PROVA ESCRITA DE DIREITO E PROCESSO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO (art. 16º nº 4 da Lei 2/2008 de 14/1)

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1 PROVA ESCRITA DE DIREITO E PROCESSO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO (art. 16º nº 4 da Lei 2/2008 de 14/1) 1ª Chamada Grelha de Correcção Nota: As indicações constantes da grelha reflectem as que se afiguram ser as soluções mais correctas para cada uma das questões formuladas. Porém, não deixarão de ser valorizadas outras opções, desde que plausíveis e alicerçadas em fundamentos consistentes. Caso I 1ª Questão Como Daniel requereu a suspensão jurisdicional da eficácia e o requerimento cautelar foi admitido, tendo sido citado o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, é aplicável o regime do artigo 128º do CPTA. Por conseguinte, o Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional estava proibido de dar seguimento à decisão expropriativa, salvo se, mediante resolução fundamentada, reconhecesse, no prazo de 15 dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público. A resolução emitida foi, porém, intempestiva, tendo, por isso, o Ministro violado tal proibição quando lançou o concurso para a adjudicação da empreitada de demolição das construções. (1,5 valores) Perante isso, Daniel deve pedir ao juiz cautelar a declaração de ineficácia do acto de execução indevida, segundo o disposto no nº 4 do artigo 128º do CPTA. (1 valor) 2ª Questão As questões referem-se ao regime dos requisitos de atribuição das providências cautelares, do artigo 120º do CPTA: a) À face da CRP (artigo 268º, nº 4), não existem actos que, por definição, não sejam passíveis de impugnação contenciosa ou de suspensão jurisdicional de eficácia. Por outro lado, os requisitos de atribuição das providências têm de ser aferidos em concreto e não em abstracto. Por outro lado, a previsão legal do carácter urgente das expropriações em causa deve ser compatibilizada com o regime, também legal, de atribuição das providências cautelares, que, concretizando o direito à tutela jurisdicional efectiva (artigo 268º, nº 4, da CRP), impõe que, em concreto, o juiz proceda à ponderação dos interesses em presença. Essa ponderação é, portanto, incumbência constitucional e legalmente conferida ao juiz cautelar, que, ao realizá-la, mais não faz do que exercer a função jurisdicional em sede cautelar. 1

2 Acresce que a declaração de expropriação com carácter urgente tem de ser fundamentada (artigo 15.º, n.º 2, do Código das Expropriações aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro), o que evidencia a possibilidade do seu controlo jurisdicional. A não ser assim, isto é, a pretender-se que os actos expropriativos levados a efeito para a realização do programa em causa estariam subtraídos da possibilidade de intervenção dos tribunais só pelo facto de o diploma legal aplicável considerar que as correspondentes expropriações eram de relevante interesse público e tinham carácter urgente, estaria a permitir-se à Administração violar de modo arbitrário os direitos dos cidadãos atingidos pelas referidas expropriações, em violação do princípio do Estado de direito e do direito à tutela jurisdicional efectiva, consagrados nos artigos 2.º, 3.º, 20.º e 202º da CRP e no artigo 2.º do CPTA (Acórdão do STA de , Proc. Nº 018/08). (1,5 valores) b) O preenchimento dos requisitos de atribuição das providências cautelares tem de ser aferido em concreto, podendo depender do confronto entre múltiplos interesses, tanto públicos, como privados. Por outro lado, o actual regime legal não estabelece uma relação de prioridade pela qual os interesses públicos prevaleçam, por definição, sobre os interesses privados. No plano da ponderação dos interesses, a que se refere o nº 2 do artigo 120º do CPTA, o juiz cautelar deve, por isso, proceder à apreciação relativa dos danos decorrentes, para cada um dos interesses em presença, da atribuição ou recusa da providência cautelar, sendo perfeitamente possível que, em concreto, a providência deva ser concedida por serem superiores os danos que, para interesses privados, decorreriam da sua recusa do que aqueles que, para o interesse público, decorrem da sua atribuição. (1,5 valores) c) Em primeiro lugar, não existem actos discricionários, pois todo o acto administrativo está submetido a vinculações jurídicas, que, mesmo quando a Administração dispõe espaços de valoração próprios do exercício da função administrativa, decorrem, pelo menos, dos princípios consagrados no artigo 266º da CRP. Por outro lado, a suspensão jurisdicional de actos administrativos praticados no exercício de poderes discricionários não envolve qualquer intromissão do Poder Judicial na apreciação do mérito da actuação administrativa, pois uma coisa é a fiscalização a que os tribunais administrativos procedem, no âmbito dos processos declarativos, do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação (artigo 3º, nº 1, do CPTA); e outra bem distinta é a ponderação dos interesses que os tribunais administrativos são chamados a fazer em sede cautelar, que, não prejudicando o juízo sobre o fundo, apenas se dirige a encontrar a mais adequada composição dos interesses em presença, com carácter provisório e instrumental em relação ao processo principal sendo que não há lugar à atribuição de tutela cautelar, por ser manifesta a improcedência da causa principal, na hipótese de o requerente nela não imputar ilegalidades ao acto, mas se limitar a questionar a conveniência ou oportunidade deste. (1,5 valores) Caso II Como o CRSS é um instituto público, a impugnação administrativa que a empresa classificada em segundo lugar decidiu deduzir para o Secretário de Estado da Segurança 2

3 Social não é um recurso hierárquico, mas um recurso tutelar (artigo 177º do CPA). Ora, as impugnações administrativas das decisões relativas à formação dos contratos públicos, como é o caso da empreitada de obras públicas, regem-se pelo disposto no Título VII do Código dos Contratos Públicos (artigos 267º-274º) e, subsidiariamente, pelo disposto no CPA (cfr. artigo 267º nº1, do CCP). E não existindo norma que especialmente preveja o regime do recurso tutelar no CCP, aplica-se a norma do nº 2 do artigo 177º do CPA, segundo a qual, o recurso tutelar só existe nos casos expressamente previstos por lei e tem, salvo disposição em contrário, carácter facultativo. Para a correcção da resposta apenas se exige a referência à regra geral, assim enunciada, bem como às disposições jurídicas indicadas, que a sustentam. (1 valor) Se a possibilidade deste recurso estivesse, portanto, expressamente prevista na lei, a sua utilização teria a relevância processual de suspender o prazo de impugnação contenciosa, que lhe atribui o nº 4 do artigo 59º do CPTA. Se, pelo contrário, a possibilidade deste recurso não estivesse expressamente prevista na lei, não se produziria o efeito previsto no mencionado nº 4 do artigo 59º. (1 valor) Como a decisão impugnada foi adoptada no âmbito do concurso público de adjudicação de um contrato de empreitada de obra pública, a sua impugnação está submetida ao regime do artigo 100º do CPTA. O regime do artigo 59º é aplicável por força da remissão do nº 1 do artigo 100º do CPTA. E não havendo lugar a recurso tutelar, no caso, por falta de expressa previsão legal, já se tinha precludido o prazo de um mês, previsto no artigo 101º do CPTA, quando a acção impugnatória foi proposta. (1 valor) Caso III a) O tributo a incidir sobre a valorização de terrenos beneficiados com a construção de obras públicas é qualificável como «contribuição especial», à face do preceituado no n.º 3 do art. 4.º da Lei Geral Tributária. Os tributos deste tipo têm a natureza de impostos, como é expressamente referido naquela norma, e enquadram-se no conceito constitucional de impostos, pois são prestações coactivas, sem carácter de sanção, exigidas por um ente público com vista à realização de fins públicos e não a contrapartida de uma actividade do Estado ou outro ente público especialmente dirigida ao respectivo obrigado (entre muitos, pode ver-se o acórdão do STA de , recurso n.º 18911, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 491, página 146). A reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República abrange a criação de impostos [arts. 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i, da CRP], pelo que o Governo não podia criar uma contribuição especial por Decreto-Lei, sem prévia autorização legislativa da Assembleia da República [art. 198.º, n.º 1, alíneas a) e b), da CRP]. Por isso, a medida aprovada pelo Governo, ao abrigo da competência atribuída pelo art. 198.º, n.º 1, alínea a), da Constituição era material e organicamente inconstitucional por incompatível com os arts. 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP. Para além disso, a criação do tributo em causa é também materialmente inconstitucional por incidir retroactivamente sobre a valorização de terrenos ocorrida antes da sua criação, o que é incompatível com a proibição de retroactividade da criação de impostos, que consta do art. 103.º, n.º 3, da CRP. (2 valores) 3

4 b) A reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República abrange não só a criação de impostos como o sistema fiscal [art. 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP] e tem-se entendido uniformemente que no seu âmbito se inclui legislar sobre todas as matérias previstas no n.º 2 do art. 103.º da CRP (neste sentido, entre muitos, pode ver-se o acórdão do Tribunal Constitucional de , publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 8.º volume, página 31), entre as quais se inclui a determinação das taxas dos impostos. Por isso, a diminuição das taxas de IRS não podia ser validamente efectuada por diploma legislativo aprovado pelo Governo, sem prévia autorização legislativa. Assim, a medida aprovada pelo Governo, ao abrigo da competência atribuída pelo art. 198.º, n.º 1, alínea a), da Constituição era material e organicamente inconstitucional, por violação dos arts. 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i, da CRP. (2 valores) c) A taxa de justiça corresponde ao conceito constitucional e legal de taxa, pois a distinção entre os conceitos de imposto e de taxa tem por base o carácter unilateral ou bilateral e sinalagmático dos tributos, sendo qualificáveis como impostos os que têm aquela primeira característica e como taxas, os que têm as últimas. A taxa de justiça cobrada nos processos judiciais tem como contrapartida a actividade desenvolvida pelos tribunais nos respectivos processos, assenta na prestação concreta de um serviço público, pelo que é de qualificar com uma verdadeira taxa (art. 4.º, n.º 2, da LGT). Essa relação sinalagmática entre o benefício recebido e a quantia paga não implica uma equivalência económica rigorosa entre ambos, mas não pode ocorrer uma desproporção que, pela sua dimensão, demonstre com clareza que não existe entre aquele benefício e aquela quantia a correspectividade ínsita numa relação sinalagmática (neste sentido, entre muitos, pode ver-se o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 115/2002, de , publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 52.º volume, página 515). Uma redução de 10% da taxa de justiça não afasta a existência de correspectividade. Por isso, não se tratando de matéria reservada à Assembleia da República, a redução imediata, em 10%, da taxa de justiça a cobrar pelos processos judiciais podia ser validamente aprovada pelo Governo, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art. 198.º da Constituição. (2 valores) Caso IV a) António podia defender contenciosamente a sua posição no processo de execução fiscal através de oposição, a apresentar no prazo de 30 dias, a contar da citação, previsto no art. 203.º, n.º 1, alínea a), do CPPT. A oposição tinha enquadramento na alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT na parte em que se refere, como fundamento de oposição, a ilegitimidade da pessoa citada por «não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram», fundamento este que é relevante em matéria de impostos sobre propriedade imobiliária. (1 valor) b) A defesa António através de oposição à execução fiscal teria êxito, apesar de não ter reclamado ou impugnado o acto de liquidação, pois aquela alínea b) do n.º 1 do art. 204.º, na parte referida, prevê uma causa de não exigibilidade do imposto em relação a quem não foi possuidor dos bens que originaram a dívida. (1 valor) 4

5 c) As consequências imediatas do êxito na oposição à execução fiscal seriam a extinção da execução fiscal em relação ao António e o seu prosseguimento em relação ao Bento, na sequência de reversão, que teria de ser efectuada, por força do disposto no art. 158.º, n.º 1, do CPPT. (1 valor) d) A improcedência da oposição teria como consequência imediata o prosseguimento da execução fiscal em relação ao António. (1 valor) 5