O SIGNIFICADO DA SIMULTANEIDADE DO ADOECIMENTO E CRONICIDADE PARA A MULHER: ESTABELECENDO O CUIDADO DE ENFERMAGEM Márcia Amancio Machado ** Alexandra de Oliveira Fernandes Ivete Palmira Sanson Zagonel RESUMO: As mulheres portadoras de doenças crônicas precisam de cuidados de saúde, a fim de prevenir complicações desagradáveis, e essa é a oportunidade que os enfermeiros têm em fornecer o que é necessário incluindo-as em programas de saúde. Ser mulher com todas as suas atribuições e conviver com a doença crônica representa mudanças não somente em si como portadora da doença, mas na família e em seu meio de convívio, aspectos complexos que envolvem um desafio que buscamos elucidar nesse trabalho. Vivenciar o adoecimento e a partir daí a simultaneidade com a cronicidade, exige um remodelamento de condições, reconstrução de sua história, adequação e aceitação de suas limitações às restrições indesejáveis. Embora muitas doenças advenham do estilo de vida inapropriado como tabagismo, alcoolismo, estresse, alimentação inadequada, sedentarismo, violência, entre outros, os quais fazem parte do estilo de vida na atualidade, o adoecer acontece independente da vontade do sujeito. O adoecimento adquire um significado para o paciente estabelecido a partir de vivências individuais e do convívio com a doença. O espaço que a doença ocupa no estilo de vida do paciente depende desse significado, que é único, pois tem influências internas, baseadas no histórico individual, e externas, baseadas na representação social que a doença possui tanto no grupo familiar quanto em outros grupos a que o individuo está inserido. A doença crônica é caracterizada por sua longa duração e por ser incurável (SANTOS e Trabalho resultante da Disciplina Momento Integrador V e VI da Faculdades Pequeno Príncipe. Acadêmicas do 7º período da Faculdades Pequeno Príncipe.Endereço: Av. Iguaçu, 2713 ap.1301 Curitiba PR e-mail: mmperazzoli@gmail.com Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Coordenadora do Curso de Enfermagem da Faculdades Pequeno Príncipe. Coordenadora do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Enfermagem NEPEE. Orientadora do trabalho.
SEBASTIANI, 2001). Quando acometido por uma doença crônica, o individuo se vê diante de mudanças nos seus hábitos e em seu estilo de vida. O paciente passa por uma crise, em que percebe inúmeras perdas: da condição saudável, de papeis, de responsabilidades. E dependendo da doença pode estar diante de um menor tempo de vida (SANTOS, 1997). As doenças crônicas podem ter caráter hereditário ou podem ter causas multifatoriais motivadas por um estilo de vida prejudicial ao individuo em relação à alimentação, atividades físicas, sono, ingestão de álcool e fumo. Além disso, o portador de doença crônica, geralmente necessita aderir ao tratamento e faze-lo até o fim da vida. A tendência em longo prazo segundo pesquisas, é que haja deterioração dos cuidados, sendo pequena a taxa de doentes que o faz de forma automática e habitual (GIKOVATE, 1999). Conforme Marcon et al (2004), as mudanças nos hábitos e nos estilos de vida têm contribuído para o aumento na incidência das doenças crônico-degenerativas em mulheres, assim como no surgimento delas em faixas etárias cada vez mais jovens. Isso faz com que as doenças crônicas constituam hoje motivo de grande preocupação para os profissionais de saúde, seja por seus aspectos limitantes, pelas conseqüências de seu tratamento, ainda que ambulatorialmente, acarretando desgaste e sofrimento para a pessoa acometida. Associa-se a esses fatores o comprometimento da situação econômica da família (custos com o tratamento e/ou redução no número dos que contribuem com a renda familiar), salientando também o fato de que grande parte dos recursos financeiros e humanos dos serviços públicos prioriza atividades de cunho curativo e de reabilitação, em vez de preventivos e de promoção da saúde. O cuidado é o instrumento de trabalho do enfermeiro e consiste em ações e atitudes de envolvimento com o outro. O cuidado está presente desde o nascimento, ou seja, pode ser considerado intrínseco do ser humano. Cuidado este que pode ser realizado em diversos contextos e situações exige do profissional enfermeiro desde o preparo técnico, humano, interativo até atitudes éticas, de atenção, zelo e responsabilidade. Diante destes questionamentos propomos a seguinte questão norteadora: Como a mulher vivencia a simultaneidade do adoecimento e cronicidade? Objetivos: Compreender o sentido atribuído pela mulher à experiência da simultaneidade
do adoecimento e cronicidade; estabelecer as intervenções de enfermagem indicadas. Metodologia: Trata-se de metodologia qualitativa por meio do método de pesquisa-cuidado, de acordo com Neves e Zagonel (2006). É um método com uma visão humanística aliando a pesquisa e o cuidado ao mesmo tempo. A pesquisa-cuidado possui cinco etapas para subsidiar o processo investigativo de acordo com Neves e Zagonel (2006): a) Aproximação com o objeto de estudo fase em que norteia a escolha da pesquisa. O método deve estar de acordo com os resultados que se esperam alcançar, os quais devem colocar em evidência a totalidade do que está perante nós. Entendemos que esta abordagem atende aos propósitos do estudo, aliando a sensibilidade do cuidado ao método científico de pesquisa; b) Encontro com o ser pesquisadocuidado A pesquisa-cuidado visa considerar o ser de forma holística, não considerando apenas o método como centro da pesquisa. Os sujeitos desse estudo foram 17 mulheres adultas, portadoras de distintas doenças crônicas, avaliadas no ambulatório que atende várias especialidades em Curitiba. Foram selecionadas todas as mulheres acima de 25 anos, em tratamento há seis meses ou mais e que participaram da consulta de enfermagem. Todos os sujeitos foram informados dos propósitos do estudo e sobre o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, o qual foi assinado antes de iniciar a coleta das informações. O horário de atendimento no ambulatório do estudo é das 14:00 às 17:00h na segunda-feira e sexta-feira, sendo nestes dias, realizada a consulta de enfermagem para captação das informações. O instrumento para a coleta das informações foi a sistematização do processo de cuidar em enfermagem por meio da consulta de enfermagem com suas etapas incluindo a entrevista semi-estruturada com questões próprias da temática, efetivada ao final da consulta. Nesta etapa o pesquisador-cuidador utiliza formas para captar a subjetividade pela entrevista. Importante salientar que durante a apreensão das informações, o pesquisador não faz nenhum tipo de interferência, apenas escuta com o olhar no objetivo da pesquisa, tão logo o ser-pesquisado conclua aquele segmento da fala, é possível então iniciar o cuidado. Em respeito aos preceitos éticos foi projetado de acordo com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética da instituição; c)
Estabelecimento das conexões da pesquisa, teoria e prática do cuidado - fase que se efetiva a pesquisa-cuidado aliando a teoria (referencial bibliográfico); a pesquisa (coleta das informações pela consulta de enfermagem) e a prática (cuidado necessário no momento da pesquisa). Essa fase é determinante do sucesso da aplicação da abordagem de pesquisa-cuidado, pois é o momento da interação em que o pesquisador-cuidador capta, desvela, ilumina o que deseja pesquisar ao mesmo tempo em que observa, julga e toma decisões conjuntas com o ser, a partir das necessidades desveladas e validadas por ambos. Essa fase é aquela que mais exige do pesquisador, pois, exercita a arte de ouvir, sem interferência, deixa fluir através da fala do ser pesquisado, os sentimentos, sensações, emoções, reações, implicações, riscos, dificuldades e facilidades diante do fenômeno pesquisado; d) Afastamento do ser pesquisador-cuidador e ser pesquisado-cuidado momento em que é indicado aos sujeitos o término dos encontros para fins da pesquisa; e) Análise do apreendido - Todas as informações foram analisadas com o olhar no referencial bibliográfico adotado, análise qualitativa para alcançar a estrutura compreensiva do significado dessa experiência. Percorridas as etapas da pesquisa-cuidado chegou-se a compreensão, interpretando o significado das respostas obtidas. Para efetivar a análise do apreendido utilizamos a técnica de análise de conteúdo proposta por Turato (2003). Resultados: Somente após a leitura flutuante exaustiva de todos os discursos apreendidos é que foi possível delinear as subcategorias, incluindo os principais aspectos referidos pelas mulheres entrevistadas. Das subcategorias surgem as categorias, que são denominações mais genéricas, em que se priorizam as falas significativas. Foram apreendidas quatro categorias: o significado da simultaneidade do adoecimento e cronicidade vivenciados pela mulher; a influência e percepções da família e sociedade; a interface do cuidado de enfermagem diante da doença crônica da mulher; a religiosidade como suporte. As entrevistadas referem que adoecer cronicamente resulta em distintas modificações, as quais envolvem o contexto pessoal, familiar e social. Entre as limitações mais significativas inclui a dor, diminuição da libido, estresse, falta de apoio, uso de medicamentos, incapacidade física, convívio com mais de uma doença ao
mesmo tempo. Referem que estão acostumadas com a doença, o que é possível inferir que o longo período de tratamento exige uma adaptação da mulher, nem sempre visível, porém expressa quase que como uma acomodação à situação pelas exigências crescentes. Além de sua doença, muitas convivem com a doença do companheiro. Conclusão: Ao refletirmos sobre os resultados desta pesquisa, sentimos que esta desvendou um emaranhado de sentimentos com as quais as mulheres convivem. Entre as modificações e limitações observa-se que são abrangentes envolvendo a vida como um todo e não apenas o segmento, o órgão acometido. São impedimentos como de ser mãe, trabalhar, fazer as ações rotineiras de forma simultânea. Palavras chaves: Saúde da mulher, doença crônica, cuidados de enfermagem. Área temática: Regulação do trabalho políticas e práticas em saúde e enfermagem REFERÊNCIAS: MARCON, S.S. et al. Características da doença crônica em famílias residentes na região norte do município de Maringá, Estado do Paraná: uma primeira aproximação. Acta Scientiarum Health Sciences Maringá, v.26, n.1, p.83-93, 2004. GIKOVATE, F. Entendendo a mulher... além da paciente. São Paulo: Lemos Editorial, 1999. NEVES, E.P.; ZAGONEL, I.P.S. Pesquisa-cuidado: uma abordagem metodológica que integra pesquisa, teoria e prática em enfermagem. Cogitare Enferm, Curitiba, v.11, n.1, p.73-79, jan/abr, 2006. SANTOS, C.T. O enfrentamento das incapacidades e perdas geradas pela doença crônica: um estudo de portadores de insuficiência renal crônica em hemodiálise. Dissertação [Mestrado] Universidade São Marcos, São Paulo, 1997. SANTOS, C.T.; SEBASTIANI, R.W. Acompanhamento psicológico à pessoa portadora de doença crônica. São Paulo: Pioneira, 2001. TURATO, E.R. Tratado da metodologia da pesquisa clínico-qualitativa: construção teórico-epistemológica discussão comparada e aplicação nas áreas da saúde e humanas. Petrópolis: Vozes, 2003.