USO DE SISTEMAS AGROFLORESTAIS JUNTO À AGRICULTURA FAMILIAR DO NORDESTE PARAENSE COMO FERRAMENTA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO

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Transcrição:

USO DE SISTEMAS AGROFLORESTAIS JUNTO À AGRICULTURA FAMILIAR DO NORDESTE PARAENSE COMO FERRAMENTA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO Antonia Taiara de Souza Reis 1 Luane Laíse Oliveira Ribeiro 1 Daiane Silva Oliveira 2 Francisco Sérgio Neres da Silva 3 Henderson Gonçalves Nobre 4 Resumo Este trabalho tem como objetivo correlacionar o ensino, pesquisa e extensão trabalhados pelo Núcleo de Agricultura Familiar e Agroecologia da Universidade Federal Rural da Amazônia Campus de Capitão Poço (NEA-UFRA/CCP) junto aos agricultores e agricultoras familiares do Nordeste Paraense na microrregião do Guamá, utilizando os sistemas agroflorestais implantados tanto na própria universidade, contemplando a demanda de pesquisas dos estudantes, técnicos e professores, quanto nas unidades produtivas dos agricultores familiares nos municípios de Irituia, Garrafão do Norte e Capitão Poço como ferramenta mediadora deste processo de formação acadêmica, profissional e de troca de experiências entre os atores envolvidos. Neste contexto, o NEA utilizou princípios agroecológicos para minimizar as problemáticas diagnosticadas, levando em consideração os anseios dos agricultores por mudanças para um sistema de produção agrícola mais diversificado e sustentável como também dos estudantes no que tange a sua formação acadêmica e futuro profissional no que diz respeito à indissociabilidade da pesquisa, ensino e extensão. Um grande avanço observado foi o conhecimento adquirido tanto por parte dos estudantes, técnicos, professores e agricultores envolvidos, ao longo do processo de implantação e acompanhamento dos SAFs. Destaca-se ainda os intercâmbios realizados às propriedades dos agricultores que já trabalhavam com SAFs, onde estes foram determinantes para inspirar e dar segurança para os agricultores que tinham a intenção em fazer a mudança de seu sistema produtivo, bem como servirem de sala de estudos, de pesquisa e de extensão. Palavras-chave: agricultura familiar; formação acadêmica; indissociabilidade; metodologias participativas; sistema agroflorestal. Abstract This study aims to correlate the teaching, research and extension worked by the Family Agriculture Center and Agroecology Federal Rural University Campus Captain Well Amazon (NEA-UFRA / CCP) with the family farmers of Pará Northeast in the micro region of Guama using agroforestry systems implemented both at the university, considering the demand of research students, technicians and teachers, and in the production units of family farmers in the municipalities of Irituia, North Garrafão and Captain well as mediating tool of this academic process, professional and exchange of experiences among stakeholders. In this context, the NEA used principles agroecological to minimize the problems diagnosed, taking 1 Estudante de Agronomia 2 Estudante de Engenharia Florestal 3 Engenheiro Agrônomo 4 Docente. Núcleo de Agricultura Familiar e Agroecologia da Universidade Federal Rural da Amazônia, Campus de Capitão Poço/PA. Endereço: Rod. PA 124, KM 0 - Bairro: Vila Nova - Cep: 68650-000; E-mail: neaufracp@gmail.com

into account the wishes of farmers for changes to a more diversified and sustainable agricultural production system as well as the students regarding their academic and professional future in terms about the inseparability of research, teaching and extension. A major breakthrough was observed the knowledge gained by both students, coaches, teachers and farmers involved throughout the implementation and monitoring of the SAF process. Noteworthy is also the exchanges made to the properties of farmers already working with AFS, where they were instrumental to inspire and provide security for farmers who were intent on making a change in your production system, as well as serve as a study room, research and extension. Key words: family farming; academic education; inseparability; participatory methodologies; agroforestry system. Introdução Atualmente uma das maiores dificuldades encontradas pelas universidades públicas é manter a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. O que se tem observado são apenas relações duais, isto é, a presença de duas destas funções básicas como ensino e a pesquisa, no qual preocupa-se muito com a produção técnico-cientifico que muitas vezes acaba não cumprindo com o seu papel social. Por outro lado, quando se trabalha o ensino e extensão, pensa-se mais em aplicar o conhecimento e buscar soluções para as problemáticas sociais, sem ter a preocupação de aprimorar e/ou gerar conhecimento técnicos-científicos. Entretanto, segundo Moita e Andrade (2009) de acordo com a Constituição Brasileira de 1988, é importante que as universidades visem à equidade desses fatores, não podendo ser compartimentados. Essas relações duais geram como consequência o não aproveitamento conjunto desse tripé, onde este seria de extrema importância para o desenvolvimento e aprimoramento de conhecimentos acadêmicos, conciliando conhecimentos teóricos e práticos, fundamentais para a formação dos atores envolvidos neste processo de construção do conhecimento. No ensino superior, com foco especial as ciências agrarias, observa-se uma dificuldade das universidades brasileiras lidarem, nos processos de formação profissional, com outro tipo de educação, voltada para um desenvolvimento integral, que consiste na formação de um profissional que pensa na mudança da sociedade em todos os seus aspectos, sendo eles sociais, econômicos, políticos, culturais e ambientais (CHÔA et al., 2012). Por outro lado, diante da necessidade por sistemas de produção mais sustentáveis e demanda de informações técnicas voltadas para a microrregião do Guama, Nordeste Paraense, a universidade quanto instituição pública desempenha um papel importantíssimo como investigadora e geradora de informações, trazendo os estudantes para dentro da realidade na qual estão inseridos, bem como levando estas informações aos agricultores e construindo com eles modelos de produção sustentáveis, com foco especial ao sistema de produção de base agroecológica. Dentre estes sistemas, tem-se como exemplo os Sistemas Agroflorestais (Safs), o qual vem sendo difundido na região nordeste paraense, mesmo com poucas pesquisas realizadas nesta região. Além disso, há carência de informações, que atenda às necessidades do agricultor, e o déficit de inovações tecnológicas dentro desse sistema, e por sua vez a utilização deste como ferramenta de ensino. A Universidade Federal Rural da Amazônia/ Campus de Capitão Poço - PA através do Núcleo de Estudos Pesquisa e Extensão em Agricultura Familiar e Agroecologia-NEA que foi criado com o intuito de construir ciência e tecnologias adaptadas às necessidades locais da agricultura familiar do nordeste paraense, tem atuado na construção participativa do conhecimento agroecológico junto com agricultores, agentes de ATER, estudantes, professores e pesquisadores. Deste modo, este trabalho tem como objetivo correlacionar o

ensino, pesquisa e extensão trabalhados pelo NEA junto aos agricultores e agricultoras familiares da microrregião do Guama utilizando os sistemas agroflorestais como ferramenta mediadora deste processo de formação acadêmica, profissional e troca de experiências entre os atores envolvidos. Metodologia O NEA através do Grupo de Trabalho de Produção Vegetal (GTPV) vem trabalhando Sistemas Agroflorestais de base agroecológica, que foram implantados tanto na própria universidade contemplando a demanda de pesquisas dos estudantes, técnicos e professores, quanto nas unidades produtivas dos agricultores familiares da região do Nordeste Paraense nos municípios de Irituia, Garrafão do Norte e Capitão Poço, totalizando dez SAFs trabalhados (Figura 1). A implantação destes sistemas, bem como o intercâmbio de experiências em SAFs já consolidados, configuram-se na principal estratégia de integrar o ensino, a pesquisa e extensão, tão necessária para a qualificação técnica e formação humanística dos futuros profissionais que estão por se formar, bem como para dar uma resposta concreta para a consolidação de uma agricultura sustentável na região. Figura 1. Localização geográfica dos sistemas agroflorestais nos municípios de Irituia, Garrafão do Norte e Capitão Poço, estado do Pará. Fez-se a utilização de Diagnóstico Rural Participativo (DRP) proposto por Verdejo (2006) e metodologias participativas como, reuniões, oficina, intercâmbio de experiências e visitas às unidades de produção agroecológica dos agricultores de forma a identificar demandas por conhecimento agroecológico e assim promover o desenvolvimento de técnicas e tecnologias junto aos agricultores, professores, técnicos e estudantes, bem como de

promover a socialização das mesmas, ao inserir uma visão sistêmica com base nos princípios agroecológicos e dos princípios fundamentais da universidade. Resultados e discussão Através do trabalho desenvolvido pelo NEA, tem-se notado mudanças na forma de trabalhar a relação pesquisa, ensino e extensão na UFRA/Capitão Poço, de modo a contribuir para o fortalecimento da indissociabilidade destes três pilares, como observado pelos estudantes que são integrantes do NEA em suas falas a seguir. É super importante né, o trabalho do Núcleo de Agroecologia do NEA daqui de Capitão Poço, principalmente porque ele vem trazer informações pra nós alunos que estamos em formação, vem mostrar pra gente o que na verdade a gente não vê dentro da sala de aula basicamente né porque são informações que ultrapassam o muro da universidade. (Estudante de Agronomia/UFRA Capitão Poço-PA). É uma experiência única né que dentro da universidade eu não teria esse contato se não fosse pelo Núcleo de Agricultura Familiar e Agroecologia que nos permite um contato direto com os agricultores, permite ter essa vivencia de campo que nem sempre a universidade proporciona. (Estudante de Agronomia/UFRA Capitão Poço-PA). Essas mudanças na forma de trabalhar o tripé ensinos/pesquisas/extensões em conjunto têm ocorrido principalmente pelo fato de professores e estudantes com visões críticas, holísticas e sistêmicas buscarem reverter o cenário educacional atual na região nordeste paraense que por sua vez não conseguiam suprir as demandas dos estudantes e agricultores locais. Martins (2012) em seu trabalho sobre estes fundamentos do tripé que rege a universidade aponta a importância de se fazer a distinção entre universidades de ensino (a qual ela chama de centros universitários) e universidades de ensino, pesquisa e extensão, na qual esta segunda é destinada a formação de profissionais críticos que sejam agentes de transformação da realidade, aptos à produção cientifica e tecnológica quanto que a primeira é descrita por esta autora como uma formadora de profissionais e técnicos executores do conhecimento. Para que isso acontecesse, a sensibilidade e percepção da importância de se trabalhar o tripé como um só e não como elemento isolado foi decisivo. Pois, a partir destes dois sentidos foi possível enxergar as falhas e o não cumprimento do princípio fundamental da universidade, a indissociabilidade ensino/pesquisa/extensão, que deve orientar a qualidade da produção universitária. Além da compreensão da ineficácia no que diz respeito à atuação pontual e compartimentalizada da universidade, também deve-se destacar a analise feita a respeito dos problemas ocasionados pelos sistemas de produção convencional no aspecto, social, econômico e ambiental. Pois foi em cima desta analise que se iniciou este trabalho diferenciado tanto no aspecto educacional quanto social. Neste contexto, o NEA utilizou princípios agroecológicas para minimizar ambas as problemáticas, levando em consideração os anseios dos agricultores por mudanças para um sistema de produção agrícola mais diversificado e sustentável, e, os anseios dos estudantes no que tange a sua formação acadêmica e futuro profissional. Dentre as várias atividades desenvolvidas e metodologias trabalhadas pelo NEA, se destaca o processo de construção dos sistemas agroflorestais (SAFs), pois ao priorizar a interdisciplinaridade e indissociabilidade na construção dos SAFs, foi possível que os estudantes trabalhassem com os conhecimentos adquiridos em sala de aula e ao mesmo tempo

utilizavam estes conhecimentos na prática. Corroborando com Neves e Malta (2014), a interdisciplinaridade, contextualização e a experiência dos estudantes, consistiram em fatores determinantes para a melhoria da qualidade em sua formação acadêmica. No decorrer das atividades os estudantes estiveram sempre trabalhando com diferentes áreas do conhecimento que vão desde o planejamento e execução destas atividades até técnicas de manejo dos sistemas de produção. Porém, um diferencial notável nestes estudantes é que além do preparo para lidar com os problemas técnicos, os mesmos têm uma formação humanística, uma vez que se trabalha com pessoas e relações, isto é, apresentam uma maior sensibilidade para perceber as problemáticas no cotidiano. A implantação desses SAFs é de extrema importância para construção de sistemas alternativos de produção nessa região, que valorizem o saber local, que atenda às necessidades de mudança por parte dos agricultores e que proporcione uma maior soberania e segurança alimentar para os produtores e consumidores. Isso pode ser observado na fala abaixo de um agricultor, onde ele expos sua opinião em relação ao SAFs implantado na comunidade do Argola, município de Garrafão do Norte/PA. Eu também estou aqui, porque acredito em tempos melhores. Hoje é o primeiro implantado no município, mais eu tenho certeza que isso vai chegar ao extremo, pra mim isso já era esperado, mais eu nunca tinha visto acontecer, mais acredito que seja mesmo o ponta pé inicial. Nós aprendemos na UFRA que esse é o modelo de transição agroecológica, isso é uma ajuda que nós vamos dar para natureza. Daqui pra frente, novas mudanças, novo sistema, para o nosso bem e do meio ambiente. (Agricultor da Comunidade Nova Olinda - Garrafão do Norte/PA). As diversas experiências construídas nas comunidades que o NEA vem atuando, possibilitaram a mudança da realidade vivida pelos agricultores, pois com esse contato foi possível a construção do conhecimento por meio da adoção de práticas agroecológicas adequando-as de acordo com a realidade da região, visando atender os anseios por mudanças no modo de produção agrícola e consequentemente estreitando as relações sociais entre eles, e com os profissionais e estudantes que estão envolvidos neste processo. A importância dessas relações e aprendizados que o NEA vem proporcionando, podem ser notados nos relatos a seguir dos agricultores do Assentamento Carlos Lamarca, município de Capitão Poço/PA. [...] O que eu ganho é a experiência de tá junto com as pessoas, porque antes ninguém tinha essa experiência de trabalhar com eles, ninguém tinha esse conhecimento e hoje o conhecimento pra mim vale muita coisa [...] (Assentado do Carlos Lamarca-Capitão Poço/PA). [...] Ganha amizade, ganha confiança né, e ganha mais o aprendizado porque as vezes a gente faz de um jeito que a gente ver que não tá indo bem, mais aí já chega outro e: oia a gente faz assim. E já com essa troca de experiência foi muito bom mesmo com vocês porque nós já sabe o tipo de adubo [...] (Assentada no Carlos Lamarca-Capitão Poço/PA). Como podemos observar nas falas dos agricultores, a universidade tem papel fundamental no processo de transição do modo de produção convencional para o agroecológico. Vale ressaltar que essa transição foi possível mediante o levantamento de

informações técnicas sobre modelos e práticas de produção alternativa adaptando-as conforme as necessidades dos agricultores (as) e a realidade na qual os mesmos estão inseridos, e principalmente, considerando as experiências práticas de estudantes, professores e técnicos. Contudo, o processo de construção dos SAFs não deixou de considerar os conhecimentos provindos tradicionalmente de geração em geração pelos agricultores, tornando os SAFs uma ferramenta de aprendizagem e troca de conhecimentos entre estudantes e agricultores, e proporcionando a geração de novas técnicas de produção mais eficientes e sustentáveis e com isso, abrindo o caminho para os mais diversos tipos de pesquisas em diferentes áreas do conhecimento, e caminhando para consolidação e viabilidade desta tecnologia, não somente no meio cientifico, mas também dando um retorno a sociedade. Os SAFs foram planejados para servirem de referência para a comunidade onde este se insere e também como ferramenta de ensino, pesquisa e extensão, isto é, uma sala de aula em campo onde estudantes, técnicos, agricultores e docentes possam desenvolver trabalhos e experimentação, pesquisas e inovação para contribuir na construção e geração de conhecimento sobre este sistema e socializar os resultados com os principais interessados, os agricultores (as) e instituições que trabalham nesta temática. Vale ressaltar que a elaboração dos mesmos foi realizada levando em consideração as características de cada local, seus objetivos e os interesses dos agricultores (as). Deste modo cada SAF implantado possui suas peculiaridades como as destacadas, no quadro abaixo. Quadro 1: Características dos SAFs implantados. Localização da implantação/comunidade Unidade Demonstrativa (UD) UFRA/CCP Osmarino- Argola/Garrafão do Norte/PA José Nilton- Jericó/Garrafão do Norte/PA. Francisco Araújo- Livramento/ Garrafão do Norte/PA. Maria Neres (Dona Mazé)- Assentamento Carlos Lamarca/Capitão Poço/PA. Francisco Dias- Tauari/ Garrafão do Norte/PA. Francisco Santos (Sr. Diney)- Galiléia/ Garrafão do Norte/PA. Benedito Clarindo- Assentamento Carlos Lamarca/Capitão Poço/PA. Pedro - Assentamento Carlos Lamarca/Capitão Poço. Fernando Cooperativa de Irituia/PA. Quantidade de espécies trabalhadas nos SAFs Área total (m 2 ) Culturas carrochefe 38 2916m 2 Açaí, Cupuaçu, Banana 15 3025m 2 Açaí, Cupuaçu 19 3025m 2 Açaí, Cupuaçu, Pimenta-do-reino 12 2500m 2 Açaí, Cupuaçu Pimenta-do-reino. 15 5600m 2 Açaí, Cupuaçu 11 3025m 2 Açaí e Pimenta-do- Reino 23 2526m 2 Açaí e Cupuaçu 20 3025m 2 Açaí, Cupuaçu e Urucum 20 3025m 2 Açaí, Cupuaçu 9 3023m² Laranja, Açaí

Como analisado no quadro 1, os SAFs foram implantados em diferentes localidades, com tamanho de área oscilando entre 2500 m 2 a 5600 m², servindo de área demonstrativa para que outros agricultores possam observar a funcionalidade dos SAFs e assim utilizá-los como base para a criação e desenvolvimento desse sistema em suas propriedades. Outra característica desses SAFs é a grande variedade de espécies que compõem os arranjos, sendo estes diferentes entre si, no qual as principais culturas escolhidas pelos agricultores foram o Açaí e o Cupuaçu que são espécies nativas da região, e que possuem importância econômica e cultural. Com vista no bom desenvolvimento dos SAFs o manejo constitui-se como fator preponderante para a manutenção do sistema. Pode-se destacar que a mão de obra utilizada no manejo do SAF na UFRA é feita de forma coletiva entre os integrantes do NEA enquanto que nas propriedades dos agricultores (as) esta é predominantemente familiar. É importante salientar que a prática de trabalhos coletivos vem sendo estimulada tanto entre agricultores quanto entre os próprios estudantes no decorrer do desenvolvimento dos SAFs tornando aptos a trabalharem em grupos e com profissionais de diferentes áreas do conhecimento, exercitando e instigando práticas cooperativistas e associativistas. Os trabalhos coletivos foram de fundamental importância para a realização das implantações e manutenção dos SAFs, uma vez que contribuíram para o compartilhamento de saberes e aprendizagem proporcionando a formação dos atores envolvidos por meio das práticas vivenciadas, fortalecendo assim o trabalho em conjunto de forma a facilitar o desenvolvimento das atividades no campo. Estas atividades realizadas de forma coletiva nos sistemas agroflorestais podem ser observadas nas imagens abaixo. Figura 2 - Implantação do SAF em Garrafão do Norte- PA. Fonte: NEA/UFRA CCP Figura 3 - Implantação do SAF em Garrafão do Norte-PA. Fonte: NEA/UFRA CCP Os sistemas agroflorestais constituem importantes espaços de construção do conhecimento para os atores envolvidos. Estes já são frutos da construção coletiva e participativa, que preza pelo diálogo e troca de experiências, e respeito a todos os tipos de saberes. Conforme Carneiro et al. (2013), o trabalho através do dialogo e o respeito aos diferentes tipos de saberes como forma de conhecimento são tão complexas quanto a mais avançada das chamadas ciências, reforçando a importância de se respeitar todo e qualquer tipo de conhecimento para o crescimento de todos os agentes envolvidos na construção e transformação do conhecimento. Considerações finais Um grande avanço observado foi o conhecimento adquirido tanto por parte dos estudantes, técnicos, professores e agricultores envolvidos, ao longo do processo de implantação e acompanhamento dos SAFs. Destaca-se ainda os intercâmbios realizados às

propriedades dos agricultores que já trabalhavam com SAFs, onde estes foram determinantes para inspirar e dar segurança para os agricultores que tinham a intenção em fazer a mudança de seu sistema produtivo, bem como servirem de sala de estudos, de pesquisa e de extensão. Atualmente, existem dez unidades demonstrativas de SAFs implantados. A implantação de sistemas de produção agroecológicos nesses locais trouxe para essa região novas perspectivas tanto para a academia que tem a oportunidade de trabalhar dentro desses sistemas o ensino, pesquisa e extensão quanto para os agricultores proporcionando o desenvolvimento sustentável local e a melhoria na qualidade de vida do agricultor, trabalhando a diversidade desse sistema e a relação de comunicação e troca de informações entre a academia e o agricultor. Os Sistemas Agroflorestais são preponderantes para o desenvolvimento conjunto dos três eixos (ensino/pesquisa/extensão), uma vez que estes são fundamentais para desenvolvimento de praticas relacionadas aos conhecimentos internos e externos a universidade, ou seja, proporcionar e levar os saberes adquiridos de forma a estender o mesmo para outros meios que venham a contribuir também com a geração de saberes e experiências. Agradecimentos Agradecemos ao CNPq/MDA e MEC/PROEXT pelo apoio financeiro, e a todos os agricultores familiares e organizações sociais da região por participarem deste processo de construção do conhecimento agroecológico. Referências bibliográficas CARNEIRO, M.; CERQUEIRA, V.; PORTELA, L. Mutirão de Agricultura Ecológica (MÃE/UFF): A Extensão e a Prática Agroecológica na Universidade. Resumos do VIII Congresso Brasileiro de Agroecologia. Porto Alegre. 2013. CHÔA, F. L.; OLIVEIRA, A. L. A. de; PEREIRA, R. M.; RIBEIRO, L. F. C.; ROBOREDO, D. Extensão universitária nos assentamentos Jacaminho e Igarapé do Bruno: novos saberes e implementação de SAF s e construções alternativas na Amazônia Meridional. Revista Conexão UEPG. p.284-299. v.8, n.2, 2012. MARTINS, L. M. Ensino-pesquisa-extensão como fundamento metodológico da construção do conhecimento na universidade. São Paulo: Unesp, 2012. Disponível em: <http://www.umcpos.com.br/centraldoaluno/arquivos/07_03_2014_218/2_- ensino_pesquisa_extensao.pdf>. Acesso em 08 de junho 2016. MOITA, F. M. G. S. C.; ANDRADE, F. C. B. de. Ensino-pesquisa-extensão: um exercício de indissociabilidade na pós-graduação. Revista Brasileira de Educação v. 14 n. 41 maio/ago. 2009. NEVES, D. S.; MALTA, S. C. L. Ensino, pesquisa e extensão: existem dificuldades docentes no ensino superior para esta integração? Form@re. Revista do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica. Universidade Federal do Piauí, Teresina, v. 2, n. 1, p. 2-12, jan. / jun. 2014. VERDEJO, M. E. Diagnóstico Rural Participativo: Um guia prático. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário / Secretaria de Agricultura Familiar, 2006.