A PÓS-MODERNIDADE E A QUESTÃO DO SECOND LIFE 1. Anyelle Karine de Andrade 2, Universidade Estadual de Maringá. Elis Bertozzi Aita 3, Universidade Estadual de Maringá, CNPq. Paulo Sérgio Pereira Ricci 4, Universidade Estadual de Maringá, CNPq. Palavras-chave: Baudrillard, Pós-modernidade, Second Life. Para que se entenda o Second Life é necessário que se explicite o conceito de simulacro e o contexto atual denominado pós-modernidade. Segundo Baudrillard (1991), na pós-modernidade, o mundo atual está dominado pelo simulacro, e este está substituindo o real. Considera-se como exemplo de simulacro os games virtuais que estão representando uma nova realidade, por exemplo, o caso do Second Life. Entende-se por pós-modernidade, baseados em Peixoto (2004), a atual fase do capitalismo pós-industrial. Esse período tem como características a multiplicidade, o consumo de serviços, a produção de informações, a transformação de desejos em necessidade a fragmentação do conhecimento Para Baudrillard o capitalismo é divido em três fases. Segundo Peixoto, A primeira seria a correlação dos signos com a representação da realidade básica, a segunda seria quando o signo mascara e perverte a realidade básica, já a terceira, num estágio mais avançado, seria quando o signo mascara a ausência de uma realidade básica (PEIXOTO, 2004 apud TEIXEIRA; GIMENEZ; PERUZZO; 2007). No terceiro estágio do capitalismo, que é o estágio atual, imagens, representações e mesmo sentimentos transformam-se em mercadoria, pois o que conduz o mercado não é o real, mas a própria lógica interna do signo. O que é consumido atualmente é a imagem, com o objetivo de introduzir nas pessoas o desejo de consumir cada vez mais. 1 Trabalho resultante de um seminário apresentado na disciplina de Psicologia Geral do curso de Psicologia da Universidade Estadual de Maringá, sob orientação da Professora Msª Lenita Gama Cambaúva. 2 Graduanda do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá. Endereço: Rua Libero Badaro, 261. CEP 87030-080. Maringá PR. E-mail: anyelleandrade@hotmail.com. 3 Graduanda do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e bolsista PIBIC/CNPq pelo Projeto de Pesquisa "O conceito de subjetividade na atualidade: uma análise a partir da Psicologia Histórico-Cultural". Endereço: Rua Libero Badaro, 261. CEP 87030-080. Maringá PR. E-mail: lis_aita@hotmail.com. 4 Graduando do curso de Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá e bolsista PIBIC/CNPq pelo Projeto de Pesquisa Delimitação do conceito de consciência em Vigotski e Pavlov: primeiros apontamentos. Sob orientação da Professora Drª Silvana Calvo Tuleski. Endereço: Rua Quintino Bocaiúva, 1270. CEP 87020-160. Maringá PR. E-mail: paulo_ricci4@hotmail.com. 1
Segundo Baudrillard (1991) a era pós-moderna cria um mundo fantasioso e este mundo fantasioso cria o hiper real, este por sua vez é caracterizado por fazer um falseamento da realidade. O mundo contemporâneo é formado por esse hiper real a ponto de não se conseguir diferenciar o que é real e o que é hiper real. Este estágio do capitalismo é dominado pelo simulacro. Podemos associar simulacro à artificial, um conjunto de imagens fictícias cujos valores são vistos como verdades. No simulacro a representação do real é perfeita, sendo que na maioria das vezes melhor do que o próprio real. Na representação a realidade ganha uma nova máscara, falseando a consciência, fato este que garante e incentiva o consumo. Há uma perda do referencial que acaba ocasionando uma não diferenciação entre o real e o irreal, entre o autêntico e o falso, entre a verdade e a mentira. Para Baudrillard (1991) vivemos em um mundo em que tudo é simulacro, onde há o predomínio do fingimento, do mascaramento e da simulação. Um mundo que enterrou o social e o substituiu pela imagem, ou seja, pela representação. No contexto da pós-modernidade entende-se o Second Life como um dos exemplos da manifestação do simulacro, constituindo-se como um mundo imaginário paralelo. De acordo com Chauí (2005) a imaginação pode criar um mundo irreal que julgamos melhor do que o nosso, a ponto de recusarmos viver neste para viver imaginariamente naquele, perdendo todo o contato com o real. (CHAUÍ, 2005. p.145). Isso ocorre diariamente, em casos de pessoas que criam um mundo novo, imaginário, e mesmo sabendo que este mundo não passa de imaginação, estas pessoas preferem viver essa fantasia. É o que estamos vendo acontecer hoje com esse novo mundo, o mundo virtual. Um exemplo da criação de um mudo imaginário é o jogo do Second Life. A tradução ao pé da letra, Segunda Vida, realmente informa o que o jogo representa. Neste game podemos criar uma segunda vida, da maneira como quisermos. E o que as pessoas buscam neste jogo parece ser realmente isso, a criação de uma outra vida, uma segunda vida melhor do que a vida real. Second Life é um jogo on-line em que pessoas do mundo todo podem simular uma Segunda vida. No Second Life cria-se um personagem, denominado avatar, dando a ele um nome, escolhendo o estilo de roupas, cabelos, formato do corpo, ou seja, tudo novo e, provavelmente, da maneira com que sempre sonhamos ser. Passa-se a viver, assim, uma nova 2
vida, mantendo relações sociais virtuais, fazendo compras, e inclusive negócios, com apenas um clique. O Second Life foi criado pelo engenheiro americano Philip Rosedale. Segundo a revista Veja (2007) mais de 5,4 milhões de habitantes já passaram por lá, plugados a computadores em vários países. A maioria é de americanos, seguidos de europeus e, claro, de brasileiros, hoje a sétima maior população, com cerca de 216 000 pessoas on-line. No Second Life tem-se uma réplica do nosso mundo capitalista. Para entrar na simulação é grátis, mas se você desejar comprar algo no jogo, como uma casa, um carro, um terreno, roupas e acessórios, é preciso pagar tudo isso do mundo virtual com o seu real cartão de crédito. Para realizar compras, paga-se uma mensalidade de cerca de 10 dólares. A moeda usada no jogo chama-se linden (L$), mesmo nome da empresa do engenheiro que criou o Second Life. Por causa dessas taxas, entre outras, em um único dia, o Second Life chega a movimentar US$ 1,3 milhão, segundo a revista Veja (2007). É possível ganhar dinheiro com esse mundo virtual. Existe no Second Life réplicas das marcas mais famosas de roupas, sapatos e etc. As organizações dessas lojas no mundo real montaram seus avatares virtuais e lucram vendendo seus produtos neste mundo on-line. Segundo a revista Veja (2004),...a chinesa radicada na Alemanha Ailin Graef, avatar Anshe Chung, (...) em dois anos e meio amealhou 1 milhão de dólares de verdade construindo e vendendo imóveis que só existem de mentirinha. (MING, 2004. p. 101) Conforme o exemplo do avatar Chung, muitas empresas e pessoas estão dedicando seu tempo para ganharem dinheiro nesse mundo virtual. Já existe o Second Life Brasil, totalmente em português. No site brasileiro pode-se comprar a moeda virtual diretamente com a moeda brasileira, com cartão de crédito nacional ou até com boleto bancário, ou seja, o Second Life está obtendo sucesso no Brasil. As empresas, faculdades, entre outros, estão percebendo o crescente interesse da população mundial pelo Second Life, e por isso estão investindo cada vez mais no jogo. Isso está tornando o game cada vez mais real, e incentivando as pessoas a realmente acreditarem estar vivendo outra vida. Second Life não passa de um jogo, mas está assumindo a forma de um site de relacionamentos, onde pessoas do mundo todo podem se comunicar, com a diferença de estarem vivendo um personagem. 3
Segundo a Revista Veja (2004), na reportagem A vida como ela não é, de autoria de Bel Moherdaui e Laura Ming: (...) o que move a maioria das pessoas a se dar ao trabalho (e dá trabalho) de montar no computador uma vida novinha em folha não é nem dinheiro, nem curiosidade, nem desencanto com o mundo real, nem proficiência digital. É a oportunidade de viver uma versão idílica da própria vida, o que geralmente significa boa forma, casa perfeita, carrão e, sim, uma boa dose de sexo também. (MOHERDAUI; MING; 2004. p. 97) Existem milhares de outras pessoas que não estão se preocupando em manter uma vida social no mundo real. Os relacionamentos virtuais estão substituindo os reais, e muitas pessoas estão se contentando em ter apenas a vida social virtual. Isso pode acarretar uma descrença na vida real, e uma acomodação, no sentido de não mais tentar se relacionar com outras pessoas reais, já que a vida virtual aparentemente supre essa falta. As pessoas estão cada vez mais vivendo suas vidas isoladas, fechadas em seu quarto com a impressão de estarem conectadas ao resto do mundo pela internet. Quando as pessoas pensam sobre isso, este fato parece muitas vezes estar distante de suas vidas. Isso tudo na verdade é muito mais comum do que muitos imaginam. Por causa disso, todo esse sucesso do Second Life preocupa muitos psicólogos. Segundo Osmaneze (2007), em matéria publicada no Portal CosmoOnline de Campinas, para a doutora em psicologia social e professora da Pontifícia Universidade de Campinas (PUC- Campinas), Silvana Brandão a necessidade de criar outra vida é uma manifestação de impossibilidade real de satisfação, liberdade e felicidade. A angústia pode ser compensada ou aliviada por mecanismos ilusórios de felicidade e realização. (BRANDÃO apud OSMANEZE, 2007) Alguns indivíduos estão buscando nesse mundo virtual uma vida feliz que não tem no mundo real. E quando estão jogando o Second Life, têm a ilusão de estarem em uma vida feliz e realizada. Osmaneze (2007) afirma que Brandão explica que o investimento em experiências virtuais em detrimento das experiências reais é um indício de que o jogo está se tornando um vício. Além disso, o jogo pode estar causando certo conformismo com a vida real. O maior risco é o virtual assumir o real, ou seja, o investimento nas realizações humanas fica depositado nas experiências virtuais e a vida real fica limitada a reproduções (BRANDÃO apud OSMANEZE, 2007). 4
É certo que a tecnologia nos trouxe muitas vantagens tais como o acesso instantâneo à informação, e a uma difusão muito grande do conhecimento, mesmo que esse seja fragmentado. Porém esta conexão permanente entre o mundo real e virtual acaba por reduzir o tempo de reflexão. A partir disso, devemos pontuar que não precisamos nos desfazer da internet ou dos jogos. O que realmente deve ocorrer é o uso saudável desse novo mundo. O que precisamos distinguir hoje é, a diversão e o entretenimento, da vida real. Podemos sim montar uma outra vida no Second Life. O que não podemos é esquecer que este outro mundo não passa de um jogo e de uma diversão momentânea, e que quando fizermos o log off vamos voltar a nossa outra vida, a vida real. E se esta vida não for a que sempre desejada, deve-se agir e ir em busca de novas perspectivas. Se a vida real não é a mesma da do Second life, deve-se ao menos tentar transformar este mundo no qual vivemos, quebrar os tabus e preconceitos, lutar por uma sociedade com melhores valores do que estes que estão postos hoje. Tem-se que tentar criar neste mundo real, uma segundo vida, um novo mundo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAUDRILLARD, J.; A pressão dos simulacros. In:. Simulacros e Simulação. Lisboa: Relógio d água, 1991. CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ed. Ática, 2005. 13º edição. CHAVES, Érica; LUZ, Lia. A nova civilização on-line: A geração que cresceu com a internet vive em ritmo acelerado e já aboliu a separação entre os relacionamentos do mundo real e aqueles do virtual. Veja, Edição especial: TECNOLOGIA. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/especiais/tecnologia_2007/p_012.html>. Acesso em: 22 nov. 2007. MOHERDAUI, Bel. MING, Laura. A vida como ela não é. Veja, ano 40, n. 15, p. 96-101. 18 abril. 2004. OSMANEZE, Fabiano. Second Life vira febre mundial. Disponível em: <http://www.cosmo.com.br>. Acesso em: 10 nov. 2007. TEIXEIRA, A. C; GIMENEZ, G; PERUZZO, I. P. Jean Baudrillard: Uma concepção do pós-modernismo. In: III Congresso Internacional de Psicologia e IX Semana da Psicologia. 2007. Maringá. Anais... Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2007. 1 CD. 5