As Gerações de Direito Fundamentais e as suas tendências Autora: Amanda Negreiro Cavalcanti 1. Introdução A iniciar os estudos sobre Direito Constitucional percebe-se que ainda permanece em meio a grande maioria dos estudiosos desta área certa divergência a respeito da nomenclatura a ser dada à evolução histórica de inserção dos direitos fundamentais nas Constituições. Alguns entendem que a terminologia correta seria a expressão geração, e outros afirmam que o termo correto seria dimensão. A fim de esclarecer melhor esta dicotomia, neste trabalho foram postas as diferentes posições, bem como um estudo relacionado às gerações ou dimensões dos direitos fundamentais. O Direito Constitucional configura-se como Direito Público fundamental por referir-se diretamente à organização e funcionamento do Estado, à articulação dos elementos primários do mesmo e ao estabelecimento das bases da estrutura política. (LENZA, 2014)
LENZA, 2014. Esquematização do Constitucionalismo. O grande mestre Paulo Bonavides faz referência expressa ao termo gerações dos direitos fundamentais para explicar a inserção histórica deles nas constituições dos países, sendo este posicionamento seguido por vários outros constitucionalistas. Explica Bonavides: os direitos fundamentais passaram na ordem institucional a manifestar-se em três gerações sucessivas, que traduzem sem dúvida um processo cumulativo e quantitativo... Com o passar dos tempos, o próprio Paulo Bonavides ponderou com relação ao termo gerações, segundo nos relata Dimitri Dimoulis, nos seguintes termos: Aliás, o próprio Bonavides, no desenrolar de seu texto, acaba reconhecendo a proeminência científica do termo dimensões em face do termo gerações, caso este último venha a induzir apenas sucessão cronológica e, portanto, suposta caducidade dos direitos das gerações antecedentes, o que não é verdade (BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19ª Edição, São Paulo: Editora Malheiros, 2006, p. 571-572).
Pelos argumentos acima elencados, fica evidente que o termo mais coerente com a evolução dos direitos fundamentais seria a expressão dimensão, e não gerações, conforme é utilizado por parte da doutrina. A exclusão do termo geração seria em virtude da impossibilidade de uma dimensão dos direitos apagarem a dimensão anterior, uma vez que os direitos se complementam jamais se excluem. Ressalte-se que o autor deste artigo irá utilizar no bojo deste as expressões gerações e dimensões como sinônimas, uma vez que vários constitucionalistas vêm fazendo desta forma, mas fica a ressalva acima trabalhada. Agora serão analisadas as gerações ou dimensões dos direitos fundamentais. 2. Os Direitos e as Garantias Fundamentais A localização dos direitos e garantias fundamentais está na CF/88, em seu Título II, onde classifica o gênero em importantes grupos, a saber: Direitos e deveres individuais e coletivos; Direitos sociais; Direitos de nacionalidade; Direitos políticos; Partidos políticos. Os Direitos Fundamentais visam assegurar a todos uma existência digna, livre e igual, criando condições à plena realização das potencialidades do ser humano. Nas palavras do eminente jurista Alexandre de Moraes podem ser definidos como O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana. Por serem indispensáveis à existência das pessoas, possuem as seguintes características: 1. Inalienabilidade: são direitos intransferíveis e inegociáveis.
2. Imprescritibilidade: não deixam de ser exigíveis em razão do não uso. 3. Irrenunciabilidade: nenhum ser humano pode abrir mão da existência desses direitos. 4. Universalidade: devem ser respeitados e reconhecidos no mundo todo. 5. Limitabilidade: não são absolutos. Podem ser limitados sempre que houver uma hipótese de colisão de direitos fundamentais. É importante salientar que esses direitos são variáveis, modificando-se ao longo da história de acordo com as necessidades e interesses do homem. Essa transformação é explicada com base na teoria das gerações de direitos fundamentais, criada a partir do lema revolucionário francês (liberdade, igualdade, fraternidade) e que pode ser assim resumida: 3. Direitos da primeira geração ou direitos de liberdade Surgiram nos séculos XVII e XVIII e foram os primeiros reconhecidos pelos textos constitucionais. Compreendem direitos civis e políticos inerentes ao ser humano e oponíveis ao Estado, visto na época como grande opressor das liberdades individuais. Incluem-se nessa geração o direito à vida, segurança, justiça, propriedade privada, liberdade de pensamento, voto, expressão, crença, locomoção, entre outros. (absenteísmo estatal) Alguns documentos históricos são marcantes para a configuração e emergência do que os autores chamam de direitos humanos de 1ª geração (séculos XVII, XVIII e XIX), destacando-se: Magna Carta de 1215, assinada pelo rei João Sem Terra ; Paz de Westfália (1648); Habeas Corpus Act (1679); Bill of Rights (1688); Declarações, seja a americana (1776), seja a francesa (1789). 4. Direitos da segunda geração ou direitos de igualdade
Surgiram após a 2ª Guerra Mundial com o advento do Estado - Social. São os chamados direitos econômicos, sociais e culturais que devem ser prestados pelo Estado através de políticas de justiça distributiva. Abrangem o direito à saúde, trabalho, educação, lazer, repouso, habitação, saneamento, greve, livre associação sindical, etc. (Surgem pela primeira vez na Constituição brasileira de 1934) Essa perspectiva de evidenciação dos direitos sociais, culturais e econômicos, bem como dos direitos coletivos, ou de coletividade, correspondendo aos direitos de igualdade (substancial, real e material, e não meramente formal), mostra-se marcante em alguns documentos, destacando-se: Constituição do México, de 1917; Constituição de Weimar, de 1919, na Alemanha, conhecida como a Constituição da primeira república alemã; Tratado de Versalhes, 1919 (OIT); No Brasil, a Constituição de 1934 (lembrando que nos textos anteriores também havia alguma previsão). 5. Direitos da terceira geração ou direitos de fraternidade/solidariedade São considerados direitos coletivos por excelência, pois estão voltados à humanidade como um todo. Nas palavras de Paulo Bonavides são direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm por primeiro destinatário o gênero humano mesmo, em um momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta. Incluem-se aqui o direito ao desenvolvimento, à paz, à comunicação, ao meio-ambiente, à conservação do patrimônio histórico e cultural da humanidade, entre outros. (Evidencia os direitos transindividuais)
A partir dai novas gerações passaram a ser identificadas. Entre elas a mais aceita pela doutrina é a quarta geração de direitos criada pelo professor Paulo Bonavides, para quem pode ser traduzida como o resultado da globalização dos direitos fundamentais de forma a torná-los universais no campo institucional. Enquadram-se aqui o direito à informação, ao pluralismo e à democracia direta. Por fim, ainda que se fale em gerações, cabe deixar claro que não existe nenhuma hierarquia ou sucessão entre os direitos fundamentais, devendo ser tratados como valores interdependentes e indivisíveis. Além do mais, a evolução desses direitos não seguiu a ordem cronológica liberdade, igualdade, fraternidade em todos os lugares ou situações históricas, ou seja, nem sempre foram reconhecidos os direitos de primeira geração para somente depois serem reconhecidos os de segunda e terceira. Dessa forma, a doutrina mais moderna vem defendendo a ideia de acumulação de direitos, preferindo, assim, a utilização do termo dimensões de direitos fundamentais. 6. Direitos fundamentais da quarta dimensão Na orientação de Norberto Bobbio, essa dimensão de direitos decorreria dos avanços no campo da engenharia genética, ao colocarem em risco a própria existência humana, em razão da manipulação do patrimônio genético. Para o mestre italiano:... já se apresentam novas exigências que só poderiam chamar-se de direitos de quarta geração, referentes aos efeitos cada vez mais traumáticos da pesquisa biológica, que permitirá manipulações do patrimônio genético de cada indivíduo.. Por outro lado, Bonavides afirma que a globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos da quarta dimensão, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado social, destacando-se os direitos a: Democracia (direta); Informação;
Pluralismo. 7. Direitos fundamentais da quinta dimensão O direito à paz foi classificado por Karel Vasak como de 3ª dimensão. Bonavides, contudo, entende que o direito à paz deva ser tratado em dimensão autônoma, chegando a afirmar que a paz é axioma da democracia participativa, ou, ainda, supremo direito da humanidade. Referências Bibliográficas: LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 18ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014. MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: Teoria Geral. 4ªed. São Paulo: Atlas, 2002. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19ª Edição, São Paulo : Editora Malheiros, 2006. DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2007. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 11ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. [1] Direitos humanos fundamentais: Teoria Geral. 4ªed. São Paulo: Atlas, 2002. [2] Curso de Direito Constitucional. 13ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003.