CONCLUSÃO Aos 23 dias do mês de Setembro de 2013, faço estes autos conclusos a Juíza de Direito Michiely Aparecida Cabrera Valezi Benedeti. Eu, - Escrivã(o) Judicial, escrevi conclusos. Vara: 1ª Vara Criminal Processo: 0002377-87.2012.8.22.0016 Classe: Ação Penal - Procedimento Ordinário (Réu Solto) Autor: Ministério Público do Estado de Rondônia Réu: Raimundo Mesquita Muniz SENTENÇA I Relatório O Ministério Público do Estado de Rondônia ofereceu denúncia em desfavor de Raimundo Mesquita Muniz, qualificado à fls. 03, imputando a este a prática do crime previsto no art. 1º, II, do Decreto-Lei nº 201/67. Narra a denúncia que o réu, na condição de Prefeito Municipal, utilizou-se, indevidamente em proveito próprio de rendas públicas. Segundo se apurou, a FUNASA (Fundação Nacional de Saúde) celebrou convênios com o Município de, de n. 1781/2000, 1778/2000 e 2440/2001. Em razão das irregularidades na execução dos convênios, foram imputados à Raimundo os seguintes valores: R$ 27.471,76 (convênio 1778/2000), R$ 3.063,17 (convênio 1781/2000) e R$ 1.633,23 (convênio 2440/2001), em consequência da tomada de contas especial instaurada pela FUNASA. Instado a efetuar os pagamentos, Raimundo utilizou-se de verbas públicas para a quitação. Os extratos bancários e microfilmagem dos cheques apontam que os valores utilizados para quitação do débito são oriundos da conta de titularidade do Município. O relatório do Conselheiro do TCE/RO, Rochilmer Mello da Rocha, concluiu que o denunciado efetuou a liquidação de seu débito junto ao Governo Federal com recursos do Município de. O Pleno do TCE/RO considerou ilegais as despesas realizadas pelo denunciado. Pág. 1 de 9
À fl. 269 determinou-se a notificação do denunciado para apresentar defesa prévia nos termos do art. 2º, inc. I do Decreto Lei n. 201/67. O réu foi notificado e apresentou Defesa Prévia, fls. 277 e 281/287. A defesa prévia foi analisada, sendo que a denúncia foi recebida em 19 de novembro de 2012, fls. 289. Em audiência de instrução foi procedido o interrogatório do réu, fls. 294. O Ministério Público, em suas alegações finais, pugnou pela condenação do réu, nos termos da denúncia. A Defesa, por seu turno, em fase de alegações finais, fls. 308/335, alegou, preliminarmente, falta de justa causa para o exercício da ação penal, incompetência do foro, inépcia da denúncia e da prescrição, e, no mérito, pela absolvição. II Fundamentação II.a Da preliminar de Inépcia da denúncia O réu alegou que a denúncia foi feita de forma genérica, sem delinear um fato específico a ser contrariado. A denúncia preenche todos os requisitos do artigo 41 do CPP, havendo a exposição do fato criminoso, a qualificação do acusado, a classificação do crime, bem como a indicação do rol de testemunhas. De ressaltar que a denúncia, nos termos em que deduzida, não dificultou a defesa do requerido durante o processado, tanto é verdade que a tese de inépcia só foi aventada em sede de alegações finais. Por tais razões, rejeito a preliminar. II.b Da Preliminar de Prescrição Pág. 2 de 9
O réu alegou que os fatos ocorreram entre os anos de 2004, tendo sido recebida a denúncia somente no ano de 2012, decorrendo o lapso temporal de oito anos. Assim, hipoteticamente, aplicando-se a pena em abstrato, o crime estaria prescrito, devendo ser extinta a punibilidade. Porém, não é o caso em tela, visto que o ordenamento jurídico pátrio não prevê a modalidade de extinção da punibilidade em decorrência do reconhecimento da prescrição virtual, isto tem sido uma construção jurisprudencial, contudo, o Superior Tribunal de Justiça repele o reconhecimento da mesma, inclusive editou a Súmula 438. O artigo 109 do Código Penal: Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no parágrafo 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: I - em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze; II - em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze; III - em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito; IV - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro; V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois; VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano. Note-se, portanto, que, em nosso sistema, a regra geral, antes do trânsito em julgado da sentença final, é de prescrição pela pena abstrata (considerado o máximo previsto pelo legislador), sendo exceção o disposto no parágrafo primeiro do artigo seguinte, o qual autoriza a consideração da pena concretamente aplicada na hipótese de prolação de sentença condenatória seguida de inexistência ou improvimento do apelo da acusação. Pág. 3 de 9
Art. 110 - A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. 1º A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. Desse modo, somente se passa a desprezar a pena máxima fixada pelo legislador, após o trânsito em julgado da decisão para a acusação. A esse respeito, anoto que o Plenário do STF, na Repercussão Geral por Questão de Ordem no RE nº 602.527/RS, de Relatoria do Ministro Cezar Peluso (DJe de 18/12/09), reafirmou a jurisprudência no sentido da impossibilidade de aplicação da chamada prescrição antecipada ou em perspectiva por ausência previsão legal. Eis a ementa desse julgado: AÇÃO PENAL. Extinção da punibilidade. Prescrição da pretensão punitiva em perspectiva, projetada ou antecipada. Ausência de previsão legal. Inadmissibilidade. Jurisprudência reafirmada. Repercussão geral reconhecida. Recurso extraordinário provido. Aplicação do art. 543-B, 3º, do CPC. É inadmissível a extinção da punibilidade em virtude de prescrição da pretensão punitiva com base em previsão da pena que hipoteticamente seria aplicada, independentemente da existência ou sorte do processo criminal. Feitas estas considerações afasto a prescrição alegada. III.c Preliminar de incompetência de foro O réu alega incompetência de foro, sob o argumento que o procedimento investigatório em tela é sobre desvio de verbas públicas pertencentes à União Federal e que o foro competente para processa-lo e julga-lo é o Tribunal Regional Federal. Pág. 4 de 9
Em análise detida dos autos, verifica-se do procedimento investigatório que o réu na verdade efetuou a liquidação de seu débito junto ao Governo Federal com recursos da Prefeitura Municipal de, o que implica dizer que não se trata de verba federal e sim verba do Município que quitou débito federal. Mesmo se assim, não fosse a teor da súmula 133 do extinto TRF, compete a justiça comum estadual processar e julgar prefeito municipal, acusado de desviar verba recebida através de acordo ou convênio firmado com a União. Diante disso, afasto a preliminar de incompetência de foro. Do mérito O Decreto-lei n. 201/67 dispõe: Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: I - [...] Il - utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos; [ ] 1º Os crimes definidos neste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos. 2º A condenação definitiva em qualquer dos crimes definidos neste artigo, acarreta a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular. Pág. 5 de 9
A materialidade está comprovada pela farta prova documental. A cópia do processo de apuração de irregularidades na devolução de recursos, realizado pelo Tribunal de Contas do Estado de Rondônia sob n. 3185/2006, fls. 07/252, bem como do procedimento investigatório promovido pelo Ministério Público, demonstrando o cometimento do crime em comento. A autoria restou demonstrada pelo depoimento prestado, além das demais provas carreadas nos autos. O denunciado, Raimundo Mesquita Muniz, na época dos fatos era prefeito municipal de. O bem tutelado no crime de peculato de uso, disposto no art. 1º, II, do decretolei nº 201/67, é a moralidade administrativa e como se vê, tal foi atingida pela conduta do requerido, na medida em que desvia indevidamente rendas públicas em proveito próprio, em razão de seu cargo. A infração em referência, observe-se, criminaliza o denominado 'peculato de uso', figura atípica na legislação penal comum, tipificando como crime funcional a conduta de utilizar-se o agente político municipal (prefeito e vereadores), indevidamente, sem animus domini, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos. Destaca-se, de início, que distinta é essa conduta daquela descrita no inciso I do art. 1º do DL 201/67, porquanto, nesse caso, o prefeito apropria-se (incorpora a seu patrimônio) de bens ou rendas, ou os desvia em proveito próprio ou alheio. No peculato de uso, previsto no inciso II do já referido dispositivo legal, o sujeito ativo do crime utiliza-se, ilicitamente, de bens, rendas ou serviços públicos, também em seu proveito ou de terceiros, agente público ou não. Ouvido em Juízo o requerido argumentou que a denúncia era parcialmente verdadeira. Alega que quando chegou a multa, a mesma chegou em nome do prefeito municipal e não no nome da pessoa física Raimundo e que por isso a multa foi paga com Pág. 6 de 9
dinheiro da prefeitura municipal (DVD fl. 296). Embora o réu alegue que não houve dolo de sua parte, suas alegações não coaduna com os documentos trazidos aos autos, conforme se observa da fl. 242, o próprio réu recebou por AR o ofício referente a decisão do Pleno, em seu endereço, fato confirmado por ele em audiência que reconheceu sua assinatura. No entanto, tais provas carreadas nos autos demonstram evidente utilização indevida, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos; Durante toda a instrução processual o réu não conseguiu comprovar a regularidade e origem da verba devolvida a FUNASA decorrente de convênio não cumprido, ônus que lhe competia. De tal sorte, emerge induvidosa a real responsabilidade do acusado pela aquisição de bens de serviços restituição de valores pagos a FUNASA decorrente de convênio realizado, com verba da prefeitura, fazendo uso de dinheiro público para tal, de forma indevida, em proveito próprio e alheio, assim, condenação é imperativo. III Dispositivo Ante ao exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado com relação ao terceiro fato narrado na denúncia, por consequência CONDENO o réu RAIMUNDO MESQUITA MUNIZ, qualificado nos autos, como incurso nas sanções do art. 1º, II, parágrafo 1º do Decreto-Lei nº 201/67. Em observância ao critério trifásico de aplicação da pena, inicio a fixação da reprimenda analisando as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, considerando: a) a culpabilidade evidenciada, sendo bastante reprovável a conduta do agente; b) os antecedentes lhe são favoráveis, visto que o que constam nas fls. 262/267, tratam-se Pág. 7 de 9
de precatórias ou inquéritos; c) conduta social boa; d) a personalidade do agente é normal, não havendo nos autos elementos objetivos diversos; e) os motivos determinante do crime foi auferir vantagem patrimonial de forma ilícita; f) as circunstâncias não o favorecem, tendo em vista que se utilizou de sua função pública para praticar o delito; g) as consequências além de infringir o dever de fidelidade para com a administração gerou dano ao erário. Assim, diante das circunstâncias judiciais acima analisadas fixo a pena base um pouco acima do mínimo legal, qual seja, 03 (três) anos de reclusão. Inexistem circunstâncias atenuantes e agravantes à serem analisadas. Ausente causas especiais de diminuição e aumento de pena à ser analisada. Em razão do exposto acima e a míngua de outras causas modificadora da pena torno a pena DEFINITIVA em 03 anos de reclusão. Considerando o montante da pena aplicada bem como tratar-se de réu primário, fixo o regime aberto, como regime inicial de cumprimento da pena (artigo 33, 2º, alínea "c", do Código Penal). Por fim, atenta às diretrizes constantes no artigo 44 e seus parágrafos do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade aplicada ao réu por pena restritiva de direito. Tal substituição se justifica por tratar-se de réu primário e os processos existentes em seu nome ainda não transitaram em julgado, sendo que a culpabilidade, a conduta social, a personalidade e os motivos do crime indicam que a mencionada substituição é suficiente. Assim sendo, com fulcro no artigo 44, 2º do Código Penal, o réu deverá efetuar como sanção alternativa, 02 (duas) penas restritivas de direito, sendo a primeira consistente em prestação de serviço à comunidade pelo período da condenação, oito horas semanais em instituição a ser designada em audiência admonitória e a segunda consistente em prestação pecuniária no importe de 05 (cinco) salários mínimos a ser destinada na fase de exceçução de pena. Condeno o réu ao pagamento das custas processuais. IV - Das Disposições Finais Pág. 8 de 9
Transitada em julgado esta decisão: 1. Lance-se o nome do acusado no rol dos culpados e expeçam-se guia de execução de pena. 2. Proceda-se às comunicações de costume. 3.Oficie-se ao INI/DPF, SSP/RO, TRE/RO e ao Cartório Distribuidor Criminal da comarca da capital (DGJ, capítulo VII, item 43) comunicando-os acerca desta decisão. 4.Expeça-se guia de execução de pena. Sentença publicada e registrada automaticamente pelo sistema SAP. Intimemse. Ciência à defesa e Ministério Público. Após a formação dos autos de execução de pena, arquivem-se estes autos. -RO, quinta-feira, 13 de março de 2014. Michiely Aparecida Cabrera Valezi Benedeti Juíza de Direito RECEBIMENTO Aos dias do mês de março de 2014. Eu, - Escrivã(o) Judicial, recebi estes autos. REGISTRO NO LIVRO DIGITAL Certifico e dou fé que a sentença retro, mediante lançamento automático, foi registrada no livro eletrônico sob o número 57/2014. Pág. 9 de 9