ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO E PREVISIBILIDADE DE UM DOWNBURST EM MACAÉ, USANDO O MODELO REGIONAL BRAMS E ÍNDICES DE INSTABILIDADE ATMOSFÉRICA Willians Bini 1 Fernando Almeida 2 RESUMO: No dia 20 de junho de 2005, tempestades de ventos fortes foram registradas na cidade de Macaé, Rio de Janeiro, causando inúmeros prejuízos e transtornos à população. Segundo dados do aeroporto de Macąé, o vendaval chegou a atingir 116 km/h, o que provocou o tombamento de cinco helicópteros que estavam estacionados no local. Este tipo de tempestade não é tão comum e chamou atenção pelo seu poder de destruição. Este trabalho pretende estudar as causas e a natureza deste fenômeno, classificação e aspectos relacionados com a sua previsibilidade. São apresentados neste trabalho resultados de modelos numéricos sobre a região de Macaé. O estudo realizado leva à conclusão de que o fenômeno ocorrido no dia 20 de junho em Macaé foi um downburst, cujos resultados numéricos e índices atmosféricos apontavam para uma forte tendência de atividade convectiva e formação de tempestade severa. RESUMO: In Jun 20, 2005, strong wings were registered in Macaé City, Rio de Janeiro, causing too many damages and problems to population. According to Macaé Airport, the gust reached 116 km/h, causing the fall of five helicopters that were parked in the Airport. This kind of thunderstorm is not so common because its destruction power. This article intends to study the causes of this phenomenon, classification and aspects related with its forecast. It will be present some results of numerical model over Macaé area. This study shows that the phenomenon occurred in Jun 20, 2005 was a downburst, whose results and atmospheric indexes indicated to a strong tendency of convective activity and thunderstorms formation. Palavras-chave: downburst, modelagem, BRAMS INTRODUÇÃO Macaé pertence à Região Norte Fluminense, que também abrange os municípios de Campos dos Goytacazes, Carapebus, Cardoso Moreira, Conceição de Macabu, Quissamã, São Fidélis, São Francisco de Itabapoana e São João da Barra. O município tem uma área total de 1.219,8 quilômetros quadrados, correspondentes a 12,5% da área da Região Norte Fluminense. A figura 1 apresenta a localização espacial e do município de Macaé. No mês de junho o regime de chuvas depende diretamente da atuação das frentes frias provenientes do sul do Brasil. O gradiente de temperatura observado entre a massa de ar 1 SOMAR Meteorologia Rua Afrânio Peixoto, 262, Butantã São Paulo SP CEP 05507-000 Fone: +55 (11) 3816 2888 Fax +55 (11) 3816 2888 e-mail: willians@met.com.br 2 Msc. Oceanógrafo Rua Egídio Martins 195/11 Ponta da Praia Santos/SP CEP 11030-161 Fone: +55 (13) 3226 1329 e-mail: fgalmeid@gmail.com 1
tropical continental (quente) e a massa de ar de origem polar (frio) ocasiona uma instabilidade na atmosfera. Nessa região também são observados fenômenos atmosféricos de menor escala como chuvas fortes, tormentas de ventos, raios e queda de granizos. Esses fenômenos podem ser observados ao longo do ano, mas são mais intensos durante o período que antecede a chegada de frentes frias, quando ocorrem temperaturas extremamente elevadas. Figura1: Posição Geográfica de Macaé e sua vista aproximada No dia 20 de Junho de 2005 foram observados ventos fortes e chuva intensa sobre Macaé. De acordo com relatos e observações feitas depois da ocorrência do fenômeno, consta que os ventos destruíram beirais de telhados, destelhou algumas casas, derrubou algumas árvores, derrubou parte de um murro de arrimo, fez com que tombassem 6 helicópteros que estavam estacionados no Aeroporto de Macaé, danificou residências situadas no bairro de Lagomar e causou danos também ao Centro de Convenções da cidade de Macaé RJ. A figura 2 mostra algumas fotos dos estragos causados pelos fortes ventos. Interessante observar que os helicópteros estão tombados num único sentido e não foram arrastados, não havendo evidências de ventos giratórios (ciclônicos). Figura 2: Estragos causados pelos fortes ventos: tombamento de helicópteros, queda de arvores e muros DESCRIÇÃO SINÓTICA: A imagem de satélite sobre a América do Sul, no canal infravermelho, das 1800Z (figura 3) mostra uma área de nebulosidade se prolongando desde o 2
Mato Grosso do Sul, até o oceano Atlântico, passando por São Paulo e o Rio de Janeiro, que está associada à propagação de uma frente fria sobre essa região. Figura 3: Imagem de satélite mostrando a frente fria sobre o Sudeste METODOLOGIA Com o objetivo de simular as condições ocorridas no dia 20/06/05 foi rodado o modelo regional BRAMS no cluster da SOMAR Meteorologia. Para este evento, foram utilizados dados da Reanálise do NCEP/NCAR(National Centers for Environmental Modeling / National Center for Atmospheric Research) na assimilação do BRAMS. A simulação feita com o BRAMS foi de 60 horas, com saídas horárias, entre as 00:00Z do dia 19 de junho de 2005 até às 12:00Z do dia 21 de junho de 2005. A figura 4-a indica o período de simulação: Figura 4: Diagrama com o período da simulação do modelo BRAMS Na simulação foram utilizadas duas grades numéricas aninhadas. Uma maior (grade 1), que abrange todo o Estado do Rio de Janeiro, sul de Minas Gerais e Leste de São Paulo, com resolução de 10 km, e outra grade mais refinada (grade 2), que abrange apenas a região de Macaé, com resolução de 1 km. A tabela 1 abaixo indica os limites de cada grade. 3
Latitude Longitude Resolução Grade 1 26.91S à 17.83S 46.71W à 36.8 8W 10 km Grade 2 23.48S à 21.30S 42.98W à 40.61W 1 km Tabela 1: Grades 1 e 2 utilizadas na simulação com o BRAMS A partir dos resultados obtidos pelo modelo BRAMS, foram gerados mapas e meteogramas de variáveis atmosféricas e os índices de instabilidade K, Tottals e Showlater (SILVA DIAS, 2000). RESULTADOS A figura 5 mostra os resultados numéricos para as 18Z da vorticidade, convergência e circulação em 1000 mb, além dos índices K, Tottals e Showalter. Nota-se claramente uma intensa linha de convergência sobre a região central do Rio de Janeiro. A circulação mostra ventos mais fortes a leste da linha de convergência, o que inclui a região de Macaé. Os três índices indicam grande instabilidade sobre o RJ, próximo à Macaé. A figura 6 mostra gráficos em forma de meteograma para a coordenada de Macaé com saídas horárias para a convergência e corrente ascendente em 1000 mb e 850 mb. Já a figura 7 mostra os meteogramas para os indices K, Tottals e Showalter. Analisando os meteogramas das principais variáveis atmosféricas, como convergência, vorticidade, corrente ascendente, intensidade do vento, umidade e geopotencial, desde a baixa até a alta troposfera, se constata que a atmosfera sobre a região referenciada apresenta condições de forte instabilidade favorecendo, portanto, o desenvolvimento de sistemas meteorológicos extremos como ventos fortes, granizo e chuvas torrenciais. CONCLUSÕES Com base no conjunto de informações analisadas nesse trabalho, chega-se a conclusão que o fenômeno meteorológico que atingiu a região de Macaé do dia 20/06/2005, é classificado como um downburst. A literatura científica define downburst (explosão ou estouro em direção ao solo) como um sistema que é formado por ventos danosos causados pela rápida descida do ar que 4
sai de uma tempestade e vai em direção ao solo atingindo uma área restrita, como se fosse uma pista com até 4 quilômetros de largura. Considerando a natureza de formação e atuação do fenômeno downburst, o que o caracteriza como um fenômeno de mesoescala, a sua previsibilidade está relacionada à disponibilidade de um conjunto de informações que vão desde dados observacionais (de superfície e de altitude), imagens de satélite, radar meteorológico e modelos matemáticos de previsão numérica de tempo (mesoescala e global). Figura 5: Mapas de vorticidade, convergência e circulação em 1000mb. Índices K, Showalter e Tottals. Previsão para as 18:00Z [grade 2] Os Modelos Numéricos de Previsão de Tempo em escala global permitem prever com até 15 dias de antecedência as condições da atmosfera sobre uma determinada região. Porém, só é possível prever fenômenos de grande escala de atuação, principalmente os transientes, como no caso as frentes frias. No entanto, em função da escala (100km), não permite a precisão de fenômenos de mesoescala como o downburst. Os modelos de mesoescala vêem complementar as informações inicialmente geradas pelos modelos globais. Em função da escala (1 a 40km) permitem aos modelos regionais refinar e detalhar as condições da atmosfera, podendo melhor definir o potencial para o desenvolvimento de fenômenos extremos. 5
Figura 6: Variação temporal da convergência e Corrente Ascendente em 858 e 1000 mb para a coordenada de Macaé [grade 2] Figura 7: Variação temporal dos índices K, Showalter e Tottals para a coordenada de Macaé [grade 2] Portanto, a previsibilidade ou não de um fenômeno meteorológico varia de acordo com a escala e o tempo de duração do fenômeno e está diretamente relacionada com a disponibilidade dos recursos tecnológicos adequados. AGRADECIMENTOS À SOMAR Meteorologia pelo apoio financeiro. À PETROBRAS pelo fornecimento de fotos e informações de relevância na elaboração deste trabalho. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS SILVA DIAS, M. A. F., 2000. Índices de Instabilidade para Previsão de Chuva e Tempestades Severas, Universidade de São Paulo, SP. 6