Apresentar o referencial teórico que sustenta as. Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

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5 aula DICOTOMIAS SAUSSUREANAS: LÍNGUA X FALA, SINCRONIA X DIACRONIA E SINTAGMA X PARADIGMA Meta Apresentar o referencial teórico que sustenta as dicotomias saussureanas. Objetivos Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: perceber os preceitos que norteiam as dicotomias saussurianas; identificar as características de cada dicotomia; reconhecer a importância das dicotomias para os estudos da linguagem.

AULA V DICOTOMIAS SAUSSUREANAS: LÍNGUA X FALA, SINCRONIA X DIACRONIA E SINTAGMA X PARADIGMA Aula 5 1 INTRODUÇÃO Como você já sabe, Saussure é considerado por muitos o Pai da Linguística moderna, não por tê-la criado (você viu na aula 1 que o estudo da linguagem é bastante remoto), mas por tê-la alçado ao status de ciência. Dentre as suas contribuições, quatro pares de conceitos se destacam por serem ainda referência para os estudos em linguística. Esses conceitos são consensualmente designados dicotomias, por serem definidos um em relação ao outro, e por não serem compreendidos de maneira fiel se estudados isoladamente. Temos então: língua X fala, sincronia X diacronia, sintagma X paradigma e significante X significado. Esta última dicotomia, como você já estudou, caracteriza o chamado signo linguístico. Nesta aula, trataremos, portanto, das outras dicotomias. UESC Letras Vernáculas 79

Introdução aos estudos linguísticos Dicotomias saussureanas: língua x fala, sincronia x diacronia e sintagma x paradigma 2 DICOTOMIAS SAUSSURIANAS 2.1 Língua X Fala Para Castelar de Carvalho (2003), esta é sua dicotomia básica e, juntamente com o par sincronia / diacronia, constitui uma das mais fecundas. Para Saussure, a oposição desses dois conceitos se deve ao fato de a língua ser eminemtemente coletiva, enquanto a fala é uma propriedade individual. Langue & Parole : a primeira é definida como sistemática, enquanto a segunda como assistemática. Situando a sua dicotomia na Sociologia, ciência que, na época, já tinha grande prestígio, Saussure (2008, p. 16) afirma e adverte ao mesmo tempo: A linguagem tem um lado individual e um lado social, sendo impossível conceber um sem o outro. Para ele, a língua, como acervo linguístico, é o conjunto dos hábitos linguísticos que permitem a uma pessoa compreender e fazer-se compreender (p. 92). A língua é uma soma de sinais depositados em cada cérebro, mais ou menos como um dicionário cujos exemplares, todos idênticos, fossem repartidos entre os indivíduos (p. 27). Para o mestre genebrino, a língua é, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos (p. 17); é a parte social da linguagem, exterior ao indivíduo, que, por si só, não pode nem criá-la nem modificá-la (grifo nosso); ela não existe senão em virtude de uma espécie de contrato estabelecido entre os membros da comunidade (p. 22). Dentre os muitos méritos deste conceito, um dos mais importantes é o fato de que Saussure, através dele, estabelece o objeto de estudo da linguística, ao afirmar que esta deve se preocupar apenas com a língua. A fala, ao contrário da língua, por ser individual, torna-se imprevisível, os atos são ilimitados, não formam um sistema e, por isto mesmo, seria assistemática. Os fatos linguísticos sociais, ao contrário, formam um sistema, pela sua própria natureza homogênea. O problema desta concepção é, conforme veremos na próxima aula, a desconsideração do caráter social da fala e da interação. 80 Módulo 1 I Volume 3 EAD

2.1.1 Redefinição da dicotomia Língua X Fala Após Saussure, vários pesquisadores redimensionaram, ampliaram e até refutaram suas ideias - como é salutar a toda ciência. Dentre as várias ampliações dos preceitos saussurianos, devemos mencionar a de André Martinet, que propõe a dupla articulação da linguagem (assunto a ser visto na próxima aula), o que proporciona melhor entendimento de dois pontos: a priori, das trocas paradigmáticas de unidades menores da língua (morfemas) e sintagmáticas, da ordem das palavras; a posteriori, a articulação de unidades destituídas de significado, como, por exemplo, em cal, onde o fonema inicial pode ser trocado dando origem a: tal, mal e sal. Outro autor de destaque na ampliação e numa possível realinhação de alguns conceitos de Saussure é Eugenio Cosèriu. Este propõe uma redefinição na dicotomia língua X fala, com a intercalação do conceito de norma. Segundo Coseriu, o mais apropriado seria o uso da tricotomia língua X norma X fala, e, assim sendo, o conceito saussureano de língua sofreria algumas modificações. A norma proposta por Cosèriu seria o uso coletivo da língua. Em outras palavras, há realizações consagradas pelo uso e que, portanto, são normais em determinadas circunstâncias linguísticas, previstas pelo sistema funcional. Para o autor, a norma seria, assim, um primeiro grau de abstração da fala, pois é à norma que nos ligamos de forma imediata, conforme o grupo social de que fazemos parte e a região onde vivemos. A tricotomia em estudo deve ser entendida como um continuum, haja vista que a língua é um sistema de comunicação atualizado pelo usuário através da fala, que lhe permite adaptá-lo às suas necessidades de uso. Por isso mesmo, a fala é circunscrita no domínio individual, enquanto a língua é coletiva. Considerandose a língua (o sistema) um conjunto de possibilidades abstratas, a norma seria então um conjunto de realizações concretas e de caráter coletivo da língua. Aula 5 2.2 Sincronia X Diacronia De origem grega, sincronia (syn- juntamente e UESC Letras Vernáculas 81

Introdução aos estudos linguísticos Dicotomias saussureanas: língua x fala, sincronia x diacronia e sintagma x paradigma -chrónos tempo ) e diacronia (dia- através e chrónos tempo ) representam respectivamente um estado de língua e uma fase de evolução. Assim, de forma inequívoca, a linguística sincrônica se ocupa da língua em um determinado momento do tempo e a linguística diacrônica, da língua e suas variações histórico-temporais. A sincronia é definida por Saussure como o eixo das simultaneidades, das descrições de um deteminado estado de funcionamento da língua. Na outra ponta do eixo, localizamse as sucessividades ou diacronia. Neste enfoque, o linguista tem por objeto de estudo a relação entre um determinado fato e outros anteriores ou posteriores, que o precederam ou lhe sucederam. Acrescente-se, ainda, que a diacronia se divide em história externa (estudo das relações existentes entre os fatores socioculturais e a evolução linguística) e história interna (estuda a evolução estrutural fonológica e morfossintática da língua). Saussure prioriza o estudo sincrônico, alegando que o falante nativo não tem consciência da sucessão dos fatos da língua no tempo. Para o indivíduo que usa a língua como veículo de comunicação e interação social, essa sucessão não existe. A única e verdadeira realidade tangível que se lhe apresenta de forma imediata é a do estado sincrônico da língua. Além disso, como a relação entre o significante e o significado é arbitrária, estará continuamente sendo afetada pelo tempo, daí a necessidade de o estudo da língua ser prioritariamente sincrônico. Castelar de Carvalho (2003) exemplifica esse enfoque com o uso do substantivo romaria, que significava originalmente peregrinação a Roma para ver o Papa. Hoje, no entanto, é usado unicamente para designar peregrinação religiosa em geral. Outros exemplos que ilustram essa perspectiva são: rapariga e vamos em boa hora. O primeiro vocábulo designava, no Brasil-colônia, apenas o feminino de rapaz e, com o passar do tempo, houve evolução semântica, passando a ter cunho pejorativo. Atualmente a palavra tem vários sentidos no Brasil, sendo os mais usuais, de acordo com o Dicionário Aurélio online: Bras. (N, NE e MG) Meretriz, prostituta e mulher-dama. Já o segundo passou pelo processo de evolução fônica (mudança na forma da frase). Atualmente, utiliza-se: vamos embora 82 Módulo 1 I Unidade 1 EAD

(norma padrão), rumbora, simbora, borimbora e outros (nível coloquial). Conforme os postulados saussurianos, são estas as características da sincronia e diacronia: Sincronia Diacronia Estática. Evolutiva. Descritiva. Prospectiva e retrospectiva. Gramática geral. Gramática histórica. Interessa-se pelo sistema e pelo Interessa-se pelas evoluções e funcionamento da língua. suas causas. Faz descrições sincrônicas. Apoia-se em descrições sincrônicas. A despeito da primazia da sincronia sobre a diacronia, o próprio Saussure (p. 16) pondera na opinião de Castelar de Carvalho (2003), premonitoriamente que prioridade não significa exclusividade. Nas palavras de Saussure, a cada instante, a linguagem implica ao mesmo tempo um sistema estabelecido e uma evolução: a cada instante, ela é uma instituição atual e um produto do passado. Dessa forma, Saussure postula que o ponto de vista da ciência linguística é que poderá ser sincrônico OU diacrônico, dependendo do fim a que se pretende atingir. E há determinados casos, por exemplo, em que a descrição sincrônica pode perfeitamente ser conjugada com a explicação diacrônica, enriquecendo-se, desse modo, a análise feita pelo linguista. Aula 5 2.3 Sintagma X Paradigma Veja o que Saussure fala sobre os eixos sintagmático e paradigmático: Deste duplo ponto de vista, uma unidade lingüística é comparável a uma parte determinada de um edifício, uma coluna, por exemplo; a coluna se acha, de um lado, numa certa relação com a arquitrave que a sustém; essa disposição de duas unidades igualmente presentes no espaço faz pensar na relação sintagmática; de outro lado, se a coluna é de ordem dórica, ela evoca a comparação mental com outras ordens (jônica, corintia, etc.), que são elementos não presentes no espaço: a UESC Letras Vernáculas 83

Introdução aos estudos linguísticos Dicotomias saussureanas: língua x fala, sincronia x diacronia e sintagma x paradigma relação é associativa (CLG, 1989, p. 143). Ao fazer tal comparação, Saussure nos dá elementos analógicos para facilitar a compreensão de como essas relações ocorrem num dado momento de fala. Ao fazer referência à coluna e à arquitrave, ele nos induz a imaginar os dois eixos acima citados: um vertical e outro horizontal. O primeiro eixo representa as relações associativas, ou paradigmáticas, e o segundo, as relações combinatórias, ou sintagmáticas. Para você entender essas duas noções, observe as posições que a palavra carro ocupa em cada umas das frases abaixo: a. O carro é de Fábio. b. Comprei um carro novo. c. Comprei uma capa para proteger o carro. d. Estamos sentados no carro, à sua espera. No eixo sintagmático, horizontalmente, devemos analisar a função da palavra carro a partir das relações que estabelece com os outros termos que estão presentes nas frases. Imagine agora as diferentes formas que o vocábulo carro pode ter: carros, carrões, carrinhos, carroça e outros. Quando você faz este exercício, está associando, a cada posição ocupada pela palavra carro, outras formas do vocábulo que poderiam ali estar. Pode, ainda, imaginar que outras palavras poderiam concorrer com carro para produzir frases estruturalmente idênticas às que se apresentam acima. Ao fazer esse tipo de exercício, estamos no âmbito do eixo paradigmático, ou vertical. Conforme Saussure, as relações sintagmáticas baseiamse, então, no caráter linear do signo linguístico, que exclui a possibilidade de pronunciar dois elementos ao mesmo tempo (p. 142). A língua é formada de elementos que se sucedem um após outro linearmente, isto é, na cadeia da fala (p. 142). Colocado no eixo sintagmático, um termo passa a ter valor contrastivo em relação àquele que o precede ou lhe sucede, ou a ambos, visto que um termo não pode aparecer ao mesmo tempo que outro, em virtude do seu caráter linear. É essa cadeia fônica que faz com que se estabeleçam relações 84 Módulo 1 I Volume 3 EAD

sintagmáticas entre os elementos que a compõem. Como a relação sintagmática se estabelece em função da presença dos termos precedente e subsequente no discurso, Saussure a chama também de relação in præsentia. Para entender melhor, veja a representação dos eixos abaixo: A C B = EIXO PARADIGMÁTICO D = EIXO SINTAGMÁTICO A Ela permanece pouco feliz Você continua deveras alegre Pedro fica parcialmente triste C Eu pareço menos infeliz D B Eu estou muito cansada Aula 5 Você deve observar que, a partir da frase Eu estou muito cansada, várias possibilidades seletivas podem ser feitas, tais como: eu / ela / você / Pedro - fico / permaneço / continuo - pouco / deveras / parcialmente/ - alegre / feliz / triste. O eixo de seleção associativo, proposto pela relação paradigmática, se faz pela oposição que um termo faz a outro, in absentia, pela ausência dos outros termos no discurso. É a chamada oposição distintiva. Apesar de suscitar discordâncias quanto a alguns pontos da sua obra, é inequívoca a influência que Saussure - com o CLG (Curso de Linguística Geral) - exerceu e exerce na Linguística moderna. A partir dos seus postulados, formaram-se várias escolas estruturalistas (fonológica de Praga, estilística de Genebra, funcionalista de Paris, glossemática de Copenhague), que deram consequência e continuidade ao pensamento do mestre de Genebra. A teoria do signo (com seus dois princípios fundamentais, arbitrariedade / linearidade), as dicotomias, a distinção fonética / fonologia, fone / fonema, a dupla articulação da linguagem, a tricotomia língua / fala / norma são categorias linguísticas fecundas, todas decorrentes do pensamento saussureano e, hoje, estão absolutamente incorporadas às UESC Letras Vernáculas 85

Introdução aos estudos linguísticos Dicotomias saussureanas: língua x fala, sincronia x diacronia e sintagma x paradigma ciências que estudam a linguagem. Agora que já detém conhecimentos sobre o assunto, vamos praticar! ATIVIDADE 1. Vimos, ao longo da aula, porque Saussure é considerado o fundador da Linguística moderna. Discorra sobre alguns postulados teóricos que influenciaram para que esta ciência se configurasse como tal. 2. Apresente, pelo menos, duas características de cada dicotomia nos quadros abaixo: Língua Fala Dicotomia Características Sincronia Diacronia Dicotomia Características Sintagmas Paradigma Dicotomia Características 3. Eugenio Cosèriu propõe uma realocação da dicotomia Língua X Fala para tricotomia. Que outro elemento é inserido? Você poderia dar um exemplo de uma palavra que, por força do uso dos falantes, esteja mudando no Português falado do Brasil? 86 Módulo 1 I Volume 3 EAD

Tricotomia: Palavra: 4. Cite um fato linguístico (palavra, frase etc.) da Língua Portuguesa falada no Brasil que poderia ser examinado à luz da sincronia e diacronia. Justifique a sua escolha. 5. Leia o fragmento do poema E agora José?, de Carlos Drummond de Andrade, e depois responda a questão: Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse Fonte: http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/resumos_comentarios/j/jose_poema_drummond. Aula 5 Tendo como base os conceitos da última dicotomia apresentada nesta aula, identifique em que eixo (paradigmático ou sintagmático) está localizada esta ocorrência da língua. Justifique sua resposta. 6. Discorra um pouco sobre a importância dos estudos dicotômicos para a Linguística moderna. UESC Letras Vernáculas 87

Introdução aos estudos linguísticos Dicotomias saussureanas: língua x fala, sincronia x diacronia e sintagma x paradigma 3 RESUMO RESUMINDO Nesta aula, você viu que: O estruturalismo, conforme exposto na obra de Saussure, baseia-se na convicção de que a linguagem é um sistema abstrato de relações diferenciais entre todas as suas partes. Esse sistema se apresenta subjacente aos fatos linguísticos concretos e constitui o principal objeto de estudo do linguista. Para fundamentar suas afirmações, Saussure estabeleceu uma série de definições e distinções sobre a natureza da linguagem, que se podem resumir nos seguintes pontos: a. a langue (língua) é o sistema de signos presente na consciência de todos os membros de uma determinada comunidade linguística, e a parole (discurso), a realização concreta e individual da língua num determinado momento e lugar por cada um dos membros da comunidade; b. o estudo sincrônico da língua (considerado prioritário por Saussure) se caracteriza pela descrição do estado estrutural da língua em um dado momento, e o estudo diacrônico, pela descrição da evolução histórica da língua, que leva em conta os diferentes estágios sincrônicos; c. um signo (composto pelo significante e significado) se define em termos sintagmáticos (a partir das relações com outros elementos que se combinam na sequência do discurso) ou paradigmáticos (associações com outros elementos capazes de aparecer no mesmo contexto). LEITURA RECOMENDADA Para complementar esta aula, recomendo a leitura dos livros de CARVALHO, Castelar de. Para compreender Saussure. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 2003 e de CABRAL, L. S. Introdução à Linguística. Porto Alegre: Globo, 1976. Na próxima aula... conheceremos importantes posicionamentos teóricos acerca da linguagem humana e comunicação animal. Veremos o porquê desta diferença terminológica e as características de cada uma. Até lá! 88 Módulo 1 I Volume 3 EAD

R E F E R Ê N C I A S BENVENISTE, Émile. Problemas de Lingüística Geral I. Trad. de Eduardo Guimarães et al. Campinas: Pontes, 1991. BORBA, F. da Silva. Introdução aos Estudos Lingüísticos. Campinas: Pontes, 1997. CAMARA, J. Mattoso. Princípios de Lingüística Geral. Rio de Janeiro: Padrão, 1989. CARVALHO, Castelar de. Para compreender Saussure. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 2003. CABRAL, L. S. Introdução à Lingüística. Porto Alegre: Globo, 1976. LYONS, John. Linguagem e Lingüística: uma introdução. Trad. de Marilda Winkler Averbug; Clarisse Sieckenius de Souza. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987. MARTINET, André. A Lingüística Sincrônica. Trad. de Lilian Arantes. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1971. ORLANDI, Eni. O que é Lingüística. São Paulo: Brasiliense, 1990. Aula 5 PERROT, J. A Lingüística. Trad. de M. L. Rodrigues e N. A. Mabuchi.São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1970. ROBINS, R. H. Lingüística Geral. Trad. de Elisabeth Corbetta A. da Cunha et al. Rio de Janeiro, Globo, 1981. ROBINS, R. H. Pequena História da Lingüística. Trad. de Luiz Martins. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico S/A, 1983. SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de lingüística geral. Trad de A. Chelini, José P. Paes e I. Blikstein. São Paulo: Cultrix, 2008. VANOYE, Francis. Usos da Linguagem. Trad. Clarisse Madureira Sabóia. São Paulo: Martins Fontes, 1991. http://www.filologia.org.br/viisenefil/09.htm / Acessado em 28 nov. 2008. http://www.jackbran.pro.br/linguistica/norma_coseriu.htm/ Acessado em 15 nov. 2008. http://www.linguisticacom.blogspot.com/2008/02/relaessintagmticas-e-relaes.html/ Acessado em 15 fev. 2009. UESC Letras Vernáculas 89

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