REALIDADE DE UM CAPS ad : A EVASÃO DO USUÁRIO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS



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Transcrição:

REALIDADE DE UM CAPS ad : A EVASÃO DO USUÁRIO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS FREITAS, Julliane Alves; CAIXETA, Camila Cardoso; MAIA, Ana Paula Araujo de Lima; PEDROSA, Digeane Cristine Cardoso. UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE ENFERMAGEM jullianealvesf@hotmail.com

INTRODUÇÃO: Na década de 80 e 90 ocorreram mudanças significativas na realidade da assistência de saúde mental no Brasil com a realização das Conferencias Nacionais de Saúde Mental. Com estas conferencias surgem a Portaria 189 do Ministério da Saúde de 1991, da Secretaria Nacional de Assistência à Saúde (SAS) e do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) que definem o financiamento público para os Núcleos/Centros de Atenção Psicossocial (NAPS/CAPS), contemplando o custeio da assistência de pacientes que demandam cuidados intensivos por equipes multiprofissionais. E, a Portaria 224 do Ministério da Saúde de 1992 que formaliza as funções dos NAPS/CAPS como unidades de saúde locais e regionalizadas com população adscrita, como possibilidade de funcionamento 24 horas durante os 7 dias da semana (COSTA; SIQUEIRA; SILVA et al 2011). O CAPS é entendido como um serviço baseado na abordagem psicossocial que tem por objetivo promover a atenção aos usuários baseada em evidências científicas e principalmente com uma ação de base comunitária. De acordo com a Reforma Psiquiátrica, a rede assistencial proposta por esta política é baseada na criação de uma rede de atenção aos usuários de modelo extra-hospitalar, inserido na comunidade, de caráter interdisciplinar e que evita a cronificação dos pacientes e o isolamento social. (COSTA; SIQUEIRA; SILVA et al 2011). Cabe ressaltar que o modelo psicossocial que foge ao modelo hospitalocentrico não se faz apenas com a implantação de novos serviços, mas com a transformação das práticas que levam ao usuário a ter controle do seu tratamento e assim aderi-lo diante do que lhes é oferecido em um CAPS (SCHNEIDER; SPOHR et al. 2006). Segundo a portaria n 336/02 do dia 19 de fevereiro de 2002 os CAPS são divididos em CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPSi e CAPSad : CAPS I com capacidade operacional para atendimento em municípios com população entre 20.000 e 70.000 habitantes; CAPS II com capacidade operacional para atendimento em municípios com população entre 70.000 a 200.000 habitantes; CAPS III com capacidade operacional para atendimento em municípios com população acima de 200.000 e com atenção continua durante 24 hrs; CAPSi Serviço de atenção psicossocial para atendimentos a crianças e adolescentes, constituindo-se na referência para uma população de cerca de 200.000 habitantes e CAPS ad Serviço de atenção psicossocial para atendimento de pacientes com transtornos decorrentes do uso e dependência de substâncias psicoativas, com capacidade operacional para atendimento em municípios com população superior a 70.000. (MS. PORT. N 336/02).

O CAPS CASA situa-se no Distrito Sanitário Central da cidade de Goiânia, Goiás. Trata-se de um serviço que contempla usuários de álcool e drogas adultos de ambos os sexos com idade acima de 18 anos residindo em Goiânia, que procuram o serviço espontaneamente ou encaminhados por outros serviços de saúde ou pela via judicial. A partir do acolhimento, é traçado o plano inicial de tratamento, com caráter multiprofissional, de modo que o paciente compareça aos atendimentos, atividades terapêuticas e de convivência programadas, com a frequência definida conforme sua necessidade, podendo variar de um regime não-intensivo até um intensivo de atendimentos (Projeto Terapêutico- CAPS CASA. Goiânia, Setembro 2007). Nesta perspectiva de cuidado do usuário de drogas inserido no CAPS, um dos fatores que chama a atenção para o cuidado integral é a adesão do usuário ao tratamento construído. A adesão ao tratamento envolve o estabelecimento de vínculo entre o usuário do serviço e equipe de saúde, de forma que haja compromisso mútuo, nas atividades integradas ao tratamento e o favorecimento de mudanças no comportamento em relação ao uso de drogas (VASTERS; PILLON, 2011). Dadas as altas taxas de abandono de tratamento frequentemente encontradas em programas de saúde mental, podem ocorrer distorções importantes na avaliação desses serviços, caso as informações relativas aos pacientes que não se mantiveram em tratamento não sejam incluídas. A avaliação das taxas de abandono deve também levar em conta a aceitação ou a rejeição das estratégias de tratamento: uma intervenção deve ser considerada inefetiva se seus usuários a consideram inaceitável e a rejeitam. Ou seja, entre inúmeros motivos capazes de explicar os abandonos de tratamento, inclui-se sua rejeição pelos pacientes e/ou familiares. (RIBEIRO, ALVES, VIEIRA et al. 2008) Um estudo realizado por RIBEIRO, ALVES, VIEIRA et al. 2008 identificou que variáveis sociodemográficas, psicopatológicas e interativas, de diagnóstico e tratamento podem ser consideradas preditoras de abandono. Ainda que padrões mais estáveis não tenham sido identificados, tais achados sugerem que alguns subgrupos de pacientes necessitem de abordagens de características personalizadas, a fim de influenciar positivamente sua adesão final ao tratamento indicado. Para tanto, este estudo se justifica por entender a importância de discutir e refletir sobre a evasão dos usuários de álcool e outras drogas do CAPS ad CASA, contribuindo desta forma para a reflexão da importância do tratamento ao usuário respeitando suas

especificidades, necessidade do fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e a elaboração de ações que visem a qualificação dos profissionais do serviço. Como Objetivo tem-se apontar as taxas de evasões do tratamento proposto no CAPS ad CASA pelos usuários de álcool e outras drogas e refletir sobre os possíveis fatores que contribuem para esta evasão dialogando com a literatura. As taxas serão obtidas através da análise dos prontuários de usuários ativos e inativos no serviço. Trata-se de um estudo exploratório, descritivo, de abordagem qualitativa. O estudo documental caracteriza-se como uma fonte de coleta de dados restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes primárias. Estas podem ser feitas no momento do acontecimento do fato ou fenômeno, ou posteriormente. (LAKATOS; MARCONI. 1991). A pesquisa qualitativa se preocupa com um nível de realidade que não pode ser quantificado, trabalha com o universo de significados, das ações, motivos, aspirações, valores, atitudes e relações humanas, captadas a partir do olhar do pesquisador, ou seja, preocupa-se principalmente em compreender e explicar a dinâmica das reações sociais (MINAYO. 1996) Este estudo pertence há um projeto maior intitulado Motivos da Evasão e/ou Permanência do usuário de Drogas no CAPS ad CASA: Ouvindo os usuários, registrado junto ao Sistema de Acompanhamento de Pesquisas sob o número 40598. Foi encaminhado para o CAPS ad CASA para autorização para manuseio de prontuários e também encaminhado à Secretaria Municipal de Saúde para obtenção da aprovação à realização da pesquisa. Posteriormente à apreciação pela FEN/UFG, o projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás (CoEP/UFG) e aprovado sob protocolo nº 476.974. Foram incluídos nesta pesquisa os prontuários dos usuários do CAPS ad CASA ativos e inativos abertos no período de janeiro de 2012 a janeiro de 2013. Caracteriza-se como prontuários inativos aqueles em que os usuários não tiveram nenhuma presença a partir do acolhimento ou sem participação em qualquer atividade terapêutica nos últimos 6 meses. Como critério de inclusão participariam aqueles usuários que possuíam idade acima de 18 anos que possuíam prontuário aberto no período descrito e como critério de exclusão não participariam aqueles usuários os quais os prontuários foram abertos fora do período estabelecido e que possuíam idade inferior a 18 anos. Para a realização da coleta de dados utilizou-se um roteiro que contempla o nome, data de nascimento, idade, endereço, telefone, data do acolhimento, se participou dos quatro

módulos do acolhimento propostos pelo CAPS, se participa de algum grupo terapêutico, a data do último atendimento, número de consultas medicas com psiquiatra ou clinico geral e o número de atendimentos entre o primeiro e o ultimo atendimento (APENDICE 1). Para análise dos dados quantitativos será utilizado o programa Epi-info versão 3.5.3, baixado gratuitamente a partir do CDC (Centers for Desease Control and Prevention- HTTP://wwwn.cdc.gov/epiinfo/html/downloads.htm) que fornecerá os gráficos e suas comparações. Foram analisados 801 prontuários no CAPS ad CASA, onde identificou-se que 196 destes pertenciam a usuários de álcool e 605 destes pertenciam a usuários de outras drogas. Nas tabelas abaixo encontram-se os valores referentes a quantidade de usuários ativos e inativos, e o tempo de permanência no serviço de cada um deles. Os dados serão discutidos seguindo três eixos que podem ser considerados fatores que contribuem para a evasão do usuário: especificidade da droga de uso/abuso, ausência do vínculo com serviço/profissional e as dificuldades de articulação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Tabela 1: Frequência dos usuários ativos e inativos de acordo com a especificidade da droga no período de janeiro de 2012 a janeiro de 2013. ATIVO INATIVO TOTAL Usuário de Álcool 58 138 196 Usuário de Outras Drogas 101 504 605 Fonte: Prontuários do Cento de Atenção Psicossocial ad CASA; Tabela 2:Tempo de permanência dos usuários inativos de acordo com a especificidade da droga no período de janeiro de 2012 a janeiro de 2013. INATIVO TEMPO NO SERVIÇO Usuário de Álcool 138 1 a 3 meses (30,6% dos usuários) Usuario de Outras Drogas 504 Menos de 1 mês (59,2% dos usuários) Fonte: Prontuários do Cento de Atenção Psicossocial ad CASA;

Conseguimos inferir destes dados que em relação a evasão do serviço, os usuários de outras drogas deixam o serviço em uma proporção maior que os usuários de álcool. Em relação ao tempo de permanência no serviço foi identificado que a maior parte dos usuários de outras drogas que abriram prontuários no CAPS ad CASA permaneceram menos de um mês no serviço, concluindo assim, que participaram apenas do acolhimento. Segundo o Ministério da Saúde (2004), o Brasil é o 62 pais com o maior consumo de álcool da América Latina e a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) identificou em uma pesquisa realizada em 2007 que 12% da população brasileira tem algum problema com o álcool. Esses dados nos revelam a necessidade de um tratamento amplo, que englobe não só as necessidades clinicas mas também as psicossociais. O álcool contribui para o surgimento e manutenção de vários problemas sociais, econômicos e de saúde no Brasil. O abuso de álcool promove patologias no fígado, sistema digestivo, deficiências nutricionais, disfunção sexual; transtornos como agressividade, depressão, crises psicóticas; conflitos familiares; complicações judiciais como dirigir embriagado, crimes violentos cometidos após ou durante o consumo de álcool, delitos relacionados a comportamentos agressivos ou anti-sociais consequentes do abuso de álcool. (MS. 2004) Alves (2004) afirma que o tratamento mais indicado para usuários de álcool é o Tratamento Integrado de técnicas psicossociais e farmacológicas. Esse tipo de tratamento inclui além do acompanhamento médico, fatores motivacionais, estratégias para aumentar a aderência ao tratamento, educação acerca da relação entre as patologias existente, treinamento de habilidades cognitivo-comportamentais, reorganização das redes sociais, assim como o tratamento específico e individualizado para cada transtorno seja ele clinico, psicológico ou social. Com os dados obtidos neste estudo vimos que os usuários de álcool permanecem por mais tempo no serviço, o que nos leva a inferir que as complicações advindas do abuso do álcool geram comorbidades clinicas e psiquiátricas que promovem a aproximação do usuário com o serviço garantindo o acompanhamento do seu atendimento clínico em regime de atenção diária, evitando desse modo as internações em hospitais psiquiátricos e garantindo a promoção da reinserção social. Uma pesquisa realizada pela FioCruz (Fundação Oswaldo Cruz) revelou que o Brasil tem cerca de 370 mil usuários de drogas (ilícitas) nas capitais e a região de maior consumo é a nordeste com 148 mil usuários. O abuso de drogas promove no indivíduo uma mudança no

estilo de vida, geralmente constituído de uso indiscriminado da substancia e um aumento na vulnerabilidade a causas externas como aumento da agressividade gerando lesões físicas, comportamento sexual arriscado, violência e exposição aumentada a patógenos. O uso/abuso das drogas esta relacionado a perdas afetivas e materiais e também a problemas de ordem física, psiquiátrica e social. A elas estão entrelaçadas as perdas que vão desde objetos pessoais até o afastamento da sociedade e o isolamento para o consumo incessante dessa droga. A ausência de um verdadeiro e significativo sentido existencial contribui para a deturpação do respeito, da confiança e da credibilidade que lhes eram atribuídos antes da dependência. (BRANCO et al. 2012). Identificamos no CAPS ad CASA que o maior número de evasões corresponde aos usuários de outras drogas. Pode-se inferir que o uso de drogas esta associado a um momento de prazer e/ou fuga, ocupando alguma falta e neste contexto um conjunto de fatores podem influenciar o estado de disposição para o tratamento favorecendo-o ou não, fatores como: gênero, história anterior de tratamento, padrão de consumo, idade, etc. O CAPS deve intervir treinando as habilidades sociais, estimulando e proporcionando formas para a pratica do autocontrole, realizando a entrevista motivacional, promovendo o manejo de estresse, terapia conjugal comportamental e reforçando a necessidade da comunidade na sua reinserção social. SOUZA et al (2006) em seu estudo afirma que para o sucesso do tratamento dos usuários de álcool e outras drogas faz-se necessário a submersão na rede de relações do indivíduo, pois essas, em conjunto, dão forma ao verdadeiro corpo do fato da dependência da droga, e remete aos vínculos afetados do indivíduo com sua família, serviço ou meio em que esta inserido. Todos os CAPS buscam construir através de sua estrutura física, das atividades e da atuação dos profissionais um ambiente acolhedor, uma casa onde o usuário pode pertencer a uma comunidade e desta forma apoia, promove saúde e proporciona a criação de novos vínculos. Essa atuação do CAPS recebe a denominação de rede operante que é definida por ser parte de uma rede social com o qual o sujeito foco obtém apoio, ajuda material, serviços e contatos sociais. (SOUZA et al. 2006). Contudo em determinadas situações identificamos que alguns profissionais não são engajados na pratica psicossocial devido a uma formação voltada para o modelo medico e hospitalocentrico, o resultado desse atendimento é a segregação e exclusão do usuário dentro da própria unidade.

Um dos fatores que podem contribuir para os altos índices de evasão do serviço e redução no tempo de permanência é a falta de vínculo com a unidade e/ou profissional por receberem um atendimento pouco acolhedor. O usuário que chega até um CAPS ad, em maioria, possui perda de grandes vínculos familiares, trabalho, amigos- e partindo dos pressupostos estabelecidos pela Reforma Psiquiátrica, o serviço deve ser capaz de auxiliar o indivíduo a estabelecer e manter os vínculos saudáveis e duradouros reduzindo assim a vulnerabilidade aos fatores de risco para o consumo de álcool ou outras drogas. Dentro desse contexto a educação permanente dos profissionais de saúde podem qualificar o atendimento prestado para o paciente. TAVARES (2006) afirma que educação permanente é compreendida como sendo um processo educativo contínuo, de revitalização e superação pessoal e profissional, de modo individual e coletivo, com objetivo de qualificação, reafirmação ou reformulação de valores, construindo relações integradoras entre os sujeitos envolvidos para uma praxe crítica e criadora. Em relação aos profissionais do campo da saúde mental o objetivo da educação permanente é consolidar os princípios estabelecidos da reforma psiquiátrica. Para que isso ocorra os tradicionais programas de educação continuada, destinados apenas a informar os indivíduos sobre recentes avanços em seu campo de conhecimento, devem ser substituídos por programas mais amplos de educação permanente que visem articular conhecimentos profissionais específicos com o de toda a rede de saberes envolvidos no sistema de saúde. (TAVARES. 2006). A Rede de Atenção Psicossocial é parte integrante do Sistema Único de Saúde (SUS), rede organizada de ações e serviços públicos de saúde, instituída no Brasil através da Lei Federal na década de 90. O SUS regula e organiza em todo o território nacional as ações e serviços de saúde de forma regionalizada e hierarquizada, em níveis de complexidade crescente, tendo direção única em cada esfera de governo: federal, municipal e estadual. (MS. 2005) Segundo o decreto n 7. 508/11 é definido por Rede de Atenção à Saúde o conjunto de ações e serviços de saúde articulados em níveis de complexidade crescente, com a finalidade de garantir a integralidade da assistência à saúde. A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) é a rede de saúde mental integrada, articulada e efetiva nos diferentes pontos de atenção para atender as pessoas em sofrimento e/ou com demandas decorrentes dos transtornos mentais e/ou do consumo de álcool, crack e outras drogas. A RAPS é constituída pela Atenção Básica em Saúde: unidade básica de saúde, núcleo de apoio a saúde da família, consultório na rua, centros de convivência e cultura;

Atenção Psicossocial Estratégica: CAPS; Atenção de Urgência e Emergência: SAMU, sala de estabilização, UPA 24 horas e portas hospitalares de atenção à urgência/pronto socorro; Atenção Residencial de Caráter Transitório; Atenção Hospitalar: enfermaria especializada em hospital geral, serviço hospitalar de referência para atenção às pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas; Estratégias de Desinstitucionalização: serviços residenciais terapêuticos, programa de volta para casa e Estratégias de Reabilitação Psicossocial: iniciativas de geração de trabalho e renda, empreendimentos solidários e cooperativas sociais. As principais características da RAPS são: seu caráter essencialmente público, com ênfase nos serviços de base comunitária adequando-se às necessidades dos usuários e familiares e a sua atuação baseada no território gerando e transformando lugares e regiões. Tem-se como objetivos: ampliar o acesso à atenção psicossocial da população em geral, promover a vinculação das pessoas em sofrimento/transtornos mentais e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas e suas famílias aos pontos de atenção, garantir a articulação e integração dos pontos de atenção das redes de saúde no território, qualificando o cuidado por meio do acolhimento, do acompanhamento contínuo e da atenção às urgências. (MS.2011) Diante à complexidade das demandas de inclusão conclui-se que somente uma organização em rede, e não apenas um serviço ou equipamento, é capaz de promover a inclusão e reinserção social de pessoas estigmatizadas, é a articulação em rede de diversos equipamentos da cidade, e não apenas de equipamentos de saúde, que pode garantir resolutividade, promoção da autonomia e da cidadania das pessoas com transtornos mentais. Para a organização desta rede, a noção de território é especialmente orientadora. (MS.2005) O CAPS dentre todos os dispositivos da RAPS é o grande articulador uma vez que seu surgimento demonstrou a possiblidade de uma nova possibilidade de tratamento substituindo em muitos casos os Hospitais Psiquiátricos. Trata-se do núcleo de uma nova clínica, produtora de autonomia, que convida o usuário à responsabilização e ao protagonismo em toda a trajetória do seu tratamento. (MS.2005) A ineficiência da RAPS deixa de seguir uma das principais diretrizes do SUS: a integralidade. Segundo esta a assistência à saúde deve ser continua e articulada com ações preventivas e curativas, individuais e coletivas em todos os níveis de complexidade do sistema. Com a ausência da atenção em qualquer componente da rede há um comprometimento na autonomia e reinserção social do usuário que em maioria encontra-se fragilizado e vulnerável pelo uso/abuso de álcool e outras drogas. Garantir o funcionamento

da RAPS significa ampliar a atenção à saúde ao indivíduo e como consequência teríamos menos evasões de tratamentos. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Os altos índices de evasões do CAPS ad CASA nos leva a refletir na necessidade de fortalecimento da rede de Atenção ao usuário, investimento na educação permanente dos profissionais que atuam e a eminência de cuidados específicos e individuais respeitando as especificidades de cada usuários. Este estudo traz algumas reflexões e levanta a possibilidade de outras pesquisas que possam intervir junto ao CAPS na tentativa de mudança da realidade apresentada.

REFERENCIAS: ALVES, H; KESSLER, F; RATTO, LRC. Comorbidade: uso de álcool e outros transtornos psiquiátricos. Revista Brasileira de Psiquiatria. 2004; BRANCO, FMFC; SOUSA, MNP; BRITO, NCC; MEDEIROS, JM; ROCHA, VLPO; et al. Compulsão, criminalidade, destruição e perdas: o significado do crack para os usuários. Enfermagem em Foco. 2012; COSTA, NR; SIQUEIRA, SV; UHR, D; et al. REFORMA PSIQUIÁTRICA, FEDERALISMO E DESCENTRALIZAÇAO DA SAÚDE PUBLICA DO BRASIL. Ciência e Saúde Coletiva. 2011; DECRETO Nº 7.508, de 28 de JUNHO de 2011; FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Estimativa do Número de Usuários de Crack e/ou Similares nas Capitais do País. Brasília-DF. 2013; LAKATOS, EM; MARCONI, MA. TÉCNICAS DE PESQUISA. In: Lakatos EM, Marconi MA.FUNDAMENTOS DE METODOLOGIA CIENTÍFICA.3a ed. São Paulo (SP): Atlas; 1991. p.195-200; LEI Nº 8.080, de 19 de SETEMBRO de 1990; MAYAN, M. UNA INTRODUCCIÓN A LOS MÉTODOS CUALITATIVOS. Modulo de Entrenamiento para Estudiantes y Profesionales, International Institute for Qualitative Methodology, 2001; MINAYO, M. C. S. O DESAFIO DO CONHECIMENTO: PESQUISA QUALITATIVA EM SAÚDE. São Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Abrasco; 1996; SCHNEIDER, DR; SPOHR, B; LEITÃO, C. Caracterização dos Serviços de Atenção de Dependência de Álcool e Outras Drogas na região da Grande Florianópolis. Revista de Ciências Humanas. n 39, p 219-236. Florianópolis. 2006; MINISTÉRIO DA SAÚDE. PORTARIA/ GM N 336. Brasília- DF. 19 de Fevereiro de 2002; MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA DE ATENÇÃO À SAÚDE. DEPARTAMENTO DE AÇÕES PROGMATICAS ESTRATÉGICAS. Saúde Mental no SUS: Os Centros de Atenção Psicossocial. Brasília- DF. 2004; MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA DE ATENÇÃO À SAÚDE. DEPARTAMENTO DE AÇÕES PROGRAMÁTICAS ESTRATÉGICA. Álcool e Redução de Danos: Uma Abordagem Inovadora para Países em Transição. 1 edição. Brasília- DF. 2004; MINISTÉRIO DA SAÚDE. Reforma Psiquiátrica e Política de Saúde Mental no Brasil. Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas Brasília. Novembro de 2005;

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APENDICE 1: Roteiro semi-estruturado para realização de entrevista com usuários do CAPS CASA ad: Entrevista com Usuário: 1. Quais os motivos que o levaram ao CAPS CASA ad? 2. Em sua opinião, quais os motivos que levaram a se distanciar do serviço? 3. Em sua opinião, quais os motivos que levaram a permanecer nas atividades propostas pelo serviço?