Diagnóstico bacteriológico de diversas patologias de cães e gatos e verificação da suscetibilidade a antimicrobianos Marília Scartezzini Denise de Moura Cordova Diane Alves de Lima Jeniffer Carolina Jaques da Silva Sérgio J. de Oliveira RESUMO Foram recebidos no laboratório de Bacteriologia e Micologia do Hospital Veterinário da Universidade Luterana do Brasil, no período de maio de 2008 a maio de 2009, 342 materiais de cães e gatos para realização de exame bacteriológico e antibiograma. Destes, foram analisados os resultados de antibiogramas de bactérias isoladas de diferentes patologias, entre as quais 77 casos de cistites, 116 casos de ferimentos, e 149 casos de otites. Os microrganismos isolados com maior frequência foram Staphylococcus sp., Pseudomonas sp., Proteus sp., Bacillus cereus. Escherichia coli., Enterococcus sp. e Streptococcus sp. Nos casos de cistite predominou o isolamento de Staphylococcus sp., Enterococcus sp., Escherichia coli. e Enterobacter sp e Streptococcus sp. Nos casos de otites foram isolados Staphylococcus sp. com maior frequência, seguidos de Pseudomonas sp e Bacillus cereus. Nos casos de ferimentos predominaram isolamentos de Staphylococcus sp, Escherichia coli., Enterococcus sp. Enterobacter sp e Streptococcus sp. Foram utilizados 17 antimicrobianos nos testes de difusão em agar. Entre os microrganismos cultivados, Enterococcus sp. apresentou resistência ao maior número de antimicrobianos testados. Palavras-chave: Diagnóstico bacteriológico. Patologias em cães e gatos. Suscetibilidade a antimicrobianos. Bacteriologic diagnosis of different pathologies of dogs and cats, antimicrobial susceptibility tests ABSTRACT Samples for bacteriological tests (n=342) were processed in the Laboratory of Bacteriology and Micology of the Veterinary Hospital (ULBRA University), from May 2008 to May 2009. This paper shows the results of antimicrobial susceptibility tests in bactéria isolated from diseases in dogs and cats: otitis (n=149), injuries (n=116) and cistitis (n=77). Marília Scartezzini é Médica Veterinária Residente de Doenças Infecciosas e Parasitárias, do Hospital Veterinário da ULBRA, Canoas, RS. E-mail: serjol@terra.com.br Denise de Moura Córdova, Diane Alves de Lima e Jeniffer Carolina Jaques da Silva são alunas do Curso de Medicina Veterinária de ULBRA, estagiárias do Laboratório de Bacteriologia e Micologia do HV. Sérgio J. de Oliveira é Médico Veterinário, Doutor, professor orientador, responsável pelo Laboratório de Bacteriologia e Micologia do HV, Curso de Medicina Veterinária, ULBRA Canoas/RS. 152Veterinária em Foco Veterinária Canoasem Foco, v.8 v.8, n.2, jan./jun. p.152-157 2011 jan./jun. 2011
Staphylococcus sp were the most prevalent, followed by Enterococcus sp, E. coli, Pseudomonas sp, Bacillus cereus, Streptococcus sp and Proteus sp. In cases of cistitis were isolated mainly Staphylococcus, Enterococcus, Enterobacter sp, E. coli and Streptococcus sp. In otitis, it was shown more prevalence of Staphylococcus sp, followed by Pseudomonas sp and Bacillus cereus. In cases of injury, were predominantly isolated Staphylococcus sp, Enterococcus sp, E. coli, Enterobacter sp and Streptococcus sp. Agar diffusion tests were performed with 17 antimicrobials. Enterococcus sp showed higher patterns of resistance... Keywords: Bacteriologic diagnosis. Pathologies of dogs and cats. Antimicrobial susceptibility tests. INTRODUÇÃO No Hospital Veterinário da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) são realizados exames clínicos e laboratoriais nas diversas espécies de animais domésticos. As patologias mais diagnosticadas em cães e gatos têm sido otites, cistites e ferimentos. Os exames laboratoriais realizados no Laboratório de Bacteriologia e Micologia do HV-ULBRA têm sido importantes como complementares e auxiliares ao diagnóstico e tratamento de doenças e compreendem exames bacteriológicos com antibiograma e micológicos. No período de maio de 2008 a maio de 2009 foram realizados 594 exames bacteriológicos no Laboratório, compreendendo casos de otite, infecções urinárias, ferimentos, secreções, abscessos, em pequenos e grandes animais. Este artigo visa relatar e discutir os resultados obtidos em casos de otites, cistites e ferimentos, dos quais foram isoladas bactérias e foram realizados antibiogramas como auxiliar no tratamento de algumas patologias em cães e gatos, no período citado. MATERIAIS E MÉTODOS Os materiais para exame consistiram em swabs obtidos de secreções em casos de otite, conjuntivite, dermatite, abscessos, secreções nasais, amostras de urina e outras. Foram coletados de cães e gatos apresentando as diversas patologias, e examinados no HV-ULBRA, no período de maio de 2008 a maio de 2009. No presente relato são avaliados apenas os antibiogramas referentes a microrganismos isolados de casos de otite, cistite e ferimentos, que foram os mais frequentes. Os materiais foram inoculados em placas de Agar sangue com 8% de sangue ovino, em placas de agar MacConkey e caldo BHI (Brain Heart Infusion), incubados a 37 ºC por 24 horas. Nos casos de otite e também em alguns casos de dermatite (quando solicitado pelo médico veterinário ou quando observado características típicas) foi realizado pesquisa da levedura Malassezia sp. através de exame direto em lâmina corado pelo método de Gram, além da realização de exames bacteriológicos. 153
As colônias bacterianas foram identificadas através da visualização em placa (morfologia de colônia, presença ou ausência de hemólise, e em microrganismos gram negativos fermentação ou não de lactose), coloração de gram, testes rápidos (catalase, oxidase, coagulase) e testes de indol, utilização de citrato, ureia, fermentação de açúcares (glicose, sacarose, maltose, dulcitol, trehalose, manose) VM/VP, SIM e fenilalanina (COWAN, 1997; OLIVEIRA, 2000). Após a identificação, as bactérias foram submetidas a teste de suscetibilidade a antimicrobianos pelo método de difusão em disco, utilizando placas de Mueller Hinton (OLIVEIRA, 2000). Os testes foram realizados frente aos antimicrobianos: amoxicilina, amoxicilina com ácido clavulânico, amicacina, cefalexina, azitromicina, ceftazidima, ciprofloxacina, doxiciclina, enrofloxacina, gentamicina, neomicina, polimixina B, tobramicina, cefoxitina, nitrofurantoína, norfloxacina, sulfazotrim, cefaclor, penicilina e cloranfenicol. RESULTADOS Os resultados são apresentados nas tabelas 1, 2, 3 e 4. TABELA 1 Ocorrência de bactérias nas diferentes patologias em cães e gatos. Bactérias Cistite Otite Ferimentos Total Staphylococcus SP 17 75 36 128 Enterococcus SP 12 11 20 43 E. coli 19 05 18 42 Enterobacter sp 07 02 10 19 Corynebacterium sp 08 01 02 11 Streptococcus SP 06 06 10 20 Pseudomonas SP 01 18 03 22 Proteus sp 03 10 09 22 B. cereus 0 16 0 21 Bacillus sp 01 4 0 05 Klebsiella sp 01 0 08 09 Pasteurella sp 01 01 0 02 Neisseria sp 01 0 0 01 Total 77 149 116 342 154
TABELA 2 Suscetibilidade a antimicrobianos (50% ou mais no antibiograma*) dos casos de cistite. Antimicrobianos Staphylococcus Enterococcus E. coli Corynebacterium Amicacina S R S R Amox+ac.clavulânico S S R R Amoxicilina R S R NT Azitromicina R R R R Cefaclor S R S NT Cefalexina S R R R Cefoxitina S R S R Ceftazidima S R S R Ciprofloxacina R R S R Doxiciclina S R R S Enrofloxacina R R R R Gentamicina R R S R Neomicina R R S R Nitrofurantoína S S S R Norfloxacina NT S NT NT Polimixina S R S NT Sulfazotrim R R NT NT Tobramicina S R S R S: suscetível; R: resistente; NT: não testado (*) Resultados suscetível ou resistente (S ou R) em pelo menos 50% dos casos, aos antimicrobianos relacionados na tabela. TABELA 3 Suscetibilidade a antimicrobianos (50 % ou mais dos casos de otites). Antimicrobianos Staphylococcus Enterococcus Pseudomonas Proteus B.cereus Amicacina S R S S S Amox+ ac. clavulânico S S R R R Amoxicilina R S R R R Azitromicina S R R R S Cefaclor S R R S R Cefalexina S R R R R Cefoxitina S R R S S Ceftazidima S S S S S Ciprofloxacina S S S R S Cloranfenicol S NT R R S Doxiciclina S R R S S Enrofloxacina S S S S S Gentamicina S R S S S Neomicina R R R S S Polimixina S R S R R Sulfazotrim S S R S R Tobramicina S R S S S S: suscetível; R: resistente; NT: não testado 155
TABELA 4 Suscetibilidade a antimicrobianos (50 % ou mais dos casos de ferimentos). Antimicrobianos Staphylococcus Enterococcus Streptococcus E. coli Enterobactéria Amicacina S R R S S Amox+ ac. clavulânico S S S R R Amoxicilina R S S R R Azitromicina R R S R R Cefaclor S R S R R Cefalexina S R S R S Cefoxitina S R S S R Ceftazidima NT R S S S Ciprofloxacina R S S R R Cloranfenicol NT NT NT NT NT Doxiciclina R R S R R Enrofloxacina R R S R R Gentamicina S R R S R Metronidazol R NT NT R R Neomicina R R R S R Polimixina S R S S S Tobramicina R R R S S S: suscetível; R: resistente; NT: não testado DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Analisando-se a Tabela 1 observa-se que predominaram casos de otite, com 149 isolamentos de bactérias, seguidos de ferimentos (116 isolamentos) e cistite (77 isolamentos). Em artigo publicado por Azevedo et al. (2003) os autores também constataram maior frequência de casos de otite em pequenos animais pacientes do HV da ULBRA. Santos et al. (2005) relataram os resultados de 524 antibiogramas de bactérias isoladas de diferentes patologias em cães e gatos no período de 2002 a 2003. Ocorreram otites em 408 casos, cistites em 83 e dermatites em 82 pacientes. Analisando os resultados de antibiogramas no presente trabalho, Enterococcus sp apresentaram-se 100% resistentes à amicacina, neomicina, gentamicina, polimixina, tobramicina e ás cefalosporinas. Isto também foi observado por Scartezzini (2008). Verificou-se que todas as bactérias isoladas foram suscetíveis á enrofloxacina em casos de otite (Tabela 3). Na Tabela 1 observa-se que Bacillus cereus foi isolado de 16 casos de otite, não sendo esta bactéria considerada importante na ocorrência desta doença e não foram registrados casos nos relatos de Azevedo et al. (2003) e Santos et al. (2005). Esta ocorrência deve merecer observações em próximos casos de otite, no sentido de aprimorar a colheita de material para exame, obtendo-se a certeza de que as bactérias não são apenas contaminantes sem função no processo patológico. Ferian et al. (2007) observaram maior incidência de infecções urinárias em caninos machos do que em fêmeas. Os autores sugerem que a ampla utilização de antibióticos como as quinolonas tenha contribuído para a seleção de bactérias resistentes, pois 156
obtiveram 50% de resistência à enrofloxacina. No presente trabalho também se verificou maior número de ocorrência de infecções urinárias em machos (25 cães e 25 gatos), comparado ao que ocorreu em fêmeas (26 caninos e 1 felino). Ao contrário do que ocorreu em otites, em casos de cistite as bactérias apresentaram resistência a enrofloxacina (Tabela 2), à semelhança das observações de Ferian et al. (2007), o mesmo ocorrendo nos casos de ferimentos (Tabela 4), com exceção de Streptococcus spp que foram suscetíveis. Azevedo et al. (2003) observaram que amostras de Pseudomonas sp foram suscetíveis á enrofloxacina e ciprofloxacina, o mesmo constatando-se no presente relato (Tabela 3). Através dos resultados de antibiogramas, conclui-se que devem ser incluídos nos testes os seguintes antimicrobianos, em casos de otite em cães: amicacina, ciprofloxacina, enrofloxacina, gentamicina e tobramicina. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao trabalho realizado pela Técnica em Bacteriologia Jane M. Brasil, do Laboratório de Bacteriologia e Micologia, do HV, ULBRA Canoas/RS. REFERÊNCIAS AZEVEDO, J. S. et al. Suscetibilidade a antimicrobianos, de bactérias isoladas de diversas patologias em cães e gatos. Veterinária em Foco, Canoas/RS, v.1, n.1, p.77-87, 2003. COWAN, S. T. Cowan and Steel s Manual for Identification of medical Bacteria. 2.ed. Cambridge University Press, Cambridge, 1977, 238p. FERIAN, P. E. et al. Estudo clínico, laboratorial e microbiológico de infecções urinárias em cães 14 casos. Acta Scientiae Veterinariae. 35: s581-s582, 2007. OLIVEIRA, S. J. Microbiologia Veterinária. Guia Bacteriológico Prático. 2.ed. Canoas: Editora da ULBRA, 2000, 237p. SCARTEZZINI, M. Bactérias multirresistentes a antimicrobianos no ambiente hospitalar. Trabalho de Conclusão do Curso de Medicina Veterinária, ULBRA, Canoas/RS, 2008, 66p. SANTOS, M. R. et al. Suscetibilidade a antimicrobianos, de bactérias isoladas de diversas patologias em cães e gatos. Veterinária em Foco, Canoas/RS, v.2, n.2, p. 157-164, 2005. Recebido em: abr. 2011 Aceito em: jul. 2011 157