IDEIAS MATEMÁTICAS NA CONSTRUÇÃO DE CASAS EM PARINTINS: POSSIBILIDADES PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA Aldian Gomes Menezes 1 Lucélida de Fátima Maia da Costa 2 Eixo Temático: Etnomatemática e as relações entre tendências em educação matemática. Palavras-chave: Construção de casas; Contextualização; Aprendizagem significativa; Ensino de Matemática. Introdução O ponto de partida para a pesquisa aqui apresentada foi à percepção do panorama do ensino de matemática no município de Parintins, cujas aulas de matemática seguem o estilo livresco com pouca ou nenhuma contextualização e sem utilização de recursos. Essa realidade demonstra a necessidade de se despertar para uma prática docente que utilize meios e estratégias alternativas para que a aprendizagem seja duradora e os alunos aprendam os conteúdos ensinados para a vida. Assim utilizou-se aportes etnográficos no desenvolvimento da pesquisa realizada na cidade de Parintins, cujo objetivo era compreender como as ideias matemáticas mobilizadas na construção de casas em Parintins, por pedreiros e carpinteiros, constituem possibilidades para o ensino de matemática. Para a coleta de dados foi necessário o uso de técnicas como observação direta e participativa e entrevistas semi-estruturadas que foram realizadas com pedreiros e carpinteiros com o intuito de conhecer as ideias matemáticas mobilizadas por eles. Aqui evidencia-se a relação das ideias matemáticas, as quais podem ser consideradas uma etnomatemática, identificadas no processo de construção de uma casa e sua relação com a matemática formal estudada na escola, para mostrar que esse processo se constitui num espaço para a contextualização de conceitos matemáticos na educação básica. As ideias matemáticas presente na construção de casas e a matemática escolar O processo de construção de uma casa está permeado de muitas ideias matemáticas entendidas aqui de acordo com D Ambrosio (2005) e Bishop (1999), como as formas pensar para medir, contar, comparar, quantificar, explicar, generalizar, inferir e avaliar. Essas ideias se apresentam desde a interpretação da planta da casa que vai ser construída até o acabamento. 1 Universidade do Estado do Amazonas. aldian192010@hotmail.com 2 Universidade do Estado do Amazonas. celiamaia5@hotmail.com
As ideias matemáticas mobilizadas por pedreiros e carpinteiros se evidenciam ao colocarem as coisas em relação, o que para Piaget (1978), constitui-se na base do pensamento matemático. Esse pensamento matemático caracteriza esse grupo de profissionais, pois possuem formas próprias de matematizar os fenômenos envolvidos na construção de uma casa, estratégias que foram sendo aprimoradas e repassadas de geração a geração, isto é, conhecimentos construídos com a experiência adquirida no convívio em grupo, pois de acordo com Bandura (2008, p.71), as pessoas não são apenas hospedeiras e espectadoras de mecanismos internos regidos pelos eventos ambientais. Elas são agentes das experiências, ao invés de simplesmente serem sujeitas a elas. As ideias elaboradas e aprimoradas pelos pedreiros e carpinteiros podem ser consideradas de acordo com D Ambrosio (2005) e Gerdes (2007), uma etnomatemática, ou seja, as formas próprias de determinados grupos culturais ou profissionais de estabelecer interconexões entre ideias matemáticas e outros elementos constituintes do meio em que vivem, como o é o ambiente de trabalho dos pedreiros e carpinteiros. É possível identificar nas atividades de pedreiros e carpinteiros, uma gama de aspectos que evidenciam ideias matemáticas relacionáveis aos conteúdos estudados em diversos anos escolares, o que abre possibilidades para contextualização do ensino da matemática em situações reais vividas ou vistas pelos alunos, uma vez que, muitos deles já acompanharam o processo de construção de suas próprias casas ou veem construções no trajeto de sua casa à escola. A contextualização é entendida aqui como uma possibilidade de produzir significado à aprendizagem de conceitos matemáticos estudados na escola. Assim, é preciso ter cuidado para não dar a contextualização um valor de uso estrito, de aplicação imediata, mas de busca de sentido ao que se ensina (RICARDO, 2005, p.37). A possibilidade de utilizar o processo de construção de casas para contextualizar o ensino de matemática atende o pressuposto dos Parâmetros Curriculares Nacionais PCN, o qual indica que através da contextualização de determinados conteúdos o aluno se sente mais a vontade para aprender e também é uma forma de dar um significado real ao conteúdo abstrato, ao aproximá-lo, mesmo que indiretamente da realidade (BRASIL, 2000). Na planta da casa estão presentes figuras geométricas, em especial os quadriláteros, polígonos estudados no 6º ano do ensino fundamental, nessa série o aluno é levado a explorar os conceitos de área e perímetro, e isso, significa trabalhar com conceito de medida, e medir é comparar. Assim como ocorre na construção de casas, porém na escola essa comparação acontece de modo formal, seguindo algoritmos e no processo desenvolvido pelos
pedreiros, isso acontece de modo mais prático. Na planta ainda há também a presença da ideia de razão e proporção, conteúdo previsto para o 7º ano do ensino fundamental. Acredita-se que as ideias matemáticas mobilizadas pelos pedreiros e carpinteiros, na interpretação de uma planta indica a possibilidade de contextualizar o ensino a partir do conhecimento matemático do cotidiano tornando-o mais humano. De acordo com D Ambrósio (1998), é possível humanizar o racionalismo presente na matemática, basta evidenciar a cultura e os valores presentes nos axiomas, teoremas e regras. Dessa forma, se no contexto escolar, a matemática do cotidiano for reconhecida, valorizada e relacionada aos conceitos matemáticos formais propostos nas propostas curriculares, já se está abrindo caminhos para fazer do ensino da matemática algo mais humano. É possível perceber que no processo de escavação para construção do alicerce de uma casa, se identifica a presença de ideias geométricas que mobilizam cálculos envolvendo, por exemplo, largura, comprimento e profundidade, ou seja, utiliza-se o cálculo de volume previsto na proposta curricular do 6º ano do ensino fundamental. Ao preparar a massa o pedreiro mobiliza uma lógica matemática que envolve cálculos mentais evidenciados quando elaboram estimativas das quantidades a serem utilizada para a massa se tornar adequada à construção que está sendo desenvolvida. Os cálculos mentais e a habilidade de fazer estimativas matemáticas estão presentes na proposta do 6 e 7º ano do ensino fundamental. No cálculo da quantidade de tijolos o pedreiro usa noções de área, assunto trabalhado de ao 6º ano e no 9º ano. Além disso, também no processo de construção de um muro está implícita a utilização da regra de três simples e da regra de três compostas, assuntos propostos para o 7º ano e 8º ano do ensino fundamental. Observando a presença dessas ideias matemáticas no processo de construção de casas percebe-se uma oportunidade de usar esse espaço como meio de dar significado ao conteúdo matemático que está sendo ensinado, uma vez que, pode-se utilizar várias etapas e elementos da construção como organizadores prévios da aprendizagem matemática, pois segundo Moreira, Caballero e Rodríguez (1997, p.18), os organizadores prévios podem servir para: buscar na estrutura cognitiva do aluno significados que existem, mas que não estão sendo usados a algum tempo no contexto da matéria de ensino. E principalmente para estabelecer relações entre ideias, proposições e conceitos já existentes na estrutura cognitiva e aqueles contidos no material de aprendizagem. (destaque dos autores). Durante o desenvolvimento da pesquisa observou-se que de acordo com a experiência, o pedreiro adquire habilidade para fazer estimativa, quase exata, da quantidade de tijolos, de
areia, de cimento, precisão que vai sendo aprimorada no convívio com profissionais mais experientes. Na cobertura da casa, nota-se a matemática presente, na construção de uma tesoura, na qual se evidencia a existência de triângulos semelhantes, e de elementos da trigonometria. Esses conteúdos matemáticos estão previstos na proposta do 9º ano do ensino fundamental. Então, observando atentamente o processo de construção de uma casa, percebe-se muitas possibilidades para se contextualizar o ensino de vários conteúdos matemáticos previstos nas propostas curriculares do ensino fundamental e médio, porém para que o ensino se efetive de forma contextualizada, de modo a gerar significado à aprendizagem dos alunos é necessário, de acordo com Silva (2009), que o professor conheça a realidade na qual sua escola está inserida e tenha conhecimento das tendências de ensino em educação matemática, para poder conciliar teoria e prática. Considerações finais A pesquisa permitiu a visualização e a compreensão da matemática existente no trabalho de pedreiros e carpinteiros mostrando que o processo de construção de casas constitui-se num espaço de contextualização para diversos conceitos matemáticos trabalhados na escola, em particular nas escolas de Parintins, onde os alunos geralmente vivenciam o processo de construção de casas. Contextualizar o ensino de matemática não significa apenas relacioná-lo a contextos reais, concretos, mas levar o aluno a entender a matemática situada num contexto histórico, social e cultural, aspectos geralmente esquecidos no ensino de conceitos matemáticos. Na educação básica é fundamental para a aprendizagem que a matemática seja percebida pelos alunos no seu cotidiano como uma ferramenta e não apenas como uma disciplina de difícil compreensão e sem utilidade. Não que a matemática tenha que restringirse a aplicabilidade, mas que sirva também como elemento de valorização das distintas formas de matematizar o mundo como o fazem distintos grupos socioculturais. As formas próprias de medir, comparar, localizar, generalizar são ações fundantes do pensamento matemático desenvolvido no convívio em sociedade, na troca de experiência e saberes entre gerações, a qual determina as formas de ensinar e aprender características de distintos grupos. Essas formas de ensinar e aprender devem ser consideradas na hora de pensar o ensino de matemática na escola, pois os sujeitos não abandonam suas características sociais ao se tornarem alunos.
Então, se existem indicações e resultados de estudos que apontam para a melhoria desse processo com a utilização de recursos de contextualização é dever do docente e direito do aluno ao menos experimentá-los. Referências BANDURA, A. A Teoria Social Cognitiva na Perspectiva da Agência. Em: Bandura, A.; Azzi, R. G. e Polydoro, S. Teoria Social Cognitiva: conceitos básicos. (pp. 69-96). São Paulo: Artmed, 2008. BISHOP, A. J. Enculturación Matemática: La educación matemática desde una perspectiva cultural. Barcelona: Ediciones Paidós Ibérica, S.A, 1999. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino fundamental. Brasília: MEC, 2000. D AMBRÓSIO. U. Etnomatemática: arte ou técnica de explicar e conhecer. 5 ed. São Paulo: Ática, 1998. D AMBRÓSIO, U. Etnomatemática: Elo entre as tradições e a modernidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. GERDES, P. Geometria e Cestaria dos Bora na Amazonia Peruana. Estados Unidos da América: Lulu Enterprises, Morrisville, NC 27560, 2007. GIOVANNI, J. R. A conquista da matemática. 1. ed. São Paulo, 2009. MOREIRA, M. A., CABALLERO, M. C. e RODRÍGUEZ, M. L. (orgs.) Actas del EncuentroInternacional sobreel Aprendizaje Significativo. Burgos, España, 1997. pp. 19-44. PIAGET, J. O Nascimento da Inteligência na Criança. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1978. RICARDO, E. C. Competências, Interdisciplinaridade, Contextualização: dos Parâmetros Curriculares Nacionais a uma compreensão para o ensino das ciências. Tese (Doutorado em Educação Científica e Tecnológica). Universidade Federal da Santa Catarina, Florianópolis, 2005. SILVA, F. H. S. Formação de professores: mitos do processo. Belém: EDUFRA. 2009.