A atuação do INMET, CPTEC e da Marinha do Brasil/CHM durante a ocorrência de um sistema de baixa pressão no oceano Atlântico Sul em março de 2010 Marcia dos Santos Seabra 1, Alaor Dall Antonia Júnior 2 1 Instituto Nacional de Meteorologia. Eixo Monumental Via S1. Sudoeste Brasília DF. CEP: 70680-900. marcia.seabra@inmet.gov.br. 2 Instituto Nacional de Meteorologia. Eixo Monumental Via S1. Sudoeste Brasília DF. CEP: 70680-900. alaor.dallantonia@inmet.gov.br ABSTRACT: The formation, development and displacement of a low pressure system along the coast south and southeast of Brazil in early March 2010 resulted in the joint work of the INMET, CPTEC and Brazil Navy in order to provide meteorological information in consensus for the National Civil Defense, media and general population. The monitoring and prediction of this meteorological system were performed in consensus throughout the event and had a great importance for society since it placed the three official organs of Meteorology in Brazil working together with the objective to prevent the population from an extreme meteorological event. Palavras-Chave: Previsão do tempo, sistema de baixa pressão, avisos meteorológicos, Defesa Civil Nacional. 1. INTRODUÇÃO Sistemas de baixa pressão atmosférica estão, na maioria das vezes, associados a eventos meteorológicos adversos como chuvas intensas e rajadas de vento forte, e são monitorados e previstos pelos órgãos oficiais de Meteorologia no país, que se utilizam de boletins e avisos meteorológicos para informar as condições meteorológicas associadas, no intuito de auxiliar a tomada de decisão dos órgãos de Defesa Civil Nacional e Estaduais. Desde o dia 04 de março de 2010 (quinta -feira) quando os modelos numéricos começaram a desenvolver um sistema de baixa pressão em superfície que poderia atingir a costa sul do Brasil, o INMET, a Marinha do Brasil e o CPTEC começaram a discutir sobre essa possibilidade e imediatamente a Defesa Civil Nacional foi contatada. No dia seguinte, com os modelos ainda indicando a possibilidade de o sistema atingir a costa sul do Brasil entre os dias 08 e 10 de março, e a temperatura da superfície do mar chegando a 33 C no litoral de São Paulo os órgãos oficiais de Meteorologia no Brasil, mais uma vez conversaram e à tarde foi realizada uma reunião em Brasília com membros da Defesa Civil Nacional, meteorologistas do INMET e um representante do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Nessa reunião, foram passadas as conclusões que foram tomadas em consenso entre o INMET, Marinha e o CPTEC, além da discrepância entre as soluções dos modelos numéricos, que aumentava o grau de incerteza do dia e local exato que o sistema de baixa pressão atingiria a costa sul do Brasil. A partir dessa reunião, foi decidido que os órgãos oficiais de Meteorologia elaborariam um texto em consenso, com atualização no mínimo diária, para a Defesa Civil Nacional, com todas as informações dos modelos numéricos e possíveis locais atingidos pelo sistema meteorológico. Além dessas ações, a Marinha do Brasil manteve contato com o National Hurricane Center (NHC) em Miami durante todo o evento, já que o NHC é o centro de furacões para o oceano Atlântico reconhecido pela Organização Meteorológica Mundial (OMM). O objetivo desse trabalho é mostrar a comunidade que os órgãos oficiais de
Meteorologia no país atuaram de forma coordenada e com contato direto com a Defesa Civil Nacional durante todo o evento no início de março de 2010. 2. MATERIAL E MÉTODOS Para o monitoramento de fenômenos meteorológicos, como um sistema de baixa pressão no oceano que pode ganhar características tropicais são utilizados, principalmente, informações de imagens de satélite, estações meteorológicas no continente e bóias oceanográficas no oceano. Para a previsão de fenômenos meteorológicos são utilizados os modelos numéricos de previsão de tempo. O INMET processa um modelo numérico chamado de Modelo Brasileiro de Alta Resolução (MBAR), que é gerado duas vezes ao dia, e gera previsões para cinco dias (120 horas), com intervalos a cada seis horas, para toda a América do Sul. Existem outros modelos numéricos usados, como o ETA, que é rodado no CPTEC também duas vezes ao dia, com previsões até sete dias (168 horas), intervalos a cada seis horas e também para toda a América do Sul e o HRM da Marinha do Brasil/SMM que também é processado duas vezes ao dia, com validade para 78 horas com intervalos a cada seis horas. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na ocasião do primeiro final de semana do mês de março de 2010, os modelos numéricos MBAR, ETA e HRM mostravam em seus prognósticos a formação, em aproximadamente 19 S e 37 W (na costa sul da Bahia), e o deslocamento de um centro de baixa pressão ao longo do litoral do Brasil (desde o sul da Bahia até o litoral norte do Rio Grande do Sul), o qual era previsto atingir a costa de Santa Catarina entre os dias 08 e 10 de março, de acordo com as rodadas dos modelos dos dias 05 e 06 de março. A Figura 1 apresenta a carta de superfície com os dados das estações meteorológicas e as isóbaras (obtidas do modelo MBAR) referente ao dia 05 de março de 2010 às 12 UTC. Nela destaca-se com a letra B o centro de região de baixa pressão atmosférica posicionado no litoral sul da Bahia. Outro ponto que se destacava para o monitoramento e previsão do deslocamento do sistema de baixa pressão no oceano foi a temperatura da superfície do mar (TSM), acima do normal no litoral sudeste e sul brasileiro para o período. No início de março, a TSM encontrava-se, em alguns pontos do litoral brasileiro com temperaturas de até 33 C. A Figura 2 apresenta a composição de imagens do satélite meteorológico NOAA no período de 01 a 05 de março de 2010. Nela é possível observar valores de TSM de 30,1 C no litoral entre os estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo e um máximo de 33,1 C na costa de São Paulo. Esses valores são extremamente altos para a região, tornando-se o ambiente altamente favorável para a intensificação do sistema de baixa pressão. Identificados a formação do sistema de baixa pressão no litoral sul da Bahia, a condição favorável de TSM e a previsão dos modelos numéricos indicando o deslocamento do sistema até o sul do país, atingindo a costa do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, os órgãos oficiais de meteorologia no país (INMET, CPTEC e CHM/Marinha do Brasil) iniciaram o monitoramento do sistema e chegaram a um acordo consensual na emissão de Avisos Meteorológicos em comum. Nesses textos, elaborados desde o dia 06 até o dia 10 de março e enviados para o Gabinete da Presidência da República, órgãos de Defesa Civil e imprensa, constavam sempre as últimas informações pertinentes ao caso, onde eram destacadas as áreas passíveis de serem atingidas por chuvas e/ou ventos fortes.
Figura 1: Carta Meteorológica de Superfície referente ao dia 05/03/2010 às 12UTC. Fonte: INMET. Figura 2: Composição de imagens do satélite meteorológico NOAA no período de 01 a 05 de março de 2010. Fonte: INMET. A Figura 3 apresenta imagens do satélite GOES-12 nos dias 05 (Figura 4a) e 06 (Figura 4b) de março de 2010, ambas no horário de 21:15 UTC. Na Figura 4a, observa-se a nebulosidade associada à área de baixa pressão no entre o litoral sul da Bahia e o litoral norte do Espírito Santo. Vinte e quatro horas depois (Figura 4b) a região de baixa pressão deslocouse para o litoral do Espírito e outra região formou-se entre o litoral sul de São Paulo e o Paraná. No dia 06 de março, devido ao deslocamento do sistema de baixa pressão do litoral sul da Bahia até o litoral do Rio de Janeiro foi emitido um Aviso Meteorológico, em consenso entre o INMET e o CPTEC, devido as condições favoráveis à ocorrência de chuva moderada a forte com trovoadas no Espírito Santo e Rio de Janeiro, além de ventos fortes, variando entre 40 e 70 Km/h, com rajadas podendo ultrapassar os 100 Km/h. A validade do aviso compreendia os dias 06 e 07 de março de 2010 e o mesmo foi encaminhado para a Defesa Civil Nacional e também para a imprensa. A Tabela 1 apresenta os maiores valores de chuva registrados em 24 horas em estações meteorológicas convencionais e automáticas do INMET. Em Vitória (ES), a chuva de 108,9 mm no dia 07/03 corresponde a 98% de todo o valor esperado para março. No Alto da Boa Vista (RJ) a chuva em 24 horas foi 5% acima do valor esperado. Já na Vila Militar, na zona oeste da cidade do Rio Janeiro, o acumulado em 24 horas foi 98,6 mm sendo que em apenas 3 horas na noite do dia 06, o acumulado foi de 89,4 mm. No total, seis pessoas morreram por conta de deslizamentos na cidade do Rio de Janeiro entre os dias 06 e 07 de março de 2010. Na noite dia 06 de março as rajadas de vento chegaram a 65 Km/h na Restinga da Marambaia no litoral sul do Rio de Janeiro, 59 Km/h em Jacarepaguá na zona oeste e 54 Km/h no Forte de Copacabana, zona sul da cidade.
Tabela 1: Chuva no dia 07/03/2010 e valor esperado para o mês de março. Fonte: INMET, 1992. Chuva em 07/03/2010 (mm) Climatologia de março (mm) Alto da Boa Vista (RJ) 109 103,3 Rio de Janeiro (Centro - RJ) 93,3 103,3 Vila Militar (RJ) 98,6 103,3 Vitória (ES) 108,9 111,1 A Figura 3 apresenta a rodada do MBAR no dia 07/03/2010 às 00 UTC para o campo de pressão ao nível médio do mar, vento a 10 metros e precipitação acumulada em 6 horas. Observa-se o deslocamento (em uma região com TSM acima de 30 C, conforme apresentado anteriormente) do sistema de baixa pressão a partir do litoral do Espírito Santo, atingindo a costa de Santa Catarina no dia 09/03/2010 às 15 horas (hora local) (Figura 7c). Nesse caso o modelo indicava um centro de 1004 hpa. O modelo ETA do CPTEC em uma de suas soluções previu uma baixa pressão com centro de 996 hpa (figuras não mostradas). (a) (b) (c) Figura 3: Previsão do Modelo MBAR processado em 07/03/2010 às 00UTC para o dia 07/03/2010 às 06 UTC (a), 08/03/2010 às 06UTC (b) e 09/03/2010 às 18 UTC (c). Fonte: INMET. Em resumo, os modelos numéricos MBAR/INMET, ETA/CPTEC e HRM/CHM (figuras não mostradas) indicavam um sistema de baixa pressão em superfície atingindo a costa do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina entre os dias 09 e 10 de março de 2010. As rodadas entre os dias 06 e 10/03 apresentavam grande variação de resultados e daí a necessidade de monitoramento intenso por parte dos órgãos oficiais de Meteorologia e o contato direto com a Defesa Civil. A seguir serão apresentadas algumas imagens de satélite para o período entre 09 e 11/03 e alguns dados meteorológicos das condições observadas no sul do Brasil. A Figura 5 apresenta imagens do satélite GOES-12 entre a manhã do dia 09 e a manhã do dia 10 de março de 2010. É possível observar a nebulosidade associada ao sistema de baixa pressão em superfície na costa do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. O dia 09 foi aquele em que o sistema esteve mais próximo a costa, conforme se observa na Figuras 11a. Na Figura 11b, referente a manhã do dia 10/03 observamos o deslocamento do sistema de baixa pressão para o leste, em direção ao oceano Atlântico Sul.
(a) (b) Figura 5: Imagens do satélite GOES-12 para o dia 09/03/2010 às 11:15UTC (a) e 10/03 às 08:15UTC (b). Apesar da proximidade do sistema na costa, não foram observados dados muito significativos de chuva e rajadas de vento em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. No sul de Santa Catarina foram observados os maiores valores de rajadas de vento entre os dias 08 e 10/03. Em Santa Marta (litoral sul) e Urubici (região de serra no sul de SC) os ventos chegaram a 70 Km/h nos dias 10 e 08 de março, respectivamente. Já os acumulados de chuva em 24 horas na região sul não ultrapassaram os 20 mm. Destaque para os 17,4 mm em Porto Alegre (RS) no dia 10 e 15 mm em Torres (nordeste do RS) no dia 08 de março. Não foram notadas quedas acentuadas da pressão atmosférica nas estações meteorológicas durante a aproximação do sistema de baixa pressão. As bóias de deriva que estavam na região durante o período do evento registram apenas o valor da TSM. Portanto, não é possível saber os valores de pressão e vento no oceano. 4. CONCLUSÕES A interação entre os órgãos oficiais de Meteorologia e a Defesa Civil Nacional foi de extrema importância no monitoramento do sistema de baixa pressão que se aproximou da costa sul do Brasil no início de março de 2010. Todas as análises e avisos meteorológicos foram elaborados em consenso entre o INMET, a Marinha e o CPTEC e publicados em suas respectivas páginas na internet, e encaminhados para a imprensa e para a Defesa Civil Nacional com a devida urgência. Após esse evento, os órgãos de Meteorologia (INMET, Marinha e CPTEC) decidiram em uma reunião realizada no Centro de Hidrografia da Marinha (CHM) em Niterói (RJ) no dia 19 de março de 2010, elaborar um protocolo de ações e procedimentos para enfrentamento de fenômenos severos tropicais no Atlântico Sul. Dentre as recomendações do protocolo estão o pedido de inclusão as área marítima brasileira como área de ocorrência de ciclones tropicais e a elaboração de uma lista em termos em tupi-guarani para nomeação dos ciclones tropicais, que será a lista oficial adotada pelo Brasil. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Instituto Nacional de Meteorologia, 1992: Normais Climatológicas (1961-1990), 82pp, Brasília Distrito Federal.