ESCLEROTERAPIA COMO ALTERNATIVA DE TRATAMENTO DE LESÕES VASCULARES BUCAIS

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Artigos científicos Escleroterapia como alternativa de tratamento de lesões vasculares bucais ESCLEROTERAPIA COMO ALTERNATIVA DE TRATAMENTO DE LESÕES VASCULARES BUCAIS Sclerotherapy as an alternative treatment for oral vascular pathologies Irani Zanettini 1 Rafael Miranda Zanettini 2 Guilherme Gollo 3 Resumo A esclerose química é uma técnica bastante difundida para tratamento de lesões vasculares, pois produz trombose do endotélio vascular, seguida de fibrose, reduzindo ou eliminando as lesões, sem necessidade de cirurgia. Há poucos estudos relatando o uso de esclerosantes químicos em lesões vasculares localizadas na região bucal. O presente estudo tem como objetivo avaliar a resposta biológica do medicamento oleato de etanolamina 5% (Ethamolin ), usado intralesionalmente, em aplicações de até 0,1ml. Foram selecionados 10 pacientes, de ambos os sexos, sendo 5 do sexo masculino e 5 do sexo feminino, com idades entre 35 e 80 anos (média de 57,5 anos), que apresentaram lesões vasculares iguais ou menores que 1 cm de diâmetro, com localizações diversas na mucosa bucal e que por motivos estéticos e ou funcionais desejavam sua eliminação. Os pacientes foram acompanhados até o desaparecimento das lesões. Sugere-se que para lesões vasculares de até 1 cm o oleato de etanolamina é agente eficaz de tratamento, substituindo com vantagens a cirurgia. Palavra-chave: Escleroterapia; Lesões vasculares; Hemangiomas; Etanolamina. Abstract Chemical sclerosis of vascular injuries is a technique for treatment of vascular injuries, because it produces trombosis of the vascular endotelius followed by fibrosis. The use of chemical esclerosants in buccal vascular injuries has few studies publications. This study have the objective of evaluate the biological reply of oleato of ethanolamina 5% (Ethamolin - Zest Farmacêutica Ltda), used inside the injury, in applications of until 0,1ml. Ten patients had been selected, of both sex, being 50% male and 50 % female, with age of 35 to 80 years (means of 57,5 years), who presented equal or lesser vascular injuries than 1 cm of diameter, with diverse localizations in the buccal mucosa and that for aesthetic or functional reasons they desired its elimination. These patients had been followed until the disappearance of the injuries. We conclude that for vascular injuries until 1 cm of diameter, the oleato of ethanolamin is an efficient agent for its treatment, substituting with advantages the surgery. Keywords: Sclerotherapy; Vascular injuries; Ethanolamine. 1 Especialista e Mestre em Cirurgia Bucomaxilofacial, Especialista em Dor Orofacial, Prof. Semiologia e Estomatologia da ULBRA Câmpus de Canoas-RS iranizan@terra.com.br. Rua Bento Gonçalves,2048 4. o andar. Caxias do Sul - RS. CEP 95020-412 2 Aluno de graduação do curso de Odontologia ULBRA Câmpus de Canoas-RS. 3 Aluno de graduação do curso de Odontologia ULBRA Câmpus de Canoas-RS. 119

Irani Zanettini; Rafael Miranda Zanettini; Guilherme Gollo Introdução As condutas terapêuticas nas lesões vasculares são controversas. Dependem do tipo de lesão, da localização, da idade do paciente, proximidade com estruturas vitais e, algumas vezes, do dano estético e ou funcional que causam. Várias modalidades de tratamento têm sido utilizadas nas lesões vasculares, como cirurgia, embolização, radioterapia, corticosteróide intralesional e sistêmico, LASER, interferon-alfa e esclerose física e química. Em linhas gerais, o tratamento objetiva prevenir ou reverter deformidades e outras complicações anatômicas, estéticas e funcionais (1). A esclerose física é realizada pela aplicação de nitrogênio líquido sobre a lesão, com o objetivo de levar as células à morte pela submissão ao brusco e intenso rebaixamento da temperatura, quer por choque térmico, desidratação ou também por aumento de volume que a água congelada adquire, rompendo as paredes e estruturas celulares (2). A utilização de esclerosantes químicos em lesões vasculares iniciou-se na França com o trabalho de Jean Charles Pravaz, que pela primeira vez utilizou a injeção de percloreto de ferro para tentar a cura de varizes dos membros inferiores. Com o decorrer dos anos, diferentes tipos de substâncias foram utilizadas no interior das veias, levando à lesão da parede interna e sua conseqüente obliteração. Na Suécia, o quinino foi utilizado na primeira esclerose de varizes de esôfago. No Brasil, o estudo em humanos tem sido realizado, preferencialmente, pela utilização do oleato de etanolamina em veias varicosas do esôfago (3). O oleato de etanolamina atua primeiramente por irritação da camada íntima endotelial da veia e produz uma resposta inflamatória estéril. Isto resulta em fibrose da parede do vaso e possível oclusão da veia. A substância também se difunde rapidamente pela parede do vaso e produz uma reação inflamatória extravascular. Está indicado para o tratamento de pequenas varizes ou varicosidades, desde que não exista insuficiência vascular, caso em que a terapia, além de ineficiente, pode resultar em flebite com formação de trombos extensos. Uma das contra-indicações na aplicação do fármaco é em diabéticos não compensados ou em lesões ulceradas e com infecção secundária. A concentração do agente esclerosante parece não ter influência no resultado do tratamento (4). Já a dose do medicamento deve ser proporcional ao tamanho da lesão. Mesmo em lesões maiores, a aplicação do agente esclerosante deve ser realizada em sessões intercaladas de no mínimo 7 dias, não ultrapassando 2 ml em cada injeção (5). Durante a realização dessa técnica, a anestesia nem sempre é indicada. A aplicação do agente esclerosante deve ser lenta e gradual para evitar a ruptura dos vasos sangüíneos. Ocorre algum desconforto local, manifestado clinicamente por uma sensação de ardor. A injeção do medicamento não deve ser superficial, pois poderá ocasionar uma necrose indesejada da mucosa bucal (5). Tendo em vista a utilidade desta substância, suas numerosas aplicações práticas no campo médico e seu uso pouco difundido no meio odontológico, este estudo teve por objetivo avaliar a resposta biológica do oleato de etanolamina 5% em lesões vasculares, com localização na mucosa bucal. Revisão da Literatura Alterações vasculares são anomalias de desenvolvimento dos vasos que condicionam acúmulo de sangue e são de etiologia desconhecida (2). Fazem parte deste grupo de lesões as más formações arteriovenosas, os hemangiomas, os linfoangiomas e as varicosidades. O diagnóstico correto é fundamental para definir a conduta a ser tomada e deve ser baseado fundamentalmente no exame clínico acompanhado de investigação, quando necessário. É imprescindível o diagnóstico diferencial entre malformações vasculares e hemangiomas, tendo em vista as condutas terapêuticas e, principalmente, no diferencial com lesões malignas (melanomas), que podem levar ao óbito, em caso de diagnóstico e conduta inadequados (6,7). A má formação vascular é uma lesão relacionada a uma anormalidade no desenvolvimento embrionário, considerada assim uma anomalia estrutural. Geralmente aparece no nascimento e aumenta conforme o crescimento do individuo, sendo mais comum no tronco, cabeça e pescoço (8). Hemangiomas são tumores dos vasos sanguíneos (hamartomas), freqüentemente congêni- 120

Artigos científicos tos, clinicamente benignos, representados por bolhas de conteúdo sangüíneo ou mesmo manchas de cor avermelhada ou arroxeada, que desaparecem momentaneamente a compressão e que retornam ao volume inicial quando aliviada a compressão. Podem ser encontrados na boca, podendo causar ulcerações, dor, sangramento, infecções secundárias e mesmo deformações dos tecidos (2,18,19). A varicosidade é uma lesão vascular benigna, adquirida e assintomática, caracterizada por uma veia anormal extensa e tortuosa. A varicosidade sublingual é o tipo mais comum e aparece como único ou múltiplos nódulos azul/arroxeados. Ocorrem também, embora menos freqüentemente, na mucosa (2,19). Os linfangiomas apresentam-se clinicamente como vesículas preenchidas por linfa ou também com sangue, principalmente quando traumatizadas mecanicamente. São mais comuns em crianças, na região do ápice lingual, dorsal e ventral, assim como na mucosa e semimucosa labial. Às vezes provocam macroglossia e macroqueilia (2). Uma manobra semiotécnica simples, a diascopia (Figura 1), pode ajudar no diagnostico diferencial de lesões de componente vascular sangüíneo (hemangioma e varicosidade) de outras com coloração assemelhada (2,9,14). Hemangiomas capilares e varicosidades estão entre as alterações vasculares mais prevalentes na mucosa bucal (2). Brandão et al. (10) avaliaram as alterações mais freqüentemente encontradas na boca. Foram selecionados 674 idosos, com média de idade de 72,5 anos, sendo 28,9% homens e 71,1% mulheres. Das várias lesões encontradas, a prevalente foi a varicosidade bucal com 42,5 %. Outro estudo avaliou a condição da mucosa bucal de 500 pacientes, com 60 anos ou mais, encontrando uma alta prevalência de lesões varicosas (59,6%), não havendo predileção em relação ao sexo (17). As modalidades de tratamento indicadas para o grupo de lesões vasculares podem ser a cirúrgica, por meio da excisão total; a embolização, que consiste na introdução de substâncias químicas no interior do vaso alimentante, realizada por angiografia; utilização do LASER; da esclerose física com o nitrogênio liquido e da esclerose química, sugerindo como agente esclerosante o oleato de etanolamina (2,4,5,11-16). Escleroterapia como alternativa de tratamento de lesões vasculares bucais Zambrano (11) refere-se à aplicação da terapia esclerosante em lesões de qualquer tamanho, principalmente nas de localização profunda e de difícil acesso para execução de cirurgias, que podem levar a hemorragias, às vezes severas, com risco de óbito. Ávila (12) descreveu dois casos clínicos, com diagnóstico de varicosidade, um em lábio e outro em mucosa jugal, onde utilizou o oleato de etanolamina mais glicose 50%, meio a meio. Os pacientes foram reavaliados após 15 dias, ocorrendo a resolução das lesões em ambos os casos. Concluiu que o método de tratamento escolhido é vantajoso para o paciente, pois cura as lesões em apenas uma sessão, sem provocar necrose dos tecidos. Palácios (13) utilizou um agente esclerosante como alternativa de tratamento em 58 pacientes, sendo 36 do sexo feminino (62,07%) e 22 do sexo masculino (37,93%). A maioria das lesões localizava-se no lábio inferior. O agente esclerosante utilizado foi o polidocanol 3%, diluído em água destilada para diminuir a concentração a 1,5%. O tratamento consistiu em aplicações intralesionais do medicamento, para produzir uma fibrose no tecido endotelial dos vasos, tendo como conseqüência a eliminação parcial ou total da lesão. Os resultados encontrados foram a desaparição total ou parcial das lesões em todos os pacientes, não ocorreram recidivas e não foi aplicado o medicamento mais que seis vezes. Em estudo de avaliação do tratamento de 30 lesões vasculares (hemangiomas, malformações vasculares e varicosidades) em 27 pacientes, utilizando o oleato de etanolamina em injeções intralesionais, na concentração de 1,25% a 2,5%, em intervalos de 15 dias, observou-se a involução de todas as lesões. Concluiu-se que este agente esclerosante é 100% efetivo para o tratamento de lesões vasculares, não havendo diferença entre concentrações do medicamento (4). Cruz Filho et al. (3), trabalhando em cães, utilizaram o oleato de monoetanolamina para avaliar seu efeito sobre os tecidos. Foi observado que o oleato de monoetanolamina, em contato com a parede interna da veia superficial, produziu trombose venosa. Observou-se extravasamento de esclerosante somente na primeira semana de estudo. Diversos são os agentes esclerosantes utilizados. Destacam-se o morruato de sódio e o psiliato de sódio, as duas drogas mais utilizadas no 121

Irani Zanettini; Rafael Miranda Zanettini; Guilherme Gollo passado. No entanto, por provocarem dor local, reações alérgicas com certa freqüência e até mesmo, em alguns casos, choque anafilático, essas substâncias passaram a ser menos empregadas. O tetradecil sulfato de sódio e o oleato de etanolamina são os agentes esclerosantes mais utilizados atualmente (5,15). Outras substâncias utilizadas como esclerosantes, na área médica, são: polidocanol, sulfato de tetradecil sódico, glicerina cromada e soluções salinas hipertônicas. A utilização destes fármacos tem como objetivo o controle ou a eliminação de lesões vasculares, com a possibilidade de impedir desfigurações permanentes, minimizar aflições psicossociais do paciente, evitar procedimentos agressivos, sendo considerada técnica simples eficaz e conservadora (3,4,6,7,12,15). Metodologia Este estudo foi desenvolvido em pacientes das Clinicas Odontológicas da ULBRA (Câmpus de Canoas RS, Brasil), que procuraram tratamentos odontológicos diversos e que, no processo de triagem, durante o exame clinico, apresentaram lesões vasculares localizadas na mucosa bucal e que, por motivos estéticos e ou funcionais, desejavam sua remoção. A amostra consistiu de onze lesões em dez pacientes, sendo cinco do sexo masculino e cinco do sexo feminino, com idades entre 35 e 80 anos (média 57,5 anos). As lesões eram de 1cm ou menos, diagnosticadas após exame clinico e manobra de diascopia ( Figura 1), com o objetivo de confirmar o diagnóstico clínico e permitir diagnóstico diferencial com outras lesões não vasculares. O paciente nº 1 (tabela1) apresentou duas lesões diferentes, sendo uma varicosidade no lábio inferior e um hemangioma localizado na língua. O protocolo para seleção dos pacientes e a condução do tratamento foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição. Os pacientes selecionados apresentavam condições clínicas satisfatórias, não havendo contra-indicação formal para a aplicação do agente esclerosante. Todos os pacientes receberam aplicação de solução de oleato de monoetanolamina a 5% (Ethamolin - Zes Farmacêutica, Rio de Janeiro), intralesional, em dose fracionada de 0,1 ml (Figura 2), sem utilização de anestésicos locais. Após a aplicação do agente esclerosante, prescreveu-se uso de gelo externo e analgésicos via oral, se necessário. 122

Artigos científicos Escleroterapia como alternativa de tratamento de lesões vasculares bucais A distribuição dos pacientes de acordo com a idade, sexo, tipo de lesão, sua localização, tamanho e número de aplicações é apresentada na Tabela 1. Tabela 1 - Distribuição dos pacientes de acordo com a idade, sexo, localização, tamanho e número de aplicações. Paciente Idade (Anos) *Sexo *Lesão Localização Tamanho (cm) Quantidade Injetada (Ml) N.ºde Aplicações 1 74 M V Lábio inferior 0,4 0,1 1 H Ponta da língua 0,6 0,1 1 2 49 F V. Lábio inferior 0,6 0,1 2 3 60 M V. Lábio superior 0,6 0,1 1 4 48 F V. Lábio inferior 0,4 0,1 1 5 80 M V. Lábio inferior 0,6 0,1 1 6 67 F V. Lábio inferior 0,6 0,1 1 7 54 M V. Lábio inferior 0,6 0,1 1 8 35 F H Mucosa Jugal 1 0,1 2 9 57 F V. Lábio inferior 0,6 0,1 1 10 45 F H Lábio inferior 0,8 0,1 1 * V- Varicosidade; H- Hemangioma;M-Masculino; F-Feminino 123

Irani Zanettini; Rafael Miranda Zanettini; Guilherme Gollo Após a aplicação do agente esclerosante, os pacientes foram reavaliados semanalmente, sendo aplicada uma segunda injeção do produto na segunda semana, caso a lesão não estivesse involuindo (Figuras 3 e 4). 124

Artigos científicos Resultados Os resultados obtidos neste estudo (Tabela 1) mostram que das onze lesões diagnosticadas, oito correspondem a varicosidades (72%) e três a hemangiomas (28%), não havendo diferenças nas respostas ao tratamento quando comparados gênero, idade, localização ou tamanho das lesões. Em relação ao número de aplicações, somente 2 lesões necessitaram da segunda aplicação do agente esclerosante (18%) enquanto que as outras (82%) regrediram com uma única aplicação de 0,1 ml da solução. Discussão A utilização de agentes esclerosantes para tratamento de lesões vasculares está bem documentada na literatura, principalmente no tratamento de varizes, varicosidades e hemangiomas, estando indicada em lesões de qualquer tamanho, principalmente nas de localização profunda e de difícil acesso para execução de cirurgias que podem levar à hemorragia (11). Em algumas lesões intrabucais, a crioterapia é eficaz, com a vantagem de ser rápida e de possuir poucas complicações quando usada corretamente. A desvantagem é sua limitação de uso apenas em lesões pequenas e superficiais da mucosa (5). A terapia com esclerosantes tem mostrado vantagens em relação a outras formas terapêuticas, por ser de fácil execução, pouco invasiva e de resultados previsíveis, desde que aplicada com a técnica adequada e em lesões de porte pequeno ou médio (3-7,12,15). O presente estudo está de acordo com a literatura consultada, uma vez que em todos os pacientes que receberam o tratamento com esclerosante químico à base de oleato de etanolamina ocorreu a cura completa das lesões. A anestesia, precedendo a aplicação da substância esclerosante, é defendida por alguns autores (5). Entretanto, no presente trabalho não foi executada para não mascarar a ardência local no momento da aplicação do medicamento, no caso da agulha ultrapassar o limite da lesão. Observou-se que se a injeção do agente esclerosante for feita intralesionalmente, não haverá dor no momento da aplicação e sim um desconforto, alguns minutos após sua aplicação, perfeitamente Escleroterapia como alternativa de tratamento de lesões vasculares bucais suportável pelo paciente e controlável com medicação analgésica. Os resultados do presente trabalho estão acordes com a literatura consultada, onde se observou maior prevalência de lesões varicosas em relação aos hemangiomas, bem como se obteve involução da maioria das lesões com dose única do agente esclerosante. Demonstrou-se que a escleroterapia é técnica efetiva e relativamente simples de ser executada em ambulatório, associada à disponibilidade e o baixo custo do agente esclerosante. Os efeitos colaterais foram discretas inflamações e dor passageira, nas áreas adjacentes à lesão. Conclusão Os resultados deste trabalho permitem concluir que em lesões vasculares iguais ou menores que 1 cm a aplicação do oleato de etanolamina promove a involução completa delas, constituindo-se assim em alternativa ao tratamento cirúrgico. Referências 1. Nagler RM, Braun J, Daitzchman M, Peled M, Laufer D. Selective embolization for head and neck vasculopathies. O Surgery O Medicine O Pathol O Radiol Endod 2002 ; 93:127-131. 2. Boraks S. Diagnóstico Bucal. 3ed. São Paulo: Artes Médicas; 2001. 3. Cruz Filho M, Maia CC, Abrahão S, Baptista Silva JCC, Gomes PO, Soufen MA, Novo NF, Juliano Y. Efeitos do oleato de etanolamina na parede venosa, de cães. Acta Cir Bras [online] 2002; 17. [Capturado 15 de set.2005]. Disponível em URL: http://www.scielo.br 4. Batista Rodrigues Johann AC, Aguiar MCF, Vieira do Carmo MA, Gómez RS, Castro WH,Mesquita RA. Sclerotherapy of benign oral vascular lesion with ethanolamine oleate: an open clinical trial with 30 lesions. O Surg O Med O Pathol O Radiol Endod 2005;100:579-584. 5. Ribas MO ; Larangeira J; Sousa MH. Hemangioma bucal: escleroterapia com oleato de 125

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