AMANDIO GONÇALVES DE OLIVEIRA FILHO amgfilho12@yahoo.com.br ESTUDO DA FRAGILIDADE AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DE CARIACICA- ES: CONTRIBUIÇÃO PARA O PLANEJAMENTO MUNICIPAL 1. INTRODUÇÃO O avanço das relações da sociedade com o meio físico, acompanhado do aumento da exploração dos recursos naturais e desenvolvimento da agricultura e da industrialização tem promovido pressão constante e crescente sobre o meio ambiente. Neste sentido, Ross (1994) aponta que em função de problemas ambientais decorrentes das diferentes práticas econômicas e socioculturais presentes no Brasil, a gestão e planejamento territorial municipal em nível ambiental são urgentes. Nesta direção, as preocupações dos gestores políticos, e também da sociedade em geral, não devem se pautar apenas sobre o desenvolvimento econômico e técnico-científico, mas, também em uma visão que vislumbre tanto as potencialidades quanto as fragilidades do meio físico natural. Esta pesquisa baseia-se na metodologia de Ross (1994) de estudos de Zoneamento Ambiental e nos pressupostos teóricos de Tricart (1977) acerca do conceito de Unidades Ecodinâmicas. Dentro desta concepção, as relações que se processam na natureza são regidas segundo ordens de trocas de energia e matéria, de forma dinâmica e em equilíbrio (Teoria de Sistemas). De acordo com esta visão, se processam na natureza duas situações dinâmicas distintas, de um lado um sistema natural em equilíbrio conservando as trocas de energia e matérias, de outro um ambiente antropizado, no qual as intervenções promovidas pelo homem, como desmatamentos, produção agrícola e industrial promovem instabilidade no fluxo natural de energia e matéria. Segundo a proposta de Ross (1994) a fragilidade do relevo dentro do ordenamento das unidades ecodinâmicas estáveis ou instáveis é sistematizada em cinco classes que variam de muito fraca (1) a muito forte (5), conforme o Organograma 1, sendo que a fragilidade ambiental potencial centra-se nas características naturais sem a presença do homem, e a emergente considera a ação humana na paisagem. 1
Unidades Ecodinâmicas Estáveis Instáveis Instabilidade Ambiental Potencial Instabilidade Ambiental Emergente Muito Baixa (1) Baixa (2) Intermediária (3) Alta (4) Muito Alta (5) Muito Baixa (1) Baixa (2) Intermediária (3) Alta (4) Muito Alta (5) Organograma 1: Metodologia da pesquisa. 2. OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral Elaborar estudo da fragilidade ambiental do município de Cariacica. 2.2 Objetivos específicos Analisar a importância do estudo da fragilidade ambiental no contexto do planejamento municipal; apontar a contribuição da geomorfologia em estudos de fragilidade ambiental e verificar a eficiência do emprego do geoprocessamento em estudos de fragilidade ambiental. 2
3. ÁREA DE ESTUDO O município de Cariacica está situado na Região Metropolita da Grande Vitória, limitandose a leste com a Capital Vitória e Vila Velha, a oeste com Domingos Martins, a nordeste com Serra, a sul com Viana e a noroeste com Santa Leopoldina. As rodovias federais BR 262 e BR 101 constituem as principais vias de ligação da cidade com os municípios vizinhos. Cariacica possui uma área aproximada de 280 km², sendo a maior porção da cidade ocupada pela zona rural, entretanto, esta parcela não reflete a ocupação da cidade, pois aproximadamente 95% dos habitantes ocupam a área urbana. Figure 1: Mapa de localização de Cariacica-ES. 4. METODOLOGIA 3
A etapa inicial da pesquisa consistiu na elaboração das informações base para a correlação e classificação do relevo segundo suas fragilidades. Nesta etapa, em um ambiente de Sistema de Informações Geográficas (SIG), em que os diferentes níveis de informações foram agrupados em Planos de Informações (PI), em formato matricial. Todos os PI: declividade do relevo, padrão de formas do relevo, dissecação do relevo, unidades geomorfológicas, pedologia e uso da terra e cobertura vegetal foram classificados (receberam um valor numérico) segundo as cinco classes de fragilidades adotadas. Adequada a base cartográfica, os passos seguintes acompanharam os preceitos da álgebra de mapas para a correlação das diferentes informações, a fim de se obter as cartas sínteses de fragilidade potencial e emergencial do relevo de Cariacica-ES. Cordeiro et al. (2001) definem álgebra de mapas como operações matemáticas sobre mapas, que representam procedimentos de análise espacial em geoprocessamento que produz novos dados a partir do relacionamento entre diferentes mapas, podendo ser também a manipulação de diferentes atributos em um único mapa. 4.1 Sobre as variáveis Dentre as informações utilizadas nesta modelagem a declividade constitui uma das principais variáveis na modelagem dos mapas de fragilidade, por facilitar a compreensão e a análise dos processos morfodinâmicos que ocorrem no relevo. A declividade das encostas constitui importante influência no controle dos eventos dinâmicos de retirada de material do solo (erosão) e deposição, além de estar diretamente associada aos eventos morfodinâmicos de deslizamentos de massa e enxurradas, que são impulsionados pelo fator gravidade, que implica nos movimentos descendentes dos materiais da erosão e das águas pluviais. Neste sentido, a disposição das inclinações das vertentes está diretamente associada aos processos morfodinâmicos que atuam sobre o relevo, revelando a capacidade e velocidade de deslocamento de materiais sobre as encostas (SILVEIRA et al., 2005). 4
A classificação segundo os graus de declividade é apresentada na Tabela 1. Tabela 1: Classes de Declividade Classes de declividade Instabilidade Ecodinâmica Peso 3 6% (1,72º - 3, 43º) Muitobaixa 1 6 12% (3, 43º - 6,85º) Baixa 2 12 20% (6,85º - 11, 31º) Intermediária 3 20-30% (11, 31º - 16, 70º) Alta 4 > 30% (>16, 70º) Muito Alta 5 As demais variáveis presentes na modelagem seguiram o mesmo critério de operacionalização, sendo classificadas segundo seu grau de contribuição para a vulnerabilidade do relevo. A variável de dissecação do relevo foi ordenada segundo a proposta de Ross(2006), sendo adotados maiores pesos para os índices mais altos de dissecação, baseada na correlação entre distâncias interfluviais e entalhamento de talvegue, o que revela as áreas com predomínio de processos geomorfológicos de erosão e deposição. Para a variável tipos de relevo foi adotada classificação semelhante à de declividade, sendo que os pesos foram distribuídos segundo as maiores amplitudes das formas associadas às maiores declividades, revelados pelos diferentes modelados do relevo: rampas, colinas, morrotes, morros com encostas suavizadas, morros e montanhas mapeados segundo a proposta de Pires Neto (1991 apud Goulart, 1992). Para o ordenamento dos pesos da variável unidades geomorfológicas foi levado em consideração o arranjo estrutural das formas individualizadas e principalmente a dinâmica morfogenética atuante sobre o modelado, para as unidades presentes em Cariacica mapeadas por Oliveira Filho (2010): patamares escalonados, colinas costeiras e planícies litorâneas, foram adotadas as classes de fragilidade muito alta, intermediária e intermediária, respectivamente. 5
Os solos constituem importante fator no desenho da fragilidade ambiental em função de suas características de textura, estrutura, grau de coesão das partículas e espessuras dos horizontes, o que revela suas particularidades de maior ou menor susceptibilidade aos processos morfodinâmicos. Nesta direção, com base no mapa de solos da Embrapa de 1978, as faixas de solos presentes em Cariacica receberam os respectivos valores: argissolos (3), gleissolo melânico (4), gleissolo sálico (5), cambissoloháplico (3), latossolo vermelhoamarelo (2), neossolo flúvico (3) e neossolo quartzarênico (5), além da adoção de peso 5 para as áreas de afloramentos de rochas. Observando a proposição de Ross (1994) de ordenamento ecodinâmico das rochas baseado na resistência das mesmas à morfogênese e susceptibilidade a processos de fraturas, falhamentos e foliação, para as unidades litológicas presentes em Cariacica, identificadaspela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM, 2004), foram adotados os seguintes pesos: paraíba do sul (1,5), tonalitos tipo jequitibá (2), depósitos flúvico-lagunares (5), enderbitos santa tereza (1,5) e suíte máfica (3). A compilação e correlação das variáveis descritas propiciaram a geração da Carta de Fragilidade Ambiental Potencial da área de estudo, que serviu de base para a etapa seguinte de geração da Carta de Fragilidade Ambiental Emergente de Cariacica, que é o resultado do cruzamento do produto de fragilidade potencial com a variável de uso e cobertura da terra. Para o cálculo das varáveis envolvidas no mapa de Fragilidade Ambiental Potencial foi adotada a soma simples dos pesos atribuídos a cada informação, seguida da média dos valores em função do número de variáveis envolvidas. Para efeito de arredondamentos foi adotado que valores acima de 0,5 seriam arredondados para 1, e valores inferiores para 0. O mapa de uso e cobertura da terra de Cariacica foi elaborado a partir da digitalização em ambiente SIG do mapa de Uso do Solo e Cobertura Vegetal de Cariacica disponibilizado pelo Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), seguido da verificação da interpretação 6
utilizando como base fotos aéreas georreferenciadas da área de estudo do ano de 2008, adquiridas junto ao Geobases (Sistema Integrado de Bases Geoespaciais do Estado do Espírito Santo). Os dados de uso e cobertura da terra de Cariacica foram agrupados e classificados conforme a Tabela 2 com destaque para a influência da cobertura vegetal na mitigação da fragilidade potencial do relevo, por outro lado a ocupação urbana representa fator importante para potencializar a fragilidade ambiental. Tabela 2: Uso da Terra e Cobertura Vegetal de Cariacica Fragilidade Ambiental Uso da Terra e Classede Peso Cobertura Vegetal Fragilidade Afloramento Alta 4 Alagado Muito Alta 5 Cultura Intermediária 3.5 FlorestaPlantada Baixa 2 Manguezal Muito Alta 5 Mata MuitoBaixa 1 Mineração Muito Alta 5 Pastagem Intermediária 3 Urbano Alta 4 Água Alta 4.5 5. RESULTADOS O primeiro resultado gerado foi a Carta de Fragilidade Ambiental Potencial, revelando que 19,97% do território cariaciquense apresenta grau de fragilidade potencial baixo, outros 39,09% intermediário, 38,04% alto e 2,90% muito alto.com base na análise da Figura 2 é possível identificar que aproximadamente 40% da área municipal de Cariacica apresentam altas ou muito altas fragilidades, associada especialmente as porções de relevo com maiores 7
amplitudes e fortes declividades, localizados no setor oeste da cidade. Estas áreas são do ponto de vista morfodinâmico mais vulneráveis aos processos de erosão. Aproximadamente 60% da área da cidade apresentam de baixa a intermediária fragilidade potencial, estando situado sobre relevo de colinas suaves a onduladas na parte leste e central do município, com inclinações menos abruptas, e solos mais desenvolvidos e mais bem drenados, o que garante a estes espaços menor vulnerabilidade ambiental. Figure 2: Carta de Fragilidade Ambiental Potencial de Cariacica. A Carta de Fragilidade Ambiental Emergente (Figura 3)é o resultado da média entre a Carta de Fragilidade Ambiental Potencial e as variáveis de uso da terra e cobertura vegetal, em que a contribuição do fator antrópico é avaliada neste modelo. É possível observar uma mudança substancial na espacialização da vulnerabilidade ambiental, onde grande parte da 8
cidade que apresenta de alta a muito alta fragilidade natural, devido às variáveis naturais do relevo, como declividade, pedologia e características geomorfológicas, passam a ser classificadas como de muito baixa à intermediária fragilidade, devido, especialmente, à presença de vegetação. Por outro lado, ambientes que apresentam baixa fragilidade potencial, passam a apresentar fragilidade ambiental intermediária, isto devido à presença da urbanização da terra e áreas de mineração. Esta diferenciação observada na fragilidade ambiental da cidade, devido ao uso da terra e a cobertura vegetal reside no grau de proteção que estas variáveis atribuem aos ambientes naturais em função dos diferentes usos da paisagem, em que a atuação antrópica, seja com atividades de mineração, agropecuária, ou com elementos urbanos tendem a aumentar a fragilidade do meio. A Carta de Fragilidade Ambiental Emergente demonstra que as atividades humanas culminam com a intensificação da vulnerabilidade ambiental da cidade em setores, que do ponto de vista natural são mais estáveis. 9
Figure 3: Carta de Fragilidade Ambiental Emergente de Cariacica. Com relação à proposta metodológica empregada de mapeamento das unidades ecodinâmicas instáveis, os resultados foram satisfatórios, por permitirem a identificação das áreas naturais potencialmente mais vulneráveis e analisar a influência da presença humana neste cenário. Neste aspecto, o uso do SIG foi essencial, mostrando-se eficiente para o mapeamento das feições de interesse, facilitando os processos de coleta, armazenamento, manipulação, correlação e apresentação dos dados empregados. De forma geral, os produtos apresentados podem ser utilizados pelos gestores públicos para identificar os setores potencialmente vulneráveis frente aos agentes morfodinâmicos naturais confrontados com a ação antrópica sobre o meio ambiente. 10
6. REFERÊNCIAS CORDEIRO, J. P.; BARBOSA, C. C. F.;CÂMARA, G.; Álgebra de mapas. In: CÂMARA, G.; DAVIS, C.; MONTEIRO, A. M. V. (Org.). Introdução à ciência da geoinformação: INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, 2001 Disponível em: <http://www.dpi.inpe.br/gilberto/livro/introd/>. Acesso: 12 de junho de /2013 CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL. Carta Geológica do Brasil ao Milionésimo: sistema de informações geográficas-sig. Folha SF.24 Vitoria. [Geological Map of Brazil 1:1.000.000 scale: geographic information system-gis]. Brasília: CPRM, 2004. CD ROM 37/41. Programa Geologia do Brasil. ISBN 85-7499- 009-4 11
GEOBASES Sistema Integrado de Bases Georreferenciadas do Estado do Espírito Santo. 2008. GOULART, A. C. O.; Análise integrada do relevo: subsídios ao planejamento ambiental urbano. Monografia apresentada ao curso de geografia da Universidade de São Pulo. 1992. IJSN- Instituto Jone dos Santos Neves. Espírito Santo em mapas. Uso e cobertura da terra, 2010. Disponível em: <http://www.ijsn.es.gov.br/sitio/index.php?option=com_wrapper&view=wrapper&itemid= 109> OLIVEIRA FILHO, A. G.; Estudo geomorfológico do município de Cariacica-ES com uso de sistemas de informações geográficas. Trabalho de conclusão de curso (Universidade Federal do Espírito Santo, Departamento de Geografia), Vitória, 2010. EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Projeto Espírito Santo Solos. Disponível em <http://mapoteca.cnps.embrapa.br> Acesso em 12 de setembro de 2010. ROSS, J. L. S. Análise empírica da fragilidade dos ambientes naturais e antropizados. Revista do Departamento de Geografia.n.8, p.63-74. 1994. ROSS, J. L. S.; Geomorfologia aplicada aos Eias-Rimas. In:. Geomorfologia e meio Ambiente. (Orgs). Antônio José Teixeira Guerra e Sandra Baptista da Cunha. 6ª Ed. Rio de janeiro: Bertrand Brasil, 2006. cap. 6. p. 291-336. SILVEIRA, C. T.; FIORI, A. P.; OKA-FIORE, C.; Estudo das unidades ecodinâmicas de instabilidade potencial na APA de Guaratuba: subsídio para o planejamento ambiental. Boletim Paranaense de Geociências, n. 57, p. 9-23, 2005. Editora UFPR TRICART, J. Ecodinâmica. IBGE-SUPREN: Rio de Janeiro, 1977. p. 91. 12