PERFIL DO TRABALHADOR ACIDENTADO, COM ÊNFASE NA CONSTRUÇÃO CIVIL: JOÃO PESSOA 1980 E 1991 Ronaldo Carvalho Barbosa Universidade Federal da Paraíba - Departamento de Estatística, João Pessoa-Pb, Fone: ( 083 ) 216.7075 Fax: ( 083 ) 216.7117 Neir Antunes Paes Departamento de Estatística - UFPb, João Pessoa-Pb e-mail: neir @ di.ufpb.br Celso Luiz Perreira Rodrigues Departamento de Engenharia de Produção - UFPb, João Pessoa-Pb Abstract This work aims basically at carrying out a descriptive profile of the accidented worker in the city of João Pessoa, with emphasis on those pertaining to the civil construction industry, during the years of 1980 and 1991. This study was achieved throught demographic, epidemiologic and social and economic variables as well as a set of variables related to the conditions of both the work and the worker. Such variables were gathered from the Instituto Nacional de Seguridade Social - INSS archives. The majority of the work accidents happened to the accidented person with the following profile: male, married with age between 20 and 24 years old. Among the professions, the hodmen was the most frequent. The contact with some type of element was the main cause of the accident and, the medical report had an indication between 6 to 10 probable treatment days. Keywords: Demography, Accidents, Profile. 1. Introdução No Brasil, assim como em João Pessoa, historicamente, a saúde do trabalhador tem tido pouca atenção, tanto pelas instituições governamentais quanto pelas empresas privadas e pelas instituições de pesquisa, as quais, pouco têm se preocupado com as condições e agravo, relacionados com a prevenção e cuidados com o trabalhador. Investigando as preocupações dos órgãos públicos e instituições envolvidas com as políticas de saúde ocupacional em João Pessoa - INSS, Ministério da Saúde e outros, observa-se uma ausência quase total de estudos realizados sobre a saúde do trabalhador, mais especificamente sobre acidente de trabalho. Há uma urgente necessidade de se discutir essa temática no sentido de entender e esclarecer as condições de segurança do trabalhador que possam subsidiar as políticas de trabalho e de gerenciamento do mesmo no município. Sendo assim, este estudo tem como objetivo, traçar de maneira descritiva, o perfil dos trabalhadores acidentados, em especial os trabalhadores do setor da construção civil, através dos acidentes do trabalho
ocorridos no município de João Pessoa, durante os anos de 1980 e 1991. Pretende-se com isso, contribuir para uma melhor compreensão desta problemática, com também de dar subsídios para que os agentes do gerenciamento da construção civil possam oferecer uma melhor condição de trabalho e uma melhor qualidade de vida para os trabalhadores. O município de João Pessoa, onde se localiza um dos pontos extremos do país, a Ponta do Seixas, possui uma densidade demográfica de 2.346 hab/km 2, que apresentou uma taxa de crescimento populacional média de 3,82% ao ano, na década de 80 contendo uma população total de 494.503 habitantes em 1991, dos quais 78% estavam em idade de trabalhar, mas apenas 36% fazia parte da População Economicamente Ativa - PEA, ficando o setor da construção civil com 7% dessa mão-de-obra. Este setor foi um dos que mais cresceu em 1991 devido a uma expansão imobiliária motivada por uma classe social emergente que demandava habitação na faixa litorânea do município. 2. Material e Métodos Foram notificados 1.342 acidentes do trabalho em 1980 e 551 em 1991. Desses acidentes foram estudados em detalhes todos os casos ocorridos no setor da construção civil (435 em 1980, e 124 em 1991). Esses dados foram obtidos através de consulta aos arquivos do INSS em João Pessoa, realizada nos meses de outubro de 1995 a março de 1996, com o uso de um formulário para registro de algumas informações constantes das fichas da Comunicação de Acidentes do Trabalho - CAT. O formulário foi dividido em quatro blocos de variáveis. No primeiro bloco foram registrados os dados sobre a empresa e sua localização e setor de atuação, buscando identificar quais os acidentes do trabalho que ocorreram em João Pessoa e no ramo da construção civil. No segundo, reuniu-se características do acidentado tais como: idade, sexo, estado civil, profissão e salário. O terceiro, referiu-se ao acidente, envolvendo as variáveis: mês, turno, após quantas horas de trabalho ocorreu o acidente e sua descrição. O último bloco disse respeito ao laudo médico, contendo as variáveis: óbito, duração provável do tratamento e o tempo exato de afastamento. De posse dessas informações juntamente com a descrição quantitativa das variáveis mensuradas pôde-se traçar o perfil dos trabalhadores acidentados e o da população da construção civil. 3. Resultados De 1980 para 1991 houve uma queda de 58,9% no número geral de acidentes ocorridos no município. No setor da construção civil a redução foi de 71,5%. Tal redução pode ter várias hipóteses explicativas que, inclusive, não seriam excludentes: a subnotificação, a melhoria das condições de trabalho através da legislação, melhores condições de trabalho oferecidas pelos órgãos empregadores, melhor qualificação e conscientização do trabalhador exigindo uma maior segurança no trabalho, entre outras. A partir do universo dos acidentes de trabalho registrados e aqui analisados foi possível apontar, na Tabela 1 e Tabela 2, alguns atributos gerais mais característicos da população de trabalhadores pessoenses e da população da construção civil que sofreu acidentes em 1980 e 1991. Os percentuais aqui apresentados representam os mais elevados que foram encontrados dentro de cada variável.
Tabela 1 - Resumo das Características mais Acentuadas e Distribuição Percentual das Variáveis dos Trabalhadores Acidentados do Município de João Pessoa: 1980-1991 VARIÁVEIS FAIXA % 1980 1991 Idade Sexo Estado Civil Profissão Renda Tempo (mês ) Turno Hora de Ocorrência Causa do acidente Dias Prováveis de Tratamento Dias Exato de Tratamento 20 a 24 anos Homem Casado Servente < 1 sm 1 < 2 sm Julho Janeiro Manhã Tarde 3 < 4 horas 4 < 5 horas Contacto com elemento Acima de 30 dias Fonte: INSS, Setor de Acidentes do Trabalho - João Pessoa/PB. 21,0 24,0 93,0 92,0 59,0 61,0 23,0 18,0 43,0 - - 49,0 12,0 - - 10,0 44,0 - - 43,0 16,0 - - 10,0 35,0 27,0 81,0 67,5 52,0 - - 28,0 Essas características do trabalhador apareceram tanto em 1980 quanto em 1991, guardando, é claro, as suas devidas proporções. Em 1980 a renda salarial dos trabalhadores foi de até 1 salário mínimo, enquanto que em 1991 foi de 1 a 2 salários mínimos. Os meses onde os acidentes ocorreram mais frequentemente foram julho e janeiro respectivamente para 1980 e 1991. Quanto ao turno atingido, em 1980, foi na parte da manhã enquanto que em 1991, foi à tarde. Em 1980 os trabalhadores sofreram acidentes entre 3 a 4 horas após o início do trabalho e em 1991 entre 4 a 5 horas. Para os dias exatos de afastamento os trabalhadores passaram, em 1980, entre 11 a 15 dias ausentes do trabalho e, em 1991, acima de 60 dias o que é preocupante pois isso acontece com 23% dos acidentados. Tabela 2 - Resumo das Características mais Acentuadas e Distribuição Percentual das Variáveis dos Trabalhadores Acidentados na Construção Civil do Município de João Pessoa: 1980-1991 VARIÁVEIS FAIXA % 1980 1991 Idade Sexo Estado Civil Profissão Renda Tempo (mês ) Turno Hora de Ocorrência Causa do acidente Dias Prováveis de Tratamento Dias Exato de Tratamento 20 a 24 anos Homem Casado Servente < 1 sm 1 < 2 sm Julho Janeiro Manhã 3 < 4 horas 3 < 5 horas Contacto com elemento Acima de 30 dias Fonte: INSS, Setor de Acidentes do Trabalho - João Pessoa/PB. 24,6 22,6 99,8 100 59,1 60,5 56,3 57,3 60,5 - - 69,4 15,2 - - 14,5 52,0 48,4 14,5 - - 20,2 37,2 25,0 86,4 71,0 51,0 - - 29,0
De acordo com a análise das variáveis, a Tabela 2 mostra que a maioria dos trabalhadores acidentados da construção civil são: do sexo masculino, casado, com idade de 20 a 24 anos, servente, com renda variando de 1 a 2 salários mínimos, que se acidentou no turno da manhã ou no da tarde e cujos acidentes foram causados por contacto com elementos, ocorridos entre as 3ª e 5ª primeiras horas. Há três variáveis que chamam mais atenção em ambas as tabelas. São elas: a renda, os dias prováveis de tratamento e os dias exatos de tratamento. Podemos observar que a renda dos trabalhadores geral e os da construção civil indicam uma melhora em 1991, devido talvez nesta década uma maior luta dos movimentos de classe em termos de reividicações salariais. Já os dias prováveis de tratamento, em 1980 a maioria ( 81% ) e em 1991 ( 67,5% ) dos trabalhadores pessoenses ficaram até 15 dias afastados. No setor da construção civil, os percentuais para a mesma faixa, são maiores, em 1980 ( 86,4% ) e 1991 ( 71% ), isso devido talvez as próprias condições de risco extremamente adversas existentes neste setor, como também, por ser a faixa onde os encargos sociais ficam a cargo dos empregadores. A situação quanto aos dias exatos de tratamento, além dos diferentes percentuais, mostra também uma mudança nas faixas: em 1980, a maioria (52% dos trabalhadores) passou até 15 dias de afastamento; em 1991, a categoria com maior frequência (28%) reuniu os acidentes que demandaram acima de 30 dias de afastamento. No setor da construção civil a maioria, 51% dos trabalhadores passavam até 15 dias de afastamento e em 1991, 29% deles passaram acima de 30 dias afastados, o que poderia sugerir que a política e cuidados na prevenção dos acidentes atuaram no sentido de uma maior atenção à saúde do trabalhador. 4. Conclusão Conforme os perfis dos trabalhadores acidentados apresentados, podemos concluir que praticamente as mesmas características predominantes nos anos de 1980 se repetiram insistentemente em 1991 sem que houvesse reduções importantes nas magnitudes relativas encontradas em ambos os períodos. A manutenção de perfis semelhantes denuncia uma política estável na redução dos acidentes quando se analisa a questão do ponto de vista relativo. Forçoso é reconhecer que a magnitude absoluta dos números revela uma assustadora redução nos acidentes, passando de um total de 1342 acidentes em 1980 para apenas 551 em 1991 principalmente se levarmos em conta que o contigente populacional da PEA aumentou na década, em 66%. É preciso avançar no estudo da qualidade dos dados, buscar formas metodológicas de mensurar o grau de subnotificação dos acidentes. A constatação observada nos dados oficiais de que houve uma violenta redução no número de acidentes pode camuflar uma outra realidade que exige maiores investigações. Este é um dos grandes problemas que entravam o conhecimento da realidade desta problemática e pouco tem-se avançado neste sentido no Brasil, confirmando-se também em João Pessoa. Diante dos resultados obtidos neste trabalho faz-se, a título de encaminhamento, algumas sugestões como: ### Os acidentes do trabalho ocorridos poderão servir de referência para que os empregadores, os empregados, o governo e as representações de classe tomem medidas mais objetivas no cumprimento das normas e leis prevencionistas de acidentes. ### O grupo etário de 20 a 24 anos é o que representou o maior foco dos acidentes em 1980 confirmando que jovens nessa faixa, ainda inexperientes, continuassem sendo as maiores vitimas 10 anos depois em uma clara denúncia de que atenção especial nas políticas de redução dos acidentes deveriam, prioritariamente, ser destinadas a esse grupo etário, o qual, por sua vez, é um dos grupos com maior proporção da população masculina
trabalhadora na construção civil. A preocupação com os jovens também deveria ser estendida, prioritariamente, aos casados e aos trabalhadores serventes da construção civil e nas primeiras horas de trabalho. ### para se ter uma melhor compreensão sobre a saúde do trabalhador acidentado da construção civil seria necessário um estudo mais detalhado como, por exemplo, comparando com outros setores de atividade, envolvendo os tipos e local de acidentes, aumentando a série de anos de estudo. 5. Bibliografia BRASIL - IBGE - Censo Demográfico: Dados gerais, Rio de Janeiro, 1980 e 1991 CENEPI, Maria Guadalupe Medina, Paulo Sérgio Siebra Beraldo, Eni Aires Borba, Luiza de Paiva Silva. Informes Epidemiológico do SUS, jan/fev. 1993. DE CICCO, Francisco M. G. A. F.. Brasil, 1980: Estatísticas de acidentes de trabalho. São Paulo: FUNDACENTRO, 1982. 53 p. FERREIRA, Renata Rivera e MENDES, René. Alguns aspectos epidemiológicos dos acidentes de trabalho fatais ocorridos em Campinas, S.P. (Brasil), 1972-1978. Revista Saúde Pública, São Paulo, v. 15, p. 251-262, 1981. KOIFMAN, S. et al. Mortalidade e acidentes de trabalho na indústria elétrica. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 17, p. 83-93, 1983. M. A. MEDRADO Faria, O. M. A. Guimarães, E. A. Castilho, W. Bezerra, L. E. Rocha, A. F. Alvarenga. Saúde e Trabalho: Acidentes de Trabalho em Cubatão. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, S.P, 11 (42):, abr./jun.1983 PARAÍBA - IBGE - Censo Demográfico: Dados gerais, Rio de Janeiro, 1980 e 1991 Mão de obra,, 1980 WÜNSCH, Filho, Victor. Variações e tendências na morbimortalidade dos trabalhadores,1995.