Influência dos Parâmetros do Processamento sobre a Transesterificação das Blendas PBAT/PBS H. S. M. Lopes¹, T. H. S. Maia¹, C. G. Renda¹, A. A. Lucas¹ ¹ Universidade Federal de São Carlos - Rodovia Washington Luiz (SP 310), Km 253, São Carlos/SP Brasil CEP 13565-905 Rua Oito de Maio, 149 Jardim Santa Rosália, Sorocaba/SP CEP 18090-140 henrique_sml@hotmail.com RESUMO Uma blenda biodegradável de Poli(butileno adipato-co-tereftalato) (PBAT) e Poli(butileno succinato) (PBS), PBS/PBAT (70/30 m/m %) foi processada em um misturador interno a fim de observar a influência dos parâmetros do processo nas propriedades do material. Durante a mistura, podem ocorrer reações de transesterificação, melhorando a compatibilidade entre os polímeros. Os parâmetros estudados foram tempo, velocidade dos rotores e a temperatura de mistura. As propriedades reológicas em regime dinâmico foram investigadas e pôde-se observar uma maior interação na blenda processada em menores temperaturas e velocidades durante maiores tempos, através de um maior valor do Módulo de Armazenamento e Viscosidade Complexa obtidos, sugerindo que houve transesterificação. Complementarmente, as propriedades mecânicas, térmicas e térmicas dinâmicomecânicas avaliadas apresentaram um aumento nos valores de Módulo Elástico, Resistência à Tração, e Módulo de Armazenamento (E ) para a mesma condição. Não houve alteração significativa na cristalinidade. Palavras-chave: Transesterificação, Poliéster, Biodegradável, Compatibilidade INTRODUÇÃO O descarte incorreto de produtos fabricados a partir de plásticos sintéticos aumenta a geração de resíduos sólidos e induz a um grave problema de poluição. Neste contexto, estudos com polímeros biodegradáveis têm sido realizados como uma alternativa para a substituição dos polímeros sintéticos commodities (1, 2, 3). No intuito de desenvolver um material biodegradável como potencial substituto para os 9634
plásticos convencionais, está sendo estudada uma blenda polimérica de dois poliésteres biodegradáveis, poli(butileno adipato-co-tereftalato) PBAT e poli (butileno succinato) PBS. O PBS é um poliéster alifático biodegradável sintetizado pela reação de policondensação de 1,4-butanodiol com ácido succínico. Esse poliéster tem natureza semicristalina, boa estabilidade térmica, boas propriedades de processamento e baixo ponto de fusão (2,3). O PBAT é comercialmente sintetizado por matéria-prima oriunda do petróleo, ácido adípico, 1,4-butanodiol, e ácido tereftálico, possui elevada flexibilidade, excelente resistência ao impacto e baixa temperatura de fusão, sendo biodegradável em diversos ambientes, tais como, água com lodo ativado e águas marítimas (1,3). Durante o processamento termomecânico, reações químicas, tais como cisão de cadeia e a formação de novas ligações primárias e/ou secundárias acontecem, podendo piorar ou melhorar as propriedades finais dos polímeros. Em especial, quando poliésteres são misturados, podem ocorrer reações de transesterifcação, que envolvem alcoólise, acidólise e troca de ésteres. A reação de transesterificação é um mecanismo de troca que pode ajudar a formar um novo tipo de ligação éster entre os componentes da mistura, o produto dessa reação pode ter papel importante na compatibilidade, cristalinidade e nas propriedades mecânicas da blenda (2,4). MATERIAIS E MÉTODOS Materiais Foram utilizados granulados de poli (butileno adipato-co-tereftalato) (PBAT), fornecido pela empresa BASF sob o nome comercial de Ecoflex F Blend C1200, com um índice de fluidez entre 2,7 e 4,9 g/10min e poli (butileno succinato) (PBS), fabricado pela empresa NaturePlast sob o nome comercial de PBI 003, com um índice de fluidez de 20 g/10min. Antes da mistura, os grânulos dos polímeros foram secos a 80 C durante pelo menos 12 horas em uma estufa com circulação de ar. Métodos Preparação da Blenda As amostras com composição de 70% PBS e de 30% PBAT foram preparados em um reômetro de torque, da marca Thermo Scientific Haake Polylab QC, com rotores do tipo Roller R3000. Estes materiais foram pré-misturados manualmente e 9635
esta mistura foi adicionada à câmara do misturador. Após a mistura, o material foi prensado a 140 C sob pressão de 3MPa por 1 minuto e, após breve alívio de tensões, a pressão foi elevada para 5MPa por 1 minuto seguido de resfriamento sob pressão até 50 C. A Tabela 1 apresenta os valores de velocidade dos rotores, tempo e temperatura utilizadas em cada condição. Tabela 1: Condições de processamento das amostras no misturador. Amostra Temperatura (ºC) Rotação (rpm) Tempo (minutos) 1 120 50 3 2 120 100 3 3 150 50 3 4 150 100 3 5 120 50 6 6 120 100 6 7 150 50 6 8 150 100 6 9 135 75 4,5 10 135 75 4,5 Ensaio de Tração Os ensaios foram realizados de acordo com a norma ASTM D882. A distância entre garras foi fixada em 17,5 mm. A velocidade do ensaio foi de 500mm/min. Foram realizadas de 5 a 10 amostras por condição. Espectroscopia no Infravermelho por Transformada de Fourier (FTIR) As amostras foram caracterizadas por FTIR (Attenuated Total Reflectance, ATR) e o equipamento utilizado foi um espectrômetro Agilent Technologies Cary630 FTIR e o software Microlab. Foi utilizada a faixa de leitura de 650 a 4000cm -1. Cada espectro teve 64 acumulações, com uma resolução de 4cm -1. 9636
Reometria de Placas Paralelas em Regime Oscilatório Foi utilizado um reômetro de deformação controlada da marca TA Instruments, modelo ARG2 para a obtenção das propriedades reológicas das blendas. As amostras utilizadas foram reprensadas, logo após o processamento. A distância entre placas utilizada foi de 1 mm, com uma temperatura de 150 C. A frequência variou de 0,01 a 100 rad/s e a deformação foi mantida constante, em 1%, previamente avaliada, garantindo o regime viscoelástico linear. Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC) A análise de DSC foi realizada em um calorímetro da marca TA Instruments, modelo Q2000, sob atmosfera de nitrogênio. Amostras entre 5 e 10 mg e foram analisadas em porta-amostras de alumínio. A análise foi realizada entre -50 até 150 C, com uma taxa de aquecimento e resfriamento de 10 C/min. Análise Térmica Dinâmico-Mecânica (DMTA) Os módulos de perda e armazenamento, juntamente com tan δ, foram mensurados em função da temperatura em um equipamento da TA Instruments, modelo Q800. A análise foi realizada entre -60 até 80 C, com uma taxa de aquecimento de 3 C/min. Foi utilizada a garra no modo de tração com uma frequência de 1 Hz e amplitude oscilatória de 15 μm. RESULTADOS E DISCUSSÕES Propriedades Mecânicas A Tabela 2 contém as propriedades mecânicas das blendas. Os resultados foram tratados estatisticamente e as Figura 1 e 2 apresentam as superfícies de resposta de variação do Módulo Elásticos e Resistência à Tração em função das variáveis estudadas, duas a duas. Se considerarmos que a resistência mecânica dos materiais será resultante da competição entre a cisão de cadeias (degradação) e recombinação das mesmas por transesterificação, é possível observar que, conforme há um aumento da Temperatura e da Rotação, os efeitos de degradação possuem maior influência sobre o resultado de Módulo Elástico e Resistência à Tração, causando uma 9637
diminuição dos mesmos. Já os resultados obtidos à baixas Temperaturas e Rotações sugerem que o processo de transesterificação seja favorecido, devido ao maior Módulo Elástico observados para as blendas. Tabela 2: Propriedades Mecânicas das Amostras Processadas Condição Módulo Elástico (GPa) Resistência à Tração (MPa) 1 1,90±0,03 26,51±0,65 2 1,78±0,06 25,56±1,15 3 1,80±0,05 25,81±0,84 4 1,88±0,06 25,67±1,21 5 2,28±0,08 30,60±1,03 6 2,14±0,12 27,11±2,65 7 1,95±0,02 27,56±0,41 8 1,96±0,03 26,13±0,69 9 1,93±0,03 26,90±0,85 10 1,97±0,01 26,84±0,40 A partir dos resultados de propriedades mecânicas obtidos, as condições 1, 4, 5, 8 e 9 foram escolhidas para posteriores análises devido às diferenças obtidas nestes resultados. (a) (b) Figura 1: Influência da Temperatura e Rotação (a); Temperatura e Tempo (b) no Módulo Elástico. 9638
(a) (b) (c) Figura 2: Influência do Tempo e Temperatura (a); Temperatura e Rotação (b); e Tempo e Rotação (c) na Resistência à Tração. Espectroscopia no Infravermelho por Transformada de Fourier (FTIR) As análises de FTIR identificam reações químicas e físicas entre os polímeros durante as misturas (blendas). Os espectros das amostras das dez condições comparados com os das amostras puras estão apresentados na Figura 3. Os picos de frequência do grupo carbonila das blendas demonstraram uma pequena variação se comparada aos polímeros puros, o que pode indicar, conforme trabalhos realizados (6, 7), que tenha havido reações de transesterificações e a formação de copoliéster de PBS e PBAT na reação de éster-éster; ou ainda que houve a degradação dos polímeros ou das blendas, devido ao processamento, não sendo 9639
portanto conclusiva para analisar a ocorrência das reações de transesterificação. (a) (b) Figura 3: Espectros das amostras em suas dez condições de processamento e dos polímeros puros (a); Evolução do espectro na região da carbonila (b). Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC) As Figuras 4a e 4b apresentam os termogramas processadas em diferentes condições, juntamente com os polímeros puros. (a) (b) Figura 4: Primeiro aquecimento no ensaio de DSC das blendas processadas e dos polímeros puros (a); Resfriamento no ensaio de DSC das blendas processadas e dos polímeros puros (b). 9640
As blendas preparadas em diferentes condições mostram semelhantes picos endotérmicos de fusão cristalina, aproximadamente em 114 C ±0,5, referente ao PBS puro, observado na Figura 4a. Duplos picos de fusão cristalina também são observados e resultado semelhante é encontrado na literatura (2). Segundo os autores, estes picos duplos podem estar relacionados com a fusão cristalina dos cristais mais imperfeitos que recristalizam-se, seguida da fusão cristalina dos cristais mais perfeitos e recristalizados (8). Não houve alteração significativa na cristalização das blendas sob resfriamento, observado na Figura 4 (b), com início de cristalização para as amostras girando em torno de 84 C. O índice de cristalinidade dos materiais foi calculado a partir das curvas de fusão e está disposto na Tabela 3 Tabela 3 Índice de cristalinidade dos materiais Condição 1 4 5 8 9 PBAT PBS Índice de Cristalinidade (%) 55,0 55,7 59,1 57,6 55,4 8,7 55,2 Observa-se que a Condição 5 possui o maior índice de cristalinidade entre as amostras processadas. As demais amostras apresentam índice de cristalinidade próximo ao do PBS puro, evidenciando que as condições de mistura não influenciaram na cristalização das blendas. Análise Térmica Dinâmico-Mecânica (DMTA) As Figuras 5a e 5b apresentam o Módulo de Armazenamento e a Tangente de Perda em função da Temperatura das amostras. Na Figura 5a, a amostra processada na condição 5 apresentou valor maior de Módulo de Armazenamento do que o do PBS puro por toda a faixa de temperatura de ensaio, confirmando assim uma maior interação entre os componentes da blenda devido ao processo de transesterificação (6). Os picos observados na tangente de perda, na Figura 5b, referentes à transição vítrea, Tg, das amostras obtidas em diferentes condições são muito próximas às dos polímeros puros, que são -30 C, para o PBAT, e -24 C, para o PBS (2, 9). Observa-se que a amostra 5 apresenta um menor valor de tangente de perda, indicando uma maior interação entre os 9641
componentes da blenda, o que está de acordo com os resultados de propriedades mecânicas. (a) (b) Figura 5: Módulo de Armazenamento (E ) e tangente de perda em função da temperatura. Propriedades Reológicas em Regime Oscilatório As Figuras 6 e 7 mostram o Módulo de Armazenamento (G ) e o Módulo de Perda (G ), respectivamente, ambos em relação à Frequência Angular. Figura 6: Módulo de Armazenamento em função da Frequência Angular para as diferentes amostras. É possível observar que, conforme aumenta-se a Frequência Angular, ambos os módulos (armazenamento e perda) também aumentam. Sob altas frequências, a diferença entre os módulos de armazenamento e perda de cada condição é muito 9642
pequena. Em baixas frequências nota-se que as condições 4 e 5 possuem os valores de módulo de armazenamento ligeiramente maiores. O módulo de perdas possui pouca variação, com valores ligeiramente maiores para as condições 4 e 5. Este maior valor de Módulo de Armazenamento (G ) foi reportado em outro trabalho e vinculado à condição com maior grau de transesterificação (2) e estes resultados corroboram com os resultados previamente apresentados. Figura 7: Módulo de Perda em função da Frequência Angular para as diferentes amostras. Figura 8: Viscosidade complexa em função da Frequência Angular para as blendas processadas em diferentes condições. A viscosidade complexa das blendas em função da Frequência Angular é apresentada na Figura 8. Um leve aumento na viscosidade é observado para as 9643
blendas das condições 4 e 5. Mais uma vez, a combinação de maior tempo e menor temperatura (Condição 5) sinaliza um processo mais intenso de transesterificação do que de degradação, como previamente observado pela avaliação das suas propriedades mecânicas, de cristalinidade e térmicas dinâmico-mecânicas. CONCLUSÃO A partir dos resultados apresentados, observa-se que, em menores temperaturas e velocidades de rotação e em tempos maiores, o processo de transesterificação é favorecido em relação ao processo de degradação. Em ensaio de tração, maiores valores de Módulo Elástico e Resistência à Tração foram adquiridos. Em ensaio de DMTA, um Módulo de Armazenamento (E ) e menor Tangente de Perda foram obtidos. Em ensaio reológico, um maior Módulo de Armazenamento (G ) foi observado, acompanhados de um maior índice de cristalinidade, analisado por DSC. REFERÊNCIAS 1 CAI, Y.; LV, J.; FENG, J. Spectral characterization of four kinds of biodegradable plastics: poly (lactic acid), poly (butylenes adipate-co-terephthalate), poly (hydroxybutyrate-co-hydroxyvalerate) and poly (butylenes succinate) with FTIR and raman spectroscopy. Journal of Polymers and the Environment, v. 21, n. 1, p. 108-114, 2013. 2 MUTHURAJ, R.; MISRA, M.; MOHANTY, A. K. Biodegradable Poly (butylene succinate) and Poly (butylene adipate-co-terephthalate) Blends: Reactive Extrusion and Performance Evaluation. Journal of Polymers and the Environment, v. 22, n. 3, p. 336-349, 2014. 3 JAVADI, A. et al. Processing and characterization of microcellular PHBV/PBAT blends. Polymer Engineering & Science, v. 50, n. 7, p. 1440-1448, 2010. 4 JAYAKANNAN, M.; ANILKUMAR, P. Mechanistic aspects of ester carbonate exchange in polycarbonate/cycloaliphatic polyester with model reactions. Journal of Polymer Science Part A: Polymer Chemistry, v. 42, n. 16, p. 3996-4008, 2004. 5 AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. ASTM D882: Standard Testing Method for Tensile Properties of Thin Plastic Sheeting. United States, 2000. 9644
6 JOHN, J.; MANI, R.; BHATTACHARYA, M. Evaluation of Compatibility and Properties of Biodegradable Polyester Blends. Journal of Polymer Science: Part A: Polymer Chemistry, v. 40, p. 2003-2014, 2002. 7 KWEI, T. K. The effect of hydrogen bonding on the glass transition temperatures of polymer mixtures. Journal of Polymer Science: Polymer Letters Edition, v. 22, n. 6, p. 307-313, 1984. 8 ZHANG, Kunyu; MOHANTY, Amar K.; MISRA, Manju. Fully biodegradable and biorenewable ternary blends from polylactide, poly (3-hydroxybutyrate-cohydroxyvalerate) and poly (butylene succinate) with balanced properties. ACS applied materials & interfaces, v. 4, n. 6, p. 3091-3101, 2012. 9 CAN, Erde et al. Polybutylene Succinate (PBS) Polycaprolactone (PCL) Blends Compatibilized with Poly (ethylene oxide)-block-poly (propylene oxide)-block-poly (ethylene oxide)(peo-ppo-peo) Copolymer for Biomaterial Applications. Polymer- Plastics Technology and Engineering, v. 53, n. 11, p. 1178-1193, 2014. 10 RAVATI, Sepehr et al. High performance materials based on a self assembled multiple percolated ternary blend. AIChE Journal, v. 60, n. 8, p. 3005-3012, 2014. Processing Parameters Influence on the PBAT/PBS Blends Transesterification ABSTRACT A biodegradable blend of poly (butylene-adipate-co-terephtalate) (PBAT) and poly (butylene succinate) (PBS) was processed in a internal mixer for the purpose of analyse its parameters influence on the material properties. During the mixture, transesterifications reactions could occur, improving the compatibility among the polymers. In this study, was varied the processing parameters of the blend PBS/PBAT (70/30, w/w, %), in order to observe its influence on the transesterification. Its rheological properties was investigated and a strong interaction was achieved in the blends processed in minor temperatures and rotations under high times, due to a higher Storage Modulus and Complex Viscosity. Completely, its mechanical, thermal and thermomechanical properties showed an optimization in Young s Modulus, Tensile Strength and Storage Modulus (E ) for the same condition, while the crystallinity had no significant change, suggesting the transesterification. Key-words: Transesterification, Polyester, Biodegradable, Compatibility. 9645