa, valor de resistência semelhante ao concreto sem substituição de cimento por cinza leve. Esse resultado foi comprovado pela análise estatística com ANOVA e Teste de Tukey. Essa substituição de até 7,5 % de cimento por cinza leve no traço normal, também reduziu o consumo de cimento de 367,6 kg/m3 para 339 kg/m3, o que é benéfico para o meio ambiente pois a incorporação da cinza no cimento irá reduzir a poluição causada pelas indústrias de cimento durante a sua fabricação e esta consequentemente pode diminuir o consumo dos recursos naturais utilizados no processo. Para o traço rico, os resultados dos corpos de prova e da análise estatística evidenciaram que apesar da cinza leve ter atividade pozolânica comprovada por ensaios de laboratório, qualquer substituição parcial de cimento por cinza leve altera a resistência à compressão, isto é, a substituição de cinza leve por cimento altera mais significativamente os valores da resistência no traço rico que no traço normal. 7

Em síntese, conclui-se que a cinza leve obtida da queima do bagaço de cana-de-açúcar pode substituir parcialmente o cimento em traço com consumo de cimento de aproximadamente 367,6 kg/m 3 de concreto, já que esta apresentou um elevado índice de pozolanicidade e uma resistência mecânica semelhante para o concreto com substituição parcial de até 7,5 % de cimento por esse resíduo. Os resultados encontrados foram para os dois traços propostos, porém como a cinza leve apresentou índice de atividade pozolânica segundo a ABNT NBR 15.895 [13] há possibilidade de sua utilização substituindo o cimento parcialmente para outros traços. Ressalta-se que os resultados obtidos no trabalho são válidos para a cinza leve analisada, e que se for utilizada outra cinza, há necessidade da realização de novos ensaios para comprovação da eficácia desse resíduo como substituto parcial do cimento. 6. AGRADECIMENTOS À Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal e Nível Superior) e Fundação Araucária de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Paraná, pelos recursos disponibilizados. 7. REFERÊNCIAS [1] Sales, A; Lima, S.A. (2010) Use of Brazilian sugarcane bagasse ash in concrete as sand replacement. Waste management, Vol. 30, p. 1114 1122. [2] Feitosa, D. G.; Maltoni, K. L.; Silvia, I. P. F. (2009). Avaliação da Cinza, Oriunda da Queima do Bagaço da Cana de Açúcar, na Substituição da Adubação Química Convencional para Produção de Alimentos e Preservação do Meio Ambiente. Rev. Bras. de agroecologia, Curitiba, v. 4, n. 2, p. 2412-2415. [3] Brasil (2010). Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. [4] Martins, C. H.; Machado, P. H. T.; Altoé, S. P. S. (2011). Produção de corpos de prova de concreto com cinza do bagaço de cana-de-açúcar. In: VII Encontro Tecnológico de Engenharia Civil e Arquitetura, Maringá, Brasil. [5] Nita, C; John V. M. (2007). Materiais pozolânicos: o metacaulim e a sílica ativa. Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP. Departamento de Engenharia de Construção Civil; BT/PCC/451, São Paulo, EPUSP. [6] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2003). NBR NM 248. Agregados Determinação da composição granulométrica. Rio de Janeiro. [7] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2006). NBR NM 45. Agregados - Determinação da massa unitária e do volume de vazios. Rio de Janeiro. [8] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2009). NBR NM 52. Agregado miúdo - Determinação de massa específica e massa específica aparente. Rio de Janeiro. [9] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2009). NBR NM 53. Agregado graúdo determinação de massa específica, massa específica aparente e absorção de água. Rio de Janeiro. [10] Associação Brasileira de Normas Técnicas (1998). NBR 7181. Solo análise granulométrica. Rio de Janeiro. [11] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2001). NBR NM 23. Cimento Portland e outros materiais em pó Determinação da massa específica. Rio de Janeiro. [12] Raverdy M.,Brivot F.,Paillere A. M., Dron, R. (1980). Appreciation de l activite pouzzolanique des constituants secondaires, 7 th International Congress Chemical Cement, Paris, III, IV, pag 36-41. [13] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2010). NBR 15895. Materiais pozolânicos Determinação do teor de hidróxido de cálcio fixado Método Chapelle modificado. Rio de Janeiro. [14] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2008). NBR 5738. Concreto Procedimento para moldagem e cura de corpos-de-prova. Rio de Janeiro. [15] Nunes, I. H. S.(2009). Estudo das características físicas e químicas da cinza do bagaço de cana-de-açúcar para uso na construção. 67 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Urbana) Universidade Estadual de Maringá, Maringá. [16] Associação Brasileira de Normas Técnicas (2007). NBR 5739. Concreto Ensaio de compressão de corposde-prova cilíndricos. Rio de Janeiro. [17] Montgomery, D.C.; Runger, G.C. (2013). Estatística aplicada e probabilidade para engenheiros. 5ª ed. Editora LTC, Rio de Janeiro, Brasil. [18] Brito, A. L. F. (20070. Protocolo de avaliação de materiais resultantes da estabilização por solidificação de resíduos. 2007. Tese Doutorado (Pós-Graduação em Engenharia Ambiental), Universidade Federal de Santa Catarina, Santa Catarina, Brasil. 8