Os bloqueios tecnológicos na AP



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1. Quem somos nós? A AGI Soluções nasceu em Belo Horizonte (BH), com a simples missão de entregar serviços de TI de forma rápida e com alta qualidade.

Transcrição:

Como ultrapassar e como agravar os danos colaterais

Infraestrutura de software da Administração Pública A Administração Pública portuguesa está, em grande medida bloqueada num único fornecedor no que respeita a software básico da infraestrutura (sistemas operativos, software de produtividade, email, etc). Este bloqueio acarreta custos avultados para o Estado Português e é consequência de anos de aquisições, com gasto de dinheiros públicos em aplicações não interoperáveis, monoplataforma.

Danos colaterais A aquisição de software monoplataforma tem danos colaterais, porque introduz dependências do software X no sistema operativo Y ou na aplicação Z. Estas dependências são custeadas não por quem fornece mas por quem compra e levam à inflexibilidade na avaliação de alternativas. Como veremos, a prática que a isto conduziu resulta no incumprimento da Lei e no condicionamento do mercado, por alegadas dificuldades técnicas.

Mas será que o custo deste bloqueio justifica preocupações? A ordem de grandeza dos custos com infraestrutura é fácil de calcular. Estima se que a Administração Pública portuguesa (central, regional, local e EPEs) tenha aproximadamente 250 000 PCs. O custo anual por PC varia entre 220 EUR (valores informalmente conhecidos) e 964 EUR (produtos desktop topo de gama no Acordo Quadro de Licenciamento de Software sem incluir CALs). Daqui resulta um valor anual mínimo de 55 M EUR com valor real que se supõe bastante superior. Ora o dispêndio total em software foi em 2010 de cerca de 170 M EUR (fonte: DGO). Portanto o custo de software básico de infraestrutura representa no mínimo 32 % da despesa total do Estado em software.

Mas será que o bloqueio é real? O bloqueio é de tal forma real que entidades como a DGITA e o Banco de Portugal não hesitam em promover Concursos Públicos ilegais por forma a garantir que o fornecedor de software não muda. Exemplos: http://dre.pt/pdfgratiscp/2011/03/043/404406768.pdf 10M EUR http://dre.pt/pdfgratiscp/2011/12/235/405445203.pdf 3M EUR http://dre.pt/pdfgratiscp/2011/12/250/405532927.pdf 420K EUR http://dre.pt/pdfgratiscp/2011/11/218/405339645.pdf 133M EUR Artigo 1º, nº 4, do CCP estabelece que: à contratação publica são especialmente aplicáveis os princípios da transparência, da igualdade e da concorrência

Até que ponto isto é grave? E se alguma entidade do Estado abrisse um Concurso Público para aquisição de viaturas BMW Série 7, alegando a concorrência estar assegurada por terem sido consultados vários stands? Se isto acontecesse os comentadores nos media diriam escândalo, favorecimento, corrupção,.... Ora isto é precisamente o que se passa com o software e para que continue a acontecer alegam se razões técnicas. As razões técnicas alegadas são a consequência da dependência extrema que, por negligência, se deixou instalar para o software básico de infraestrutura. (nem sequer se está a falar de software mais específico...)

Como se chegou a isto? O Estado, enquanto comprador não faz qualquer validação de interoperabilidade. O Estado poderia adquirir aplicações interoperáveis que permitem escolher a plataforma (proprietária ou aberta) em que são executadas... mas opta quase sempre por aplicações monoplataforma e cuja única plataforma é proprietária e dispendiosa. O Estado ignora as consequências a longo prazo deste tipo de decisão.

Concretamente, do que se trata? Trata se de adquirir aplicações de gestão documental que só funcionam no browser Internet Explorer e portanto têm que forçosamente ser executadas em PCs com Microsoft Windows. Trata se de adquirir aplicações cliente servidor em que o cliente é obrigatoriamente Microsoft Windows. Assim o Estado não pode sequer avaliar outras hipóteses para o sistema operativo do posto de trabalho... porque mesmo que pondere a mudança terá sempre que possuir licenças de Terminal Server para estas aplicações monoplataforma serem executadas. O Estado pagou a aplicação e continua a pagar as licenças colaterais, mesmo que mude o seu sistema base.

Mas será verdade? Vejamos o que dizem as próprias entidades quando confrontadas com a situação:

Mas será verdade? Pelos vistos a mera substituição parcelar de tecnologia poria em causa todo o conjunto:

Mas existe mesmo tecnologia multiplataforma? Qualquer gestor de TI esclarecido sabe que uma aplicação clienteservidor feita em Java funciona em qualquer sistema operativo, tanto a nível de servidor, como de posto de trabalho. Qualquer gestor de TI esclarecido conhece frameworks como Php, Java, Perl, Python, Ruby... Qualquer gestor de TI competente sabe que um aplicação Web conforme com os standards e desenvolvida de acordo com as boas práticas funcionará em qualquer navegador Web moderno. Então porque se continuam a comprar EXEs e aplicações que exigem o IE ou um pacote específico de Office?

Mas existe mesmo tecnologia multiplataforma? parte II O OpenOffice, o LibreOffice e o Lotus Symphony multiplataforma (Windows, Linux, Mac,...). (IBM) são O servidor de email Zimbra funciona com qualquer cliente de email que adira aos standards. A gestão documental Alfresco funciona com qualquer navegador.... Até as aplicações Open Source, que em muitos casos têm menos quota de mercado, conseguem ser multiplataforma. Porque continua o Estado a gastar milhões de euros em tecnologia que o condiciona?

Exemplos O CEGER é negligente na supervisão da interoperabilidade Plataformas de Contratação Electrónica e permite que plataformas exijam aos fornecedores (empresas) o browser X ou o SO Y. O portal base.gov.pt, que custou 200 000 EUR, referia na sua versão oficial estar optimizado para sistema Windows. Inúmeras entidades públicas pagam anualmente por software de Gestão Documental que só funciona em Internet Explorer.... O problema não é técnico mas sim de rigor na gestão.

ATENÇÃO DANOS COLATERAIS Não há nenhum mal em optar por sistemas de determinados fornecedores de grande dimensão, nomeadamente da Microsoft, quando tal se mostra ser a melhor opção. O mal está em ser se obrigado a isso por imposição da compra de software de terceiros que funciona exclusivamente nesse tipo de sistemas. Isto distorce o mercado e impede a concorrência estando o Estado a gastar dinheiro para se auto condicionar. Os danos colaterais devem ser evitados e se não puderem de todo ser evitados devem ser custeados pelo fornecedor.

Como agravar este problema? Agravar este problema é extremamente simples. Bastará para tal que o Estado defina um conjunto de aplicações essenciais de gestão, as desenvolva sobre tecnologia monoplataforma e obrigue toda a AP a adopta las. Resultado: agrava se a já preocupante situação. Nunca mais a AP poderá ter opções tecnológicas de infraestrutura. Fica em causa o principio da interoperabilidade condicionando o desenvolvimento de outros sistemas, em outras tecnologias. Para reforço pode ainda negociar se um contrato nacional com o fornecedor maioritário do sistemas operativo do qual as aplicações essenciais dependem, com vista a conseguir um desconto, arruinando definitivamente a pouca margem de manobra que ainda existe.

Como ultrapassar este problema? Ultrapassar este problema é igualmente simples: deve ser definido que nenhuma instituição pública poderá a partir da data MM/DD/AAAA adquirir software cuja execução implique a compra de licenças não incluídas no orçamento. Deve igualmente ser definido que nenhum software adquirido pode funcionar exclusivamente num determinado sistema operativo. Em casos devidamente justificados, poderá o governo autorizar uma única extensão do prazo para eliminação de tais condicionantes. Ou seja, os danos colaterais são desincentivados e caso existam passam a ser suportados pelo fornecedor. O mercado ajustar se há automaticamente.

Qual o papel das tecnologias Open Source? A questão da interoperabilidade das aplicações (boas práticas de desenvolvimento multiplataforma, adopção de normas abertas, ) em nada obriga à utilização de Open Source. Mas geralmente as aplicações Open Source têm muito boa interoperabilidade. Existe um enorme potencial de redução da despesa em software básico de infraestrutura pela via da adopção de tecnologia aberta. A ESOP estima poupanças da ordem de 60 70%, com sensibilidade ao factor de escala. E os restantes 30 40% são gastos em grande medida na economia nacional.

Custos crescentes da despesa pública em TI Analisando as Contas Gerais do Estado, verifica se não só que estes custos são crescentes, como que nos Serviços Integrados do Estado o valor realmente gasto tem nos últimos anos excedido o orçamentado em mais de 30 %. Conta Geral do Estado - Sof tware Inf ormático Milhões Euros 180 160 140 120 100 80 60 40 20 0 2009 2010 Serviços Integrados (orçamentado) Serviços Integrados (gasto real) SI + SFA

Milhões Euros Objectivos difíceis só realizáveis com software Open Source No orçamento de 2012 aparentemente só estão inscritos 101.716.477 Euro, uma diminuição de 40 % relativamente aos gastos de 2010. Face à grande inflexibilidade negocial das multinacionais de software, esta verba será irrealista a menos que se enverede por uma adopção vigorosa de software Open Source. 180 160 140 120 100 80 60 40 20 0 Sof tware Inf ormático Serviços e Fundos Autónomos Serviços Integrados Total 2010 (CGE) 2012 (OE)

Sobre a contribuição da ESOP para o GPTIC A ESOP foi convidada a contribuir para o GPTIC e fá lo com o intuito de ajudar o país a sair de situação extrema em que se encontra. Este contributo deve pautar se pela transparência pelo que a ESOP se reserva ao direito de publicar todos os documentos por si elaborados. Contactos: http://www.esop.pt