Sistema de Apoio à Decisão: Avaliando Cenários de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Domiciliares



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Transcrição:

Sistema de Apoio à Decisão: Avaliando Cenários de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Domiciliares Luciana Miyoko Massukado. Engenheira Civil. Doutoranda do Programa de Pós Graduação em Ciências da Engenharia Ambiental CRHEA/USP. Viviana Maria Zanta. Engenheira Civil. Docente do Programa de Pós Graduação em Engenharia Urbana Ambiental. Universidade Federal da Bahia. Valdir Schalch. Engenheiro Químico. Docente do Programa de Pós Graduação em Ciências da Engenharia Ambiental e do Programa de Pós Graduação em Hidráulica e Saneamento. EESC/USP. CONTATO Nome do contato: Luciana M. Massukado Organização: Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada End.: Rua sete de setembro, 2053 CEP 13560-180 São Carlos, SP Tel.: (16) 3376 1535 e-mail: lumiyoko@sc.usp.br RESUMO TÉCNICO A gestão e o gerenciamento dos resíduos sólidos domiciliares têm se apresentado como um dos grandes desafios a serem enfrentados não só pelas administrações municipais como também por toda a comunidade geradora de resíduos. Atualmente a gestão dos resíduos sólidos domiciliares é tratada segundo o modelo reducionista de Descartes e Newton, caracterizada pela separação e análise de partes do sistema, resultando em tomadas de decisão isoladas e pontuais. Aspectos, como a carência de capacitação técnica e de recursos financeiros, contribuem para a permanência deste cenário. Ciente desta problemática este trabalho teve como objetivo desenvolver e aplicar um sistema de apoio à decisão na perspectiva de auxiliar os gestores na avaliação de cenários de gestão dos resíduos sólidos domiciliares por meio da simulação, mostrando alguns efeitos que poderão ocorrer caso diferentes estratégias e escolhas sejam tomadas. O método consistiu, primeiramente, em definir e delimitar o campo de trabalho do sistema de apoio à decisão seguindo-se para a modelação deste sistema, que foi realizado por meio de telas de ação e fluxogramas de decisão. Terminado estes procedimentos partiu-se para a codificação do modelo em linguagem computacional (Delphi 6.0). O SIMGERE, nome do sistema desenvolvido, permite que os gestores testem diferentes opções de gestão, como por exemplo, a introdução da coleta seletiva, e então verifiquem o efeito desta decisão na vida útil do aterro sanitário. No entanto é imprescindível salientar que o processo de simulação fornece os resultados das estratégias adotadas, mas é o gestor quem irá analisar os resultados destas estratégias e selecionar aquela que considere mais adequado para a realidade do município. A aplicação do SIMGERE foi testada para a gestão dos resíduos sólidos domiciliares de São Carlos/SP uma vez que até o momento, a equipe responsável pela gestão destes resíduos não dispunha de nenhuma ferramenta que avaliasse os efeitos ambientais decorrente de diferentes estratégias adotadas. Os resultados da simulação mostraram que a vida útil para o aterro sanitário municipal de São Carlos será de aproximadamente mais dois anos, o qual foi coerente com o valor esperado pelo gestor. Entretanto, a simulação econômica precisa ser revisada para melhor refletir o modelo atual de gestão dos resíduos sólidos domiciliares desta cidade.

INTRODUÇÃO Considerado como um dos setores do saneamento básico, o sistema de resíduos sólidos tem se mostrado nas últimas décadas como um sério problema ambiental e também de saúde pública. Uma vez gerado, os resíduos sólidos demandam por soluções adequadas de forma a alterar o mínimo possível o meio ambiente e todos os elementos que dele fazem parte. O gerenciamento dos resíduos sólidos não está ligado somente à quantidade produzida, mas também a outros fatores como a heterogeneidade de seus componentes, concentração populacional nas áreas urbanas, limitações dos recursos humanos, financeiros e econômicos disponíveis e a ausência ou deficiência de políticas públicas que regule as atividades deste setor. Estes resíduos têm diferentes origens domiciliares, varrição, poda e capina,de serviços de saúde, industriais, de estações de tratamento de esgoto e de construção e demolição. Desta classificação destacam-se os resíduos sólidos domiciliares (RSD) objeto de estudo desta pesquisa que contribuem com parcela significativa dos resíduos sólidos totais gerados. Segundo a CETESB (1999) esta classe representa cerca de 65,3% em peso do total diário encaminhado para aterros e lixões cadastrados. Estima-se que 47,5 milhões de toneladas de RSD sejam produzidos no Brasil por ano (130 mil ton/dia), ou seja, aproximadamente 0,7 kg/hab.dia. (GRIMBERG, 2002). O resíduo sólido domiciliar brasileiro é composto na sua maioria por matéria orgânica putrescível, que tem como característica a rápida degradação, tornando-se, portanto, a responsável pelo odor desagradável proveniente das usinas de compostagem e dos locais de disposição. A elevada geração de resíduos sólidos facilmente degradáveis, no Brasil, pode ser em parte explicada pela cultura de desperdício de alimentos (fases de produção, industrialização, armazenagem, transporte e distribuição) existente e que é comum também a vários outros países latinos. A problemática dos RSD está relacionada muitas vezes ao manejo inadequado (tanto pela população quanto pela administração municipal), tendo como conseqüências à poluição ambiental e redução da qualidade de vida nas cidades brasileiras. Exemplos desta gestão ineficiente são os inúmeros episódios em que a ausência de tratamento e a disposição inadvertida dos resíduos provocam principalmente a contaminação do solo e das águas subterrâneas. Outra questão, não menos relevante, com relação aos RSD são os catadores informais que segregam o lixo nas ruas ou nos lixões, mostrando-se como o ponto mais agudo e visível da relação do lixo com a questão social. Trata-se do elo perfeito entre o inservível e a população marginalizada da sociedade que, no lixo, identifica o objeto a ser trabalhado na condução de sua estratégia de sobrevivência (IBAM, 2001). Portanto, infere-se que a problemática dos RSD transcende as soluções técnicas (coletar, transportar, tratar e destinar o resíduo), pois requer atitudes que permeiem os aspectos sociais (catadores), ambientais (proteção do meio ambiente), educacionais (mobilização da população), estéticos (paisagem), econômicos, de saúde pública e também de integração com os outros sistemas de saneamento.

A quantidade de fatores envolvidos no sistema de resíduos sólidos domiciliares caracteriza a complexidade de se obter uma gestão e gerenciamento eficazes. E para tanto, é necessário, no mínimo, formar uma equipe multidisciplinar, ou seja, profissionais vindos de diferentes áreas do conhecimento. Sabe-se que a tomada de decisão está envolta de incertezas e imprevistos, resultantes tanto da inabilidade do ser humano prever o futuro e trabalhar com o inesperado quanto da complexidade pertinente a questão dos resíduos sólidos. Desta forma, o trabalho em equipe minimizaria o risco das tomadas de decisões equivocadas. FERREIRA (2000) destacou que a busca por uma solução adequada para os resíduos sólidos deve ocorrer em todos os municípios. Porém, cabe salientar que, durante o processo de planejamento, não se pode ignorar as diferenças fundamentais de capacidade econômica, disponibilidade de qualificação técnica e características ambientais entre as grandes cidades e os municípios de pequeno e médio porte. No Brasil, 68,5% dos resíduos gerados em municípios com até 20 mil habitantes são depositados em locais inadequados. Esta situação torna-se relevante, pois esta parcela de municípios corresponde a 73% da população brasileira total (IBGE, 2002; JUCA, 2003). E, de uma forma geral, estes municípios vêm se deparando com problemas que envolvem aspectos sociais, econômicos, sanitários, ambientais e de saúde pública decorrentes da gestão inadequada dos seus resíduos sólidos domiciliares. Gestão esta caracterizada pela: Ausência ou deficiência de planejamento, que a partir de um diagnóstico da situação estabeleça princípios, metas e prioridades; Baixa qualificação do corpo técnico para realizar o planejamento das etapas de gestão de modo a atender satisfatoriamente as necessidades urbanas; Inexistência de histórico e de banco de dados que forneça subsídios para as tomadas de decisão; Insuficiência de recursos financeiros para cobertura dos investimentos e custeio das atividades do sistema de limpeza urbana. Acrescenta-se ainda a este quadro a diminuição, em alguns municípios, de locais adequados para a disposição final dos resíduos sólidos e que tem como causas, o aumento do custo de implantação, a rejeição dos moradores quanto ao local, e imposições ambientais mais restritas relativas à localização e operação dos aterros. MODELO DE GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS DOMICILIARES NO BRASIL Hoje, a gestão dos resíduos sólidos domiciliares se apresenta em cada cidade brasileira de forma diversa, prevalecendo, entretanto, situação nada promissora (IBAM, 2001). O enfoque dado ao problema dos resíduos no Brasil é, em sua maioria, sob o ponto de vista exclusivo da coleta e do transporte do resíduo sólido, destinando-o em áreas afastadas dos centros urbanos, longe da visão de seus geradores. Identificam-se outros dois problemas relacionados com o modelo atual de gestão dos RSD. A primeira é a descontinuidade política, evidenciada pela ruptura dos programas e planos, quando se esgota o período de gestão e outro grupo assume o poder. E o segundo problema refere-se ao aspecto legal, que mesmo considerando ser eminentemente municipal a competência para a gestão dos resíduos sólidos domiciliares, a legislação ressente-se de uma política nacional de resíduos sólidos, bem como de

normas gerais e de âmbito nacional, visando não apenas a gestão adequada dos resíduos. Infere-se, então, que o problema das administrações municipais é a visão extremamente segmentada e setorizada que a maioria delas tem com relação à gestão do resíduo sólido. Este ponto de vista leva a conflitos e divergências operacionais que minimizam a resultante das ações. Estas ações isoladas encontradas no modelo atual de gestão dos RSD recebem várias denominações sendo mais conhecidas a visão com ênfase nas partes, visão mecanicista, reducionista ou analítica. No Brasil, a competência pela gestão dos resíduos sólidos domiciliares cabe as Prefeituras Municipais, as quais defrontam-se, freqüentemente, com o dilema - a decisão de como, onde e quando aplicar os seus recursos. Para facilitar as tomadas de decisão estão surgindo vários estudos de modelagem e programação no âmbito da gestão dos resíduos sólidos, que são importantes para otimizar a análise de diferentes alternativas de gestão, uma vez que diminui o tempo despedido com os cálculos. Dentre estes programas escolheu-se o software SIMGERE simulação da gestão de resíduos para avaliar a situação atual e futura da gestão dos resíduos sólidos domiciliares de São Carlos/SP como estudo de caso. O SOFTWARE O SIMGERE é um software que foi desenvolvido para auxiliar as administrações públicas municipais na gestão de seus resíduos sólidos domiciliares utilizando para tanto a simulação de cenários (MASSUKADO, 2004). O software foi desenvolvido para engenheiros, técnicos e administradores que sejam responsáveis pela gestão de resíduos sólidos de municípios de pequeno e médio porte. Professores, alunos e pesquisadores podem utilizar o software como forma de aprendizagem ou então como objeto para desenvolver novos estudos. No programa o usuário deve entrar com alguns dados como produção de resíduos, existência ou não de coleta seletiva, custo para coleta e transporte dos resíduos, custo para disposição, entre outros. Os resultados fornecidos pelo programa são: projeção do crescimento da população, projeção da produção de resíduos, projeção anual do volume ocupado no aterro sanitário, estimativa da vida útil do aterro sanitário, estimativas dos custos operacionais e da receita obtida com a venda dos resíduos recicláveis. No programa está disponível também a composição gravimétrica de aproximadamente 40 municípios brasileiros, que se encontram distribuídos por região e estado. Portanto, o município que não dispuser dos dados referentes à composição dos seus resíduos domiciliares pode utilizar como base o valor da composição de outra localidade que possua características, por exemplo, número de habitantes semelhante ao seu (MASSUKADO, 2004).

MATERIAIS E MÉTODOS A metodologia utilizada para aplicar o SIMGERE consistiu primeiramente na coleta de dados referentes à gestão dos resíduos sólidos domiciliares no município de São Carlos/SP. Para tanto, houve a colaboração da Prefeitura Municipal por meio da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável, Ciência e Tecnologia. Os dados necessários para alimentar o software estão divididos em três blocos, o primeiro correspondente aos dados gerais (ano atual, geração de resíduo, composição gravimétrica dos resíduos, volume do aterro, índice de compactação e volume de cobertura). O segundo bloco do SIMGERE refere-se aos dados de simulação (para quanto tempo será realizada a simulação, taxa de crescimento da população, variação da geração per capita, porcentagem de resíduos desviada pela coleta seletiva, quando houver). E, por último, os dados necessários para realizar a simulação econômica (custo da coleta e transporte de resíduos, custo de disposição, custo de operação da coleta seletiva e preço médio de comercialização dos resíduos recicláveis). Mediante a posse destes dados partiu-se para a entrada dos dados coletados no programa. Por fim, realizou-se a análise do resultado, obtido pela simulação, juntamente com o grupo gestor da Secretaria a fim de verificar a coerência dos valores obtidos. Esta aplicação teve dois objetivos principais, primeiro o de verificar se as funções do sistema estavam de acordo com o planejado e se todos os elementos do sistema combinavam-se adequadamente. Desta forma seria possível verificar a coerência dos resultados obtidos pela simulação com a situação real. O segundo objetivo foi de analisar a usabilidade deste software. APLICAÇÃO DO SIMGERE A aplicação do software SIMGERE foi realizada pelo responsável pela gestão dos resíduos sólidos de São Carlos em outubro de 2004. São Carlos está situada na parte centro-oriental do estado de São Paulo. A Figura 1 mostra a localização de São Carlos no Estado de São Paulo. Figura 1: Localização de São Carlos De acordo com os dados fornecidos pela Secretaria de Desenvolvimento Sustentável, Ciência e Tecnologia da Prefeitura Municipal de São Carlos, a gestão dos resíduos sólidos urbanos domiciliares na cidade de São Carlos compete à Prefeitura Municipal que terceirizou parte dos serviços a Vega Engenharia Ambiental S/A, que hoje é responsável

pela coleta convencional, transporte, tratamento e destinação final dos RSD. Os resíduos coletados são destinados diretamente ao Aterro Sanitário, o qual necessitará de ampliação em curto espaço de tempo. A produção de RSD em São Carlos está em torno de 4100 t/mês, ou seja, cerca de 137 t/dia. Deste total, aproximadamente 100 t/mês são recolhidos pela coleta seletiva e o restante, 4000 t/mês pela coleta convencional. Para uma população de 200.000 habitantes a produção per capita de resíduos fica em torno de 0,700 kg/hab.dia. O serviço de coleta convencional beneficia 100% da área urbanizada. A freqüência desta coleta varia de acordo com a região e a produção de resíduos, podendo ser diária e de até três vezes por semana. O município está dividido em quinze setores de coleta. Já os RSD recolhidos pela coleta seletiva são encaminhados para três centrais de triagem e beneficiamento onde os resíduos são separados por tipos, prensados, armazenados para depois serem comercializados. A coleta seletiva teve início em junho de 2002, com o projeto piloto no bairro Vila Nery numa iniciativa conjunta da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Sustentável, Ciência e Tecnologia com o Fórum Comunitário do Lixo. Desde então a coleta seletiva vem se expandindo e hoje 50 bairros são atendidos. A realização da coleta seletiva é feita por três cooperativas (Ecoativa, Cooletiva e Coopervida), sendo que uma delas é constituída exclusivamente por mulheres. A forma de disposição final dos resíduos sólidos domiciliares em São Carlos é o aterro sanitário, que está localizado na Fazenda Guaporé, zona rural do município, e está distante da sede municipal cerca de 12 km. O aterro está localizado sobre o aqüífero Botucatu Pirambóia e pertence à bacia hidrográfica do Tietê Médio Inferior Tietê Jacaré. O acesso é feito através da Rodovia Washington Luis. A estrutura do aterro ocupa uma área de 180 mil m2, sendo 95 m2 destinados para as edificações existentes e o restante da área (179.905 m2) está direcionado para a disposição final de resíduos domiciliares e para os acessos e circulação. RESULTADOS DO SIMGERE O gestor poderá realizar quantas simulações desejar e analisar o resultado (impacto) de cada uma delas provoca com relação a vida útil do aterro sanitário. Para cada simulação o programa emite três relatórios. O relatório é dividido em quatro partes: Parte I: referente aos dados gerais, ou seja, à caracterização do município e dados sobre a gestão integrada dos resíduos sólidos domiciliares (Figura 2); Parte II: referente aos critérios de simulação do cenário (Figura 3); Parte III e IV: referente às planilhas de cálculo, uma com relação à vida útil do aterro sanitário e a outra referente à simulação econômica simplificada (Figura 4 e 5).

Figura 2: Relatório dos dados gerais do município e da gestão dos resíduos sólidos domiciliares

Figura 3: Relatório referente aos critérios de simulação do cenário Figura 4: Planilha de cálculo da vida útil do aterro sanitário

Figura 5: Planilha de cálculo da simulação econômica simplificada RESULTADO QUANTO À USABILIDADE Com relação à usabilidade do SIMGERE notou-se uma pequena dificuldade do usuário em se adaptar ao software. Parte desta dificuldade pode ser atribuída à falta do Manual do Usuário, que no momento da aplicação não estava disponível. O esquema de abas utilizado para o preenchimento das telas não se mostrou muito eficiente, pois ambos os usuários apresentavam a tendência de clicar nos botões e não nas abas propriamente dita. O botão informativo, caracterizado pelo ponto de interrogação, era pouco acessado. Mesmo o usuário tendo dúvidas com relação a alguma etapa do preenchimento ele não clicava neste botão. Com relação ao tempo de de processamento dos cálculos não houve reclamação. De forma geral, o programa foi considerado uma ferramenta útil e interessante pelos gestores. RESULTADO QUANTO À COERÊNCIA Quanto aos resultados obtidos pela simulação, dois merecem destaques: a previsão da vida útil do aterro sanitário e a simulação econômica simplificada do modelo operacional empregado. Com relação ao resultado da vida útil do aterro sanitário, chegou-se ao valor de 1 ano e 8 meses, que é compatível ao estimado pelos gestores que seria de 1 anos e 6 meses. Quanto à simulação econômica, houve uma ressalva, pois na contabilização dos custos/benefícios a parcela referente à venda dos resíduos recicláveis foi contabilizada no balanço como receita para a Prefeitura, situação esta que na realidade não ocorre uma vez que a receita obtida é dividida entre os funcionários da cooperativa. Portanto, o resultado da vida útil do aterro sanitário gerado pela simulação dos cenários foi coerente com a situação atual, porém o mesmo não pode ser afirmado para a

simulação econômica, indicando que o software deve ser adaptado para casos específicos como o de São Carlos. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES Durante a simulação da gestão dos resíduos sólidos domiciliares de São verificou-se que há carência por instrumentos que apóiem a tomada de decisão não somente para situações a longo prazo mas, principalmente, a curto prazo. Esta carência foi verificada pela tendência de se atribuir prazos pequenos para a simulação (2 e 6 anos). A utilização do software pelo gestor obteve ótimo desempenho, pois durante o acompanhamento do processo de simulação, observou-se que conforme novas telas surgiam para serem preenchidas o gestor se questionava sobre qual valor colocar e porquê. Neste momento, verificou-se que o sistema desenvolvido poderia sim atuar como ferramenta de apoio à decisões estratégicas. Por exemplo, para preencher o campo sobre a variação ou não da produção per capita dos RS, o gestor se perguntou: quero que a produção per capita do município decresça. (pausa) Mas para isso vou ter muito trabalho, pois terei que atuar diretamente com os geradores num processo de conscientização. Num segundo momento, outra possibilidade foi levantada, quando o gestor afirmou (...) pode ser também que ocorra um aumento da variação da produção per capita devido aos padrões de consumo cada vez mais altos... então... neste caso irei variar a produção per capita aumentando 0,5% a.a.. Ressalta-se que para o melhor aproveitamento do potencial de simulação do SIMGERE é fundamental que o usuário utilize sua experiência profissional para a seleção das informações relevantes na proposição de cenários a serem estudados e interpretação das respostas obtidas. Deste modo o SIMGERE pode ser uma ferramenta bastante útil e eficaz para subsidiar as tomadas de decisão quanto à gestão dos RSD do município. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL CETESB. Inventário Estadual de Resíduos Sólidos Domiciliares Relatório síntese 1999. São Paulo: CETESB, 2000. 64 P. 2. GRIMBERG, E. (2002). Propostas para o problema dos resíduos sólidos domiciliares. Disponível em <http:\www.polis.org.br/lixoecidadania/arsta.html>. Acesso em: 21 dez. 2002. 3. FERREIRA, J.A. Resíduos Sólidos: Perspectivas Atuais. In: SISINNO, C.L.S.; OLIVEIRA, R.M. Resíduos sólidos, ambiente e saúde: uma visão multidisciplinar. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2000. p. 19-40. 4. JUCA, J.F.T. Disposição final dos resíduos sólidos urbanos no Brasil. Anais... In: 5º Congresso Brasileiro de Geotécnica Ambiental. Porto Alegre, RS. 2003. 5. INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL IBAM. Manual de Gerenciamento Integrado de resíduos sólidos. Rio de Janeiro: 2001. 197 p. 6. MASSUKADO, L.M. Sistema de Apoio à Decisão: Avaliando cenários de gestão integrada de resíduos sólidos urbanos domiciliares. 2004. Dissertação (Mestrado em Engenharia Urbana) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia Urbana, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP. 7. PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS. Contato pessoal. 2004.