Título: Teste de fala filtrada em indivíduos com perda auditiva neurossensorial em freqüências altas associada à presença de zonas mortas na cóclea. Palavras chaves: audiometria, ruído, mascaramento, perda auditiva neurossensorial. O que se vê, na prática clínica, algumas vezes é que alguns pacientes com perdas auditivas acentuadas em freqüências altas apresentam uma dificuldade extrema de inteligibilidade de fala. Esta dificuldade pode ser verificada ao se obter um índice de reconhecimento de fala muito ruim no nível de maior conforto para o paciente. Além disso, pacientes com estas características referem um benefício muito pequeno com uso de amplificação também verificado pelo pobre desempenho nos testes de fala no silêncio e principalmente no ruído. Muitas vezes são pacientes que abandonam o uso da amplificação por não observarem benefício. Estes resultados podem sugerir que o mesmo apresente na cóclea regiões com perda total de células ciliadas, ou seja, zonas mortas na cóclea. Moore, 2004, definiu zona morta como uma região na cóclea cujas células ciliadas internas e/ou neurônios adjacentes possuem uma redução significante de suas funções, de forma que a vibração gerada nesta região passa a ser detectada por outra mais funcional, desta forma, pouca informação útil à discriminação da fala seria oriunda deste local. Portanto, esta região poderia ser considerada funcionalmente morta. Para investigar a presença de zonas mortas, um teste denominado de Threshold- Equalizing Noise (TEN - ruído de equalização dos limiares) foi desenvolvido por Moore et al, 2000. O TEN nada mais é do que uma audiometria obtida com ruído de banda larga ipsilateral. O espectro do ruído é expresso em ERB (equivalent rectangular bandwidth). O ruído é de banda larga cuja faixa de freqüências é de 125 a 15000 Hz. Segundo Jacob et al 2006, apesar do mascaramento ser definido como um procedimento utilizado dentro da avaliação audiológica, e não um teste propriamente dito, o TEN é considerado pelos autores como tal, pois é baseado na detecção de tons puros na presença de um ruído de banda larga (TEN), desenvolvido para produzir praticamente o mesmo nível de mascaramento (em dbna) por toda a extensão de freqüências do audiograma (250 Hz a 10000 Hz). Com base no que foi anteriormente exposto, o objetivo desta pesquisa foi aplicar um teste de monossílabos filtrados em pacientes com perda auditiva neurossensorial com e sem zonas mortas da cóclea. Foram avaliados 60 indivíduos adultos de 18 a 60 anos, do sexo feminino e masculino, atendidos no Núcleo Integrado de Assistência, Pesquisa e Ensino em Audição (NIAPEA) da UNIFESP. A partir dos resultados do teste TEN (dbna) foram
constituídos três grupos amostrais: Grupo Controle (GC) composto por 30 indivíduos sem perda auditiva; Grupo I (GI) composto por 15 indivíduos com perda neurossensorial de grau leve a moderadamente severo com configuração descendente sugestiva de zonas mortas na cóclea e Grupo II (GII) com perda neurossensorial de grau leve a moderadamente severo com configuração descendente sem indícios de zonas mortas na cóclea. Em seguida, foi aplicado o teste de monossílabos (Pen & Mangabeira Albernaz 1976) filtrados com filtros passa baixas nas freqüências de 1,5 khz, 2 khz e 3 khz. A análise dos dados foi realizada por meio dos testes Wilcoxon, Kruskal- Wallis e Mann- Whitney, adotando-se o nível de significância de 0,05 (5%) e todos os intervalos de confiança foram constituídos com 95% de confiança estatística. Os resultados mostraram que não houve diferenças significantes entre as orelhas esquerda e direita (Tabelas 1, 2 e 3). Como não foi constatado efeito de orelhas, ou seja, o índice de reconhecimento de monossílabos filtrados obtidos nas orelhas direita e esquerda foram estatisticamente iguais, o tamanho da amostra foi duplicado para obter uma maior fidedignidade nas análises entre os resultados dos grupos com e sem zonas mortas. A análise dos índices de reconhecimento de monossílabos filtrados revelou diferenças entre os grupos com e sem zonas mortas na cóclea (Tabelas 4 e 5). O grupo GI apresentou escores significantemente menores que os obtidos nos indivíduos do GC e GII nas listas de monossílabos com filtros passa baixas nas freqüências de 1,5 e 2,0 khz. Na apresentação da lista de monossílabos sem filtro e com filtro na freqüência de 3 khz a comparação entre os escores obtidos nos três grupos revelou diferenças estatisticamente diferentes entre os grupos, em que o GI apresentou os piores resultados, seguido pelo Grupo II e Grupo Controle. Além disso, houve diferença estatisticamente significante entre as freqüências em todos os três grupos (Tabela 6). Tabela 1. Índices Percentuais de Reconhecimento de Fala (IPRF) observados no Grupo Controle. Controle 1,5 khz 2 khz 3 khz Integra OD OE OD OE OD OE OD OE Média 41,2 42,0 63,7 63,1 79,3 80,5 95,6 95,5 Mediana 36 40 60 60 84 82 96 96 Desvio Padrão 17,5 17,9 16,8 16,3 12,5 12,7 3,4 3,6 Q1 28 29 52 49 72 76 93 93 Q3 56 56 76 72 88 88 96 96 N 30 30 30 30 30 30 30 30 IC 6,3 6,4 6,0 5,8 4,5 4,5 1,2 1,3 p-valor 0,372 0,591 0,393 0,805
Tabela 2. Índices Percentuais de Reconhecimento de Fala (IPRF) observados no Grupo II, indivíduos portadores de perda neurossensorial de grau leve a moderadamente severo com configuração descendente sem indícios de zonas mortas na cóclea. Sem Zona 1,5 khz 2 khz 3 khz Integra OD OE OD OE OD OE OD OE Média 39,2 42,1 57,3 60,8 73,3 73,6 76,8 77,9 Mediana 36 40 60 60 76 72 80 80 Desvio Padrão 15,0 12,5 10,3 5,5 7,4 7,5 8,0 8,1 Q1 26 36 56 56 72 68 76 74 Q3 50 48 64 64 76 80 80 82 N 15 15 15 15 15 15 15 15 IC 7,6 6,3 5,2 2,8 3,7 3,8 4,1 4,1 p-valor 0,177 0,200 0,794 0,566 Tabela 3: Índices Percentuais de Reconhecimento de Fala (IPRF) observados no Grupo I, indivíduos portadores de perda neurossensorial de grau leve a moderadamente severo com zonas mortas na cóclea. Com Zona 1,5 khz 2 khz 3 khz Integra OD OE OD OE OD OE OD OE Média 21,8 21,6 29,3 30,9 36,7 36,1 39,3 43,6 Mediana 16 22 26 32 38 34 46 42 Desvio Padrão 16,1 17,4 17,8 15,0 20,4 20,8 22,6 23,0 Q1 11 4 15 23 16 22 20 34 Q3 29 28 45 40 52 46 53 56 N 16 16 16 16 16 16 16 16 IC 7,9 8,5 8,7 7,4 10,0 10,2 11,1 11,3 p-valor 0,975 0,586 0,339 0,155 Tabela 4: Comparação dos Índices Percentuais de Reconhecimento de Fala (IPRF) observados nos Grupos: Controle, I e II. Grupo Média Mediana Desvio Padrão Q1 Q3 N IC p-valor Controle 41,6 38 17,6 28 56 60 4,4 1,5 khz G I 21,7 20 16,5 8 28 32 5,7 <0,001* G II 40,7 40 13,6 33 48 30 4,9 Controle 63,4 60 16,4 51 76 60 4,2 2 khz G I 30,1 30 16,2 19 41 32 5,6 <0,001* G II 59,1 60 8,3 56 64 30 3,0 Controle 79,9 84 12,5 72 88 60 3,2 3 khz G I 36,4 34 20,3 16 52 32 7,0 <0,001* G II 73,5 72 7,3 69 79 30 2,6 Controle 95,5 96 3,5 92 96 60 0,9 Integra G I 41,4 44 22,5 23 56 32 7,8 <0,001* G II 77,3 80 8,0 76 80 30 2,8
Tabela 5: P-valores da Tabela 4 Grupo Controle Com Zona 1,5 khz G II 0,979 <0,001* 2 khz G II 0,477 <0,001* 3 khz G II 0,002* <0,001* Integra G II <0,001* <0,001* Figura 1: Gráfico demonstrativo da comparação dos resultados entre Grupos: Controle, I e II. Tabela 6 : Comparação do resultado das freqüências nos Grupos: Controle, I e II (P- valores). Freqüências 1,5 khz 2 khz 3 khz Controle Integra <0,001* 2 khz <0,001* <0,001* G II <0,001* <0,001* <0,001* G I Integra <0,001* <0,001* G II <0,001* <0,001* <0,017* G II Integra <0,001* <0,001* G II <0,001* <0,001* <0,001*
Figura 2: Gráfico demonstrativo da comparação do resultado das freqüências entre Grupos: Controle, I e II. Conclusão: O índice de reconhecimento de monossílabos sem filtro e com filtro nas freqüências de 1,5, 2,0 e 3,0 khz dos indivíduos do grupo com zonas mortas na cóclea (GI) foi pior do que o dos indivíduos dos grupos com perda auditiva e sem zona morta (G II) e do grupo controle (GC). REFERÊNCIAS 1. Jacob RTS, Fernandes JC, Manfrinato J, Iório MCM. Identificação de zonas mortas da cóclea por meio do teste TEN. Rev Bras Otorrinolaringol. 2006;72(5): 673-82. 2. Moore BCJ, Huss M, Vickers DA, Glasberg BR, Alcantara JI. A test for the diagnosis of dead regions in the cochlea. Br J Audiol 2000;34:205-24. 3. Moore BCJ. Dead regions in the cochlea: conceptual foundations, diagnosis, and critical applications. Ear & Hear 2004; 25(2): 98-116.
4. Pen MG, Mangabeira-Albernaz PL. Lista de monossílabos para discriminação vocal. In: Mangabeira-Albernaz PL, Ganança MM ed. Surdez neurossensorial. São Paulo: Editora Moderna; 1976.p.20.