Como obter melhor cicatrização nas incisões das cirurgias estéticas corporais How to get better healing of incisions in corporal aesthetic surgeries Francisco Claro de Oliveira Júnior Médico cirurgião. Residente sênior de cirurgia plástica no Instituto de Cirurgia Plástica Santa Cruz. São Paulo, SP. Pablo Rassi Florêncio Médico cirurgião. Residente do 4o ano de cirurgia plástica do Instituto de Cirurgia Plástica Santa Cruz. São Paulo, SP. Ricardo Limongi Fernandes Médico dermatologista pela Universidade Federal de São Paulo. Membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Responsável pelo Ambulatório de Cosmiatria do Instituto de Cirurgia Plástica Santa Cruz. São Paulo, SP. Correspondência: Francisco Claro de Oliveira Júnior. Rua dos Ingleses, 586. Apto. 234 - Bela Vista - CEP 01329-000 - São Paulo - SP - Fone/fax: (11) 5080-2196 - E-mail: drfranciscoclaro@cplastica.org.br Unitermos: cicatriz, cirurgia estética Unterms: scar, aesthetic surgery. Sumário A cicatriz pós-operatória resultante dos procedimentos estéticos é uma grande preocupação para o cirurgião. Existem vários fatores que podem influenciar no resultado final dessas cicatrizes. Este artigo tem por finalidade mostrar os principais fatores responsáveis por uma boa cicatrização. Sumary The postoperative scar of cosmetic procedures is a big concern for the surgeon. There are several conditions that may influence the final result of these scars. This articles describes important factors responsible for a good healing. Numeração de páginas na revista impressa: 27 à 31 Resumo A cicatriz pós-operatória resultante dos procedimentos estéticos é uma grande preocupação para o cirurgião. Existem vários fatores que podem influenciar no resultado final dessas cicatrizes. Este artigo tem por finalidade mostrar os principais fatores responsáveis por uma boa cicatrização. Introdução Cicatriz é o resultado da substituição do tecido lesado por tecido conjuntivo Página 1 de 6
fibroso(1). Em qualquer intervenção cirúrgica é uma ocorrência obrigatória, mas indesejada pelo paciente. Nos procedimentos estéticos a cicatriz pode ser inaceitável. Em vista destas considerações, é de fundamental importância que o cirurgião adote todos os princípios possíveis para se obter uma cicatriz condizente com a aceitação do seu paciente. Para isso, procuramos trazer, através desta revisão, os principais fundamentos relativos aos cuidados que devem ser adotados pelo cirurgião, desde o planejamento cirúrgico até o pós-operatório, além das orientações que podem ser passadas para minimizarmos os fatores dependentes dos pacientes. Informação Antes de qualquer intervenção cirúrgica, o paciente deverá ser muito bem informado quanto ao procedimento que será realizado e suas possíveis complicações. As cicatrizes resultantes de cada procedimento devem ser muito bem detalhadas quanto às suas possíveis localizações e formas. O processo de cicatrização e seu tempo de duração deverão ser informados ao paciente previamente à intervenção planejada e reiterados no seu pós-operatório, com a finalidade de diminuir a ansiedade do paciente em relação a uma cicatriz imatura com características inestéticas resultante do processo de cicatrização normal. Tal informação previne uma possível insatisfação precoce do paciente, evitando, até mesmo, intervenções muitas vezes desnecessárias. As possíveis complicações resultantes do processo de cicatrização, principalmente aquelas inerentes aos próprios pacientes, como fatores genéticos, ambientais e cuidados pós-operatórios específicos de cada procedimento, devem ser explicados, documentados e reiterados no pós-operatório, mesmo antes de qualquer indício de uma evolução indesejada, como feridas com deiscências, cicatrizes hipertróficas, retraídas, alargadas, discrômicas ou queloideanas. A informação, portanto, é um fator responsável pela aceitação do paciente à sua futura cicatriz, uma vez que o prepara a aceitá-la, lidando psicologicamente com a qualidade de sua cicatriz. Planejamento pré-operatório O cirurgião deve procurar, sempre que possível, posicionar as cicatrizes em locais em que elas estejam menos visíveis. Seja em dobras naturais do corpo, locais encobertos por cabelos ou pelos, dentro das roupas ou, na impossibilidade de lançar mão deste artifício, utilizar locais em que, sabidamente, ocorrem cicatrizes de boa qualidade estética. Para isso, o cirurgião deve ter pleno conhecimento das características anatômicas de cada região corporal, para se beneficiar de fatores presentes nelas e obter uma boa cicatrização, com ótima qualidade estética. Os princípios anatômicos que devem ser conhecidos e respeitados para se obter uma boa cicatrização no planejamento préoperatório são descritos a seguir. 1. Característica individual O sexo e a idade precisam ser avaliados, considerando, por exemplo, que mulheres em idade reprodutiva têm maior tendência a apresentar cicatrizes hipertróficas, queloideanas ou hipercrômicas(2,3). A raça é outro fator importante, uma vez que pacientes pardos e orientais apresentam maior disponibilidade a desenvolver cicatrizes hipertróficas(2,3). 2. Espessura da pele Pele mais espessa, devido a maior matriz extracelular, tende a ter um maior estímulo cicatricial e, portanto, originar cicatrizes menos estéticas. Desse modo, deve-se sempre que possível tentar posicionar as cicatrizes em locais em que a pele é mais Página 2 de 6
fina(3). 3. Área de tensão Cicatrizes posicionadas em áreas de tensão como região pré-esternal, deltoideana, articulares(4-6) ou qualquer local onde haja grande movimentação cutânea pelo paciente, seja fisiologicamente, conforme as linhas de Langer(6) ilustradas na Figura 1, ou devido a atividades individuais de caráter esportivo ou laboral, tendem a desenvolver hipertrofia. 4. Fatores externos A alimentação e estado nutricional do paciente devem ser muito bem avaliados, assim como seus hábitos de vida, como tabagismo, etilismo e atividades recreativas, esportivas e laborais(3,7). Uma vez que todos estes fatores podem direta ou indiretamente influenciar na qualidade final da cicatriz e, portanto, precisam ser considerados para o planejamento pré-operatório. Técnica operatória 1. Cuidados pré-operatórios São de fundamental importância uma antissepsia e assepsia adequadas, no intuito de se evitar uma infecção responsável por deiscências e cicatrizes de má qualidade. A anestesia também é um fator de importância, uma vez que a execução de uma técnica cirúrgica aprimorada pode ser influenciada por uma anestesia inadequada(6). Página 3 de 6
Figura 1 - Linhas de Langer corporal. 2. Instrumental adequado e técnica atraumática Deve-se utilizar instrumentais adequados, minimizando o trauma e a manipulação ao tecido, no intuito de se evitar cicatrizes adicionais. A compressão do tecido deve ser evitada ao máximo, sendo importante nestes casos o uso de pinças de Addison delicadas, utilizadas com leve tensão ou até mesmo ganchos tipos Joseph e Gillies, ainda menos traumáticos(6). 3. Fios e agulhas O fio deve ser o mais fino que consiga manter a tensão dos tecidos aproximados em um tempo necessário. 4. Técnica de sutura As bordas da ferida cirúrgica devem ser aproximadas por planos anatômicos, respeitando-se as características de cada tecido. Cada ponto deve ser posicionado, em cada borda, equidistante da margem externa da ferida, a fim de evitar um desnivelamento da cicatriz. Deve-se colocar o mínimo de fio possível, para minimizar a reação inflamatória local, que pode alterar o processo de cicatrização. O posicionamento do fio na pele deve ser próximo às bordas, mas profundo na derme e firme o suficiente para manter a ferida levemente evertida e bem coaptada, sem Página 4 de 6
muita tensão (para evitar que os pontos fiquem marcados)(6). Cuidados médicos pós-operatórios 1. Curativos Os curativos devem ser oclusivos por no mínimo 24 horas, para manter a umidade da ferida e absorver o sangramento e o exudato. Neste período, até aproximadamente 48 horas do término do procedimento, ocorre a epitelização da camada superficial da pele, capaz de manter a umidade e proteção da área traumatizada(6,7). 2. Tração cutânea com fita adesiva de papel microporado A tração cutânea é eficaz quando mantida 24 horas por dia, por um período de pelo menos quatro semanas pós-operatória, tendo a finalidade de manter a umidade, evitar trauma local direto e diminuir a tensão sobre a ferida(8). Uma maneira eficaz de realizá-la é posicionando a fita adesiva de papel microporado sobre a cicatriz em dois sentidos, recrutando os tecidos laterais bilateralmente para o centro da microporagem no intuito de aliviar a tensão sobre esta área. 3. Placas de silicone A lâmina de silicone tem influenciado na melhora de qualidade das cicatrizes quando empregada logo após a epitelização da pele (aproximadamente 48 horas após trauma) e quando mantida por 24 horas, sendo retirada diariamente por um período máximo de apenas 30 minutos. Ela atua na cicatriz através do aumento da atividade da colagenase, por elevação da temperatura local em aproximadamente 1ºC e por hidratação do estrato córneo secundário à oclusão(2,3). Outros mecanismos de ação são a sua carga elétrica negativa e a leve compressão sobre a ferida em cicatrização que orientam as fibras de colágeno paralelamente a pele(3). Sua eficácia está comprovada apenas para as placas confeccionadas com 100% de silicone(2). 4. Corticoide injetável Esta modalidade deverá ser utilizada apenas nos casos em que a cicatriz está hipertrófica ou queloideana. Idealmente aos seis meses após a cirurgia e nunca antes dos três meses de pós-operatório. Sua abordagem é por meio da triancinolona na dose inicial de 10 mg/ml até 40 mg/ml após três semanas da primeira aplicação sem efeito. Sua aplicação deverá ser realizada em intervalos de três a seis semanas, mantendo-se a atenção quanto ao risco de atrofia cutânea secundária ao corticoide. O mecanismo de ação desta droga é através da diminuição da atividade inflamatória(2,3), da síntese de citosinas, do número e da atividade dos fibroblastos locais com consequente menor produção de colágeno(2,3). Conclusão Uma cicatriz de boa qualidade e bem aceita pelo paciente é conseguida apenas através de um longo processo que se inicia ainda na consulta, muito antes da abordagem cirúrgica, que deverá, por sua vez, ser muito bem planejada e executada. A atenção e o minucioso cuidado dado pelo cirurgião em cada etapa de um procedimento cirúrgico estético, juntamente com a orientação fornecida ao seu paciente desde a primeira consulta até o momento de conclusão de seu tratamento constituem a melhor forma de se obter uma ótima cicatriz. Bibliografia 1. Diegelmann, R. F. Cellular and biochemical aspects of normal and abnormal Página 5 de 6
wound healing: an overview. J. Urol. 1997 157: 298-302. 2. Figueiredo JCA, Claro Jr F, Zampar AG, Mélega JM. Quelóide: fatores de influência diagnóstica. Rev Brás Cir Plast.2008 23 (4): 274-80. 3. Amaral AB, Tardelli HC, Mélega JM. Correção de cicatrizes. In: Mélega JM, editor. Cirurgia plástica fundamentos e arte princípios gerais. Rio de Janeiro: Medsi 2002. p. 271-82. 4. Cosman, B Crikelair GF, Ju DM. et al. The surgical treatment of keloids. Plast. Reconstr. Surg. 1961 27: 335. 5. Franco T, Franco D, Colucci NRS. Cicatrizes Patológicas. In: Carreirão S, Cardim V, Goldenberg D, editors. Cirurgia Plástica, Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. São Paulo: Editora Atheneu 2005. p.143-154. 6. Góes CHFS, Arantes HL, Kawasaki MC. Princípios básicos da técnica em cirurgia plástica. In: Mélega JM, editor. Cirurgia plástica fundamentos e arte princípios gerais. Rio de Janeiro: Medsi 2002. p. 25-37. 7. Mélega JM, Freitas AG. Biologia da Cicatrização. In: Mélega JM, editor. Cirurgia plástica fundamentos e arte princípios gerais. Rio de Janeiro: Medsi 2002. p. 9-14. 8. Mustoe, T. A., Cooter, R. D., Gold, M. H., et al. International clinical guidelines for scar management. Plast. Reconstr. Surg.2002 110: 560. 9. Shih R, Waltzman J, Evans GRD. Review of Over-the-Counter Topical Scar Treatment Products. Plast. Reconstr. Surg. 2007 119: 1091. Página 6 de 6