REGISTRO DE MUDANÇAS AMBIENTAIS PLEISTOCÊNICAS E HOLOCÊNICAS EM CABECEIRA DE VALE DO PLANALTO NORTE CATARINENSE: MUNICÍPIO DE CAMPO ALEGRE.

Documentos relacionados
OLIVEIRA, M. A. T. 1 LIMA, G. L. 1 BEHLING, H. 2. PESSENDA, L. C. R. 3 FERREIRA, G. M. S. S. 1 DUZZIONI, R.

CARACTERIZAÇÃO DE DEPÓSITOS ALUVIAIS QUATERNÁRIOS, LOCALIDADE DE CERRO DO TOURO, CAMPO ALEGRE-SC. Depto. Geociências, UFSC

Palavras-Chave: Cabeceira de Vale Depósitos Quaternários Eixo Temático: Análise e Diagnóstico de Processos Erosivos

CARACTERIZAÇÃO ESTRATIGRÁFICA DE CABECEIRA DE DRENAGEM LOCALIZADA NO PLANALTO DAS ARAUCÁRIAS SUL DO BRASIL

APLICAÇÃO DA MICROMORFOLOGIA DE SOLOS A ANÁLISE DE SEDIMENTOS RECENTES

APLICAÇÃO DA MICROMORFOLOGIA DE SOLOS AO ESTUDO DE SEDIMENTOS QUATERNARIOS EM CABECEIRAS DE VALE OLIVEIRA, M. A. T. 2 LIMA, G. L.

45 mm. Marcelo Accioly Teixeira de Oliveira 1 ; Gisele Leite de Lima 2 ; Vivian Jeske-Pieruschka 3.

APLICAÇÃO DO DIAGRAMA TEXTURAL DE FLEMMING À ANÁLISE GRANULOMÉTRICA DE SEDIMENTOS QUARTERNÁRIOS

Análise fitolítica e palinologia: vegetação e clima na costa norte do Espírito Santo, Brasil

CONSIDERAÇÕES SOBRE IDADES LOE DE DEPÓSITOS COLUVIAIS E ALÚVIO- COLUVIAIS DA REGIÃO DO MÉDIO VALE DO RIO PARAÍBA DO SUL (SP/RJ)

Definição. Unidade Territorial com características naturais bem. Por essa razão, muitas vezes o termo é usado

FSP Avaré 1º semestre 2013 Prof. Fabio Tonin MECÂNICA DOS SOLOS

Caracterização da Ecorregião do Planalto Central

Figura 07: Arenito Fluvial na baixa vertente formando lajeado Fonte: Corrêa, L. da S. L. trabalho de campo dia

FORMAÇÃO DE CANAIS POR COALESCÊNCIA DE LAGOAS: UMA HIPÓTESE PARA A REDE DE DRENAGEM DA REGIÃO DE QUERÊNCIA DO NORTE, PR

PALAVRAS-CHAVE: paleoambiente; Quaternário; alúvio-colúvio

Difratometria por raios X

COMPARAÇÃO DE TÉCNICAS DE DISPERSÃO DE MATÉRIA ORGÂNICA EM SEDIMENTOS TURFOSOS PARA ANÁLISES GRANULOMÉTRICAS.

UNIDADES DE RELEVO DA BACIA DO RIO PEQUENO, ANTONINA/PR: MAPEAMENTO PRELIMINAR

AULÃO UDESC 2013 GEOGRAFIA DE SANTA CATARINA PROF. ANDRÉ TOMASINI Aula: Aspectos físicos.

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Nº 504

GEOGRAFIA DO BRASIL Relevo e Solo

RECONSTITUIÇÃO PALEOAMBIENTAL UTILIZANDO ISÓTOPOS ESTÁVEIS DO C E N E FITÓLITOS EM TURFEIRA NA REGIÃO DE CAMPO MOURÃO/PR BRASIL

MUDANÇAS DA VEGETAÇÃO NA ILHA DE MARAJÓ DURANTE O HOLOCENO SUPERIOR

Geomorfologia Aplicada

ANÁLISE DE LIMIARES E PROCESSOS DE GERAÇÃO DE ESCOAMENTO SUPERFICIAL EM UMA ENCOSTA DA LAGOA DO PERI-SC

FORMAÇÃO DO SOLO 13/04/2018. (Gênese do solo) FATORES DE FORMAÇÃO DO SOLO FATORES DE FORMAÇÃO DO SOLO BIBLIOGRAFIA OBRIGATÓRIA GÊNESE DO SOLO

Se formam a partir de materiais praticamente inertes, extremamente resistentes ao intemperismo (areias de quartzo);

AREA DE ESTUDllO. Fig. i- hreo de estudio. I c

Solo. Solo=f (rocha matriz, clima, relevo, biosfera e tempo)

EVOLUÇÃO DE PALEOVALE DE SEGUNDA ORDEM HIERARQUICA NO PLANALTO DAS ARAUCÁRIAS - SUPERFÍCIE II - NOS 41 Ka AP (SUL DO BRASIL)

A SEQÜÊNCIA HOLOCÊNICA DA PLATAFORMA CONTINENTAL CENTRAL DO ESTADO DA BAHIA (COSTA DO CACAU)

Geologia e relevo. Bases geológicas e Classificação do relevo

Fatores de Formação do Solo. Unidade III - Fatores de Formação do Solo

45 mm PALEOQUEIMADAS NO HOLOCENO DA REGIÃO DE CABO FRIO, RJ

Caracterização granulométrica e estratigráfica de depósito de encosta no vale do rio Bananas, Guarapuava (PR)

ESTUDO DA MORFODINÂMICA DA MICROBACIA DO CÓRREGO DO CHAFARIZ NA ÁREA URBANA DE ALFENAS- MG: PROPOSTA DE RECUPERAÇÃO

GEOMORFOLOGIA DO QUATERNÁRIO

BRASIL: RELEVO, HIDROGRAFIA E LITORAL

BRASIL: RELEVO, HIDROGRAFIA E LITORAL

DADOS PALINOLÓGICOS CARACTERIZAM PALEOAMBIENTE TROPICAL NOS CAMPOS GERAIS NO HOLOCENO TARDIO

GEOGRAFIA. Prof. Daniel San.

ESTRATIGRAFIA DE DEPÓSITOS DE TURFEIRA, NA LOCALIDADE DO CAMPO DO CIAMA, PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO TABULEIRO SC

Clima(s) CLIMAS - SOLOS E AGRICULTURA TROPICAL. Mestrado em Direito à Alimentação e Desenvolvimento Rural UC: Agricultura Tropical.

CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DO LOCAL - GEOMORFOLOGIA

Lição 13 Processos e Fatores de Formação do Solo

1º. ProjESimpósio de setembro 2013 RNV Linhares, ES

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS GEOMORFOLOGIA E FOTOGEOLOGIA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOLOGIA E GEOQUÍMICA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

DINÂMICA DA VEGETAÇÃO DA REGIÃO DE HUMAITÁ-AM DURANTE O PLEISTOCENO TARDIO E O HOLOCENO

7. o ANO FUNDAMENTAL. Prof. a Andreza Xavier Prof. o Walace Vinente

GEOLOGIA COSTEIRA DA ILHA DE SÃO FRANCISCO DO SUL/SC COASTAL GEOLOGY OF THE SÃO FRANCISCO DO SUL/SC ISLAND.

Formação do Solo. Luciane Costa de Oliveira

Dinâmica externa: atividade da água superficial

ANEXO 1 GLOSSÁRIO. Vegetação de Restinga

Geomorfologia Aplicada

Projeto de doutorado

Docente: Profa. Dra. Angela Laufer Rech Turma: 4 período 2 Semestre 2017

Geotécnica Ambiental. Aula 2: Revisão sobre solos

Material de apoio. Origem e Constituição. Origem e Constituição. Curso básico de mecânica dos solos (Carlos Souza Pinto, Oficina de Textos, 2006);

Formação dos Solos. Fundação Carmelitana Mário Palmério - FUCAMP Curso de Bacharelado em Engenharia Civil. Disciplina: Geologia Básica de Engenharia

DISCIPLINA: GEOMORFOLOGIA ESCULTURAL E APLICADA - GB 060. PROF. DR. LEONARDO JOSÉ CORDEIRO SANTOS

01 Q76543 Geografia Geografia Física. 02 Q76544 Geografia Geografia Física. a) o horizonte de acumulação e o horizonte orgânico;

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO ENGENHARIA CIVIL GEOTÉCNICA /2. Marita Raquel Paris Cavassani Curbani

Marcelo Accioly Teixeira de OLIVEIRA 1 & Gisele Leite de LIMA 2 INTRODUÇÃO

Solos e suas várias importâncias

Grandes Ecossistemas do Brasil

Data: /08/2014 Bimestre: 2. Nome: 6 ANO B Nº. Disciplina: Geografia Professor: Geraldo

Figura 1 Altimetria média de Minas Gerais. (Autor: Carlos Wagner G A Coelho)

CARACTERIZAÇÃO PEDOESTRATIGRÁFICA DE DEPÓSITOS DE ENCOSTA E DE VALE, LOCALIDADE DE CERRO DO TOURO, CAMPO ALEGRE, ESTADO DE SANTA CATARINA

Capítulo 3 Morfologia de uma bacia de drenagem. Introdução a Hidrologia de Florestas

CARACTERIZAÇÃO FÍSICA DE CROSTAS EM SUPERFÍCIES DE SOLOS DEGRADADOS EM MANAUS (AM): UMA ABORDAGEM PRELIMINAR.


CARACTERIZAÇÃO DE PERFIS TRANSVERSAIS NO SEGMENTO ENTRE A VOLTA DO ANGICAL À CONFLUÊNCIA COM O SEPOTUBA, NO RIO PARAGUAI MATO GROSSO

Geologia e conservação de solos. Luiz José Cruz Bezerra

PROGRAMA DA DISCIPLINA

DEPÓSITOS QUATERNÁRIOS DE PLANÍCIE DE INUNDAÇÃO NO CURSO MÉDIO DO RIO PARDO, CANDELÁRIA, RIO GRANDE DO SUL

ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS VOÇOROCAS DA SERRA DA FORTALEZA EM CAMPOS GERAIS, SUL DE MINAS GERAIS

Gelo e Mudanças. Aluna: Luciane Sato

(capaz de gerar escoamento)

RELATÓRIO DE CAMPO - GEOMORFOLOGIA II

para transporte de sedimentos fazendo uma simulação numérica 3D para processos deposicionais nos ambientes de plataforma, taludes e bacias

Estudos Ambientais. Solos CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ - CEAP

A Formação do Solo. Nuno Cortez. Seminário LIPOR 4 Novembro Solo: Um recurso a preservar.

EVOLUÇÃO DOS SOLOS NOS TERRAÇOS MARINHOS DA PLANÍCIE COSTEIRA DE BERTIOGA-SP *

Recursos Hídricos e Manejo de Bacias Hidrográficas Profa. Cristiana C. Miranda RECORDANDO NOSSA AULA DE INFILTRAÇÃO..

CARACTERÍSTICAS DOS RESERVATÓRIOS

GEOLOGIA E GEOMORFOLOGIA: AGENTES EXTERNOS MÓDULO 07

Geografia. Os Biomas Brasileiros. Professor Thomás Teixeira.

Geologia e Geomorfologia na Gestão Ambiental. Aula 4. Organização da Aula. Intemperismo e Formação dos Solos. Contextualização.

45 mm EVIDÊNCIAS PALINOLÓGICAS DAS VARIAÇÕES PRETÉRITAS DA VEGETAÇÃO E DO CLIMA NA SERRA DO ESPINHAÇO MERIDIONAL, MINAS GERAIS, BRASIL

Iane Barroncas Gomes Engenheira Florestal Mestre em Ciências de Florestas Tropicais Professora Assistente CESIT - UEA. Gênese e Morfologia do Solo

2 Área de Estudo Meio Físico Localização e características gerais

BANCO DE QUESTÕES - GEOGRAFIA - 7º ANO - ENSINO FUNDAMENTAL

MANEJO E INDICADORES DA QUALIDADE. Professores: ELIANE GUIMARÃES PEREIRA MELLONI ROGÉRIO MELLONI

Formas de relevo. Professora: Jordana Costa

MICROMORFOLOGIA DE FLUXOS DE LAMA SUBAÉREOS QUATERNÁRIOS NO PLANALTO DAS ARAUCÁRIAS - SUL DO BRASIL

Variação espaço-temporal do transporte de sedimentos do Rio Santo Anastácio, Oeste Paulista

Transcrição:

REGISTRO DE MUDANÇAS AMBIENTAIS PLEISTOCÊNICAS E HOLOCÊNICAS EM CABECEIRA DE VALE DO PLANALTO NORTE CATARINENSE: MUNICÍPIO DE CAMPO ALEGRE. Marcelo Accioly Teixeira de Oliveira 1 ; Hermann Behling 2 ; Luiz Carlos Ruiz Pessenda 3 ; Gisele Leite de Lima 1 ; Glaucia Maria dos Santos Silva Ferreira 1 ; William de Oliveira Sant Ana 1 ; 1 Depto. de Geociências, UFSC (maroliv@cfh.ufsc.br); 2 Depto. de Geociências, Universidade de Bremen (Alemanha); 3 Lab. 14 C, CENA (Piracicaba) Abstract. Low resolution of continental sedimentary record is a common source of skepticism about the application of geomorphology and sedimentology to Quaternary studies. However, when supported by independent proxy data, geomorphology and sedimentology may favor palaeohydrological interpretation. This paper presents results obtained from a valley head site in southern Brazilian highlands, under mild subtropical climate. Results point to environmental changes, which ages coincide to Marine Isotopic Stages (MIS) 5b; 3 and 1. In spite of temperatures and precipitation lower then today during the late Pleistocene, the study valley head seem to have sustained a local wetter environment, feeding shallow soil-water saturated zones and contributing to hillslope erosion and sedimentation whatever the sign of the climatic change. Inner organization of holocenic slope wash deposits suggests a mid Holocene climate drier then today, under the influence of seasonally contrasted precipitation regimes. The predominance of overland flow-related sedimentary deposits suggests that an excess of precipitation over evaporation had influenced the local palaeohydrology. This palaeohydrological condition seems recurrent and also explains alternated periods of pedogenesis and sedimentation. Palavras-chave: Geomorfologia, Cabeceiras de Vale, Paleoidrologia. 1. Introdução O estudo de cabeceiras de vale, explicitado na década de 90, deu ênfase a unidades do relevo nas quais mecanismos de produção e de preservação de sedimentos tenderiam a ser recorrentes ao longo do tempo (Dietrich and Dunne 1993). Estudos de geomorfologia do Quaternário que enfatizavam a investigação de áreas de cabeceira de vale, no entanto, já vinham sendo conduzidos no Brasil desde a década de 70 (Meis and Machado 1978). Apesar de serem muito comuns no Brasil tropical e subtropical, coberturas coluviais são consideradas com ceticismo quando utilizadas como indicadores paleoambientais (Thomas et al. 2001). Neste trabalho apresentamos estudo sobre coberturas alúvio-coluviais em cabeceiras de vale. Resultados geomorfológicos, sedimentológicos, palinológicos, isotópicos e micromorfológicos são associados, de modo a favorecer interpretação paleoambiental. A área do estudo se situa em torno da localidade de Cerro do Touro, no município de Campo Alegre (SC). O município está situado no Planalto de São Bento do Sul, caracterizado por relevo de colinas desenvolvido sobre patamares estruturais que apresentam morfologia de cuesta na periferia do planalto. O substrato é formado por rochas Neo- Proterozóicas da bacia vulcano-sedimentar de Campo Alegre. Altitudes variam de 850 a

1.046 metros e o clima é mesotérmico, com verões relativamente frescos (tipo Cfb de Köppen). A temperatura média anual é de 16,4 C e as precipitações oscilam entre 1.600 e 1.800 mm. A vegetação tropical e subtropical coexiste na área, formando a Floresta Ombrófila Mista. Campos de Altitude são comuns, com matas galeria nos vales e depressões topográficas. 2. Métodos e Técnicas Este trabalho apresenta resultados de uma das seqüências deposicionais estudadas na área. A seqüência foi descrita através de nivelamento e projeção sobre papel milimetrado. Características das unidades como cor, espessura, textura, estrutura e teor de cascalho, foram descritas. Amostras foram coletadas para análises variadas. A análise granulométrica foi realizada no Laboratório de Pedologia do Depto. de Geociências da U.F.S.C., segundo procedimento padrão. A micromorfologia foi efetuada através da análise de lâminas delgadas no Laboratório de Petrografia do Depto. de Geociências da U.F.S.C., segundo Bullock et al. (1985). Imagens das lâminas delgadas foram obtidas através de scanner de slides CanoScan 2710. A palinologia foi efetuada através de descrição morfológica no Depto. de Geociências da Universidade de Bremen, Alemanha (Behling 1993). O carbono do solo (carbono orgânico total e 13 C) foi estimado no Laboratório de 14 C, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA, Piracicaba), sendo o 13 C expresso através da notação convencional ( ): δ 13 C ( ) = [(R amostra /R padrão ) - 1]. 1000, onde: R amostra e R padrão correspondem, respectivamente ao quociente 12 C/ 13 C da amostra e do padrão. Datações 14 C foram efetuadas no Laboratório 14 C (CENA, Piracicaba) e no Instituto de Física da Universidade Erlangen-Nürnberg (Alemanha). Datações TL e LOE foram realizadas no Laboratório de Vidros e Datações (FATECSP). 3. Resultados A Figura 1 ilustra seqüência pedoestratigráfica, exposta no interior de mina de argila no município de Campo Alegre. Camadas alúvio-coluviais se intercalam com horizontes de solo. Figura 1: seqüência deposicional no interior de mina de argila. 1- turfa enterrada (unidade 1); 2- paleossolo truncado por erosão (unidade 4). A síntese da seqüência e das principais características das unidades investigadas é apresentada através de seção colunar esquemática, representando a espessura máxima das unidades (Figura 2). As principais camadas enumeradas são: 1 colúvio, composto por lentes sub-paralelas de cascalho intemperizado; 2 turfa pleistocênica soterrada; 3 colúvio maciço hidromorfizado; 4 paleo-horizonte A truncado e soterrado; 5 cascalho lamoso, com clastos intemperizados; 6 alúvio-colúvio finamente estratificado, com lentes grossas (cascalho e areia) e lamosas (silte e argila). Estas seis unidades formam duas seqüências distintas: Seqüência Inferior (unidades 1, 2, 3 e 4) e Seqüência Superior (unidades 5 e 6).

Figura 2: sessão colunar da seqüência deposicional estudada. 1, 2 etc.: principais camadas identificadas. 3.1 Idades obtidas para seqüência deposicional As idades obtidas, o método utilizado e características das unidades são as que seguem: - 90.000 ± 11,000 A.P. (TL): unidade 1: lentes de cascalho basal; - > 50.000 A.P. ( 14 C): unidade 2: base da turfa enterrada; - 49.300 + 9.700 4.250 A.P. ( 14 C): unidade 2: topo da turfa enterrada; - 6.625 ± 750 A.P. (LOE): depósito de areia na transição entre a unidade 4 e a unidade 5. Seguem, abaixo, resultados detalhados da Seqüência Inferior e da Seqüência Superior. 3.2 Seqüência inferior: geogênese, pedogênese e hidromorfia no Pleistoceno Superior Segundo a cronologia estabelecida, a cabeceira estudada preserva depósitos minerais que datam do início da última glaciação (unidade 1). Solos orgânicos (turfas) se desenvolveram durante período equivalente, ou anterior, ao interestádio do Estágio Marinho Isotópico 3 (unidade 2). Amostras da unidade 2 foram coletadas para análise polínica e para análise do carbono orgânico do solo. A Figura 3 (ver ao final do texto) ilustra diagrama sumário do percentual de polens ao longo da unidade. O dendograma da análise de agrupamento divide a unidade 2 em duas zonas polínicas: zona I (mais antiga) e zona II (mais recente). O diagrama do percentual de polens (Figura 4, ver ao final do texto) ilustra a distribuição de espécies ao longo das duas zonas polínicas. O período mais antigo (zona polínica I) foi ligeiramente mais quente e seco do que o período mais recente (zona polínica II), como sugerido pela presença mais importante de Podocarpus e pela raridade de Weinmannia na zona polínica II. De fato, Podocarpus necessita de ambiente suficientemente úmido, enquanto Weinmannia tem pouca tolerância ao frio. O diagrama polínico sugere, portanto, período mais antigo, sob clima mais seco e quente (zona I), sucedido por período mais frio e úmido (zona II). A análise do carbono do solo da unidade 2 sugere o predomínio de espécies arbóreas ao longo de toda a unidade (Figura 5). Este resultado é contraditório com o predomínio de Campos, sugerido pelos diagramas polínicos das Figuras 3 e 4 (ver ao final do texto ). A contradição aparente entre os resultados da análise polínica e os da análise do δ 13 C seria resolvida pela postulação de domínio de transição entre a vegetação de campos nos interflúvios e as matas galerias nos vales. Esta transição da vegetação refletiria, portanto, o padrão hidrológico típico de cabeceiras de vale: domínio de transição entre encostas e canais fluviais.

A unidade 4 foi coberta por aproximadamente 3 metros de depósito alúviocoluvial (unidades 5 e 6) (ver Figura 2). O conjunto do depósito sugere acumulação em leque aluvial. Estruturas sedimentares de detalhe foram analisadas através de lâminas delgadas. A Figura 6 ilustra a transição entre o solo erodido da unidade 4 e a unidade sobrejacente. Figura 5: distribuição do percentual de C e do índice δ 13 C ao longo da unidade 2. As amostras entre 194 cm e 211cm pertencem à unidade 4. Valores de δ 13 C entre 30 e 22 indicam plantas do tipo C 3 (árvores). Valores entre 17 e 9 indicam plantas do tipo C 4 (gramíneas). A Seqüência Inferior da cabeceira de vale estudada é caracterizada pela alternância de períodos de erosão e sedimentação e períodos de pedogênese em ambiente hidromórfico, sugerindo nível elevado do lençol freático. Estas condições paleoidrológicas teriam prevalecido durante o desenvolvimento do perfil estudado. O diagrama polínico da unidade 2 sugere passagem entre período mais quente e seco, na base, para período mais frio e úmido, no topo. Os diagramas de carbono do solo, além de indicar ambiente local úmido para suporte de árvores, sugerem diminuição do percentual de carbono da base para o topo do perfil, indicando diminuição da produção de biomassa associada ao provável resfriamento. 3.3 Seqüência Superior: erosão e degradação ambiental durante o Holoceno Médio A Seqüência Superior do depósito inicia com o truncamento da unidade 4. Datação de areias ao longo da descontinuidade erosiva sugere erosão da unidade no Holoceno Médio. Figura 6: contato erosivo (em branco) entre as unidades 4 e 5. Notar lâminas de tração (em amarelo). A descrição micromorfológica desta transição sugere: a) tração sobre o horizonte enterrado; b) preenchimento de fissuras por pedorelíqueas; c) material carbonizado no interior de pedotúbulos (Sant Ana 2005). Descrição micromorfológica de amostra da unidade 5 indica importante desenvolvimento de cutãs iluviais, sobretudo nas unidades lamosas do depósito (Oliveira and Ferreira, 2004). Em geral, predominam variações texturais similares às que podem ser verificadas em depósitos atuais de fluxos de chuva. A Figura 7 ilustra o padrão verificado em lâminas delgadas obtidas de amostra da unidade 5 e de amostra de depósito de chuva atual no piso da mina estudada. As estruturas preservadas na seqüência superior sugerem: a) degradação ambiental no Holoceno Médio; b) retração da vegetação e incêndios eventuais; c) topografia exposta à erosão por escoamento superficial difuso.

Figura 7: estruturas visíveis em lâminas delgadas de depósito holocênico (A) e em depósito de fluxo de chuva atual (B) na área de estudo. 4. Conclusões Os resultados obtidos confirmam o potencial do estudo de cabeceiras de vale para a identificação de depósitos representativos. Os depósitos da Seqüência Inferior sugerem temperaturas e precipitações menores do que as atuais associadas à manutenção de ambiente local relativamente úmido no final do Pleistoceno. Depósitos da Seqüência Superior sugerem fluxos de chuva sob regime contrastado de precipitação sazonal durante o Holoceno Médio. O predomínio de registro sedimentar relacionado com processos de escoamento superficial sugere paleoidrologia local caracterizada por relativo excesso de precipitação sobre taxas de evapo-transpiração. Este regime paleoidrológico explica ainda a alternância ente períodos de pedogênese e de morfogênese na área do estudo. 5. Referências BULLOCK P, FEDOROFF N, JONGERIUS A, STOOPS G e TURSINA T. 1985. Handbook of soil thin section description. Waine Research, Albrington, United Kindon, 152 p. DIETRICH, W.E.; DUNNE, T. 1993. The channel head. In: BEVEN, K. e KIRKBY, M.J. (Eds.), Channel Network Hydrology, John Willey and Sons Ltd, p. 175-219. MEIS, M.R.M., MACHADO, M.B. 1978. A morfologia de rampas e terraços do médio Vale do rio Doce. Finisterra 13 (26): 201-218. THOMAS, M.F., NOTT, J., PRICE, D.M. 2001. Late Quaternary sedimentation in the humid tropics: a review with new data from NE Queensland, Australia. Geomorphology 39: 53-68. BEHLING, H. 1993. Untersuchungen zur spätpleistozänen und holozänen Vegetations- und Klimageschichte der tropischen Küstenwälder und der Araukarienwälder in Santa Catarina (Südbrasilien). Dissertationes Botanicae 206, J. Cramer, Berlin Stuttgart, 149 p. OLIVEIRA, M. A. T.; FERREIRA, G. M. S. S. 2004. Descrição micromorfológica de estruturas sedimentares em colúvios e aluviões recentes. In: Simpósio de Geodinâmica de Superfície - XLII Congresso Brasileiro de Geologia, 2004, Araxá, MG. Anais. Belo Horizonte : SBG, 2004: 985-987. PESSENDA L.C.R.; GOUVEIA S.E.M.; ARAVENA R.; BOULET R.; VALENCIA, E.P.E. 2004. Holocene fire and vegetation changes in southeastern Brazil as deduced from fossil charcoal and soil carbon isotopes. Quaternary International, vol. 114, no. 1: 35-43(9). SANT'ANA, W. de O. 2005. Aplicação da Micromorfologia de Solos na Análise de Soterramento de Paleossolo Quaternário. Trabalho de Conclusão de Curso. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina, 54.

Figura 3: diagrama sumário do percentual de polens ao longo da unidade 2. Notar dendograma de análise de agrupamento, à direita, indicando a delimitação de duas zonas polínicas distintas (zonas I e II). Figura 4: diagrama parcial do percentual de polens ao longo da unidade 2. Devido à limitação de espaço o diagrama apresenta apenas as espécies mais freqüentes de cada bioma. Adaptado de Oliveira et al. (inédito)