Informática aplicada à música: contribuições para a formação de professores de música



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Transcrição:

1 Informática aplicada à música: contribuições para a formação de professores de música José Ruy Henderson Filho 1 Resumo Este relato de experiência apresenta descrição e reflexão sobre atividades desenvolvidas na disciplina Informática Aplicada à Música, do Curso de Licenciatura em Música da Universidade do Estado do Pará. A inclusão dessa disciplina no currículo do curso se deu a partir de debates sobre as mudanças no cenário musical e, por conseguinte, na educação musical com vistas à utilização de novos recursos tecnológicos cada vez mais presentes no fazer musical. A experiência aqui relatada foi realizada no primeiro semestre de 2014 com duas turmas de licenciandos em música, visando à preparação dos mesmos para trabalharem com diferentes aplicativos musicais, sempre discutindo e propondo atividades para aplicação em suas práticas pedagógico-musicais. O uso de software livre na disciplina considerou a realidade das escolas públicas, permitindo assim que os programas abordados na disciplina possam ser utilizados posteriormente nas escolas onde os futuros professores irão atuar. Palavras chave: tecnologias na educação musical; formação de professores de música; software livre. Introdução A experiência relatada neste trabalho vem sendo desenvolvida e aperfeiçoada, desde 2011, acompanhando as discussões da área de educação musical, mais especificamente sobre suas interfaces com as tecnologias. No ano de 2004 foi implantado o Projeto Político Pedagógico PPP do Curso de Licenciatura em Música da Universidade do Estado do Pará UEPA atualmente em vigor. Nesse Projeto foi inserida no currículo do curso a disciplina Informática Aplicada à Música, com 04 horas semanais, totalizando 80 horas em um semestre. A disciplina visa não só a instrumentalização para o uso de software específico de música, mas a 1 Doutor em Música (Educação Musical) pela UFRGS-Professor Adjunto - Universidade do Estado do Pará

2 apropriação por parte do licenciando dos recursos disponíveis em diferentes tipos de software e sua aplicação no ensino da música. Apesar dessa ideia não ter sido compreendida por alguns professores, à época da discussão sobre a inserção da referida disciplina no currículo do curso, essa foi a abordagem que utilizei ao assumir a disciplina a partir do ano de 2011. Anteriormente (entre os anos de 2006 a 2010), a primeira abordagem (instrumentalização para o uso de software específico) era a utilizada, limitando-se quase que totalmente a software de edição de partituras. A ementa da disciplina ainda carece de reformulação, o que deverá ser feito na revisão do atual PPP do curso. No entanto, é possível fazer ajustes no conteúdo programático da disciplina, o que não nos deixa presos a uma proposta já defasada por mudanças de concepção e por inovações provocadas pelas mais recentes tecnologias. A ementa da disciplina contempla tanto a exploração de software específico de música, mas também abre possibilidade de se explorar a partir de outras perspectivas, considerando a criação/registro, a pesquisa e o processo de ensino e aprendizagem que pode ser auxiliado pelo computador. Considera também o computador como instrumento musical, com suas possibilidades de uso inclusive como fonte sonora e para a criação de arranjos. Ementa: Exploração de Softwares dentro do código musical. Criação, registro, pesquisa e ensino-aprendizagem. O computador como fonte sonora e instrumento de arranjo e execução musical. (PPP do curso de Licenciatura em Música da UEPA, 2002, p. 32). Desde o ano de 2011, sendo responsável pela disciplina, venho realizando algumas experimentações visando à preparação dos licenciandos para trabalharem com diferentes aplicativos musicais, sempre discutindo e propondo atividades para aplicação em suas práticas pedagógico-musicais. Nos últimos anos muitos cursos de licenciatura em música, vêm implantando em seus currículos disciplinas que apresentam essa relação da tecnologia com a música/ensino da música. No entanto, a simples inserção de uma disciplina não garante uma formação tecnológica que permita ao futuro professor de música uma aplicação pedagógica no ensino e aprendizagem musical. A formação tecnológica ainda está muito voltada para o conhecimento sobre as tecnologias em si, ou seja, para utilização de software musical, para edição de partituras, para gravação, sequenciamento etc., o

3 que Bellochio e Leme (2007) chamam de conhecimento técnico-operacional. A formação tecnológica nos cursos de licenciatura em música deve, além de promover esse domínio, possibilitar uma visão crítica sobre tais tecnologias, ampliando seu uso para além da técnica. Formar professores que dominem a tecnologia a ponto de criar alternativas pedagógicas com o auxílio das mesmas. O professor de música necessita mais que o acesso e o conhecimento técnico-operacional dos mesmos. Ao mexer com tecnologias, não quer dizer que o professor de música saiba como utilizá-las de modo crítico-reflexivo ou que ele tenha compreensão das possibilidades práticas das mesmas, do seu potencial educativo (BELLOCHIO e LEME, 2007 p. 89). Esse professor precisa dominar o computador tanto para poder utilizá-lo na produção de materiais didáticos, audiovisuais, apresentações, mas acima de tudo para possibilitar uma aprendizagem musical mais significativa para seus alunos, permitindo que eles próprios tirem proveito de seus recursos. O desenvolvimento da disciplina Informática Aplicada à Música está baseado nesses pressupostos, que passaremos a discutir adiante. Essa discussão torna-se importante, pois visa contribuir para reflexão sobre o papel das tecnologias na formação do professor de música. Após esse embasamento teórico, serão relatadas as atividades desenvolvidas na disciplina Informática Aplicada à Música, junto a duas turmas do curso de licenciatura em música da Universidade do Estado do Pará. Cabe ressaltar que, apesar de estar atuando há quatro anos na referida disciplina, delimitaremos a discussão neste artigo ao seu desenvolvimento no primeiro semestre de 2014. Tecnologias no ensino da música: por que e para quê? A discussão sobre tecnologias no ensino da música vem crescendo nos últimos quinze anos. Especificamente a literatura da área de educação musical vem expandindo em número de pesquisas e relatos práticos sobre o tema. Podemos encontrar nessa literatura pesquisas sobre educação musical a distância (HENDERSON FILHO, 2007; GOHN, 2009; KRÜGER, 2010); pesquisas que buscam investigar a utilização no ensino da música de tecnologias musicais já existentes, mas desenvolvidas para fins não educacionais (ARALDI, 2004; BOZZETTO, 2003; GOHN, 2003; RAMOS, 2002;

4 SCHMELING, 2005), refletindo a utilização desses recursos na educação musical; e ainda pesquisas que estudam/criam recursos tecnológicos musicais com fins específicos na educação musical (FICHEMAN; KRÜGER; LOPES, 2003; MARINS, 2003; MILETTO et al., 2004). Muitos desses autores defendem e apresentam formas de uso de diferentes tecnologias (computador, internet, celular, CD, rádio, entre outras) no ensino da música. Mas se considerarmos o grau de presença de tais tecnologias no cotidiano das pessoas, percebemos que ainda são poucas as práticas educativas que fazem esse uso com frequência. Sobre esse aspecto, nos chama atenção à colocação de John Daniel (2003): A tecnologia em mutação afeta quase todos os aspecto da vida, exceto, dizem muitos críticos, o mundo da educação. Por que motivo? Sua tecnologia é inerentemente inadequada à educação? Será porque os professores relutam em usá-la? Será porque ninguém encontrou ainda o meio de usá-las bem? Como se responde a essa pergunta? (DANIEL, 2003, p. 54) Concordando com o autor, penso que a ausência revelada do uso de novas tecnologias nas práticas educativas está associada primeiramente à falta de uma formação de professores adequada para tal uso. Se durante sua formação, o professor não vivenciou essa prática, muito dificilmente ele incorporará o uso dessas tecnologias em sua prática docente. Gohn (2003) discute algumas possibilidades para a realização da aprendizagem prática de música com o auxílio de novas tecnologias, como o vídeo e o computador. O autor, além de apresentar sua visão em relação ao cenário tecnológico na área de música, analisa alguns exemplos de sites que disponibilizam conteúdo de ensino de bateria, discutindo a utilização de meios tecnológicos na autoaprendizagem musical. O autor relaciona a influência tecnológica sobre o processo de aprendizagem musical ao processo de escuta ao longo dos anos, se referindo ao surgimento do fonógrafo e do rádio. Ele lembra as reações adversas, quando das suas aparições, como essas tecnologias foram consideradas musicalmente um atraso educacional, enquanto hoje, para as novas gerações, um mundo sem gravações e rádios seria inconcebível (GOHN, 2003, p. 182). Fazendo uma transposição para os dias atuais, no que diz respeito à utilização de novas tecnologias, o autor continua:

5 Assim como o ato de ouvir CDs e rádios para aprender novas músicas e novos ritmos tornou-se uma prática comum, pode-se deduzir que o uso da internet e outras redes eletrônicas para a realização de cursos e aperfeiçoamentos musicais será usual, que as vídeo-aulas irão evoluir para sistemas mais interativos o que já ocorre atualmente com o formato DVD e serão integradas aos computadores, e que o conjunto dessas alternativas formará a realidade do dia-a-dia dos indivíduos ensinando e aprendendo música (GOHN, 2003, p.182). A questão que devemos levantar hoje já não é mais se devemos ou não introduzir essas novas tecnologias no ensino da música, mas sim de que forma podemos tirar proveito das mesmas. Para isso, os professores precisam se apropriar dessas novas tecnologias, tanto para uso pessoal como profissional, conhecendo e sendo capazes de pesquisar maneiras de introduzi-las em suas práticas docentes. No caso do professor de música, segundo Henderson Filho (2007), (...) há ainda uma exigência mais específica que é o conhecimento das novas tecnologias de produção sonora, que possibilitam novas formas de se fazer música, sendo que, cada vez mais, essas tecnologias estão evoluindo e se popularizando e o professor de música precisa conhecê-las e saber como funcionam (p. 58). O foco deste trabalho, apesar de considerar a larga abrangência do conceito de tecnologias, está no computador e seus recursos de comunicação. Nesse sentido, destaco a definição de Henderson Filho (2014), quanto aos quatro níveis de utilização do computador pelo professor de música: O primeiro deles consiste na sua utilização para a preparação de aulas, registro e controle de atividades, bem como na pesquisa pessoal; o segundo visa produção de material didático, onde o professor elabora apresentações, simulações, seleciona e apresenta áudio e vídeo entre outros; o terceiro nível consiste na utilização (planejada e orientada pelo professor) por parte do aluno de programas educativos que apresentam/reforçam conceitos teóricos e disponibilizam exercícios práticos; o quarto nível consiste na sua utilização como instrumento de produção e execução musical, onde o estudante já atinge uma postura ativa frente à máquina, produzindo suas próprias músicas ou utilizando o computador para criar e/ou recriar músicas (p. 5). O desenvolvimento da disciplina Informática Aplicada à música teve como meta atingir esse quarto nível de utilização, onde os discentes puderam explorar diferentes programas no intuito de realizar uma produção musical própria.

6 Metodologia Neste tópico apresento a descrição/reflexão das atividades desenvolvidas na disciplina ao longo do primeiro semestre de 2014. A atividade destacada, intitulada Projeto de gravação envolveu diferentes categorias de software e abordou vários conteúdos da disciplina. A proposta da disciplina Informática Aplicada à Música vem dando ênfase à utilização de software livre 2, tendo em vista a realidade das escolas públicas do Estado que utilizam o sistema operacional Linux. Essa escolha leva em consideração tanto o sistema operacional presente nas escolas, como a ausência de recurso financeiro para compra de software proprietário (comercial), o que evita também a prática da pirataria de software nas escolas. A abordagem do software livre inicialmente exigiu um trabalho de conscientização dos licenciandos sobre sua importância e utilização. Muitos já vêm com a concepção de que software livre e gratuito é inferior ao software proprietário/comercial. Discutimos inicialmente sobre os avanços dos mesmos e sua adequação a realidade das escolas do Estado. Alguns alunos que já utilizam software proprietário apresentam mais resistência ao uso de software livre por já terem se acostumado aos recursos do mesmo e por nunca terem experimentado qualquer outro software. No entato, ao desenvolvermos atividades práticas com software livre, essa resistência diminui ao perceberem que muito do que se faz com o software proprietário, é possível fazer também com o software livre. Procuramos não discutir se determinado software é melhor que outro. Trabalhamos com a ideia de que o melhor software é aquele que atende às necessidades práticas do usuário. Ao longo de um semestre trabalhamos com diferentes categorias de software, entre elas: software sequenciador, software de gravação e edição de audio, software educativo-musical e software de edição de partituras. A seguir descrevemos os programas selecionados em cada categoria e a metodologia utilizada na disciplina, refletindo paralelamente sobre os resultados alcançados. As atividades e seus resultados 2 Programa de computador que pode ser usado, copiado, estudado, modificado e redistribuído com algumas restrições. A liberdade de tais diretrizes é central ao conceito, o qual se opõe ao conceito de software proprietário, mas não ao software que é vendido almejando lucro (software comercial).

7 Desenvolvemos ao longo do primeiro bimestre da disciplnia uma proposta que consistiu de elaboração de arranjo/gravação em grupo de uma música popular de livre escolha dos alunos. Assim, foram utilizados para realização do projeto tanto um software sequenciador como um de gravação e edição de áudio, e a escolha dos mesmos partiu de dois critérios: 1) software livre com opção para língua portuguesa e 2) multiplataforma, que funcione pelo menos nos sistemas Windows e Linux. Este último critério viabiliza a utilização nos mais difundidos sistemas operacionais, incluindo Linux, presente nos laboratórios das escolas públicas. Programas das categorias de editores de partitura e educativo musical foram trabalhados individualmente, discutindo-se sua aplicabilidade no ensino da música. A seguir, sao apresentadas estratégias utilizadas para cada uma das categorias de software. Software sequencidor: O software dessa categoria utilizado na disciplina e que atende aos dois critérios acima mencionados, foi o Hydrogen, que consiste em um sistema de geração de padrões ritmos por meio de sequenciamento de sons de instrumentos percussivos sampleados (amostra de sons de instrumentos reais). O Hydrogen foi utilizado na construção do padrão rítmico da música a ser gravada por cada equipe. Inicialmente, foram trabalhados alguns padrões básicos utilizando a notação específica para bateria. Foi solicitado aos alunos que criassem, no Hydrogen, um padrão rítmico de acordo com a música escolhida. A partir do primeiro padrão, os alunos deveriam criar mais dois padrões de variação. Após a criação de pelo menos três padrões solicitados, os alunos construíram a sequência de padrões de acordo com a duração da música, exportanto para o formato de áudio (wav), para que pudesse ser utilizado na próxima etapa. A utilização do software Hydrogen, por trabalhar com divisão rítmico-musical baseada em divisões de tempo que não necessitam de conhecimento prévio da escrita musical convencional facilitou a construção rítmica das músicas e permitiu aos alunos criarem padrões e variações rítmicas bastante interessantes. O Hydrogen, por essas características, pode muito bem ser utilizado em escolas regulares por alunos que ainda não têm familiaridade com o código musical, e ao mesmo tempo pode servir como recurso auxiliar na aprendizagem do mesmo. Software de gravação e edição de audio: O software dessa categoria utilizado na disciplina foi o Audacity, que também atende tanto ao critério de estar na língua

8 portuguesa, como o de ser multiplataforma. Nessa etapa, os alunos foram orientados a importar o arquivo inicialmente gerado no Hydrogen, ou seja, o ritmo da bateria, que serviria como base para a gravação dos demais instrumentos/vozes definidos por eles e que seriam agora gravados em multipistas, utilizando equipamentos de gravação (microfone, interface de áudio digital), instrumentos elétricos (guitarra e violão) bem como instrumentos acústicos (flauta, saxofone etc.) e a própria voz. Grupos foram formados por dois ou três alunos, que se revezaram na execução musical e na operação do software, sempre acompanhado pelo professor. O resultado foi a gravação de 12 músicas, com as mais variadas formações (canto e violão; canto, saxofone e violão; flauta e violão; guitarra e teclado entre outras), sempre com acompanhamento da bateria criada com o programa Hydrogen. As músicas, em sua maioria, não foram gravadas na íntegra, devido ao tempo limitado que tínhamos para realizar as gravações (nos horários das aulas da disciplina). Cabe ressaltar que o objetivo da atividade não era obter uma gravação perfeita, mas sim possibilitar aos alunos a experimentação do processo de gravação e produção musical, valorizando também o trabalho em equipe. Portanto, o foco foi no processo e não no produto. Software de edição de partituras: nesta categoria, utilizamos o programa Musescore, que é atualmente o software livre de edição de partituras mais difundido e que também atende aos critérios definidos para os dois anteriores. Em sua utilização, pudemos destacar uma série de recursos presentes nos mais avançados programas comerciais dessa categoria. Como nas turmas em questão havia alunos que já utilizavam algum software de edição proprietário, como o Sibelius, no início da utilização do Musescore houve certa resistência e críticas ao programa por achar que o Sibelius possui uma interface mais interessante ou mais recursos do que o Musescore. No entanto, quando comecei a mostrar que o Musescore também possui vários dos recursos mencionados, houve melhor aceitação do mesmo. Discutimos sobre a necessidade prática que cada pessoa pode ter e que pode ser suprida pelo programa, bem como discutimos sobre a familiaridade com determinado programa, o que faz com que o usuário ache um (aquele como o qual está acostumado) melhor do que outro (aquele que não tem familiaridade ou não conhece).

9 A atividade com esta categoria de software foi basicamente visando familiarizar os alunos com os recursos do programa Musescore por meio de cópia de partituras e criação de exercícios, que podem ser criados para serem utilizados pelo professor em sala. Software educativo musical: para abordar essa categoria, optamos por apenas indicar, com uma breve demonstração, alguns programas e jogos educativos que podem ser utilizados no ensino e aprendizagem musical, discutindo possibilidades e limites e o papel do professor frente a esses programas. Essa limitação foi imposta pelo tempo reduzido para realização da disciplina, o que inviabiliza o trabalho mais aprofundado com cada tipo de software. Considerações finais As experiências vivenciadas ao longo de quatro anos na disciplina Informática aplicada à Música no curso de Licenciatura em Música da Universidade do Estado do Pará tem se baseado na ideia de que a inclusão de novas tecnologias na formação do licenciado em música precisa considerar que o mesmo deve conhecer tais tecnologias explorando-as e dominando-as tanto para uso pessoal como para a sua prática como professor, não apenas como recurso audiovisual, mas como instrumento de produção/criação musical, onde os licenciandos ampliem as possibilidades de uso, conhecendo diferentes programas e metodologias de ensino que tirem o melhor proveito dessa tecnologia. O professor de música que domine um software pode produzir seu próprio material didático, seja ele impresso ou audiovisual, mas essa tecnologia também pode possibilitar que o aluno construa seu próprio conhecimento musical por meio da utilização mais ativa do computador, na perspectiva do 4º nível de utilização mencionado anteriormente. Mas essa utilização ativa pode se expandir além da disciplina específica que aborda a tecnologia na educação musical. Disciplinas que abordam a teoria da música poderiam se beneficiar com a utilização do computador e de programas apropriados que possibilitem a análise musical, a escuta apoiada por recursos audiovisuais, o treinamento auditivo, dentre tantas outras atividades necessárias para o aprendizado musical que poderiam se tornar mais dinâmicas e motivadoras com o uso de tecnologias

10 que apoiem as mesmas. A formação do professor de música para a utilização de novas tecnologias será mais completa quando a inclusão tecnológica chegar às demais disciplinas e os professores repensarem suas metodologias e se apropriarem de recursos tecnológicos adequados à formação do educador musical do século XXI, em sintonia com as transformações sociais causadas pela evolução tecnológica, onde somente a escola não se apropria devidamente dessas transformações. Referências ARALDI, Juciane. Formação e prática musical de DJs: um estudo multicaso em Porto Alegre. Dissertação (Mestrado em Música) Programa de Pós-Graduação em Música, Instituto de Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004. BELLOCHIO, Claudia R., LEME, G. R. Professores de escolas de música: um estudo sobre a utilização de tecnologias. Revista da ABEM. Porto Alegre, n. 17, p. 87-96, set. 2007. BOZZETTO, Adriana. Músicas do celular. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 12., 2003, Florianópolis. Anais Florianópolis: Abem, 2003. p. 8-14. DANIEL, John. Tecnologia e educação: aventuras no eterno triângulo. In: DANIEL, John. Educação e tecnologia num mundo globalizado. Brasília: UNESCO, 2003. FICHEMAN, Irene Karaguilla, KRÜGER, Susana Ester, LOPES, Roseli de Deus. Editor musical: uma pesquisa sobre software para atividades de composição individual e colaborativa. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 12., 2003, Florianópolis. Anais Florianópolis: Abem, 2003. p. 375-386. GOHN, Daniel Marcondes. Auto-aprendizagem musical: alternativas tecnológicas. São Paulo, Annablume: Fapesp, 2003.. Educação musical a distância: propostas para ensino e aprendizagem de percussão. Tese (Doutorado em Ciências da Comunicação)-Programa de Pós- Graduação em Ciências da Comunicação da Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009. HENDERSON FILHO, José Ruy. Formação continuada de professores de música em ambiente de ensino e aprendizagem online. Tese (Doutorado em Música) Programa de Pós-Graduação em Música, Instituto de Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007.

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