PODER JUDICIÁRIO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 68451/CE (2006.05.00.024572-4) AGRTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL AGRDO : AUTARQUIA MUNICIPAL DE TRANSITO E SERVIÇOS PUBLICOS E CIDADANIA DE FORTALEZA AGRDO : TRANA CONSTRUÇÕES LTDA AGRDO : FOTOSENSORES TECNOLOGIA ELETRÔNICA LTDA ADV/PROC : JACKELINE DE AZEVEDO AGRDO : ELISEU KOPP & CIA LTDA AGRDO : EMPRESA INDUSTRIAL TÉCNICA S/A AGRDO : GERALDO CABRAL RÔLA FILHO AGRDO : FRANCISCO BALTAZAR NETO ADV/PROC : FERNANDO ALFREDO R. FRANCO AGRDO : EGIDIO BOFFÁ AGRDO : UNIÃO ORIGEM : 2ª VARA FEDERAL DO CEARÁ - CE RELATOR : DES. FED. RUBENS DE MENDONÇA CANUTO (Convocado) RELATÓRIO O Sr. Des. Fed. RUBENS DE MENDONÇA CANUTO (Convocado): Trata-se de agravo por instrumento interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) de decisão que indeferiu medida liminar postulada em sede de ação civil pública para sobrestar as Concorrências Públicas ns. 004/2005 e 005/2005 da Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e Cidadania de Fortaleza (AMC), impedir a divulgação de resultados referentes a esses certames e obstar a contratação de qualquer outra empresa com dispensa de licitação para executar o objeto licitado. O MPF sustenta que referidas licitações, realizadas pela autarquia de trânsito do Município de Fortaleza visando a implantação de sistema de fiscalização eletrônica em vias municipais, estão eivadas de ilegalidade. Como principal delas, o MPF destaca que as empresas participantes do certamente estão sob controle societário de um mesmo grupo familiar, evidenciando a inexistência de efetiva concorrência. Foram apresentadas contraminutas pela AMC (fls. 327/350), União Federal (fls. 645/654), Empresa Industrial Técnica S/A (EIT) e Geraldo Cabral Rôla Filho (fls. 658/663), Trana Construções Ltda. (fls. 695/703) e Eliseu Kopp & Cia. Ltda. (fls. 723/735). A Procuradoria Regional da República da 5ª Região opinou pelo reconhecimento da ilegitimidade ativa do MPF, visto que a controvérsia diz respeito a interesse local e não federal, com a extinção do processo, nos termos do art. 267, VI, do CPC (fls. 750/755). É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 68451/CE (2006.05.00.024572-4) AGRTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL AGRDO : AUTARQUIA MUNICIPAL DE TRANSITO E SERVIÇOS PUBLICOS E CIDADANIA DE FORTALEZA AGRDO : TRANA CONSTRUÇÕES LTDA AGRDO : FOTOSENSORES TECNOLOGIA ELETRÔNICA LTDA ADV/PROC : JACKELINE DE AZEVEDO AGRDO : ELISEU KOPP & CIA LTDA AGRDO : EMPRESA INDUSTRIAL TÉCNICA S/A AGRDO : GERALDO CABRAL RÔLA FILHO AGRDO : FRANCISCO BALTAZAR NETO ADV/PROC : FERNANDO ALFREDO R. FRANCO AGRDO : EGIDIO BOFFÁ AGRDO : UNIÃO ORIGEM : 2ª VARA FEDERAL DO CEARÁ - CE RELATOR : DES. FED. RUBENS DE MENDONÇA CANUTO (Convocado) VOTO O Sr. Des. Fed. RUBENS DE MENDONÇA CANUTO (Convocado): O presente agravo de instrumento, interposto pelo MPF, visa reformar decisão interlocutória que, em sede de ação civil pública, indeferiu pedido de concessão de liminar para sobrestar as Concorrências Públicas ns. 004 e 005/2005 da Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e Cidadania de Fortaleza (AMC), impedir a divulgação de resultados referentes a esses certames e obstar a contratação de qualquer outra empresa com dispensa de licitação para executar o objeto licitado (implantação de sistema eletrônico de controle de trânsito e aplicação de penalidades aos infratores). As licitações vergastadas foram deflagradas pela autarquia municipal visando à execução indireta da atribuição que lhe foi conferida pelo art. 24, VI, do Código Nacional de Trânsito, que assim dispõe: Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição: (...) VI executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito; As Concorrências Públicas ns. 004 e 005/2005 da AMC estão sendo realizadas para que a entidade municipal delegue a uma empresa privada a execução de competência administrativa que lhe fora atribuída por lei, até porque referente a assunto de interesse local, nos termos do art. 30, V, da Constituição da República.
AGTR68451-CE V-2 PODER JUDICIÁRIO Por isso não se vislumbra qualquer interesse federal no feito. Tanto é verdade que nenhuma pretensão foi deduzida em face da União, autarquia ou empresa pública federal. Nada legitima a inclusão da União (DENATRAN) no pólo passivo desta relação processual. Não me resta nenhuma dúvida de que o MPF indicou a União como ré apenas com a finalidade de atrair a causa para sua esfera de atribuição e para a competência da Justiça Federal. Ocorre que a legitimidade ativa do MPF não se configura com a mera propositura da ação contra ente federal. É necessário mais, que haja interesse federal na lide. Em outras palavras, o que define a legitimidade do MPF é o objeto da controvérsia, e não a pessoa com quem litiga. Por exemplo, o MPF pode ser legitimado para propor ação contra um ente e gestores municipais por desvio de recursos públicos repassados pelo Governo Federal. Nesse caso, não estará demandando nenhuma entidade com foro na Justiça Federal, mas a causa, por seu objeto, enquadra-se nas suas atribuições. Noutra vertente, não é a simples propositura de uma ação contra a União, autarquia ou empresa pública federal que legitimará ativamente o MPF. Se a inclusão de uma dessas entidades no pólo passivo foi realizada indevidamente, porque não respaldada na lide deduzida em juízo, o ente federal demandado indevidamente deve ser excluído da lide e em seguida deve ser reconhecida a ilegitimidade ativa do Parquet Federal. Essa última situação corresponde exatamente ao caso dos autos, como notado pela AMC em sua contraminuta ao agravo e pela brilhante Procuradora Regional da República subscritora do parecer de fls. 750/755. A questão pertinente à ilegitimidade passiva da União e ativa do MPF não foi objeto de impugnação no presente agravo de instrumento, interposto, diga-se, exclusivamente pelo próprio MPF. Entrementes, isso não impede a sua apreciação por esta Corte. O efeito translativo dos remédios recursais, existente inclusive no agravo por instrumento, traz para o âmbito de cognição do juízo ad quem todas as questões de ordem pública que não foram abrangidas pelo efeito devolutivo. Assim, é juridicamente possível a extinção do processo sem resolução de mérito por carência de ação mesmo que essa matéria não tenha sido veiculada em agravo por instrumento e que a decisão do Tribunal piore a situação processual do agravante. Tratando-se de matéria de ordem pública, abrangida pelo efeito recursal translativo, não há que se falar em reformatio in pejus.
AGTR68451-CE V-3 PODER JUDICIÁRIO Em recente julgado, o Superior Tribunal de Justiça decidiu no mesmo sentido, ipsis litteris: PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ- EXECUTIVIDADE. PEDIDO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO INDEFERIDO. DECISÃO IMPUGNADA MEDIANTE AGRAVO DE INSTRUMENTO, NO QUAL SE FORMULA PEDIDO DE REFORMA PARA O FIM DE CONCESSÃO DO EFEITO SUSPENSIVO À EXCEÇÃO E DE PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO. APLICAÇÃO, PELO TRIBUNAL, DO EFEITO TRANSLATIVO DOS RECURSOS, COM A EXTINÇÃO DIRETA DA AÇÃO DE EXECUÇÃO NO JULGAMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO, INDEPENDENTEMENTE DE PEDIDO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. JULGAMENTO POR MAIORIA. DESNECESSIDADE DE INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS INFRINGENTES. - A Corte Especial do STJ estabeleceu o cabimento da interposição de embargos infringentes em acórdãos proferidos no julgamento de agravo de instrumento, inclusive nas hipóteses de julgamento que rejeita exceção de pré-executividade, contanto que tais acórdãos tenham decidido o mérito da controvérsia (EREsp nº 276.107/GO). - No processo sob julgamento, em que pese o fundamento principal que orientou o TJ/PR para extinguir a execução tenha sido o de que não haveria mora do devedor, o dispositivo legal em que o TJ/PR sustentou sua decisão é o do art. 267, 3º, do CPC. A decisão, portanto, não pode ser considerada de mérito, para fins de definição do recurso cabível. A hipótese se diferencia do precedente da Corte Especial e não é de se exigir a interposição prévia de embargos infringentes. - É possível a aplicação, pelo Tribunal, do efeito translativo dos recursos em sede de agravo de instrumento, extinguindo diretamente a ação independentemente de pedido, se verificar a ocorrência de uma das causas referidas no art. 267, 3º, do CPC. Precedente. - Não é possível, em sede de recurso especial, promover a revisão da matéria fática decidida. Súmula 7/STJ. Recurso especial a que se nega provimento. (RESP 736.966-PR, 3ª Turma, unânime, Relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 14/04/2009, DJE de 06/05/2009)
PODER JUDICIÁRIO AGTR68451-CE V-4 PROCESSO CIVIL AGRAVO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO QUE CONCEDEU LIMINAR EM AUTOS DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 512 DO CPC AFASTADA EFEITO TRANSLATIVO DOS RECURSOS ORDINÁRIOS APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ECONOMIA PROCESSUAL E DO PROCESSO DE RESULTADOS APONTADA OFENSA AOS ARTIGOS 458, II, E 535, II, DO CPC NÃO OCORRÊNCIA PEDIDO DE SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIA DA COTA DE PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA INSTITUÍDA PELA LEI N. 3.504/97 DE BIRIGÜI MINISTÉRIO PÚBLICO ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM PRECEDENTES DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL SUPERADA. Em respeito ao efeito translativo dos recursos ordinários, pode o Tribunal Estadual, ao julgar agravo interposto contra decisão concessiva de liminar, extinguir o processo sem julgamento do mérito, conhecendo de ofício da ilegitimidade da parte, por se tratar de matéria de ordem pública, suscetível de ser apreciada nas instâncias ordinárias. Tal regra privilegia, também, os princípios da economia processual e do processo de resultados. Não há nos autos qualquer omissão, contradição ou obscuridade, pois o egrégio Tribunal de origem apreciou toda a matéria recursal devolvida. Nesse eito, salientou a Corte a quo que "o juiz não está obrigado a examinar, um a um, os pretensos fundamentos das partes nem todas as alegações que produzem" (fl. 188); que "é cediço que condição da ação é matéria de ordem pública, devendo ser examinada de ofício na instância ordinária" (fl. 188); que foi "sustentada pelo agravante a ilegitimidade ativa ad causam do agravado, ora embargante" (fl. 189); e que "embargos de declaração não servem para suscitar polêmica em torno dos fundamentos do acórdão, sob pena de infringi-lo" (fl. 189). A função teleológica da decisão judicial é a de compor, precipuamente, litígios. Não é peça acadêmica ou doutrinária, tampouco destina-se a responder a argumentos, à guisa de quesitos, como se laudo pericial fora. Contenta-se o sistema com a solução da controvérsia observada a res in iudicium deducta. Ação civil pública promovida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo em face do Município de Birigüi, para obstar a cobrança da cota de participação comunitária instituída pela Lei Municipal n. 3.504/97. Ilegitimidade do Ministério Público Estadual para propor a ação civil pública, uma vez que, na hipótese em exame, não se trata de defesa de interesses coletivos ou difusos, transindividuais e indivisíveis, tampouco de direitos individuais indisponíveis e homogêneos, mas sim de direitos individuais, divisíveis e disponíveis de determinados contribuintes. O contribuinte "não é consumidor, no sentido da lei, desde que, nem adquire, nem utiliza produto ou serviço, como destinatário (ou consumidor) final e não intervém em qualquer relação de consumo" (Resp n. 57.645/PR, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 19.06.95). Divergência jurisprudencial superada. Recurso especial não conhecido. (RESP 302.626-SP, STJ, 2ª Turma, unânime, Relator Ministro Franciulli Netto, julgado em 15/04/2003, DJ de 04/08/2003, p. 255).
AGTR68451-CE V-5 PODER JUDICIÁRIO Não tendo sido deduzida nenhuma pretensão em face da União e não havendo interesse federal na causa, deve ser reconhecida, respectivamente, a ilegitimidade passiva da União e a ativa do MPF, com a exclusão da primeira da relação processual e a posterior extinção do feito sem resolução de mérito. Diante do exposto, reconhecendo ex officio a ilegitimidade passiva da União e a ativa do MPF, decreto a extinção do processo sem resolução de mérito, a teor do art. 267, VI, do CPC, e julgo prejudicado o agravo por instrumento. É como voto.
PODER JUDICIÁRIO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 68451/CE (2006.05.00.024572-4) AGRTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL AGRDO : AUTARQUIA MUNICIPAL DE TRANSITO E SERVIÇOS PUBLICOS E CIDADANIA DE FORTALEZA AGRDO : TRANA CONSTRUÇÕES LTDA AGRDO : FOTOSENSORES TECNOLOGIA ELETRÔNICA LTDA ADV/PROC : JACKELINE DE AZEVEDO AGRDO : ELISEU KOPP & CIA LTDA AGRDO : EMPRESA INDUSTRIAL TÉCNICA S/A AGRDO : GERALDO CABRAL RÔLA FILHO AGRDO : FRANCISCO BALTAZAR NETO ADV/PROC : FERNANDO ALFREDO R. FRANCO AGRDO : EGIDIO BOFFÁ AGRDO : UNIÃO ORIGEM : 2ª VARA FEDERAL DO CEARÁ - CE RELATOR : DES. FED. RUBENS DE MENDONÇA CANUTO (Convocado) EMENTA PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FRAUDE EM LICITAÇÃO MUNICIPAL. MATÉRIA DE INTERESSE LOCAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E ATIVA DO MPF. RECONHECIMENTO EX OFFICIO EM SEDE DE AGRAVO POR INSTRUMENTO. EFEITO TRANSLATIVO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. - Agravo interposto em ação civil pública pelo qual se pretende a concessão de medida liminar para sobrestar licitações realizadas pela Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e Cidadania de Fortaleza, impedir a divulgação de resultados referentes a esses certames e obstar a contratação de qualquer outra empresa com dispensa de licitação para executar o objeto licitado (implantação de sistema eletrônico de controle de trânsito e aplicação de penalidades aos infratores). - Licitações deflagradas por autarquia municipal visando delegar a execução de atribuição que lhe foi conferida por lei (art. 24, VI, do Código Nacional de Trânsito) com base em dispositivo constitucional que reserva para as entidades municipais a competência administrativa sobre assuntos de interesse local (art. 30, V, da CF). - Ausência de interesse federal. Inexistência de pretensão deduzida em face da União, autarquia ou empresa pública federal. Inclusão da União no pólo passivo apenas com a finalidade de atrair a causa para esfera de atribuição do MPF e para a competência da Justiça Federal. Irrelevância dessa conduta para fins de verificação da legitimidade do MPF e da competência da Justiça Federal, já que aquela deve ser aferida a partir do objeto litigioso, que deve envolver interesse federal. Acolhimento do parecer da Procuradoria Regional da República na 5ª Região.
AGTR68451-CE Ac-02 PODER JUDICIÁRIO - O reconhecimento da carência de ação pode ocorrer em sede de agravo por instrumento, ainda que ele verse exclusivamente sobre outras questões. Efeito translativo dos recursos, também existente no agravo, que possibilita ao órgão ad quem decidir de ofício sobre questões de ordem pública. Precedentes do STJ. - Reconhecimento, ex officio, da ilegitimidade passiva da União e da ativa do MPF. Extinção do processo, sem resolução de mérito, por carência de ação. Agravo prejudicado. Vistos, etc. ACÓRDÃO Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, reconhecer de ofício a ilegitimidade passiva da União e da ativa do Ministério Público Federal e julgar prejudicado o agravo, nos termos do Relatório, Voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Recife, 27 de outubro de 2009. (Data de julgamento) Des. Fed. RUBENS DE MENDONÇA CANUTO Relator Convocado