O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO CAMPO

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O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO CAMPO Ana Marta Gonçalves Soares SEDUC-Feira de Santana/MPEJA-UNEB Patrícia Lessa Santos Costa MPEJA/GESTEC-UNEB Resumo: As questões relacionadas ao Campo, não podem ser compreendidas sem antes analisar a sobrevivência no espaço rural, o que implica em afirmar que é preciso educar para um modelo que inclua e amplie oportunidades de desenvolvimento individual e coletivo. Assim, o processo de escolarização do Campo, em específico para a Educação de Jovens e Adultos EJA demanda diferenças na medida em que esses sujeitos integram outros processos formadores, que antecedem o escolar, nos quais constroem saberes, conhecimentos, valores, culturas e identidades. A EJA é compreendida não como recuperação do passado perdido, mas como direito do sujeito ao exercício da cidadania plena. É dentro dessa perspectiva, buscando compreender a partir da percepção dos sujeitos como o currículo da escola pode contribuir para a formação de estudantes jovens e adultos do Campo, que essa pesquisa foi iniciada. O currículo é compreendido aqui como uma dinâmica socioeducacional, como espaço onde se produzem e se criam significados sociais que não se situam apenas na consciência pessoal ou individual, são estreitamente ligados a relações sociais de poder e desigualdade. O reconhecimento da experiência, a construção da autonomia e a emancipação, são elementos fundantes no debate sobre currículo na EJA do Campo. A abordagem metodológica utilizada é a pesquisa-ação, tendo em vista a participação e transformação da realidade. Os procedimentos utilizados até o momento foram a exploração bibliográfica e a observa participante. Os resultados iniciais indicam um grupo mobilizado para um cotidiano escolar que precisa ser compreendido como espaço de produção, de transformação e de mobilização de saberes. PALAVRAS-CHAVE: Campo, Currículo, Educação de Jovens e Adultos. INTRODUÇÃO O Campo sempre foi visto como lugar de atraso, uma realidade a ser superada e, por esse motivo, as políticas sociais e educacionais não foram vistas pelo poder público como prioritárias para esse lugar. Nesse percurso, quando a educação escolar passou a ser ofertada, ela foi desenvolvida na perspectiva da Educação Rural adequada aos modelos políticos de desenvolvimento econômico efetivados no campo, cujas bases se fundamentavam nos interesses das classes dominantes (AZEVEDO, 2007, p. 145), o que provocou profundas cicatrizes no processo de escolarização desses sujeitos, em específico na EJA. 03015

2 Esse trabalho apresenta os primeiros passos de uma pesquisa que é desenvolvida com os alunos e professores da EJA da Escola Municipal da Amizade, localizada no distrito de Humildes em Feira de Santana, considerando o contexto de uma comunidade rural que apresenta um processo de industrialização e modificação nas relações sociais, culturais econômicas e de trabalho. Conta com o objetivo geral de compreender, a partir da percepção dos sujeitos, como o currículo da escola pode contribuir para a formação de estudantes jovens e adultos do Campo. Assim, foram definidas três categorias de análise para o percurso da investigação: EJA, Currículo e Campo. Nesse viés, a EJA em sua atual configuração não é compreendida como recuperação do passado perdido, mas como direito do sujeito ao exercício da cidadania plena (DI PIERRO,JOIA, RIBEIRO, 2001), um espaço de práticas e reflexões que, inevitavelmente, transborda os limites da escolarização em sentido estrito. Isto por abarcar processos formativos diversos onde podem ser incluídas iniciativas visando a qualificação profissional, o desenvolvimento comunitário, a formação política e inúmeras questões culturais providas de outros espaços que não o escolar. O currículo é compreendido aqui como uma dinâmica socioeducacional, espaço onde se produzem e se criam significados sociais que não se situam apenas na consciência pessoal ou individual, mas estão estreitamente ligados a relações sociais de poder e desigualdade. Na categoria Campo, é necessário refletir que a Educação Rural desvinculase do Campo, que por meio de movimentos sociais começaram a reivindicar, dentre os direitos políticos, econômicos e sociais, o direito a políticas educacionais específicas e diferenciadas (ARROYO,CALDART,MOLINA, 2004). Isso se reflete no entendimento de uma educação básica do Campo, voltada para os interesses, sociais, econômicos e culturais dos homens e mulheres que moram e/ou trabalham no Campo. A opção pela metodologia da pesquisa-ação foi baseada no convívio diário com os sujeitos e nas características do contexto. Para Barbier (2002, p.59), a pesquisa-ação torna-se ciência da práxis exercida pelos técnicos no âmago de seu local de investimento. Assim, deve contribuir para transformar a realidade e produzir conhecimentos relativos a essa transformação, a partir da constatação de um problema que demande intervenção e investigação por parte do pesquisador. 03016

3 A composição do grupo se constituiu no primeiro passo. A estratégia foi utilizar o desejo comum de repensar o papel da escola do Campo, capaz de tornar o ensino e a aprendizagem mais críticos, formando estudantes da EJA mais autônomos, preparados para intervir na realidade existente e transformá-la. O critério foi o voluntariado, assim, cinco professoras, incluindo a coordenação da escola se disponibilizaram a participar integralmente. Também foram convidados a participar da pesquisa um grupo de 35 estudantes, os quais apresentavam frequência regular. O projeto foi apresentado aos sujeitos da pesquisa em momentos distintos, primeiro aos docentes, depois aos estudantes, o qual contou com a contribuição dos sujeitos sobre incluir as gestoras da escola no processo, proposta acatada por entender que a gestão educacional democrática assenta-se na mobilização dinâmica e em equipe do elemento humano, coletivamente organizado (LUCK 2011, p. 23). A proposta de atividades a serem desenvolvidas com o grupo foi apresentada e validada com os sujeitos. Esse momento também possibilitou a reflexão do grupo e a avaliação sobre o nível de comprometimento no processo, além de dar suporte a um estudo mais direcionado sobre os próximos passos a serem dados na pesquisa. Os encontros sinalizaram para a necessidade de construção e fortalecimento de alguns conceitos para os diferentes sujeitos, prioritariamente os conceitos de emancipação, autonomia, participação, currículo, Projeto Político Pedagógico, EJA e Campo. Neste cenário, fez-se necessário realizar uma opção teórica acerca das questões relativas ao currículo na EJA do Campo, pois as teorias do currículo se imbricam com os elementos da realidade e precisam ser entendidas naquilo que as fundamentam, para que possamos estabelecer as conexões com os eventos do contexto social e histórico. Nesse aspecto, Silva (2007) aponta que as teorias tradicionais eram teorias de aceitação, ajuste e adaptação. Enquanto as teorias críticas são teorias de desconfiança, questionamento e transformação radical. É na efervescência dessas discussões que surgem as teorias críticas, numa inversão de fundamentos até então postos pelas teorias tradicionais, já que as teorias críticas não estavam mais preocupadas em discutir como fazer o currículo, mas sim em entender o que o currículo faz. Segundo Macedo (2012, p.38), ao desconfiar do status quo, as teorias críticas vão direcionar seus olhares críticos sobre as iniquidades sociais e as injustiças que excluem através dos atos de currículo. Para o autor, o currículo deve estar envolvido 03017

4 com uma heterogeneidade articulada a uma educação em prol do bem comum socialmente referenciado, a uma educação motivada pela crítica aos processos de convencimento, adaptação e repressão da hegemonia dominante, capaz de estabelecer a busca pela ruptura do status quo e pela crítica ao currículo como reprodutor da cultura de dominação e da desigualdade social. O reconhecimento da experiência, a construção da autonomia e a emancipação, são elementos fundantes no debate sobre currículo na EJA do Campo. As teorias críticas evidenciam que o currículo se configura como um artefato socioeducacional indispensável para não negar ou garantir possibilidades aos sujeitos de acesso e usufruto dessa cidadania. Não seria possível realizar uma opção teórica acerca do currículo sem refletir sobre a especificidade da EJA. Este tem sido um tema polêmico e controvertido desde os primeiros momentos em que começou a ser pensada. Segundo Paiva (2004), ressignificar os processos de aprendizagem pelos quais os sujeitos se produzem e se humanizam, ao longo de toda a vida, é o que constitui o verdadeiro sentido da EJA. Dessa forma, para se alcançar uma práxis que possibilite uma aprendizagem significativa, é imprescindível que sejam consideradas no processo educativo, informações que desvelem o contexto nos quais esses sujeitos estão inseridos. Na compreensão de Arroyo, Caldart e Molina (2004, p.176) o Campo se distingue do rural por representar mais do que um perímetro não urbano, é um campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção das condições da existência social e com as realizações da sociedade humana. A complexidade desse espaço é para além de físico, é também econômico, social, cultural e político. Assim, Quanto mais se afirma a especificidade do campo mais se afirma a especificidade da educação e da escola do campo. Mais se torna urgente um pensamento educacional e uma cultura escolar e docente que se alimentem dessa dinâmica formadora. Também mais se afirma a necessidade de equacionar a função social da educação e da escola em um projeto de inserção do campo no conjunto da sociedade. (ARROYO, CALDART, MOLINA, 2004, p.13) A educação possui o desafio de ressignificar a escola, considerando sua função social e cultural, vinculadas aos interesses e ao desenvolvimento sociocultural dos diferentes grupos sociais que habitam e trabalham no Campo para atender as necessidades e expectativas desses sujeitos. 03018

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A continuidade dessa investigação tem a pretensão de apresentar a experiência de uma escola do Campo em busca de uma formação de qualidade para os jovens e adultos, a partir do currículo em uma perspectiva crítica, percebido como instrumento ideológico e espaço de criação e transformação, o que implica no desenvolvimento de sujeitos que possam transgredir e se empoderar de condições outras, que lhes permita compreender a realidade em que estão inseridos. É preciso, pois, que os sujeitos da Educação de Jovens e Adultos possam reconhecer o lugar em que estão e a partir dele possam estabelecer novas relações com o mundo e reconhecerem-se como sujeitos de direitos, tendo a autonomia como princípio elementar. Nesse bojo, a escola precisa ser entendida como espaço de transformação, lugar dos diversos saberes e de mobilização. REFERÊNCIAS ARROYO, Miguel Gonzalez. CALDART, Roseli Salete. MOLINA, Mônica Castagna. Por uma educação do campo. 3ªed. Petrópolis - RJ: Vozes, 2004. AZEVEDO, Márcio Adriano de. Política de Educação do Campo: concepções processos e desafios. In: CABRAL NETO, Antonio et al. Pontos e contrapontos da política educacional: uma leitura contextualizada de iniciativas governamentais. Brasília: Liber Livros, 2007. BARBIER, R. A pesquisa-ação. Brasília: Plano,2002 (Série Pesquisa em Educação, vol. 3). DI PIERRO, Maria Clara, JOIA, Orlando, RIBEIRO, Vera Masagão. Visões da educação de jovens e adultos no Brasil. Caderno Cedes, ano XXI, nº 55, novembro/ 2001. LUCK, Heloisa. Concepções e processos democráticos de gestão educacional. 7ª. ed.,petrópolis - RJ: Vozes,2011. MACEDO, Roberto Sidnei. Currículo: campo, conceito e pesquisa. 5ª.ed., Petrópolis- RJ: Vozes, 2012. PAIVA, J. Educação de jovens e adultos: questões atuais em cenário de mudanças. In: OLIVEIRA, I. B. de, PAIVA, J. (orgs.). Educação de Jovens e Adultos. Rio de Janeiro: DP&A, 2004. SILVA, Tomás Tadeu da. Documentos de Identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. 03019