A EVOLUÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONTRATUAIS E SUA FUNÇÃO SOCIAL



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Transcrição:

Revista Jurídica da Unic / Emam - v. 1 - n. 1 - jul./dez. 2013 A EVOLUÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONTRATUAIS E SUA FUNÇÃO SOCIAL Maximilliam Mayolino Leão 1 DA TEORIA DOS CONTRATOS Apontaremos, por este breve estudo, discorrer sobre a evolução do tratamento jurídico do contrato, um dos mais relevantes institutos jurídicos da sociedade capitalista, onde o ordenamento brasileiro, todavia, não tratou de conceituar o instituto do contrato, sua definição é uma construção doutrinária. Vivemos no mundo dos contratos, pois todos os dias realizamos vários contratos, ao comprar um produto, na utilização dos serviços público ou na execução de nosso trabalho, pois sem adentrarmos nas controvérsias 1 Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela UMSA-Universidade do Museu Social Argentino em Buenos Aires em Fase de elaboração de Tese, é Administrador de Empresas, formado com Habilitação em Comercio Exterior pela Universidade de Cuiabá, onde também formou em Direito com expertise na área Criminal, Filosófica, Contratual e Administrativa, possui Mestrado em Ciências da Computação pela UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina nas áreas de concentração de Administração e Gerência de Redes e Desenvolvimento de Contratos e Atos Jurídicos de eventos ligados à Tecnologia e serviços de terceiros SLA, Atualmente é Professor titular dos cursos de Direito, Administração, Sistemas de Informação e Engenharia de Produção tendo como maior ênfase as áreas Administrativas, Tecnológicas, Contratualista, Criminal, Filosófica e Psicologia Jurídica, com sólidos conhecimentos em Negócios de Rede e Consultoria Empresarial, Foi pesquisador FIC/UFMT/NAT(NASA) 2000/2003, foi membro Coordenador Pesquisador do (NPCD) Núcleo de Pesquisas em Computação Distribuída (UFSC)2000/2002, Membro da SBC Sociedade Brasileira de Computação, Foi Coordenador Geral da FIC - Faculdade de Informática de Cuiabá de 1999 a 2005 e Pesquisador do NPDSI (Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Sistema de Informação Unic/ADM)2004/2008, cursou MBA em Gestão Acadêmica pela Unipos/ UNIC.Atua como Professor de Pós Graduação nos cursos de Direito, Administração, Sistema de Informação e Engenharias.foi Diretor Geral da UNIC-VG/FAUSB, Grupo Krotron Educacional, onde também Coordenou os Cursos de Direito2006/2011 e Administração 2006/2011. Atuou mais de 1993 a 2006 anos como Consultor Federal em Administração e Tecnologia junto ao Ministério dos Transportes - Departamento Nacional de Estradas de Rodagem e Departamento Nacional de Infraestrutura e Terrestre nas áreas de Tecnologia, Administrativa, acompanhado Processos, Logística e a área Jurídica contratos e licitações. Tem de experiência desde 1988 nas áreas da Ciência da Computação, com ênfase em Arquitetura de Sistemas de Computação, Ambientes de Desenvolvimento e Plataformas de Operação, Periféricos e Redes, atuando principalmente em Estruturação Ambiental e Banco de Dados, Projeto de Sistemas, Planejamento de Redes e Infraestrutura de Segurança Física e Lógica, tendo ampla experiência na Dinâmica dos Crimes Virtuais e Avaliação de Segurança Física em Redes Locais e Intranet s. Foi Conselheiro Fiscal para assuntos Técnicos no Estado de Mato Grosso, Ouvidor Setorial de Saúde do Estado, é Perito Técnico Judicial Trabalhista, Tem sólida experiência em gestão de acadêmica de ensino superior desde 1994,(Educacional/Administrativa/Financeira) Foi Presidente do Instituto de Assistência à Saúde dos Servidores do Estado de Mato Grosso(2010/2011), foi Assessor Técnico Jurídico Autárquico (2008/2010), foi Assessor Especial de Administração Sistêmica(2006/2007).

148 A evolução dos princípios contratuais e sua função social que cercam o problema da conceituação do contrato, podemos defini-lo como o acordo de vontades, celebrado entre duas ou mais pessoas, com objeto economicamente apreciável, que visa criar, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos e obrigações. Em outros lastros temos também que o contrato é convenção estabelecida entre duas ou mais pessoas para constituir, regular ou extingui entre elas uma relação jurídica patrimonial, ou é uma espécie de negócio jurídico que se distingue, na formação, por exigir a presença de pelo menos, de duas partes, portanto o contrato é um negócio jurídico bilateral, ou plurilateral, bem como podemos ainda entender que o contrato é o ato jurídico em virtude do qual duas ou mais pessoas se obrigam, por consentimento recíproco, a dar, fazer, ou não fazer alguma coisa. Nosso entendimento tarjem a esclarece que contrato é um acordo de vontades para o fim de adquirir, transferir, modificar ou extinguir direitos, vontades estas, na conformidade da lei, e com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, conservar ou modificar direitos, ou seja, um conceito mais sintético, pelo qual, o contrato é um acordo de vontades com a finalidade de produzir efeitos jurídicos, e por este cerne de conceito, podemos perceber que o distrato e o adendo contratual também têm natureza jurídica contratual, pois aquele pretende extinguir os contratos e este objetiva modificá-los. O contrato, em tempos modernos, faz parte do dia-a-dia dos cidadãos, seja em sua relação com o Estado, seja com outros membros da sociedade, pois ao longo das décadas, a relação contratual sofreu profundas modificações, impulsionadas, em sua grande parte, pela implementação de políticas econômicas e pelos avanços dos direitos dos consumidores. No âmbito do Direito Civil, o contrato é todo acordo de vontades de fundo econômico entre pessoas de Direito Privado que tenham por objetivo a aquisição, o resguardo, a transferência, a conservação, a modificação ou a extinção de direitos, recebendo o amparo do ordenamento jurídico. Desta forma para que se tenha um contrato, fazem-se imprescindíveis requisitos básicos como, agentes capazes, objeto lícito e possível, e forma adequada à lei, ou quando não houver forma prescrita, que não seja defesa pelo ordenamento, ladeado a esses elementos, temos aquele no qual se origina o contrato, o acordo de vontades, onde ela há de ser livre e voluntária. Outro grande entendimento é que o contrato possui duas funções primordiais, sendo a primeira a econômica e a segunda social, onde a

Maximilliam Mayolino Leão 149 primeira caracteriza-se pelo auxílio ou papel que presta na circulação de riquezas, e já no que concerne à função social, constitui-se ele meio de civilização, de educação do povo para a vida em sociedade. DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONTRATO O direito primitivo já havia estabelecido costumes que regulavam os contratos, pois em uma tribo ou clã celebrava um acordo com outra tribo, para fornecimento de algum produto ou cessão de um direito e somente os chefes das tribos ou os comissários por eles designados que pactuavam em nome de toda a tribo, desta forma, em caso de descumprimento, todo o grupo-credor poderia exigir o cumprimento do grupo inadimplente. Na busca da evolução e em tratando-se de leis escritas, na antiga Mesopotâmia que nos deparamos com os primeiros enunciados conhecidos acerca dos contratos, as chamadas leis de Eshnunna, promulgadas provavelmente entre os anos de 1825 e 1787 a.c., já dispunham sobre a compra e venda, arrendamento e empréstimo a juros, todavia o Código de Hamurabi, elaborado anos mais tarde no Império Babilônico, provavelmente em 1758 a.c., também continha dispositivos semelhantes, regulamentando alguns contratos específicos, a execução destes contratos, as taxas de juros cobradas, bem como o preço de determinados serviços. Assim, prescreve o 268 do Código de Hamurabi que: Se um homem alugou um boi para semear o grão, seu aluguel será de 2 sutu de cevada, o correspondente a 20 litros de cevada, em outra passagem, é fixada a taxa máxima de juros, se o empréstimo foi de cevada, os juros serão de 33% (1/3 do bem emprestado), se o empréstimo foi de prata, a taxa máxima será de 20%. Nesta visão podemos logo inferir que o direito dos contratos existe desde que o homem deu início às primeiras comunidades, no entanto, é o Direito Romano o primeiro a sistematizar a regulação contratual, criando algumas categorias de contratos, pois isto significa que contratos específicos receberam tratamento normativo em sociedades anteriores à romana, mas será esta que estabelecerá as bases para a teoria contratual, aplicável a todos os contratos, definindo requisitos, garantias e classificações. Cabe ressaltar que o Direito Romano apresenta períodos bem distintos, que fazem com que a regulamentação do contrato varie bastante de época a época, sendo desta forma, que o contrato do direito romano

150 A evolução dos princípios contratuais e sua função social arcaico é muito diferente do pósclássico, mas vejamos sinteticamente esta evolução para traçarmos um entendimento evolucionário. O direito romano arcaico funda-se que o contrato era o ato que submetia o devedor ao poder do credor, em razão da forte presença de crenças religiosas, especialmente nos deuses domésticos, o cumprimento de um contrato era questão de honra e o vínculo jurídico era pessoal, levando o credor, em caso de inadimplemento, a atingir o corpo do devedor. O entendimento modifica-se no Direito Romano clássico, pois podemos perceber a utilização de três vocábulos para designar fenômenos semelhantes: convenção, contrato e pacto, onde a convenção era o gênero e as espécies eram o contrato e o pacto, pois os contratos eram convenções normatizadas, e por isso protegidas pela via da actio. Três eram as espécies contratuais: a) litteris, que exigia inscrição no livro do credor (denominado codex); b) re, que se fazia pela tradição efetiva da coisa; c) verbis, que se celebrava pela troca de expressões orais, como em um ritual religioso. Estes contratos tinham proteção judicial prevista pelo ius civile, podendo o credor reclamar via actio, sua execução. Havia, no entanto, outra categoria de convenção, com finalidades semelhantes, o pacto que era um acordo não previsto em lei e não exigia forma especial, nem era protegido pela actio. Durante a república romana e o alto império romano a visão do direito romano clássico, para os pactos era mais frequente onde foi criada proteção judicial, onde os pretores, através de seus editos, começaram a proteger os pactos mais frequentes, o que acabou por apontá-los a categoria de contratos, desta forma criou-se, então, uma nova espécie contratual, os contratus solo consensu, que envolviam venda, locação, mandato e sociedade. Para estes contratos bastava a emissão de vontade, sem nenhuma formalidade e por fim, algumas constituições imperiais também concederam proteção a alguns tipos de pacto. Na Idade Média, por influência do direito germânico, o inadimplemento comumente ensejava a escravidão ou a prisão, pois o direito feudal, elaborado e aplicado pelo senhor dentro dos feudos, pressupunha um contrato prévio celebrado entre senhor feudal e vassalo, pelo qual assumiam obrigações recíprocas, onde ao vassalo era dada uma porção

Maximilliam Mayolino Leão 151 de terra, que deveria ser cultivada mediante o pagamento de uma parcela da produção, em contrapartida o vassalo devia a seu senhor a fidelidade (abster-se de atos hostis ou perigosos contra o senhor), o auxilium (ajuda militar e material, nem sempre de caráter pecuniário) que, na maioria das vezes, apresentava-se sob a forma de auxílio militar (de homens e armamentos) ou com o consilium (obrigação de auxiliar ao senhor com conselho sempre que este convocava). O contrato feudo-vassálico era ato formal e simbólico e a entrega da coisa ou de algo que a representasse era essencial para que o contrato se efetivasse. Aos poucos, em razão do desenvolvimento do direito canônico, a vontade foi sobrelevada como fonte do direito contratual, onde a palavra empenhada fazia lei, e o contrato não era somente uma questão jurídica, mas religiosa, pois assim, a boa-fé era essencial e o povo temia o perjúrio, condenado pela Igreja, desta feita a frequência da utilização de juramentos em nome de Deus na formação contratual. Ao mesmo tempo em que se resgatava o Direito Romano clássico, através do Corpus Iuris Civilis, que exigia a formalidade na constituição do contrato, a Igreja estabelecia: ex nudo pacto, actio oritur, os costumes municipais dos séculos XIII e XIV, em cidades da Itália, França e Países Baixos, admitiram o consensualismo no direito dos contratos, embora glosadores e comentadores resistissem. Para que houvesse contrato, bastava o consenso, o acordo de vontades e o respeito à palavra dada fazia do contrato uma obrigação moral, pois com o jusnaturalismo, a obrigatoriedade dos contratos é reforçada como regra fundada na própria razão e que deve prevalecer nos direitos nacionais, pois o homem é senhor de seus atos; indivíduo autônomo, que não deve se submeter a nenhuma autoridade exterior, desta forma, o contrato seria a submissão a normas criadas pelo próprio indivíduo, sendo, portanto, legitimada pela vontade das partes, que livremente pactuavam. São estas as ideias que serão inseridas nos códigos modernos pelos iluministas, onde a burguesia, como forma de manter o Estado afastado de suas atividades, assume o jusnaturalismo racionalista como fundamento do Direito e a vontade é eleita como fundamento da sociedade moderna da formação do Estado à fundamentação do Direito. Assim, tanto o Direito Público quanto o Direito Privado viram o surgimento do dogma da vontade em seu alicerce; o contrato como funda-

152 A evolução dos princípios contratuais e sua função social mento da sociedade capitalista. No Direito Público, a formação do Estado fundou-se no contrato social que, segundo Rousseau, pretende aliviar o homem da infelicidade gerada pela passagem do estado natural para a sociedade política, pois o contrato social, constituído pela vontade geral, era fonte legítima para ordenação social. Nas relações privadas, a vontade como fundamento se repetia nas relações comerciais especialmente após o impulso dado pelo Direito Canônico à boa-fé, o ideal de justiça era consectário da vontade individual dos contratantes, pois, ao assumir uma obrigação, o devedor restringe sua liberdade, mas por intermédio de sua própria vontade. No final do século XIX, na França, Fouillée podia resumir a concepção reinante dizendo, em expressão que ficou célebre, que toda justiça é contratual e que quem diz contratual, diz justo toute justice est contractualle; qui dit contractuel, dit juste. A ideia kantiana de que a legitimidade do contrato, ou mesmo da lei, está no fato do homem impor normas a si mesmo, fundamentou toda a teorização da autonomia liberal, pois o estabelecimento do direito abstrato possibilitou ampla circulação de riquezas e o contrato garantiria liberdade e igualdade jurídicas, pois estas advinham da própria vontade dos contratantes, onde a liberdade por meio da auto-regulação de interesses e a igualdade, meramente formal, pelo objetivo de se criar um campo de atuação em que condições pessoais não influiriam. Depois do implemento do Estado Social, com a proteção à parte mais vulnerável nos contratos de massa e com a reação ao desrespeito aos direitos de personalidade, a vontade já não possui o mesmo status no mundo jurídico. O Estado passou a intervir na economia do contrato, permitindo a modificação de suas cláusulas, obrigando determinadas pessoas a contratar ou estabelecendo cláusulas. A derrocada do voluntarismo veio com a nova hermenêutica, especialmente com os filósofos e psicólogos que trabalham a compreensão e vêem a vontade como expressão culturalmente condicionada, pois se as pessoas celebram contratos, não é simplesmente porque desejam, mas porque são movidas por necessidades, ainda que falsas, fantasiosas. Deste intervencionismo do Estado Social, passamos à crise contratual, um momento de revisão teórica, onde a teoria clássica dos contratos

Maximilliam Mayolino Leão 153 não oferece resposta satisfatória para os contratos de massa e o conteúdo contratual não pode mais ser previamente discutido e, na maioria das vezes, é imposto por uma parte ou pela lei, que fixa um conteúdo básico. Neste contexto, a importância dos princípios contratuais se sobreleva a boa-fé, a autonomia privada e a função social do contrato demonstram a modificação sofrida ao longo do século XX. O contrato não é apenas instrumento econômico, mas instrumento que deve contribuir para o pleno desenvolvimento do ser humano. PRINCÍPIOS CLÁSSICOS APLICADOS AOS CONTRATOS Antes de tratarmos dos princípios informadores dos contratos, é preciso distinguir os princípios clássicos dos que vigoram hodiernamente, isso porque, no decorrer do tempo, a matéria sofreu grandes transformações, advindas, em sua maioria, de políticas econômicas adotadas nos diferentes períodos da história do homem. A principiologia clássica encontra fundamento no liberalismo, que congregava a sociedade em torno do laissez-faire e o centro das atividades era a liberdade do cidadão em detrimento do intervencionismo estatal, onde entendia-se o Estado como mal necessário que deveria ser reduzido, ao mesmo tempo em que a vontade, ou melhor, o acordo de vontades ganhava status de lei. Até o Estado-juiz sofreu as consequências do liberalismo, na medida em que se fortaleceu o princípio da legalidade como forma de conter a discricionariedade do Judiciário, pois a liberdade era vista na sua concepção formal, isto é, a preocupação era em se garantir, por meio de lei, a simples liberdade de acordar, sem se aferir a sua aplicação na prática. O mesmo ocorria com relação à igualdade, bastava à presunção de que todos eram iguais para que se tivesse como presente o princípio da igualdade, onde em decorrência dessas concepções, que perduraram até o início do século XX, podemos dizer que quatro são os princípios clássicos da Teoria Geral dos Contratos: o da autonomia da vontade; o da obrigatoriedade dos contratos; o da relatividade dos contratos; e o do consensualismo. A matéria, entretanto, não é pacífica, entendendo alguns, como Silvio Venosa, que o princípio da boa-fé também deve ser inserido nesse rol. A autonomia da vontade assegura às partes total liberdade para concluir

154 A evolução dos princípios contratuais e sua função social os seus contratos e funda-se na vontade livre, sob dois aspectos: o prisma da liberdade propriamente dita de contratar ou não, estabelecendo-se o conteúdo do contrato e a pessoa com quem contratar; e o da liberdade de escolha das partes quanto à modalidade contratual a ser adotada. O princípio da força obrigatória dos contratos, conhecido pela expressão pacta sunt servanda, informa-nos que o contrato válido e eficaz deve ser cumprido entre as partes e essa obrigatoriedade forma a base do Direito contratual, porquanto sem ela não haveria possibilidade de se exigir o cumprimento do contrato por viajudicial, tornando-o inútil. Decorre desse princípio a intangibilidade do contrato, consoante a qual não pode haver alteração unilateral nem interferência do juiz no seu conteúdo, onde o fundamento para tanto é o fato de as partes terem contratado de livre e espontânea vontade; deve, portanto, cumprir o estritamente acordado. A vontade livre e espontânea é vista como o cerne do acordo, a regra é que os contratos só atinjam as partes que dele participaram, eis o princípio da relatividade dos contratos que alcança também o seu objeto mediato, onde devemos entender como parte contratual aquela que estipulou diretamente o contrato, esteja ligada ao vínculo negocial emergente e seja destinatária de seus efeitos finais. O referido princípio não é absoluto, comporta exceções a ser expressas exemplos: a estipulação em favor de terceiro, as convenções coletivas e fideicomisso constituído por ato intervivos. Pelo princípio do consensualismo, considera-se celebrado o contrato no momento em que as partes chegam ao consenso, na conformidade com a lei, dispensa assim, qualquer formalidade adicional e obriga, desde já, os contratantes. O Direito romano, no início, só reconhecia como válido o contrato formal, solene, e posteriormente, evoluiu e passou a admitir contratos não solenes, desde que presente o consenso entre as partes. Numa fase posterior, mesmo os contratos formais perderam aquelas fórmulas. Num primeiro momento, estas caíram em desuso, restando apenas menção de que haviam sido cumpridas, pois essa menção era mais importante do que as próprias fórmulas, e num segundo momento, até mesmo a menção deixou de ser exigida, e o consensualismo tornou-se regra, pois assim, hoje a regra é a forma livre, devendo vir expressas em lei as exceções.

Maximilliam Mayolino Leão 155 PRINCÍPIOS MODERNOS DOS CONTRATOS No final do século XIX e início do século XX, nasce o chamado Estado Social, mas foi com a incidência do fenômeno da massificação no campo jurídico-contratual, que os conceitos da Teoria Clássica do Contrato foram reformulados. O liberalismo e o individualismo resultaram do capitalismo mercantilista, e com a revolução industrial, já no século XVIII, a sociedade se transforma e dois fenômenos importantes ocorrem: a urbanização e a concentração capitalista, esta consequência da concorrência, da racionalização. Esses fenômenos resultaram, mais tarde, na massificação das cidades, das fábricas, das relações de trabalho e de consumo, da própria responsabilidade civil (do grupo pelo ato de um indivíduo). A massificação dos contratos é, portanto, consequência da concentração industrial e comercial, a qual reduziu o número de empresas e aumentou em tamanho a massificação das comunicações e a crescente globalização acirraram a concorrência e o consumo, o que obrigou as empresas a reduzirem custos e acelerarem os negócios, desta forma as cláusulas contratuais gerais e os contratos de adesão passam a ser utilizadas com maior vigor. A massificação fez surgir um automatismo da vontade que deixa imperceptível o mecanismo desta, antes um baluarte do contrato, pois modernamente, os contratos se dão entre o indivíduo e um ente despersonalizado, cuja identidade só será conhecida à ocasião do inadimplemento, se houver; quando, então, importará a sua identificação para que seja coagido a cumprir a prestação. O elemento objetivo do contrato, em se tratando de contratos de massa, ganha proeminência sobre o elemento subjetivo e o exame do contrato, nessa hipótese, aproxima-se do inconsciente coletivo. O contrato de adesão, surgiu dessa necessidade de se contratar ao mesmo tempo com inúmeras pessoas idêntico objeto, mediante de cláusulas predispostas, que asseguram a agilidade do contrato. O consensualismo manifesta-se por simples adesão às cláusulas que foram apresentadas pelo outro contratante, enquanto não houver adesão ao contrato, as suas condições gerais não ingressam no mundo jurídico, onde há condições gerais dos contratos que podem, no entanto, emanar da vontade paritária das partes, do poder regulamentar do Estado ou da atividade de terceiros. O contrato de adesão é uma espécie do gênero contrato com cláusulas predispostas, onde o Código de Defesa do Consumidor, no art. 54,

156 A evolução dos princípios contratuais e sua função social conceitua o contrato de adesão, nos seus termos: é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. O legislador abrangeu em tal definição as estipulações unilaterais do Poder Público e as cláusulas redigidas prévia e unilateralmente por uma das partes, onde ademais, ao fato de haver inserção de alguma cláusula não desnatura o contrato de cláusulas predispostas, pois, para tanto, é necessário alteração substancial. Cabe ao legislador e ao julgador traçar os limites dessa imposição de cláusulas, tendo em vista a proteção do aderente, hipossuficiente, pois não se pode defender, hoje, uma total liberdade contratual porque a sociedade não mais a permite. Paradoxalmente, a plena liberdade contratual, nos dias atuais, se converteria na própria negação dessa liberdade, onde o Código de Defesa do Consumidor, preconizado pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XXXII, trouxe uma série de disposições dirigidas ao contrato de adesão, principalmente no que tange às cláusulas abusivas. Além disso, foram trazidos, no bojo da mencionada lei, instrumentos eficazes em favor do consumidor, no tocante à responsabilidade objetiva do fornecedor e à possibilidade de inversão do ônus da prova. Princípios contratuais modernos vieram expressos no texto da lei, como é o caso do princípio geral da boa-fé, da obrigatoriedade da proposta e da intangibilidade das convenções. Ao coibir a vantagem exagerada do fornecedor, o Código traz à tona os princípios tradicionais da lesão nos contratos e da excessiva onerosidade, atualmente, também presentes no novo Código Civil. O microssistema apresentado pelo Código de Defesa do Consumidor coaduna-se perfeitamente com a principiologia moderna da Teoria Geral dos Contratos, que preconiza a harmonia entre os interesses particulares e públicos, do bem comum. É a acepção do contrato conforme a Teoria Preceptiva, segundo a qual deve ser ele cumprido em razão da sua repercussão social onde temse como cerne da eficiência do contrato a sua finalidade social. Os valores fundamentais da sociedade ocidental são a ordem, a justiça e a liberdade e com base neles, o contrato intenta promover o bem comum, o progresso econômico e o bem-estar social, onde a liberdade

Maximilliam Mayolino Leão 157 corresponde o princípio da autonomia privada da vontade, a ordem, o princípio da boa fé e a justiça, o princípio da justiça universal. O princípio da autonomia privada consiste na liberdade de as pessoas regularem, mediante contrato, seus interesses, respeitados os limites legais. Difere do princípio da autonomia da vontade porque neste todos são livres para decidir, como bem entenderem, sobre o contrato, o qual é visto como fenômeno exclusivamente volitivo, esta situação não ocorre na autonomia privada, pois nesta, a liberdade de contratar é bem menos ampla, uma vez que, por vezes, a lei impõe a certas pessoas o dever de contratar ou autoriza que apenas uma das partes estabeleça as cláusulas contratuais, como ocorre nos contratos de adesão. Decorrem da autonomia privada os princípios da confiança e a da auto-responsabilidade, onde o primeiro baseia-se no valor social da aparência: as partes têm de ter segurança ou a confiança de que o contrato será cumprido, mesmo que à força. O princípio da auto-responsabilidade informa que haverá responsabilidade de alguém, se lhe for imputável a situação objetiva criada, onde em outras palavras, desde que uma pessoa declare sua vontade livremente, de acordo com a lei, será responsável por ela, pois ao declarar sua vontade, o indivíduo se auto-responsabiliza pela sua manifestação. O princípio da boa-fé divide-se em boa-fé objetiva e subjetiva, onde esta consiste em crenças internas, conhecimentos e convicções próprias, a boa-fé objetiva baseia-se em fatos de ordem pública, sendo este princípio o mais utilizado e adotado pela Teoria Geral dos Contratos. Corresponde ao dever imposto às partes de agir de acordo com certos padrões de correção e lealdade, o aludido princípio tem diversas funções, dentre elas se destacam, a interpretativa, a integrativa e de controle, onde na primeira, o princípio determina que os contratos devam ser interpretados em seu sentido objetivo aparente, salvo quando o destinatário conheça a vontade real do declarante. Se resultarem dúvidas dessa operação, deve ser preferido o significado que a boa-fé objetiva aponte, a função integrativa que consiste em integrar os deveres, poderes, direitos e faculdades primárias e secundárias. Em sua função de controle, o princípio informa que o credor, no exercício de seu direito, não pode exceder os limites impostos pela boa-fé, sob pena de proceder ilicitamente.

158 A evolução dos princípios contratuais e sua função social A função de controle tem a ver com as limitações da liberdade contratual, da autonomia da vontade em geral e com a teoria do abuso de direito, adotada expressamente pelo novo Código Civil. A frustração do fim contratual objetivo e a impossibilidade econômica da prestação podem dar ensejo à extinção do contrato por violar o princípio da boa-fé. Por fim, dentro da principiologia moderna, temos o princípio da justiça contratual, consoante o qual deve haver sempre relação de paridade nos contratos comutativos, de sorte que nenhuma das partes dê mais ou menos do que recebeu. A equidade é fundamental ao princípio da justiça contratual pode ser formal ou substancial (material), onde a primeira preocupa-se com a igualdade de oportunidades no momento da contratação, e a segunda preocupa-se com o efetivo equilíbrio do contrato, que baseia-se em dois outros princípios, o princípio objetivo da equivalência entre prestação e contraprestação e o princípio da distribuição equitativa dos ônus e riscos. Pode-se dizer que, salvo casos excepcionais, presente o princípio da justiça formal, presume-se presente o da justiça substancial, porem há casos em que essa presunção inexiste, por haver desequilíbrio manifesto, e nessas hipóteses, à parte supostamente beneficiada caberá o dever de provar que houve justiça contratual. Dentre os exemplos podemos apontar, os vícios de consentimento, incapacidade de uma das partes, lesão, estado de perigo, contrato de adesão e padronizados, em todos esses casos falta a justiça formal; desequilíbrio contratual futuro, falta a justiça substancial. DA FUNÇÃO SOCIAL E ATUAL DOS CONTRATOS Tendo em vista a síntese histórica, importante para compreender as funções desempenhadas pelos contratos em nossos dias, sem sombra de dúvida, a função econômica e social dos contratos em nossa sociedade de consumo é enorme, a ponto de afirmarmos que sem o contrato, nossa sociedade capitalista não existiria. O contrato é instrumento de circulação de riqueza, ajudando a distribuir a renda e a gerar empregos, pois em uma perspectiva contemporânea, contrato é um conceito funcional e, como tal, desempenha importante papel social.

Maximilliam Mayolino Leão 159 A função social do contrato, erigida modernamente a princípio, coloca em foco a dimensão coletiva, não se limitando à satisfação de necessidades individuais dos contratantes. Esses conceitos, ditos funcionais, operam relacionando dois planos, onde o plano normativo e o plano da realidade social se estruturam pois é equívoca, portanto, a leitura de institutos civis sob a perspectiva puramente estrutural das categorias, conceitos e institutos devem ser lidos à luz da função exercida. É essa a grande viragem do direito moderno, uma passagem de uma concepção estrutural do direito em favor de uma postura funcionalizada, onde sobreleva a atuação social dos direitos. O princípio da função social do contrato evidencia a funcionalização do contrato, fazendo devolvê-lo à sua tarefa original, às vezes esquecida nos caminhos do individualismo. O contrato, além da realização de interesses privados, deve contribuir para edificação do ser humano digno, pois ainda, a função pedagógica do contrato, entendendo-o como meio de socialidade, exercitando os relacionamentos sociais sadios. Envolve uma noção de respeito ao outro, a si mesmo e ao ordenamento, já que se empenha a própria palavra, aproximam os homens, abate suas diferenças. As cláusulas contratuais dão aos contratantes noções de respeito ao outro e a si mesmos, visto que, afinal, empenharam sua própria palavra. Por meio dos contratos, as pessoas adquirem do direito como um todo, pois, em última instância, um contrato nada mais é do que a miniatura do ordenamento jurídico, em que as partes estipulam deveres e direitos, através de cláusulas, que passam a vigorar entre elas. PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIO DOS CONTRATOS (PACTA SUNT SERVANDA) O princípio da Força Obrigatória dos Contratos, que recebe também nomes como Pacta Sunt Servanda, princípio da Força Vinculante dos Contratos, princípio da Intangibilidade dos Contratos ou princípio da Obrigatoriedade das Convenções, encontra seu fundamento de existência na vontade que faz nascer os contratos. Considerando-se que contratos são acordos bilaterais ou plurilaterais nos quais as partes convergem suas vontades para a obtenção de um

160 A evolução dos princípios contratuais e sua função social fim patrimonial específico que pode se concretizar na criação, modificação ou extinção de direitos e obrigações, desde que haja efetiva possibilidade de apreciação econômica dos mesmos, uma vez convencionados os limites do contrato ficam as partes ligadas pelo vínculo da vontade que as uniu. O referido vínculo o qual une os contratantes, apesar de não estar positivado no ordenamento jurídico brasileiro, acaba sendo tutelado pela Justiça em razão de ser considerado um princípio geral do Direito, de caráter universal transcendente, de forma que estipulado validamente seu conteúdo, vale dizer, definidos os direitos e obrigações de cada parte, as respectivas cláusulas têm, para os contratantes, força obrigatória. Por este motivo é tão difundido o brocardo que afirma que o contrato faz lei entre as partes, onde cumpre ressaltar que o princípio da Força Obrigatória dos Contratos somente passa a reger as convenções se todos os requisitos de existência, validade e eficácia dos contratos tiverem sido observados. Cabe apontar que, em suma, se os agentes forem capazes, o objeto for lícito, possível e determinado ou determinável, a forma for prescrita ou não-defesa em lei, e a vontade das partes for real, ou seja, a obrigação tiver sido pactuada de forma livre e espontânea. Assim, o princípio da Força Obrigatória dos Contratos impõe a observância de todas as obrigações pactuadas pelas partes contratantes, sob pena de a parte inadimplente responder com seu patrimônio pelo prejuízo que a outra sofrer. Somente justificariam o não-cumprimento das convenções a força maior, o caso fortuito ou a invocação do direito de arrependimento, quando o mesmo tivesse sido expressamente previsto pelos contratantes. Destarte, uma das mais importantes consequências do princípio da Força Obrigatória dos Contratos é a impossibilidade de alteração do conteúdo pactuado, ou seja, a imutabilidade ou intangibilidade das cláusulas contratuais, que somente seriam apreciadas judicialmente no caso de estarem eivadas de nulidade ou vício de vontade. Pois bem, a finalidade do princípio da Força Obrigatória dos Contratos é outorgar segurança aos negócios jurídicos, incentivando a sua concretização, tendo em vista que a possibilidade de execução do patrimônio da parte inadimplente torna os contratos celebrados no ordenamento brasileiro confiáveis perante os olhos da parte prejudicada, além de garantir a existência do princípio da Autonomia da Vontade. Entretanto, o princípio da Força Obrigatória dos Contratos vem so-

Maximilliam Mayolino Leão 161 frendo atenuações no direito brasileiro em razão tanto do espaço conquistado pelo princípio da Isonomia, que exige o tratamento desigual de partes desiguais em força, de modo a assegurar o equilíbrio entre as mesmas, quanto do surgimento da acima mencionada Teoria da Imprevisão que autoriza a intervenção judicial nos casos em que a realidade dos fatos se alterar de modo não-previsto pelos contratantes, prejudicando o cumprimento do pactuado. Portanto, face a estes princípios, há conclusão de que o princípio da Força Obrigatória dos Contratos não pode mais ser encarado de forma absoluta. DA REVISÃO DO CONTRATO Embora os princípios da obrigatoriedade e da intangibilidade dos contratos continuem a ser regra na Teoria Geral dos Contratos, há, atualmente, algumas situações que autorizam uma das partes a descumpri-lo, sem que o outro contratante tenha contribuído para gerar as circunstâncias anormais autorizadoras do inadimplemento ou da alteração no objeto do contrato. A teoria da imprevisão e a quebra da base negocial fornecem diferentes subsídios para as hipóteses e pela primeira vez, a revisão do contrato está autorizada quando houver onerosidade excessiva decorrente de evento superveniente, extraordinário e imprevisível que torne insuportável o adimplemento do pacto para uma das partes. Temos entendido que, havendo anormalidade na construção que todo contrato dependente do futuro encerra, pode-se operar a redução das suas prestações, onde pela teoria da quebra da base negocial, a revisão está autorizada sempre que os legítimos interesses do contrato forem frustrados ou se desaparecer a relação de equivalência entre o fim essencial deste e as partes, pode se tratar de fato superveniente, anormal, ainda que previsível, que torna impraticável a prestação e desequilibra o contrato. Assim, para se atender ao pleito fundado na referida teoria, é preciso analisar se foi atingida a base do negócio, se ocorreu situação anormal, se a economia contratual foi afetada, se a situação adversa não é imputável ao contratante, se a contratação não atribuiu a uma das partes o ônus do evento futuro e, por fim, se ocorreu onerosidade excessiva. Podemos ainda entender, que o Código de Defesa do Consumidor adotado expressamente, em seu art. 6º, n. V, a Teoria da Quebra da Base Negocial, que não exige a imprevisibilidade do evento causador do de-

162 A evolução dos princípios contratuais e sua função social sequilíbrio, onde o Supremo Tribunal Federal vem admitindo a cláusula rebus sic stantibus como implícita somente em contratos com pagamentos periódicos sucessivos de ambas as partes ao longo do prazo dilatado, desde que ocorra alteração profunda e inteiramente imprevisível das circunstâncias existentes ao tempo da celebração do negócio. A esfera judicial deve dar preferência ao reequilíbrio contratual em detrimento da sua resolução, porquanto, todo contrato tem uma função social e o clássico princípio da intangibilidade merece ser relido, na medida em que tal esfera está autorizada a alterar o conteúdo contratual quando necessário para se estabelecer o equilíbrio. CONCLUSÕES FINAIS Certos e evidente que o contrato assume, hodiernamente, funções diversas das que perpassaram este instituto ao longo de séculos. Da solidariedade clânica dos tempos antigos, o contrato assumiu um caráter muito mais geral com os romanos, com preocupação precipuamente processual; recebeu influência voluntarista do direito canônico e do Iluminismo; e acabou por ser devidamente instrumentalizado na busca pela efetivação da dignidade da pessoa humana. Ao afirmarmos que o contrato é elemento contribuinte da dignidade humana, condicionado pela função social, não estamos reiterando posições acerca do ocaso do direito privado. O contrato é instrumento de realização de interesses privados, prevalentemente, porém estes interesses só podem ser tutelados se não ofenderem interesses sociais. Observados de outra matriz ou outra forma, às vezes cumprir a função social do contrato é tão-somente adimplir com a obrigação, satisfazendo o credor; pois sua satisfação pode ser parte integrante e essencial na construção da sociedade livre e fraterna, posta constitucionalmente. Desta forma o grande erro em se afirmar que o interesse social sobrepõe-se ao interesse particular é integrante daquele e, não raras vezes, estar de acordo com o interesse social é satisfazer o interesse particular. Não devemos descaracterizar o contrato como instrumento de realização privada, mas impedir que seja meio egoísta de opressão da parte mais fraca. A evolução principiológica dos contratos, embora tenha ganhado forte impulsão com o Código de Defesa do Consumidor e o recente Código Civil

Maximilliam Mayolino Leão 163 Brasileiro, é muito mais um fenômeno social do que propriamente jurídico. A realidade mais uma vez se antecipou ao legislador, a quem coube adequar a legislação aos fatos. De certo, hodiernamente, não há como se entender o contrato como simples forma de gerir interesses privados, pois o interesse público está indiscutivelmente associado ao papel dos diversos tipos de contrato, principalmente àqueles cujas cláusulas são predispostas unilateralmente. Entendo ainda que não é razão pela qual o Código de Defesa do Consumidor atribuiu ao Ministério Público legitimidade para tutelar os interesses individuais homogêneos, que, apesar de não serem coletivos propriamente ditos, mereceram do legislador um tratamento equiparado. Assim, o Código de Defesa do Consumidor rompeu com a velha dicotomia entre o interesse privado e o interesse público, devendo-se compreender que muitos interessem aparentemente privados encerram um interesse público que justifica a imposição de normas cogentes e uma maior interferência do Poder Judiciário. As normas reguladoras dos contratos não mais podem ser entendidas como meramente de Direito Privado, porque as relações contratuais geram uma série de consequências para toda a sociedade, fazendo surgir o interesse público na sua adequada e efetiva regulação. Em uma visão comparada da codificação civil argentina no Libro segundo de los derechos Personales en las relaciones civiles, percebemos a grande influencia e semelhança em seus títulos e capítulos em sua Sección Tercera De las obligaciones que nacen de los contratos, percebemos a total imersão latina e romana na construção conceitual da legislação, desta forma concretizando que os princípios contratual e sua função social são pilares arquitetados as este instrumento jurídico de forma universal. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALTERINI, Atílio Aníbal. Os contratos de consumo e as cláusulas abusivas. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, v. 15, p. 5-19, jul./set., 1995. AZEVEDO, Álvaro Villagra. Curso de Direito Civil. v. 9. São Paulo: Revista do Tribunais, 2001. BITTAR, Carlos Alberto. Direito dos Contratos e dos Atos Unilaterais. Rio de Janeiro: Forense, 1990.

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