PROVA ESCRITA DE DIREITO TRIBUTÁRIO VIA ACADÉMICA 1.ª CHAMADA 9 DE ABRIL DE 2016 GRELHA DE CORREÇÃO Cotação total da prova de direito e processo tributário 10 valores A atribuição da cotação máxima à resposta a cada questão pressupõe um tratamento completo das várias questões suscitadas, que deverá ser coerente e corretamente fundamentado, com indicação dos preceitos legais aplicáveis. A indicação de jurisprudência pertinente é valorizada. Na cotação atribuída serão tidos em consideração a pertinência do conteúdo, a qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a organização da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o domínio da língua portuguesa. Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até um máximo de 3 valores, para o total da prova. As indicações constantes da grelha refletem as que se afiguram ser as soluções mais corretas para as situações em abordagem. Porém, não deixaram de ser valorizadas outras opções, desde que plausíveis e alicerçadas em fundamentos consistentes. CASO I Em 22 de outubro de 2015 a Filóstrato, Lda., empresa de aluguer operacional e gestão de frotas automóveis, interpôs junto do serviço de finanças competente uma oposição à execução nos termos do artigo 204.º do CPPT, contra duas penhoras de veículos de que Grelha de correção 1.ª chamada - via académica 1
é proprietária, efetuadas pelo órgão de execução fiscal, no âmbito de dois processos de execução fiscal distintos em que é executada por dívidas de IRC. Na oposição pede a anulação e consequente levantamento das penhoras, alegando para o efeito serem as mesmas ilegais, por corresponderem a valores manifestamente desproporcionados relativamente ao montante da dívida exequenda. Oportunamente, o serviço de finanças remeteu os autos de oposição à execução ao tribunal competente, declarando na informação emitida nos termos do n.º 1, do artigo 208.º, do CPPT e junta aos mesmos, além do mais, que os dois processos de execução nos quais foram efetuadas as penhoras dos veículos contestadas pela Filóstrato, Lda., não se encontram apensos entre si, por se encontrarem em fases processuais distintas. Aberta conclusão ao juiz para apreciação liminar, o mesmo verifica que nos autos de oposição se encontram documentos que comprovam que a Filóstrato, Lda. foi notificada das penhoras em causa no dia 15 de outubro de 2015. Fundamentadamente, indique se o meio processual escolhido por Filóstrato, Lda., foi o adequado e, se entender que não, refira qual o que devia ter sido utilizado e se se encontram reunidos os requisitos para a convolação prevista nos artigos 97.º, n.º 3, da LGT e 98.º, n.º 4, do CPPT. Cotação total de 3 valores O meio processual adequado para atacar as penhoras é a reclamação da decisão do órgão da execução fiscal, prevista no artigo 276.º e seguintes do CPPT, e não a oposição à execução, cujos fundamentos taxativos são enumerados no n.º 1 no artigo 204.º do CPPT. Apesar de não existir um problema de tempestividade, porque a oposição foi interposta no prazo de 10 dias previsto no n.º 1 do artigo 277.º, do CPPT, a convolação não é possível sem mais, por estar em causa uma cumulação ilegal de reclamações, uma vez que as penhoras contestadas foram efetuadas em dois processos de execução fiscal distintos e não apensos entre si. Antes de a ordenar, o juiz deverá convidar o reclamante a escolher contra qual das duas penhoras pretende reclamar. Grelha de correção 1.ª chamada - via académica 2
Caso II Tendo sido citados numa execução fiscal instaurada contra si para a cobrança coerciva de uma dívida de IRS no montante de EUR 100.000,00, Otelo e Desdémona, casados entre si, interpuseram uma oposição à execução, invocando para o efeito a inexistência do imposto nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação, nos termos do disposto na alínea a), do artigo 204.º, do CPPT. Argumentam que o IRS em cobrança coerciva não é devido, por resultar da tributação ilegal de uma mais-valia (categoria G) obtida com a venda em 2015 de um prédio urbano que, quando foi adquirido em 5 de dezembro de 1988, se encontrava inscrito na matriz como prédio rústico, apenas tendo obtido licença e alvará de construção em junho de 2006, na sequência da sua reclassificação em 2005 como terreno para construção por força de um plano de urbanização. 1ª Indique se o meio processual escolhido por Otelo e Desdémona foi o adequado e, se entender que não, refira qual o que deveria ter sido utilizado. Cotação total de 1,5 valores Tratando-se da alegação de uma ilegalidade concreta da liquidação de IRS, o meio processual adequado para o efeito é a impugnação judicial e não a oposição à execução. Sob a alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT apenas são invocáveis ilegalidades abstratas, ou seja, violações diretas do princípio constitucional da legalidade dos impostos, estando em causa a (i)legalidade do próprio tributo, o que não é o caso, uma vez que em causa está (a invocação de) um vício de violação de lei, concretamente, do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro. 2ª Indique, justificadamente, se Otelo e Desdémona têm razão quando invocam a ilegalidade da liquidação de IRS, levando em consideração que os ganhos com a venda de prédios rústicos não eram sujeitos ao Imposto de Mais-Valias criado pelo Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 373, de 9 de junho de 1965 (Código do Imposto de Mais-Valias). Cotação total de 2,5 valores Em causa está a aplicação da norma transitória constante no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, para cuja aplicação releva a qualidade que o terreno Grelha de correção 1.ª chamada - via académica 3
tinha na data de entrada em vigor do Código do IRS, ou seja, no dia 1 de janeiro de 1989 (cf. artigo 2.º do DL 442-A/88). Uma vez que em 01/01/1989 o imóvel em questão estava classificado como rústico, a situação estava abrangida pela citada norma transitória, sendo a liquidação de IRS ilegal por violação da mesma, uma vez que os ganhos com a venda de prédios rústicos não eram tributáveis em sede de mais-valias no âmbito do Código do Imposto de Mais- Valias, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 373 de 9 de junho de 1965. Caso III Através de um decreto-lei e sem qualquer intervenção prévia habilitante por parte da Assembleia da República, é criada uma taxa de salubridade suína destinada à promoção da segurança alimentar relativamente ao consumo da carne de porco, com ela se pretendendo financiar encargos das entidades públicas competentes com: - a execução dos controlos oficiais no âmbito da segurança alimentar; - a proteção e sanidade dos suínos; - o apoio à prevenção e erradicação das doenças dos porcos; - o apoio à preservação do património genético e incentivo ao desenvolvimento da qualidade da carne de porco. A referida taxa de salubridade suína recai sobre os estabelecimentos comerciais que comercializem carne de porco, que a devem pagar com uma periodicidade anual, considerando-se no preâmbulo do respetivo diploma de criação que tal taxa consubstancia uma contrapartida da garantia de segurança da qualidade alimentar da carne de porco, assim tendo reflexos positivos na fiabilidade dos produtos por eles comercializados. Qualifique o tributo em causa e pronuncie-se quanto à respetiva constitucionalidade orgânica. Cotação total de 3 valores De acordo com o decidido pelo Tribunal Constitucional no acórdão do plenário n.º 539/2015 (processo 27/15) de 20 de outubro de 2015, em causa está uma contribuição Grelha de correção 1.ª chamada - via académica 4
financeira, tributo previsto no artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP desde a revisão constitucional de 1997 (Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro), porque ao contrário das taxas não se dirige à compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que apenas são presumivelmente aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica, em que prestação beneficia um grupo homogéneo ou diferenciável de destinatários, como é o caso, uma vez que os comerciantes de carne de porco beneficiam presumivelmente do investimento feito na salubridade da carne de porco que comercializam, embora não seja possível identificar ou singularizar uma contraprestação efetiva. Embora parte da doutrina (cf. VASQUES, Sérgio As taxas de regulação económica em Portugal: uma introdução. In VASQUES, Sérgio, coord., As taxas de regulação económica. Coimbra: Almedina, 2008, p. 38; no mesmo sentido; VASQUES, Sérgio O Princípio da Equivalência como Critério da Igualdade Tributária, Coimbra: Livraria Almedina, 2008, págs. 240; SILVA, Suzana Tavares da As taxas e a coerência do sistema tributário, 2.ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2013, pág. 22) defenda que até à criação do regime geral previsto no supracitado preceito constitucional [artigo 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP] a criação e definição da disciplina das contribuições se encontra subordinada à reserva de lei integral, o Tribunal Constitucional veio já pronunciar-se em sentido diverso no supramencionado acórdão do Plenário n.º 539/2015, ali se defendendo que a existência do regime geral não é pressuposto necessário da criação das contribuições financeiras, por se entender não ter suporte no texto constitucional que na ausência do mesmo se estenda a competência reservada da Assembleia da República ao ato de aprovação de contribuições financeiras individualizadas por assim se criar, no seu entendimento, uma reserva integral de regime onde ela não existe. Grelha de correção 1.ª chamada - via académica 5