Efeito de um protocolo fisioterapêutico na função respiratória de crianças com paralisia cerebral



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Transcrição:

Efeito de um protocolo fisioterapêutico na função respiratória de crianças com paralisia cerebral Effect of a physiotherapeutic protocol on respiratory function of children with cerebral palsy Monique Maglovsky Feroldi 1, Rafaela Baptistella Mira 2, Ana Beatriz Sasseron 3, Patricia Fregadolli 4 RESUMO Objetivo. Verificar os efeitos de um protocolo fisioterapêutico composto por técnicas manuais de mobilização torácica, na função respiratória de pacientes com paralisia cerebral (PC). Método. Foi realizado um estudo piloto com 05 pacientes com PC quadriplégica com idade média de 8,6 ± 3,5 anos. A função respiratória foi avaliada com um ventilômetro de Wright (Ferraris R MK8) adaptado a uma máscara facial para verificação do volume minuto (VM), frequência respiratória (FR) e volume corrente (VC). O padrão respiratório foi avaliado através da inspeção do paciente. As avaliações foram feitas pelo mesmo avaliador antes e após 10 sessões de fisioterapia utilizando técnicas manuais de mobilização torácica. Foi realizada análise estatística das variáveis numéricas entre os períodos pré e póstratamento através do teste de Wilcoxon. Resultados. Após o tratamento, houve aumento na FR de 22,9%, aumento significativo de 23,13% no VM (p=0,043) e redução de 14,62% no VC. Em todos os pacientes, o padrão respiratório inicial foi costal e alteraram para padrão respiratório misto após o tratamento. Conclusão. os pacientes estudados obtiveram aumento significativo no VM e alteração do padrão respiratório. Unitermos. Paralisia Cerebral, Quadriplegia, Testes de Função Respiratória, Fisioterapia. Citação. Feroldi MM, Mira RB, Sasseron AB, Fregadolli P. Efeito de um protocolo fisioterapêutico na função respiratória de crianças com paralisia cerebral. ABSTRACT Objective. To verify the effects of a physiotherapeutic protocol based on manual techniques of thoracic mobilization on respiratory function of patients with cerebral palsy. Method. It was made a pilot study with 5 quadriplegic cerebral palsy with an average 8,6 ± 3,5 years of age. The pulmonary function was evaluated with Ferraris Wright MK8 ventilometer adjusted with facial mask on the patients to verify minute volume, respiratory rate and tidal volume. The breathing pattern was evaluated through patient inspection. The evaluations were made by the same person before and after the 10 physiotherapy sessions with manual techniques of thoracic mobilization. The statistic analysis was made by Wilcoxon test. Results. The respiratory rate increased 22,9%, minute volume increased 23,13% (p=0,043) and tidal volume decreased 14,62%. All the evaluated patients had a costal breathing pattern before of the treatment and after treatment, had a mixed breathing pattern. Conclusion. the patients had a significant increase on minute volume and modification from costal breathing pattern to mixed. Keywords. Cerebral Palsy, Quadriplegia, Respiratory Function Tests, Physical Therapy. Citation. Feroldi MM, Mira RB, Sasseron AB, Fregadolli P. Effect of a physiotherapeutic protocol on respiratory function of children with cerebral palsy. Trabalho realizado no Centro Universitário Hermínio Ometto Uniararas, Araras-SP, Brasil. 1. Fisioterapeuta, Uniararas, Araras-SP, Brasil. 2. Fisioterapeuta, Uniararas, Araras-SP, Brasil. 3. Fisioterapeuta, Mestre em Cirurgia Experimental (Unicamp), Especialista em Clínica Fisioterápica Uniararas, docente do curso de graduação em Fisioterapia e Especialização em Fisioterapia Respiratória adulto e infantil da Uniararas, Araras-SP, Brasil. 4. Fisioterapeuta da UTI da ISCM de Rio Claro-SP, Especialista em Fisioterapia Respiratória adulto e infantil (Uniararas), Araras-SP, Brasil. Endereço para correspondência: Patricia Fregadolli Rua 1-B, nº412, Cidade Nova CEP 13506-813, Rio Claro-SP, Brasil. E-mail: paty_dolli@yahoo.com.br Relato de Caso Recebido em: 31/08/09 Aceito em: 26/04/10 Conflito de interesses: não Rev Neurocienc 2011;19(1):109-114 109

INTRODUÇÃO A hipertonia é a causa mais importante de deformidades na Paralisia Cerebral (PC), criando um desequilíbrio muscular entre os músculos espásticos e seus antagonistas fracos 1. Este desequilíbrio muscular gera alterações na mecânica respiratória e favorece o encurtamento da musculatura inspiratória, enquanto que a musculatura abdominal apresenta-se tensa e enfraquecida. O pescoço encurtado e a postura elevada dos ombros contribuem pra a manutenção da elevação do tórax com projeção do osso esterno durante o ciclo respiratório 2. A associação da tensão permanente com o pobre alongamento muscular que provoca deficiência ao fluxo expiratório eleva a capacidade residual funcional e o volume corrente. Os músculos expiratórios e inspiratórios fracos associados ao aumento da capacidade residual funcional e a diminuição da capacidade vital fazem com que as costelas e o esterno fiquem na posição de inspiração durante todo o ciclo respiratório, aumentando o diâmetro ântero-posterior do tórax 2. Com a fraqueza dos músculos respiratórios a habilidade de gerar grandes volumes é perdida e a força para gerar tosse efetiva decresce 3. Com isso, leva à microatelectasias diminuindo a complacência pulmonar e consequentemente a área de ventilação. Com o aumento da área de atelectasia, o trabalho respiratório aumenta levando a hipercabia, hipoxemia e falência ventilatória 4,5. Na PC a escoliose e a cifoescoliose são complicações comuns 6. A distorção do gradil costal coloca os músculos respiratórios em desvantagem mecânica, onde o hemitórax do lado da convexidade da escoliose tende a ficar hiperinsuflado e o lado côncavo ficando hipoventilado 7. Na literatura, existem trabalhos que abordam a influência de técnicas manuais de mobilização torácica e alongamento da musculatura acessória na função respiratória 8-10, porém em grupos específicos como crianças com PC ainda são raros os estudos. Com isso, o objetivo desse estudo foi avaliar os efeitos de um protocolo de mobilização torácica no padrão respiratório e nos volumes pulmonares (volume corrente e volume minuto) de pacientes com PC quadriplégicos com deformidades torácicas. MÉTODO Trata-se de um estudo piloto experimental do tipo relato de casos com 5 pacientes portadores de Paralisia Cerebral quadriplégica, realizado na clínica escola de Fisioterapia do Centro Universitário Hermínio Ometto (Uniararas). Os critérios de inclusão para a participação do estudo foram: pacientes portadores de paralisia cerebral quadriplégica; pacientes em acompanhamento no setor de neuropediatria da clínica escola de fisioterapia da Uniararas, com faixa etária entre 5 a 12 anos de idade; pacientes os quais foram autorizados previamente pelos respectivos pais. Aqueles os quais não estão de acordo com os critérios de inclusão, foram descartados do estudo. Amostra Participaram deste estudo 5 pacientes com PC quadriplégica com alterações posturais do tipo escoliose em S, com idade média de 8,6 ± 3,5 anos, sendo 3 do gênero feminino e 2 do gênero masculino. Procedimentos Esta pesquisa foi realizada após aprovação do comitê de ética e mérito em pesquisa do Centro Universitário Hermínio Ometto com o parecer de número 715/2007. Um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido por escrito foi obtido dos pais dos pacientes após receberem orientações sobre a pesquisa. As variáveis do estudo (volumes pulmonares, a frequência respiratória e o padrão respiratório) foram avaliadas em todos os pacientes pela mesma pesquisadora, tanto no momento pré tratamento (imediatamente antes da primeira sessão) como no momento pós tratamento. Para a avaliação, os pacientes foram posiciona- 110 Rev Neurocienc 2011;19(1):109-114

dos em decúbito dorsal com elevação de aproximadamente 30 graus com uso de travesseiros. Os volumes pulmonares foram avaliados por um aparelho ventilômetro de Wright da marca Ferraris MK8, adaptado a uma máscara facial. Após adaptação da criança e durante respiração tranquila por um minuto, foi realizada a leitura do volume minuto (VM) e contagem do número de respirações (FR) para o cálculo do volume corrente (VC) dado pela fórmula VC = VM/FR (litros) 11. As variáveis foram comparadas nos momentos Pré (1) e Pós (2) intervenção fisioterapêutica (10 sessões) englobando técnicas manuais de mobilização de tórax. O padrão respiratório foi verificado com o tórax e abdome desnudo, por meio da inspeção da mobilização da caixa torácica do paciente durante as incursões respiratórias, observando a contração dos músculos respiratórios, sua biomecânica e a sincronização dos movimentos respiratórios, classificando esse padrão respiratório em costal (maior mobilização torácica em ápices pulmonares durante as incursões respiratórias), diafragmático (maior mobilização abdominal durante as incursões respiratórias) ou misto (sem um padrão predominante). Quanto à intervenção terapêutica, foi elaborado um protocolo composto por: - Mobilização global passiva, com ênfase nas articulações: glenoumeral; escapulo-torácico e art. esterno-clavicular; - Manobra de relaxamento e alongamento diafragmático; - Alongamento plástico e pompage dos músculos: escalenos, peitoral menor e maior; esternocleidomastóideo, intercostais e abdominais. Os alongamentos foram mantidos por cerca de 30 segundos de maneira a afastar as inserções musculares. A pompage foi realizada nos músculos supracitados de maneira a realizar um alongamento de cada fáscia de forma lenta, regular e progressiva, mantendo tal tensão por cerca de 15 segundos, e posteriormente liberando essa tensão de forma lenta, promovendo o retorno natural da fáscia à sua posição inicial. Durante a aplicação do protocolo, as crianças permaneceram em decúbito dorsal e lateral com a cabeça fletida cerca de 30 graus. O protocolo de tratamento proposto foi realizado individualmente, com a frequência de duas vezes por semana, durante 40 minutos, em 10 sessões, por três meses. Análise estatística Foi realizada análise descritiva e estatística das variáveis numéricas. Foram calculadas as diferenças percentuais dos escores dos pacientes. O teste de Wilcoxon foi aplicado para análise dos escores pré e póstratamento dos pacientes utilizando o programa SPSS versão 13.0. RESULTADOS A idade média dos voluntários foi de 8,6 ± 3,5 anos portadores de PC quadriplégica com deformidades na coluna vertebral (escoliose em S ). Os resultados foram analisados de acordo com as variáveis estudadas, calculando a média e o desvio padrão dos valores obtidos em cada paciente, antes e após o tratamento fisioterapêutico (Tabela 1). Foi observado um aumento significativo do VM quando comparado nos momentos pré e pós tratamento (de 5,1±2,4 para 6,28±1,67 com p=0,043). Quanto à FR e o VC, não houve diferença estatística no pré e pós tratamento (19,2 ± 7,88 para 23,6 ± 2,5 com p=0,33 e 0,31 ± 0,19 para 0,26 ± 0,08 com p=0,83 respectivamente). Tabela 1 Variáveis avaliadas nos períodos pré-tratamento e pós-tratamento Variáveis Frequência respiratória (rpm) Volume minuto (L/min) Volume corrente (L) Pré-tratamento (n=5) Média ± DP Pós-tratamento (n=5) Média ± DP p-valor 19,2±7,88 23,6±2,5 0,33 5,1±2,4 6,28±1,67 0,043 0,31±0,19 0,26±0,08 0,83 Rev Neurocienc 2011;19(1):109-114 111

Litros VM1: Volume Minuto pré-intervenção; VM2: Volume Minuto pós-intervenção; VC1: Volume Corrente pré-intervenção; VC2: Volume Corrente pós-intervenção. Figura 1. Valores de VM e VC, com significância estatística somente do item VM (p=0,043 teste de Wilcoxon). Em relação ao padrão respiratório, apesar da avaliação ser subjetiva, todos os voluntários alteraram o padrão respiratório de costal para misto. Após a análise dos dados, os valores obtidos foram demonstrados em gráficos. A Figura 1 representa os valores de VM e VC nos períodos pré tratamento e pós tratamento. A Figura 2 representa a variável FR nos dois períodos. Observando-se as diferenças das médias em porcentagens, entre pré e pós tratamento, o VC apresentou redução de 14,62% e os VM e FR, aumento de 22,9 e 23,13% respectivamente. DISCUSSÃO As doenças pulmonares são uma importante causa de morbidade e mortalidade em crianças com Número de incursões por minuto (ipm) Figura 2. Média de desvio padrão da variável frequência respiratória (FR) nos momentos pré (1) e pós (2) tratamento. 112 Rev Neurocienc 2011;19(1):109-114

PC 12 do tipo tetraparéticos espásticos ou crianças com GMFCS nível V. A avaliação e o gerenciamento da disfunção respiratória devem ser reconhecidos como parte de uma rotina de reabilitação 13. Apesar dos músculos respiratórios não serem passíveis de imobilização, a permanência constante de contração favorece uma postura em inspiração 14 restringindo a mobilidade da caixa torácica. A mobilização de tronco é importante, pois permite a manutenção da mobilidade da coluna vertebral entre o esterno e as costelas (Apostila de Schumacker, 1994), permitindo uma expansibilidade torácica mais eficaz. Já o alongamento muscular melhora a relação comprimento-tensão das fibras musculares, favorecendo o desempenho da bomba respiratória, considerando que quanto mais alongado estiver um músculo, maior será sua capacidade de gerar tensão 10. Sendo assim, o alongamento realizado nos músculos envolvidos na respiração, deve proporcionar uma capacidade de contração muscular mais eficaz, melhorando o desempenho respiratório. O efeito do alongamento dos músculos respiratórios nas variáveis pulmonares foi estudado em portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), e os resultados mostraram um aumento da mobilidade torácica e do volume corrente nesses pacientes 8. Em um estudo 10, os autores analisaram a função pulmonar em indivíduos saudáveis após intervenção terapêutica com alongamento e pompage da cadeia muscular respiratória e concluíram que o protocolo proposto mostrou ser eficiente para promover aumento das variáveis espirométricas. No presente estudo foi observado um aumento significativo do VM quando comparado nos momentos pré e pós tratamento (de 5,1 ± 2,4 para 6,28 ± 1,67; p=0,043). Este fato ocorreu provavelmente devido ao aumento da FR (19,2 ± 7,88 para 23,6 ± 2,5 com p=0,33), já que o VM resulta do produto desta pelo VC e também pelo fato de ter ocorrido o aumento da FR e não do VC. Neste estudo, os pacientes apresentaram um aumento na FR, que pode ter ocorrido pelo aumento do trabalho do músculo diafragma, enfraquecido e retraído nestes pacientes, aumentando a FR como mecanismo compensatório, com consequente aumento do VC (0,31 ± 0,19 para 0,26 ± 0,08 com p=0,83). Em outro estudo 2, o qual os pesquisadores estudaram a prevalência de distúrbios respiratórios em crianças com PC, verificaram como característica destes pacientes o padrão respiratório alterado, uso excessivo da musculatura acessória, além de redução no volume corrente e capacidade vital e aumento da capacidade residual funcional e volume residual, levando à uma respiração superficial e aumento do trabalho respiratório. No presente estudo, foi observado que por meio das técnicas de mobilização torácica houve mudança do padrão respiratório de costal para padrão respiratório misto, fazendo com que estes pacientes utilizassem menos a musculatura acessória da respiração, exigindo maior ação do músculo diafragma. As crianças com paralisia cerebral com escoliose apresentam significante hipoxemia e comprometimento cardiopulmonar devido a múltiplas aspirações e ao padrão ventilatório superficial que esses indivíduos apresentam 15. Indivíduos que possuem alterações posturais podem apresentar padrão respiratório característico com tendência a realizar respirações torácicas com escassa utilização do diafragma, movimentando pequena quantidade de ar 16. Os pacientes deste estudo apresentaram importante comprometimento postural e padrão respiratório costal. A desorganização da movimentação dos membros superiores e da cabeça proporciona distorções torácicas e diminuem a eficiência dos músculos respiratórios 2. Através das técnicas manuais de mobilização torácica muscular, houve um aumento significativo do volume minuto (p=0,043) e mudança do padrão respiratório de costal para padrão respiratório misto. Rev Neurocienc 2011;19(1):109-114 113

A elaboração de um protocolo de tratamento através de técnicas manuais passivas e a mensuração do seu efeito real sobre a função respiratória em indivíduos com PC quadriplégica poderá ajudar muitos fisioterapeutas a direcionarem seus esforços terapêuticos, e com isso, um maior número de pacientes poderá se beneficiar desta técnica. CONCLUSÃO As crianças submetidas ao protocolo obtiveram aumento significativo no VM e alteração do padrão respiratório. O aumento da FR e a diminuição do VC podem ser atribuídos à alteração do padrão respiratório, que pode ter ocasionado maior ação do músculo diafragma. Sugere-se, a partir deste estudo piloto, que novos estudos sejam realizados com um número maior de pacientes. REFERÊNCIAS 1.Burns Y, Gelmour J, Kentish M, Macdonald J. Fisioterapia na criança com problemas neurológicos, neuromusculares e de desenvolvimento do sistema nervoso. In: Fisioterapia e Crescimento na Infância. São Paulo: Santos Livraria Editora, 1999, p.359-69. 2.Borges MBS, Galigali AT, Assad RA. Prevalência de distúrbios respiratórios em crianças com paralisia cerebral na clínica escola de fisioterapia da Universidade Católica de Brasília. Fisioter Mov 2005;18:37-47. 3.Mier-Jedrzejowicz A, Brophy C, Green M. Respiratory muscle weakness during upper respiratory tract infections. Am Rev Respir Dis 1988;138:5-7. 4.Teitelbaum JS, Borel CO. Respiratory dysfunction in Guillain-Barr`e syndrome. Clin Chest Med 1994;15:705-14. 5.Tzeng AC, Bach JR. Prevent of pulmonary morbidity for patients with neuromuscular disease. Chest 2000;118:1390-6. 6.Nelson CA. Paralisia Cerebral. In: Umphred DA. Reabilitação Neurológica. 4ª. ed. São Paulo: Manole, 2004, p.272-85. 7.Gianni MAC. Paralisia Cerebral. In: Moura EW, Campos e Silva PA. Fisioterapia: aspectos clínicos e práticos da reabilitação. São Paulo: Artes Médicas, 2005, p.14-83. 8.Kakizaki F, Shibuya M, Yamazaki Y, Yamada M, Suzuki H, Homma I. Preliminary report on the effects of respiratory muscle stretch gymnastics on chest wall mobility in patients with chronic obstructive pulmonary disease. Respiratory Care 1999; 44:409-14. 9.Moreno MA, Catai AM, Teodori RM, Borges BLA, Cesar MC, Silva E. Efeito de um programa de alongamento muscular pelo método de Reeducação Postural Global sobre a força muscular respiratória e a mobilidade toracoabdominal de homens jovens sedentários. J bras pneumol 2007;33:679-86. 10.Moreno MA, Catai AM, Teodori RM, Borges BLA, Zuttin RS, Silva E. Adaptações do sistema respiratório referentes à função pulmonar em resposta a um programa de alongamento muscular pelo Método de Reeducação Postural Global. Revista Fisioterapia e pesquisa 2009; 16(1): 11-5. 11.Emmerich JC. Monitorização Respiratória: Fundamentos. Rio de Janeiro: Ed. Revinter Ltda, 2001, p.51-2. 12.Reddihough DS, Baikie G, Walstab JE. Cerebral palsy in Victoria, Australia: mortality and causes of death. J Paediatr Child Health 2001;37:183-6. 13.Ersöz M, Selçuk B, Gündüz R, Kurtaran A, Akyüz M. Decreased chest mobility in children with spastic cerebral palsy. The Turkish journal of pediatrics 2006;48:344. 14.Souchard PE. Respiração. São Paulo: Summus, 1989, p.100-2. 15.Kalen V, Conklin MM, Sherman FC. Untreated Scoliosis in Severe Cerebral Palsy. J Pediatr Orthop 1992;12:337-40. 16.West JB. Mecânica da Respiração. In: Fisiologia Respiratória Moderna. 5ª. ed. São Paulo: Manole, 1996, p.83-92. 114 Rev Neurocienc 2011;19(1):109-114