UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FACULDADE DE CIÊNCIAS EDUCAÇÃO E LETRAS FACE CURSO DE PEDAGOGIA



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Transcrição:

1 UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FACULDADE DE CIÊNCIAS EDUCAÇÃO E LETRAS FACE CURSO DE PEDAGOGIA Élida Cristina Ferreira da Silva Regiane de Souza Valdete Silva Queiroga ETNOMATEMÁTICA E PRÁTICA DE PROFESSORAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Governador Valadares 2009

2 ÉLIDA CRISTINA FEREIRA DA SILVA REGIANE DE SOUZA VALDETE SILVA QUEIROGA ETNOMATEMÁTICA E PRÁTICA DE PROFESSORAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Monografia para obtenção da graduação em Pedagogia, apresentada à Faculdade de Ciências Educação e Letras da Universidade Vale do Rio Doce. Orientadora: Prof. Dra. Maria Celeste Reis Fernandes de Souza Governador Valadares 2009

3 ETNOMATEMÁTICA E PRÁTICA DE PROFESSORAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Monografia para obtenção da graduação em Pedagogia, apresentada à faculdade de Ciências Educação e Letras da Universidade Vale do Rio Doce. Governador Valadares, de de. Banca Examinadora: Prof Dra Maria Celeste Reis Fernandes de Souza Orientadora Universidade Vale do Rio Doce Prof. Ms. Nádia Jorge Medeiros Silva Universidade Vale do Rio Doce Prof. Ms. Hérika Nunes Torres Fonseca Universidade Vale do Rio Doce

4 DEDICATÓRIA Dedicamos a DEUS, amigo que esteve/estará sempre presente em todos os momentos, nos abençoando com sua presença.

5 AGRADECIMENTO A todos que de alguma forma contribuíram para esta conquista. A orientadora que muito nos instigou para que atingíssemos o nível de uma boa pesquisa, nossos sinceros agradecimentos. Aos pais pelos princípios éticos ensinados. Em especial a DEUS que foi sempre fiel. Teremos eternos agradecimentos a todos vocês.

6 RESUMO Fundamentada na perspectiva Etnomatemática, esta pesquisa aborda tal conceito relacionado à Prática de Professoras na Educação Infantil. Tendo como propósito analisar de que forma a Etnomatemática comparece nas práticas matemáticas escolares na percepção de professoras que atuam na Educação Infantil definiu-se como objetivos específicos da investigação analisar através das práticas relatadas as concepções matemáticas das professoras, suas práticas matemáticas escolares e como as vivências dos/das alunos/as são acolhidas nessas práticas matemáticas escolares. A pesquisa realizada em uma abordagem qualitativa utilizou como instrumento de coleta de dados, entrevistas com professoras que atuam na Educação Infantil e são alunas de um curso de formação de professores/as em Educação Infantil. Os resultados indicam a presença de uma perspectiva tradicional no ensino da matemática e a predominância de práticas construtivistas. Em decorrência dessa presença e predominância construtivista identifica-se um apagamento do Sujeito, fato relevante no pensamento Etnomatemático e que remete a reflexão sobre o processo educativo de crianças e a busca da construção de novas pesquisas no campo da Etnomatemática. Palavras-chave: Etnomatemática. Sujeito. Prática.

7 ABSTRACT Based on Ethnomathematics perspective, this research addresses this concept related to the Practice of Teachers in the infantile Education. With the intent to examine how the Ethnomathematics attends school mathematical practices in the perception of teachers working in the infantile education was defined as specific research examining the practices reported by the conceptions of mathematics teachers, their school mathematical practices and how the experiences of / of students / accepted these practices are mathematical school. The investigation of a qualitative approach used as a tool for data collection, interviews with teachers working in childhood and are students of a training course teacher in the infantile education. The results indicate the presence of a traditional perspective in the teaching of mathematics and the prevalence of constructivist practices. Because of this presence and prevalence constructivist identified a deletion of the subject, a relevant fact in mind Ethnomathematics and to reflections on the educational process of children and seeking to build new research in the field of Ethnomathematics. -key: Ethnomathematics. Subject. Practices.

8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO...09 1 EDUCAÇÃO INFANTIL, ETNOMATEMÁTICA E FORMAÇÃO DE PROFESSORAS..12 1.1 UNIVERSO INFANTIL E EDUCAÇÃO INFANTIL...12 1.2 ETNOMATEMÁTICA...15 1.3 FORMAÇÃO DE PROFESSORAS...18 2 A CONCEPÇÃO DAS PROFESSORAS SOBRE A MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE AS PRÁTICAS NOS DIZEM...20 2.1 A FORTE PRESENÇA DA IDÉIA CONSTRUTIVISTA...22 2.2 PRESENÇA DA CONCEPÇÃO TRADICIONAL...26 3. ETNOMATEMÁTICA E O APAGAMENTO DO SUJEITO...27 CONCLUSÃO...31 RFERÊNCIAS...32

9 INTRODUÇÃO Nossa reflexão sobre o tema desta pesquisa, Etnomatemática e prática de professoras na Educação Infantil, iniciou no 6º período do curso de Pedagogia quando começamos os estudos na disciplina Fundamentos e Metodologia da Matemática na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental. No decorrer dos nossos estudos, surgiram em sala de aula discussões e conceitos como: Etnomatemática, numeramento e letramento etc. Foi durante os estudos desta disciplina que aconteceu a tomada de decisão de que a Etnomatemática seria o foco de pesquisa da nossa produção acadêmica. A Etnomatemática é compreendida por nós, como uma tendência no campo da Educação Matemática e que propõe outra visão de ensino, segundo a qual o sujeito tem a possibilidade de relacionar suas experiências fora da escola com os conhecimentos escolares. E nesse sentido, Knijnik (2004), interpretando D Ambrósio aponta que a proposta Etnomatemática (...) teve sua origem na busca de entender o fazer e o saber matemático de culturas marginalizadas (KNIJNIK, 2004, p22.). A autora salienta que a mesma remete, sobretudo à dinâmica da evolução desses fazeres e saberes, resultante da exposição a outra cultura (ibidem, p.22). Daí percebe-se a relevância dada ao pensamento Etnomatemático no que se refere à recuperação das histórias presentes e passadas dos diferentes grupos culturais (ibidem, p.22). Mais interessante ainda, na nossa compreensão é que a Etnomatemática vai muito além desta recuperação das histórias, pois esta dá espaço àqueles grupos que têm sido sistematicamente marginalizados por não se constituírem nos setores hegemônicos da sociedade (ibidem, p.22). A ação do professor é fundamental neste processo, pois o mesmo é quem irá proporcionar ao/a aluno/a, meios que favorecerão sua autonomia, o pensamento e a acolhida da sua cultura. Isso dará a partir da mediação das ações educativas através de sua prática, possibilitando mudanças em suas ações educativas tendo uma postura metacognitiva que é uma reflexão sobre sua própria aprendizagem, como relata Dias (2008). É nesse sentido da ação docente que, parece-nos, há uma lacuna entre a teoria e prática do/a professor/a, lacuna esta que precisa ser ultrapassada. É importante destacar o processo de

10 repensar a prática do/a professor/a no qual o mesmo amplia o seu olhar refletindo sobre suas ações para possibilitar um processo de ensino e aprendizagem mais efetivo. (Dias, 2008). Mediante isso, vemos a importância da pesquisa que se volta para as concepções matemáticas das professoras procurando compreender como o ensino da matemática vem sendo realizado no processo educativo na Educação Infantil. Atentas a importância de que as práticas vivenciadas no cotidiano das crianças tenha seu lugar na sala de aula é que nos voltamos para o campo da Etnomatemática e da ação de professoras que atuam na Educação Infantil. Diante dessas inquietações que nos confrontamos com as discussões sobre Etnomatemática e ação docente, definimos como PROBLEMA DE PESQUISA desta investigação: De que forma a Etnomatemática comparece nas práticas matemáticas escolares na percepção de professoras que atuam na Educação Infantil? Assim, o OBJETIVO GERAL da pesquisa está em analisar de que modo a Etnomatemática comparece nas práticas escolares na percepção das professoras que atuam na Educação Infantil. Ao analisar de que forma a Etnomatemática comparece nas práticas escolares na percepção de professores que atuam na Educação Infantil, teremos como OBJETIVOS ESPECÍFICOS: identificar as concepções matemáticas das professoras; identificar no relato das professoras as práticas matemáticas escolares e verificar nesses relatos como as vivências dos/das alunos/as são acolhidas nas práticas matemáticas escolares. Utiliza-se nesta pesquisa, uma abordagem qualitativa e como técnica de coleta de dados a entrevista, a partir da contribuição de quatro professoras de Educação Infantil e que cursam Complementação de Estudos para a Docência na Educação Infantil 1 da Universidade Vale do Rio Doce. Deste modo os relatos das mesmas são questões norteadoras para a análise feita pesquisa. Os resultados desta investigação serão apresentados em três capítulos. No primeiro capítulo apresentaremos Educação infantil, Etnomatemática e Formação de professoras, no segundo capítulo discutiremos a Concepção das Professoras sobre Matemática na Educação Infantil e por último mostraremos no capítulo intitulado Etnomatemática e o apagamento do sujeito, posto que este sujeito (a criança) pouco se apresenta na escola, com suas experiências e culturas. Este fato é relevante ao se pesquisar em uma perspectiva Etnomatemática que considera 1 Curso oferecido pela Universidade Vale do Rio Doce UNIVALE, março a outubro de 2009.

11 o sujeito, pois remete a reflexões sobre o processo educativo e a busca da construção de novas pesquisas no campo da Etnomatemática. Temos como intuito da nossa pesquisa promover uma contribuição significativa nas produções acadêmicas geradas no campo da Educação Matemática e do curso de Pedagogia da UNIVALE, como, também, contribuir com aqueles que virão e desejarão estudar neste campo, o que, conseqüentemente, se somará a esta investigação.

12 1 EDUCAÇÃO INFANTIL, ETNOMATEMÁTICA E FORMAÇÃO DE PROFESSORAS. Neste primeiro capítulo propomos a discussão sobre concepções de criança e de Educação Infantil, com objetivo de compreender os propósitos da Educação Infantil e do ensino da matemática para crianças. Apresentaremos, também, a Etnomatemática como uma abordagem para a renovação das práticas educativas e que buscam o sujeito como portador de historicidade do conhecimento Knijnik (2004). E por fim, abordaremos o tema Formação de Professoras com finalidade de apresentar a trajetória histórica de formação das professoras da Educação Infantil apontando a importância dessa formação. Estabelecemos, assim, relações entre Educação Infantil, Etnomatemática e Formação de professoras. 1.1 UNIVERSO INFANTIL E EDUCAÇÃO INFANTIL Damazio, estudioso da Educação Infantil, cita em Locke, filósofo inglês, a concepção de criança na teoria empirista, segundo a qual o indivíduo nasce como um balde vazio, no qual a experiência do mundo vai depositando sua substância, ou seja a criança então é um ser incompleto, um vazio inicial já que sua mente é como uma página em branco, que deve ser preenchida ao sabor dos fatos exteriores (DAMAZIO, 1994 p.12). Ainda nesta mesma concepção, o autor cita Descartes, filósofo francês, na teoria racionalista, segundo a qual a criança é um adulto pré-formado, que já traz em si as probabilidades de seu crescimento intelectual. Ao invés de um resultado do meio, a criança será o resultado de sua própria razão, que já nasce com ela e que ela precisa ser desenvolvida. (ibidem. P.13). Portanto, nessas duas correntes de pensamento, na sua concepção de criança, a mesma não é percebida como um indivíduo que tenha condições de agir, pensar e questionar, ou seja, esses processos são preestabelecidos pelos adultos. Ela é vista como um ser em desenvolvimento que necessita do auxilio de adultos, não priorizando também suas experiências já adquiridas. Assim, de acordo com as teorias citadas acima, percebe-se que a criança se desenvolve com a intervenção do adulto. Mediante essas teorias o autor destaca a de Piaget, por ser uma teoria que, segundo ele, tem uma nova maneira de pensar a criança, ou seja, a de olhar como

13 sujeito da ação sobre o meio, evidenciando que a criança é um sujeito em seu processo de crescimento, com suas possibilidades orgânicas e mentais e portadoras de seus próprios meios de viver e conhecer a realidade (DAMAZIO, 1994, p.17). Foi então a partir da teoria de Piaget, que começou a valorização do pensamento do sujeito, a criança como um ser que pensa e tem possibilidades de agir de acordo com as propostas que o meio lhe oferece, assim também o termo construir conhecimentos a partir das ações da criança sobre o meio. No entanto cabe aos educadores refletir sobre quais ações devem ser propiciadas para que esse processo de construção de conhecimentos aconteça. Alguns desses modos de conceber a criança vão sendo esquecidos historicamente, e alguns deles vão configurando modos de compreender a infância, documentos oficiais e a própria constituição do que chamamos Educação Infantil. No que se refere à Educação Infantil iremos apresentar um breve histórico, seus significados de acordo com alguns autores. Anete Abramowicz e Gisela Wajskop (1995), nos trazem um breve histórico de como eram os espaços de Educação Infantil, sendo que entre os séculos XVIII e XIX, é que surgiram às primeiras instituições de Educação Infantil, denominadas escolas de tricotar fundada por Padre Oberlin, creches, destacando que creche é uma palavra de origem francesa e significa manjedoura, fundadas por Marbean e jardins de infância os Kundergarten, fundados por Froebel (ABRAMOWICZ e WAJSKO, 1995, p.9). As autoras ressaltam que os espaços relacionados aos cuidados com a criança, ou seja, as creches. Nessas creches os espaços e as rotinas eram organizados em função de idéias do que significa educar tais crianças, sendo sua função, de assistência, custódia e higiene, onde se constituíam os centros do processo educativo (ABRAMOWICZ, WAJSKOP, 1995 p.10). No Brasil as preocupações com a Educação Infantil por parte do governo, sociedade civil, educadores, desencadeiam década de 80 uma série de debates em relação ao processo educativo das crianças em creches, que teve início com os movimentos populares dos anos 1970. A partir de então as creches passaram a ser pensadas e reivindicadas com um lugar de educação e cuidados coletivos das crianças de zero a seis anos. Educar deixou de ser apenas cuidar, assistir e higienizar (ABRAMOWICZ, WAJSKOP, p.10). Mediante essas discussões consolida-se o direito à educação de crianças de 0 a 6 anos, e hoje este é garantido por lei em creches e escola, como é firmado no Estatuto da Criança e Adolescente. Em julho de 1990, o Estatuto da Criança e Adolescente reafirma em seu artigo nº

14 54, parágrafo IV: É dever de o Estado assegurar à criança e adolescente (...), atendimento em creche e pré-escola ás crianças de zero a seis anos de idade. No Referencial Curricular da Educação Infantil, editado pelo Ministério da Educação MEC, documento que orienta essa modalidade de educação norteando processos e práticas educativas para as instituições de Educação Infantil se apresentam, também, além do reconhecimento do direito a Educação Infantil, concepções sobre criança. Este documento vem nos trazer concepção de criança e as mudanças que ocorreram ao longo de nossa história nessas concepções. A necessidade de se olhar a criança em todo seu contexto social e familiar; valorizar a sua diversidade cultural aparece com destaque no documento. O documento afirma que as constroem o conhecimento a partir das suas relações com o outro e o meio em que vive. Enfim compreender, conhecer e reconhecer esse processo da criança é um grande desafio da educação infantil e dos profissionais (RCNEI, 1998 p 21). Na perspectiva do nosso foco de trabalho, que é analisar de que modo a Etnomatemática aparece nas práticas escolares na percepção de professoras que atuam na Educação Infantil, destacaremos as orientações que o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil apresentam em relação à criança e a matemática. De acordo com o Referencial Curricular, as crianças desde que nascem, estão imersas em um universo do quais os conhecimentos matemáticos é parte integrante. Elas participam de uma série de situações envolvendo números, relações entre quantidades, noções de espaço (RCNEI, 1998, p 207). Assim as crianças estão a todo instante envolvidas em práticas que contemplam saberes matemáticos, mas ao mesmo tempo essas práticas não são percebidas, principalmente no que diz respeito à escola, que não trazem essas mesmas práticas para ampliação dos conhecimentos dos indivíduos em sua aprendizagem. O trabalho com a matemática quando voltado para valorização e incentivo das experiências adquiridas no convívio social, favorece a inserção das pessoas em seu contexto social. O Referencial nos aponta ainda que o trabalho com noções matemáticas na Educação Infantil deve atender as necessidades das próprias crianças de construírem conhecimentos e que estes correspondam a uma necessidade social. Propõe-se então, oferecer as crianças condições melhores para viver, participar e compreender um mundo que exige diferentes conhecimentos e habilidades.

15 Enfim, o Referencial Curricular enfatiza, também, que a continuidade da aprendizagem matemática não dispensa a intencionalidade e o planejamento, ações das quais as crianças elaboram o conhecimento em geral e o conhecimento matemático em particular. Diante das discussões sobre Educação Infantil e concepção de criança, percebemos que a criança é um sujeito que traz consigo maneiras de pensar, e agir, e que essas ações vão se desenvolvendo no decorrer de sua vida, sendo que sua interação e suas práticas com o meio em que vive é que favorecem seu desenvolvimento. Lembrando as Instituições e ou espaços de Educação infantil tem um papel fundamental no processo ensino aprendizagem, uma vez que a Educação Infantil é o alicerce que inicia o processo de construir e reconstruir o ensino aprendizagem. É necessário, portanto, ver a criança como sujeito ativo, com suas capacidades diversificadas de pensar, valorização das diversidades culturais. Sabe-se que os conhecimentos matemáticos se fazem presentes em todos os momentos da vida da criança. Entretanto, essas vivências muitas vezes não são percebidas pelos adultos, e como conseqüências não são valorizadas para mediar as ações que auxiliam na aquisição de novos conhecimentos, o que nos remete a necessidade de compreensão da Etnomatemática e sua contribuição no processo de ensino. 1.2 ETNOMATEMÁTICA São poucas as produções acadêmicas na perspectiva Etnomatemática geradas entre o ano de 1999 a 2005 da Universidade Vale do Rio Doce UNIVALE, da cidade de Governador Valadares. Dias (2008) faz um Estado da Arte ao investigar pesquisas bibliográficas produzidas na UNIVALE. A autora apresenta pesquisas elaboradas por alunas dos cursos Normal Superior e Pedagogia no período de 1999 a 2005 com o intuito de descrever, discutir e analisar as produções monográficas. Essa pesquisa foi feita através de um mapeamento na qual a autora apresenta as pesquisas que foram construídas e aponta que é preciso buscar novas produções, como podemos constatar no quadro abaixo:

16 Nº AUTORA ANO FOCO 01 Jaqueline Aparecida Campos Pereira 1999 O ensino da Matemática na formação de cidadão autônomo (Educação Infantil e 1ºsérie das Séries Iniciais). 02 Civânia C. da Silva 2001 A educação e prática pedagógica do professor nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental. 03 Renilda Ferreira Heringer 2001 O Ensino da Matemática: Conhecimento x Saber Científico. 04 Rosane Maria Marciano Brando Abreu 2002 A Construção do conceito de número e sua composição aditiva. 05 Maria Auxiliadora N. M. 2002 O ensino Matemático e suas configurações nas Séries Iniciais de Educação Básica. 06 Lornd Costa Bahia 2002 Contribuições de ensino da Matemática na Educação Infantil. 07 Emilene Dias Duarte 2003 Resolução de problemas: Uma metodologia de ensino de Matemática. 08 Ivana Gomes Nunes 2003 A importância dos jogos para a Construção do pensamento lógicomatemático. 09 Adenilzia Gerlada de Andrade 2003 Configurações das dificuldades de Aprendizagem em matemática nos Anos Iniciais da Educação Básica. 10 Ana Paula Oliveira de Assis 2003 O Conhecimento Numérico na Educação Infantil 11 Karine Machado de Oliveira Vieira 12 Maria dos Anjos Costa de Oliveira 2003 O ensino/aprendizagem da Matemática nos anos iniciais da Educação Básica construindo uma nova concepção. 2004 A Educação Matemática e a prática pedagógica do professor através dos jogos nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental. 13 Márcia Gomes de Oliveira 2005 Jogos no Ensino da Matemática Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Quadro síntese das monografias mapeadas por Dias (2008). Ao observar o quadro acima, verificamos a ausência de pesquisa no campo da Educação Matemática que tem como referencial teórico a Etnomatemática, o que provoca-nos inquietação. Um dado interessante que deve ser relatado é a ênfase acentuada nos ideais construtivistas entrelaçados nestas produções acadêmicas, como ressalta a autora. Inicialmente, discutiremos a Etnomatemática como conceito básico de nossa pesquisa, pois mediante estudos realizados, esta é compreendida por nós como: o estudo da evolução

17 cultural da humanidade em sentido amplo, buscando entender o conhecimento do saber e fazer nos diferentes grupos sociais ( KNIJNIK, 2004). O termo Etnomatemática foi usado primeiramente por Ubiratan D Ambrósio, em meado dos anos 70 e foi este estudioso quem apresentou as primeiras teorizações sobre esta temática, sendo futuramente nomeada como Programa de Pesquisa. D Ambrósio teve como fonte de inspiração suas experiências...como diretor de um programa de pós-graduação em Matemática (...), quando no início das políticas afirmativas em relação às comunidades negras, seu envolvimento naquele tempo no exterior com os movimentos sociais (...), e, principalmente, sua participação em um projeto da UNESCO de Pós-Graduação na República de Mali que lhe serviram como fonte de inspiração para o que então nomeou Programa de Pesquisa Etnomatemática (KNIJNIK, 2004, p. 21). No movimento de análise do nascimento e evolução do conceito de Etnomatemática, Paulo Gerdes (1991) interpretado por Knijnik (2006) afirma que em um primeiro instante a expressão Etnomatemática foi utilizada como questionamento da matemática escolar e sua vinculação com a Matemática acadêmica (KNIJNIK 2006, p. 126 apud Gerdes, 1991). Isto nos traz a reflexão sobre a leitura de Carraher (1991), que no livro Na vida dez na escola zero relata as práticas matemáticas dos sujeitos considerando sua diversidade cultural. Podemos relacionar este livro que traz a vivência de crianças, de feirantes, de pedreiros, com Etnomatemática. A Etnomatemática nos chama a atenção pela sua potencialidade de compreender a matemática escolar e a matemática que o sujeito apreendeu fora do espaço escolar. Isso propicia romper, no espaço escolar com uma concepção tradicional de ensino-aprendizagem, segundo o qual o aluno assimila todo o conhecimento transmitido pelo professor e o acumula visão que não considera vivências matemáticas fora do espaço escolar. A visão Etnomatemática no campo educacional considera o professor para promover processo de ensino e aprendizagem, deixando de ser um mero transmissor ou informador de conhecimento, assim o mesmo ajudará no processo de ensino aprendizagem interagindo os conhecimentos escolares com os conhecimentos não escolares. Referindo-se ao Programa de Pesquisa Etnomatemática, Knijnik (2002) afirma que, a proposta historiográfica inserida neste programa, tem como objetivo admitir a importância da história da ciência para a valorização da historicidade do conhecimento (KINIJNIK, 2002, p. 164) enfatizando-se a busca de entender o fazer e o saber matemático de culturas marginalizadas (ibidem, p. 164).

18 Neste sentido, vemos a importância do pensamento Etnomatemático que é à recuperação das histórias presentes e passadas dos diferentes grupos culturais (KNIJNIK, 2002, p.164) resgatando a história daquele que foi sistematicamente marginalizado por supostamente não enquadrar-se nas características da cultura ocidental, predominando-se uma visão etnocêntrica. A Etnomatemática vem para (des) construir conceitos como educação matemática neutra, etnocentrismo, concepção tradicionalista e construtivista entre outras. Este modo de pensar que constrói/reconstrói conceitos sobre o campo de estudo da matemática que queremos relatar em nosso campo de pesquisa acadêmico. Isso porque acreditamos em suas propostas visando à recuperação do currículo escolar, interagindo os saberes escolares com os saberes das vivências dos(as) educandos(as), a valorização de saberes de diferentes grupos culturais além de desconstruir conceitos já apontados. 1.3 FORMAÇÃO DE PROFESSORAS A formação de professores/as é fundamental no processo educativo principalmente no campo da Educação Infantil, pois são uns dos primeiros passos educacionais percorrido pela criança, sendo que decorrente desta virão outros níveis de ensino a serem cursados. Visto que a criança constrói e vivencia as primeiras experiências escolares relacionando-se com o outro no meio em que está inserida este espaço precisa ser enriquecedor. Neste sentido, o Referencial Curricular da Educação Infantil (1998) nos alerta sobre a importância das professoras serem realmente formadas e capacitadas para atuar em tal área. Com tal capacitação específica as educadoras serão capazes de desenvolver práticas criativas, reflexivas, flexíveis a fim de promover boas proposta de trabalho partindo-se da realidade do aluno(a) em questão em prol de possibilitar ao mesmo a construção de seu aprendizado. É válido ressaltar que no princípio os professores não precisavam de formação superior para atuar no campo da educação, pois para lecionar na Educação Infantil bastava apenas a formação no Curso Magistério, sendo que em alguns casos, algumas pessoas não tinham nem mesmo o curso citado. A Leis Diretrizes e Base (2009) afirma que a formação de docentes no nível superior é obrigatória para lecionarem no campo da Educação Infantil, Anos Inicial e Anos Finais do Ensino

19 Fundamental. Assim o magistério torna-se desqualificado, já que este não é um curso superior. Analisa-se que para quaisquer práticas educativas a serem realizadas necessita regularmente de formação superior, conseqüentemente formação continuada. Ao refletir sobre o Ensino da Matemática D Ambrósio (1996) afirma que as características de uma professora do século XXI no campo da Educação Matemática devem contempla quatro pontos específicos, sendo eles: visão do que venha a ser matemática; visão do que constitui a aprendizagem da matemática; visão do que constitui um ambiente propício à aprendizagem da matemática (D AMBRÓSIO, 1996, p.87). Neste contexto ele afirma que, para ser um professor qualificado no século referente, é preciso ter tais características e desenvolver conceitos metodológicos significativos na prática cotidiana. Segundo D Ambrósio o professor não é o sol que ilumina tudo. Sobre muitas coisas ele sabe bem menos que seus alunos.(d AMBRÓSIO, ano 97p, 85) No entanto percebemos nesta fala que existe um leque de conhecimento por trás deste pensamento em que retrata a abertura de espaço para que o aluno expresse seus desejos de conhecer e apreender o conceito matemático de forma clara e significativa. Nesse sentido, ressaltamos a importância dos Educadores, ou seja, professores terem formação de nível superior, ou ter também formação continuada não só para atuar na Educação Infantil, mas em outras áreas de ensino, pois, tendo formação teórica com certeza serão formadores de sujeitos críticos e capazes de opinaram seus desejos e anseios enquanto cidadão. Na perspectiva Etnomatemática a educação é um ato político e se algum professor julga necessário que sua ação é politicamente neutra, não entendeu nada de sua profissão. Tudo que fazemos o nosso comportamento, as nossas opiniões e atitudes são registrados e gravados pelos alunos e entraram naquele caldeirão que fará a sopa de sua consciência. Maior ou menor tempero político é nossa responsabilidade. Daí se falar tanto em educação para cidadania. (D AMBRÓSIO, 1996, p.85) Isso, mais uma vez adverte-nos sobre o papel de sermos formadores de cidadãs políticos, ou seja, formadores de sujeitos capazes de compreender questões culturais. Sendo que a educação para cidadania é um dos grandes objetivos da educação hoje, pois, de acordo com a citação entendemos que o conceito matemático precisa-se adequar a explanação de estudos étnicos para os sujeitos em questão. É válido lembrar que a formação de professores/as no campo da educação matemática e outras áreas de conhecimento continua sendo um desafio.

20 2 A CONCEPÇÃO DAS PROFESSORAS SOBRE A MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE AS PRÁTICAS NOS DIZEM Esta pesquisa orientou-se por uma abordagem qualitativa. Tal escolha diz respeito ao objeto de estudo e ao objetivo da pesquisa que é analisar de que modo a Etnomatemática comparece nas práticas escolares na percepção de professores que atuam na Educação Infantil, questão que discutiremos neste capítulo a partir da pesquisa de campo. A reflexão e análise das práticas de docentes na Educação Infantil e conseqüentemente suas concepções de ensino, sua relação com a Etnomatemática e suas contribuições nos saberes da criança, foram questionamentos abordados nesta pesquisa e, é nesse sentido que a abordagem qualitativa permitiu uma compreensão dessas questões. O processo da pesquisa foi realizado através de coletas de dados de entrevistas abertas. As entrevistas foram realizadas durante o intervalo de aulas no período noturno, em três dias, no espaço da Universidade Vale do Rio Doce. Os sujeitos da pesquisa foram quatro alunas do Curso de Complementação em Educação Infantil da Universidade Vale do Rio Doce UNIVALE, da cidade de Governador Valadares. Tínhamos como critério de seleção alunas graduadas na UNIVALE, considerando que as mesmas vivenciaram em seu currículo a disciplina Fundamentos e Metodologia da Matemática na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Outros dois critérios de seleção eram que estas fossem alunas no curso de Complementação em Educação Infantil que vivenciaram novamente a disciplina e que fossem atuantes na área. Solicitamos que as entrevistadas relatassem duas propostas de aulas que contivessem práticas matemáticas da Educação Infantil. Não havendo nenhuma dúvida quanto ao que era solicitado, as entrevistas eram gravadas e após a palavra final questionávamos se as mesmas sentiam necessidade de acrescentar algo mais em seus relatos. Em nenhum momento interrompíamos os relatos com questionamentos. As entrevistas sucederam de forma tranqüila. Fomos muito claras quanto a nossa finalidade quando solicitamos que as alunas relatassem as propostas de aula com práticas matemáticas. Com isso, tínhamos como expectativa o relato de uma proposta na qual as alunas relatariam dois dias consecutivos de aula, com atividades desenvolvidas no dia a dia.

21 Sabendo que as entrevistas são recortes das práticas das alunas entrevistadas, já que são relatos de aulas e não observação de campo, teremos um mútuo respeito na análise do material, pelo fato de sabermos que a prática é sempre mais abrangente do que o relatado. A partir daí, no decorrer da elaboração e análise ética do material obtido nas entrevistas, atingiremos o objetivo da pesquisa que é analisar de que modo a Etnomatemática comparece nas práticas escolares na percepção de professoras que atuam na Educação infantil e em específico, identificaremos as concepções matemáticas das professoras, suas práticas escolares e como as vivências dos(as) alunos(as) são acolhidas nas práticas matemáticas escolares. Quanto às alunas entrevistas, estas se mostraram dispostas a contribuir com o nosso trabalho, pois além de disponibilizar seu tempo para a entrevista, às mesmas ofereceram materiais 2 que poderiam demonstrar suas práticas. Segundo Dário Fiorentini, existem diferentes modos de conceber e ver a questão da qualidade do ensino da matemática. Alguns podem relacioná-la ao nível de rigor e formalização dos conteúdos matemáticos trabalhados na escola. Outros ao emprego de técnicas de ensino e ao controle do processo ensino/apendizagem com o propósito de reduzir as reprovações. Há ainda aqueles que a relacionam ao uso de uma matemática ligada ao cotidiano ou à realidade do aluno. Ou aqueles que colocam a Educação Matemática a serviço da formação da cidadania (FIORENTINI, 1995, p.1). Compreende-se pela citação acima que os modos de conceber a matemática se modificaram por parte daqueles que tentam produzir as inovações ou transformações do ensino (p.1) de acordo com o momento histórico e as determinações sócio-culturais e políticas. Nesse, sentido pudemos, identificar nas práticas das professoras modos de conceber a matemática em uma visão mais tradicional e de modo muito forte uma concepção ligada à tendência construtivista, assim como, parece-nos uma lacuna da perspectiva Etnomatemática, como mostraremos a seguir. 2 Os materias oferecidos pelas alunas não foram acolhidos, devido nossa proposta de pesquisa não estar inserida em uma análise de material. As entrevistas atenderam aos propósitos da pesquisa.

22 2.1 A FORTE PRESENÇA DA IDÉIA CONSTRUTIVISTA Discutiremos aqui a perspectiva construtivista, que tem uma predominância nas práticas mencionadas anteriormente. Fiorentini cita o construtivismo, segundo Freitag afirmando que o mesmo. parte do pressuposto epistemológico de que o pensamento não tem fronteiras: que ele se constrói, se desconstrói, se reconstrói.(...) As estruturas do pensamento, do julgamento e da argumentação dos sujeitos não são impostas ás criança, de fora, como acontece no Behaviorismo. Também não são consideradas inatas, como se fossem umas dádivas da natureza. A concepção defendida por Piaget e pelos pós-piagetianos é que essas estruturas de pensamento... São o resultado de uma construção realizada (interiormente) por parte da criança em longas etapas de reflexão, de remanejamento que resultam da ação da criança sobre o mundo e da interação com seus pares e interlocutores. Isso significa que o pólo decisório dos processos de aprendizagem está na criança e não na figura do professor, do administrador, do diretor (...) FRIORENTINI ano 1992, apud FREITAG (p.27-29). Nota-se que na concepção construtivista a criança constrói seu conhecimento a partir de sua interação como o outro e o meio, portanto o adulto é visto como um mediador desse processo. Da mesma forma que fundamentando se em Piaget concebe-se o construtivismo, o Referencial Curricular da Educação Infantil, também, institui como importante: Associar a educação infantil a padrões de qualidade, ou seja, concepções de desenvolvimento que consideram as crianças nos seus contextos sociais, ambientais, culturais, e, mais concretamente, nas interações e práticas sociais que lhes fornecem elementos relacionados ás mais diversas linguagens e ao contato com os mais variados conhecimentos para a construção de uma identidade autônoma. Educar significa, propiciar situações que contribua para o desenvolvimento e capacidades infantis de relação interpessoal, e o acesso mais amplo da realidade social e cultural (RCNEI. 1998 p. 23) Embora não tenha se preocupado em construir uma teoria de ensino ou de aprendizagem do ponto de vista educacional, foi a partir da epistemologia genética piagetiana que o construtivismo emergiu como tendência pedagógica, passando então a influenciar fortemente as inovações do ensino da Matemática. É essa tendência que faz sua aparição nas falas analisadas:

23 Eu gosto muito de trabalhar assim, com o bingo porque é bem divertido (Ester 3, professora de crianças de 4 e 5 anos)... virar um líquido numa garrafa para eles perceberem qual que tem mais qual que tem menos (Ester, professora de crianças de 4 e 5 anos),... ele (o varetão), é parecido com o jogo de vareta comum, só que com o varetão a criança tem mais acesso a ele (Sara,professora de crianças de 5 anos). Na concepção construtivista o jogo configurou-se, como prática corrente na Educação Infantil designando assim a ideia de que a aprendizagem de conteúdos matemáticos se daria prioritariamente por meio de atividades lúdicas, fortalecendo deste modo a concepção sobre o aprender brincando. Kamii (1994) autora que se fundamenta na perspectiva construtivista para o ensino da matemática enfatiza que o jogo é um recurso favorável para o desenvolvimento da autonomia 4, pois percebe que este é uma alternativa inteligente de lidar com o número, sem ser de forma mecânica. A interação social que acontece nos jogos possibilita a oportunidade de fazer/criar novas regras e tomar decisões juntos, segunda a autora. Isso permite que a criança veja a conseqüência das decisões que foram tomadas e como decorrência disso haverá um favorecimento da nãoformação de pessoas passivas e heterônomas 5. O jogo, também, nessa perspectiva favorece a interação social no momento de discussão entre o grupo e no qual haverá troca de saberes em busca de resposta para a resolução de problema. Este recurso é valorizado na teoria Piagetiana por causa de sua importância para a construção do conhecimento lógico-matemático. A gente vai pro pátio e trabalha lateralidade, por exemplo, qual criança está na sua frente, qual criança está atrás, tem muita criança na sua frente e muita criança atrás de você... (Débora, professora de crianças de 3 anos) As relações espaciais entre os objetos envolvem noções de orientação como proximidade, interioridade e direcionalidade e estes determinam a posição de uma pessoa ou de um objeto no espaço. Quanto a isso, é preciso situar as crianças a uma referência seja ela, referindo-se a 3 Os nomes de todas as professoras são fictícios. 4 Autonomia significa ser governado por si mesmo (KAMII, 1994, p.68). 5 Heterônomas quer dizer ser governada por outra pessoa (KAMII, 1994, p.68)

24 objetos, pessoas paradas ou em movimentos, favorecendo a percepção do espaço exterior e distante da criança. (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, 1998). Por esta concepção construtivista o trabalho na Educação Infantil promove desafios que dizem respeito às relações habituais da criança com o espaço, colocar-se a tarefa de apresentar situações significativas que dinamizem a estruturação do espaço em que as crianças desenvolvam e para que adquiram um controle cada vez maior sobre suas ações e possam resolver problemas de natureza espacial e potencializar o desenvolvimento de seu pensamento geométrico. O livro A criança e o número (1991) tem sido amplamente adotado como referencial para discussões sobre a aprendizagem do conceito de número como orientação para a matemática escolar. Identifica-se nas práticas relatadas a presença dessa concepção na forma de ensino dos números: Se sair o número três o aluno pega três botões e coloca do lado do grupo dele. (Leví, professora de crianças de 5 anos) Outra forma é o boliche de garrafa pet. As crianças jogam a bola e depois de jogarem elas têm que contar quantas garrafas, elas deixaram cair e os números fixados em cada garrafa... e registram em forma de número de desenho, vai depender da criança. Se ela der conta de colocar o número, ela já pode registrar, se ela der conta de desenhar ela desenha (Leví, professora de crianças de 5 anos) Baseado-nos na discussão apresentada por Kamii (1991) a representação de um número através de signos, como a fala três, ou símbolos que são desenhos e até mesmo a representação gráfica 3, se concretiza depois do momento em que a criança tiver passado da abstração empírica para a abstração reflexiva. É este modo de pensar que se apresenta nas falas e parece ecoar a orientação construtivista para a ação docente, posto que segundo essa concepção as crianças não aprendem conceitos numéricos com desenhos. Tampouco aprendem conceitos numéricos meramente pela manipulação de objetos. Elas constroem esses conceitos pela abstração reflexiva à medida que atuam (mentalmente) sobre os objetos (KAMII, 1991, p.58) Portanto, um princípio fundamental no âmbito lógico matemático construtivista é o de evitar o reforço da resposta certa e a correção das respostas erradas, mas, ao invés disso, encorajar a troca de idéias entre as crianças, pois em um momento este sujeito chegará à resposta correta.

25 Os jogos são essenciais no ensino construtivista, do ponto de vista do desenvolvimento da autonomia das crianças, pois envolvem regras, possibilitando o desenvolvimento da habilidade das crianças de governarem a si mesmas e quando surgir conflitos pode ajudar na tomada de decisões e possibilidades de modificar as regras. (KAMII, 1995) De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil A participação ativa da criança e a natureza lúdica e prazerosa inerentes a diferentes tipos de jogos têm servido de argumento para fortalecer essa concepção, segundo a qual se aprende matemática brincando, contrapondo a orientação de que a aprender matemática é necessário um ambiente rígido, de disciplina e silêncio. No início da aula as crianças sentam em roda e a gente conta quantos meninos e meninas vieram... e a gente coloca num quadro e faz relação de número e quantidade e a gente usa tampinhas de garrafa pet pra exemplificar. (Débora, professora de crianças de 3 anos) Eu gosto do raciocínio matemático, raciocínio lógico, por exemplo, quando eu trabalho com o cheio/vazio, noção de quantidade. (Ester, professora de crianças de 4 e 5 anos) Para o construtivismo, o conhecimento lógico-matemático não resulta nem diretamente do mundo físico nem de mentes humanas isoladas do mundo, mas sim da ação interativa/reflexiva do homem com o meio ambiente e/ou com as atividades. Segundo Kamii Piaget escolheu a matemática como exemplo para demonstrar que a atmosfera de uma sala de aula aumenta ou exprime o desenvolvimento da autonomia de maneira que são inseparavelmente morais e intelectuais. (KAMII 1995. p 97). Afirmamos assim que nestas práticas há presença de um modo de pensar a matemática e o seu ensino que se fundamenta no construtivismo visão fortalecida pelo Referencial Curricular da Educação Infantil. Algumas interpretações das pesquisas psicogenéticas 6 concluíram que o ensino da matemática será beneficiado por um trabalho que incidisse no desenvolvimento de estruturas do pensamento lógico-matemático. Assim, consideram-se experiências-chaves para o processo de desenvolvimento do raciocínio-lógico e para a aquisição de noção de número e as ações de classificar, ordenar/seriar e comparar objetos em função de diferentes critérios. (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, 1998) 6 Pesquisa psicogenética são trabalhos desenvolvidos por Jean Piaget.

26 2.2 PRESENÇA DA CONCEPÇÃO TRADICIONAL Como já mencionamos a forte presença do construtivismo nas práticas analisadas, destacaremos também a concepção tradicional que aparece nas falas das entrevistadas ao relatarem suas práticas. O ensino nessa tendência pedagógica foi acentuadamente livresco e centrada no professor e no seu papel de transmissor e expositor do conteúdo através de preleções ou de desenvolvimento teóricos na lousa. A aprendizagem do aluno era considerada passiva e consistia na memorização e na reprodução (imitação/repetição precisa dos raciocínios e procedimentos ditados pelo professor ou pelos livros (FIORENTINI 1995, p. 7). Portanto uma concepção onde o professor é detentor do saber e o aluno o receptor de informações, onde a aquisição de conhecimentos se torna uma prática burocrática e sem significados, não valoriza o que o indivíduo traz consigo seu contexto histórico e suas práticas cotidianas. Esses pressupostos didáticos são compatíveis com a concepção platônica, pois os conhecimentos preexistem e não são construídos ou inventados (FIORENTINI, 1995, p, 7). Ou seja, é uma concepção que não propicia aos indivíduos a prática de refletir, questionar, interagir, construir e reconstruir na aquisição de novos saberes. Assim analisamos que nos dias atuais ainda procede a predominância dessa concepção nas práticas educativas, mesmo na Educação Infantil na qual a orientação para o ensino da matemática tem sido, predominantemente construtivista. Como afirma Ester que apresenta práticas construtivistas, ela, também faz uma proposta que é para conhecimento de números, ou trabalha com associação, perspectiva contrária a construção de conhecimentos: Às vezes eu faço a proposta que é para conhecimento de números e às vezes eu faço com a proposta de associação, de agrupar. (Ester, professora de crianças de 4 e 5 anos ) Mostramos duas concepções de matemática: uma tradicional, na qual se aprende por associação e outra que privilegia o raciocínio lógico matemático. Por sua vez a Etnomatemática privilegia o raciocínio qualitativo. Um enfoque Etnomatemático sempre está ligado a uma

27 questão maior, de natureza ambiental ou de produção, e a Etnomatemática raramente se apresenta desvinculada de outras manifestações culturais, tais como arte e religião. A etnomatemática se enquadra perfeitamente numa concepção multicultural e holística de educação (D AMBRÓSIO, 2005.p. 44). Enfim, destacamos a importância de se repensar as práticas educativas atuais, tendo com ponto de referência a Etnomatemática que tem como foco o sujeito e suas práticas educativas e sociais, questão que discutiremos no próximo capítulo. 3 ETNOMATEMÁTICA E O APAGAMENTO O SUJEITO Mediante as discussões já mencionadas no trabalho de pesquisa, tais como: a presença do construtivismo e da perspectiva tradicional que foram relatas nas entrevistas feitas com as professoras/alunas do curso de complementação da Educação Infantil da Universidade Vale do Rio Doce, sentimos a necessidade de abordar a ausência do sujeito no contexto, uma vez que nosso foco de pesquisa é Etnomatemática e prática de professoras da Educação Infantil. Sabendo que não existe um conceito pronto e acabado de Etnomatemática, usaremos com ponto de partida a definição utilizada por D Ambrósio (1998) ao apontar que: etno hoje aceito como algo muito amplo, referente ao contexto cultural, e portanto inclui considerações como linguagem, jargão, códigos de comportamentos, mitos e símbolos; matema é uma raiz difícil, que vai na direção de explicar, de conhecer, de entender; a tica vem sem dúvida do techne, que é a mesma raiz de arte de técnica. Assim, poderíamos dizer que etnomatemática é arte ou técnica de explicar, de conhecer, de entender nos diversos contextos culturais (D AMBRÓSIO, 1998, p.5). A partir do conceito etnomatemático faremos uma relação entre as práticas relatadas com o foco teórico da pesquisa.... eu gosto de fazer bingo matemático com eles. Às vezes eu faço com a proposta que é para conhecimento de números e às vezes eu faço com uma proposta de associação, de agrupa. Quando eu faço com números eu faço com o número mesmo, às vezes eu faço com o numeral, com a representação, dois pauzinhos, dois gatinhos, dois palitinhos aí eu faço o bingo, por exemplo, eu falo número dois, aí eles vão marcar onde tem dois objetos correspondentes àquele número. Eu gosto muito de trabalhar assim, com o bingo porque é bem divertido."

28... eu gosto de raciocínio matemático, raciocínio lógico... quando eu trabalho... Eu fiz uma atividade... essa é uma atividade bacaninha que eu fiz que eu gostei de realizar..." (Ester, professora de crianças de 4 anos e 5 anos). "Eu trabalho o jogo dos botões, têm uma caixa com vários botões, várias formas tamanhos e cores. A gente divide a sala... em dois grupos. Cada criança do mesmo grupo joga uma vez o dado, conta os botões das caixinhas retira os botões e guarda depois que todos jogaram os dados retiraram os botões nós vamos para o outro grupo e fazemos à mesma coisa. Depois que todo mundo jogo a gente vai contar os botões. Um grupo conta os botões, cola os botões numa cartolina e escreve a quantidade que teve de botões em números e da mesma forma os outros grupos fazem, então fixa na parede em algum lugar na sala... Então vemos... quanto o grupo fez a mais do que o outro e trabalha toda esta relação. Eu sempre estou jogado isso com eles....... Outra forma é o boliche de garrafa pet que colocamos o número em cada garrafa. As crianças jogam a bola e depois de jogarem elas têm que contar quantas garrafas elas deixaram cair e os números que estão fixados em cada garrafa... e somam a quantidade e colocam no papel e registram em forma de número de desenho, vai depender da criança. Se ela der conta de colocar o número, ela já pode registrar se ela der conta de desenhar ela desenha. Esta é uma outra forma de trabalhar também."( Leví, professora de crianças de 5 anos). Diante das práticas acima, faremos análise reflexiva desta com o sujeito ou a falta deste no contexto discutido. O autoritarismo do docente em questão tem uma relevante predominância nas práticas relatadas. Isso é detectado no "eu" muito freqüente no relato das mesmas. Visto que, quando o educador não abre espaço para um processo educativo diversificado e significativo o sujeito envolvido neste contexto terá uma educação fragmentada. Nessa perspectiva Knijnik (2004) cita Costa (1999) ao relatar que o território de produção, circulação e consolidação de significados, como espaço privilegiados de concretização da política da identidade. Quem tem força nessa política impõe ao mundo suas representações, o universo simbólico de sua cultura particular. (p.187). O apagamento do sujeito permanece de forma clara nas práticas relatadas pelas entrevistadas. Isso é detectado quando as mesmas afirmam tais termos como: eu fiz, eu gosto, eu faço. As práticas apresentadas demonstram atividades prontas que fazem com que o

29 sujeito não seja instigado a pensar e expressar suas formas de matematizar. Daí vem-nos questionamentos. Onde está o sujeito? Quem é este sujeito? Como ele pensa matematicamente? Quais são as suas práticas culturais? Constatamos então que este sujeito se encontra na escola, como um objeto manipulado sendo fabricado por concepções educacionais vistas como certas, através disso este sujeito tornase oculto por não participar da construção do seu processo educativo. Este não critica nem questiona, aceita o que lhe é imposto. Outra característica é que este não reflete sobre suas ações. No entanto a Etnomatemática é contrária a estas concepções, pois a mesma considera as vivências do sujeito. A predominância da não valorização do sujeito é um dos meios cruciais na evasão escolar, como afirma a autora já citado ao apontar que na escola, aprendemos uma forma especial de conhecimento matemático, mas essa forma nos faz usualmente desconsiderar outras maneiras de lidar, de manejar com conhecimentos matemáticos que circulam nossas vidas (KNIJNIK, 2004, p.242). Para tanto há necessidade de repensar as práticas pedagógicas com novos olhares para conseqüentemente formar uma nova proposta curricular visando a Etnomatemática como foco. Visto que o programa da Etnomatemática visa o sujeito como agente no seu processo educativo, é válido ressaltar que, o sujeito é livre em desenvolver suas vivências nas habilidades educacionais, tornando-as significantes no seu contexto social. Segundo D Ambrósio a cultura é um conjunto de comportamentos compatibilizados e de conhecimentos compartilhados, inclui valores. Numa mesma cultura, os indivíduos dão as mesmas explicações e utilizam os mesmos instrumentos materiais e intelectuais no seu dia-adia ( p.35), assim o sujeito estabelece seu aprendizado a partir das sua vivências compartilhadas. A questão em discussão é o apagamento do sujeito no processo educativo, pois se não há presença do sujeito não há Etnomatemática, nem educação nem mesmo a matemática e conseqüentemente, não haverá valorização de seus saberes e fazeres matemáticos em suas práticas diárias. Ao detectar este apagamento do sujeito, detectamos, também, a ausência do conceito Etnomatemático no Referencial Curricular da Educação Infantil, cuja própria referência bibliográfica não apresenta nenhum autor que relate tal perspectiva teórica. Nossa preocupação, ao apontar tal fato, está na proposição do mesmo como uma referencia no espaço escolar. Portanto se não há menção da Etnomatemática no documento, não