O CARNIVORISMO COMO FONTE DE INFECÇÃO DE Cystoisospora ohioensis (APICOMPLEXA: CYSTOISOSPORINAE) PARA CÃES*

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Transcrição:

O CARNIVORISMO COMO FONTE DE INFECÇÃO DE Cystoisospora ohioensis (APICOMPLEXA: CYSTOISOSPORINAE) PARA CÃES* THE CARNIVORISM AS SOURCE OF INFECTION OF Cystoisospora ohioensis (APICOMPLEXA: CYSTOISOSPORINAE) FOR DOGS Fabiana Valadão Massad 1 ; Walter Leira Teixeira Filho 2 ; Francisco Carlos Rodrigues de Oliveira 3 e Carlos Wilson Gomes Lopes 4 ABSTRACT. Massad, F.V.; Teixeira Filho, W.L.; Oliveira, F.C.R. de & Lopes, C.W. [The carnivorism as source of infection of Cystoisospora ohioensis (Apicomplexa: Cystoisosporinae) for dogs.] O carnivorismo como fonte de infecção de Cystoisospora ohioensis (Apicomplexa: Cystoisosporinae) para cães. Revista Brasileira de Medicina Veterinária, 31(2):75-79, 2009. Departamento de Parasitologia Animal, Instituto de Veterinária, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, BR 465, Km 07, Seropédica, RJ 23890-000, Brasil. E-mail: lopescwg@ufrrj.br Cystoisospora ohioensis an intestinal coccidium of the dog was observed in broilers chicks as monozoic cysts. The aim of this research was to compare two ways of infection. So, spleen, liver and bursa of Fabricius of two broiler chicks, one experimentally infected with 10 4 C. ohioensis sporulated oocysts previously and other free of infection. At 35 days after infection (DAI)apleen, liver and bursa of Fabricius were remouved after beins eutanasia. Tree puppies free of coccidia were fed on spleen, liver and bursa de Fabricius separately. Two others puppies, also free of coccidia, one was fed on grinded broilers chicks visceras, free of coccidia, and the last one was infected by 10 4 C. ohioensis sporulated oocysts orally. Puppies fed on spleen and liver shed oocysts in their feces at 10 0 DAI and the animal fed on bursa de Fabricius shed oocysts in its feces at 16º DAI. In spite of the patent period was not observed for the dog fed on bursa of Fabricius, animals fed on spleen and liver prepatent periods were 10 days respectively. The number of oocysts shed by dogs that fed on spleen and liver were 312,261 e 164,472 respectively in a total of 476,733 oocysts, while the puppy infected with sporulated oocysts orally, the total was 4,061 oocysts in its feces. The amount of oocysts shed by puppies fed on broilers chicks suggested that the prey-predator life cycle was the more important way of infection. No oocysts were observed in the feces of a puppy fed on broiler chicks free of coccidia. KEY WORDS. Cystoisospora ohioensis, carnivorism, oocysts, hypnozoites, dogs, chickens. RESUMO. O Cystoisospora ohioensis, parasito intestinal de cães foi observado em frangos sob a forma de cisto monozóico, sendo este considerado um novo hospedeiro. O objetivo deste estudo foi comparar as duas vias de infecção para cães por esse coccídio. Para tanto, foram removidos aos 35 dias após infecção * Aceito para publicação em 22 de abril de 2009. Sob os auspícios do CNPq 1 Médica-veterinária, MSc. Curso de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), BR 465, Km 07, Seropédica, RJ 23890-000, Brasil. E-mail: massadfv@yahoo.com.br 2 Biólogo, PhD. Departamento de Parasitologia Animal (DPA), Instituto de Veterinária (IV), UFRRJ. BR 465, Km 07, Seropédica, RJ 23890-000, Brasil. E-mail: leira@ufrrj.br 3 Médico-veterinário, PhD. Laboratório de Sanidade Animal, Centro de Tecnologia Agropecuárias, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Av. Alberto Lamego, 2000, Parque Califórnia, Campos dos Goytacazes, RJ 28013-602, Brasil. E-mail: foliveira@uenf.br bolsista CNPq. 4 Médico-veterinário, PhD, LD. DPA, IV, UFRRJ. BR 465, Km 7, Seropédica, RJ 23890-000, Brasil. E-mail: lopescwg@ufrrj.br bolsista CNPq Rev. Bras. Med. Vet., 31(2):75-79, abr/jun 2009 75

Fabiana Valadão Massad et al. (DAI), baço, fígado e bursa de Fabricius de dois frangos, um infectado experimentalmente com 10 4 oocistos esporulados de C. ohioensis e outro não infectado. A cada um dos três filhotes de cães livres de infecção as vísceras dos frangos foram servidas separadamente. Dois outros filhotes, também livres de infecção por coccídios foram inoculados, um com macerado de fígado, baço e bursa de Fabricius de um frango não infectado, e ao foi dado 10 4 oocistos esporulados de C. ohioensis, por via oral. Os cães alimentados com baço e fígado começaram a eliminar oocistos em suas fezes, no 10º DAI e o alimentado com bursa de Fabricius eliminou oocistos em suas fezes no 16º DAI. Apesar do período latente do cão alimentado com bursa de Fabricius não ter sido observado, a dos animais alimentados com baço e fígado foi de 10 dias. O número de oocistos de C. ohioensis em cães experimentalmente infectados com baço e fígado foi 312.261 e 164.472, respectivamente, num total de 476.733 oocistos nas fezes, enquanto que os inoculados com oocistos esporulados eliminaram em suas fezes 4.061 oocistos. A quantidade de oocistos eliminados pelos cães alimentados com vísceras de frangos pode sugerir que a relação presa-predador foi responsável por uma maior eliminação de oocistos nas fezes. O cão alimentado com macerado de vísceras de frangos livres de coccídios não eliminou oocistos nas fezes. PALAVRAS-CHAVE. Cystoisospora ohioensis, carnivorismo, oocistos, hipnozoítas, cão, frangos. 76 INTRODUÇÃO A Coccidiose tem sido considerada uma das protozooses mais importantes para cães e gatos, devido a sua frequência e patogenicidade (Rachman & Pollock, 1961). Duas espécies têm o cão como hospedeiro definitivo, Cystoisospora canis e C. ohioensis, e duas o gato, C. felis e C. rivolta (Smith, 1981). A disseminação das espécies deste gênero está associada com maior frequência a criações, onde a aglomeração, a falta de higiene e o manejo inadequados dos animais são fatores que facilitam a propagação do agente etiológico (Dubey, 1992; Loss & Lopes, 1992; Greene, 1993). Cystoisospora ohioensis é um parasito heteroxeno facultativo onde as suas formas teciduais são encontradas no jejuno, íleo, ceco e cólon do cão associado a um quadro clínico de diarréia com muco ou estrias de sangue, desidratação, anorexia e apatia (Dubey, 1978). Este parasito ao infectar seus hospedeiros intermediários apresenta um ciclo biológico caracterizado por cistos monozóicos viscerais (Dubey, 1979) ocorrendo principalmente no fígado, baço, placas de Peyer e linfonodos mesentéricos (Oliveira et al., 2001a). Associado a isto, o cão, possui um grande número de ciclos biológicos de protozoários nos quais ele está envolvido presumivelmente devido a seu hábito predatório (Robertson & Thompson, 2002). Este trabalho teve como objetivo determinar a importância de frangos como fonte de infecção de C. ohioensis para o cão. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado no Laboratório de Coccídios e Coccidose, Projeto Sanidade Animal (Embrapa/UFRRJ) e na Estação para Pesquisas Parasitológicas W. O. Neitz, Departamento de Parasitologia Animal, Instituto de Veterinária da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Para obtenção dos oocistos de C. ohioensis duas cadelas no terço final de gestação foram mantidas em baias individuais para cães, previamente higienizadas com uma mistura de partes iguais de hipoclorito de sódio, água e detergente neutro. A seguir, foi utilizada vassoura de fogo para limpeza de paredes e pisos. Durante a permanência destes animais nas baias foram oferecidas água e ração Kanina ad libitum. A seguir, exames de fezes foram realizados diariamente utilizando-se a técnica de centrífugo-flutuação conforme Figueiredo et al. (1984), quando se observou a presença de ovos de ascarídeos em uma das fêmeas, que foram tratadas com Anti-helmíntico Prapi Plus AP comprimidos, durante dois dias consecutivos e a terceira dose foi administrada após intervalo de 15 dias. Ambas as cadelas estavam negativas para coccídios, mas mesmo assim, por medidas profiláticas, foram tratadas, uma vez ao dia com Triglobe durante dez dias conforme Oliveira (2001). Após o tratamento e constatação de que ambas estavam livres de infecção, a realização do exame de fezes foi feito semanalmente compreendendo o período dos últimos dias que antecederam ao parto até o nascimento e desmame dos filhotes. Após o desmame cinco dos filhotes com 30 dias de idade, livres de coccídios, foram selecionados aleatoriamente e utilizados como hospedeiros definitivos no experimento. Dois frangos foram escolhidos aleatoriamente de um grupo de 100 frangos de corte da linhagem Ross, todos machos, provenientes de uma granja localizada no município de Resende, Estado do Rio de Janeiro, Rev. Bras. Med. Vet., 31(2):75-79, abr/jun 2009

O carnivorismo como fonte de infecção de Cystoisospora ohioensis (Apicomplexa: Cystoisosporinae) para cães foram inoculados quando tinham sete dias de idade, por via oral com auxílio de uma sonda orogástrica com 0,5ml contendo 10 4 oocistos esporulados de C. ohioensis. Esses frangos foram eutanasiados ao 35 0 DAI, conforme COBEA (2007). Apenas três dos filhotes de cães selecionados também aleatoriamente foram alimentados separadamente com baço, fígado e bursa de Fabricius, que foram individualmente pesados, totalizando um valor de 6,3; 134,0 e 14,0 g respectivamente para cada órgão dasavesinfectadas previamente com C. ohioensis. A seguir, baço, fígado e bursa de Fabricius de um dos frangos não infectados foram macerados em solução de NaCl a 0,9% utilizando-se grau e pistilo e dado a um 4º cão. Quanto ao 5º cão, este recebeu também, por via oral, 10 4 oocistos esporulados de C. ohioensis. Infecção de cães negativos e obtenção de oocistos de Cystoisospora ohioensis Após o preparo do material homogeneizado, 6,3 g de cada órgão foi acrescido de ração úmida marca Kanina e dada a cada um dos cães. O quarto animal foi utilizado como controle negativo. Após a inoculação dos animais, as fezes destes foram coletadas, sendo homogeneizadas, colocadas em dicromato de potássio a 2,5% e mantidas em frascos limpos e submetidos à aeração com auxilio de uma bomba de aquário, para acelerar o processo de esporulação. Análise laboratorial. Após a esporulação os oocistos e esporocistos num total de 30 foram mensurados para seu diâmetros maior (DM) e menor (dm) com auxílio de uma ocular micrométrica K-15X (PZO, Polônia) em um microscópio binocular (Carl Zeiss-RFA), e para o índice morfométrico foi utilizado a razão do DM/dm tanto para os oocistos esporulados como para os esporocistos. As medidas de tendência central utilizandas e o Teste t de Tukey foram realizadas com base em Sampaio (2002). RESULTADOS E DISCUSSÃO Após a inoculação dos cães com as vísceras de frangos ficou confirmada a presença de hipnozoítas e que estes realmente pertenciam ao gênero Cystoisospora, já que os cães inicialmente negativos para protozoários iniciaram a eliminação de oocistos nas fezes e, quando esporulados foram semelhantes ao descritos para C. ohioensis (Dubey & Melhorn, 1978; Dubey, 1992; Lindsay & Blagburn, 1994). Figura 1. Oocistos esporulado de Cystoisospora ohioensis. Solução saturada de açúcar ( = 10μm) Das fezes dos cães alimentados com baço e fígado de frangos infectados com 10 4 oocistos esporulados de C. ohioensis (Figura 1), foram recuperados oocistos a partir do 10º DAI, sendo este seu período pré-patente, não diferindo para ambos os órgãos. Já, o pico de eliminação para filhotes infectados com órgãos de frangos cronificados ocorreu no 11º DAI para ambos os órgãos, sendo a quantidade máxima de oocistos eliminados neste dia foi de 230.000 para o cão alimentado com baço e de 110.000 oocistos para o cão alimentado com fígado. Os resultados provenientes do animal infectado com a bursa de Fabricius dos frangos divergiram dos outros dois órgãos citados acima, já que este tivera período pré-patente de 16 DAI muito maior do que os resultados acima citados. A eliminação de oocistos pelos cães alimentados com baço e fígado, positivos para hipnozoítas (Figura 2), persistiu por sete dias Figura 2. Baço de um frango infectado com 10 6 oocistos esporulados de Cystoisospora ohioensis. A - Presença de hipnozoítos ( ) próximo a um capilar. 200X. B Detalhe da figura maior de A. 1000X. H.E. Rev. Bras. Med. Vet., 31(2):75-79, abr/jun 2009 77

Fabiana Valadão Massad et al. Tabela 1. Oocistos eliminados nas fezes de cães infectados experimentalmente com Cystoisospora ohioensis de acordo com a fonte de infecção. Origem do mate- Material Total de oocistos recuperados rial infectante infectado Carnivorismo Via oral Frango a Baço 312.261 - Fígado 164.472 - Bursa de Fabricius Não foi feito - Frango b Homogeneizado de Negativo - baço, fígado, e bursa de Fabricius Oocistos Oocistos esporulados - 4.061 esporulados Total de oocis- - 476.733 4.061 tos recuperados a Animal previamente inoculado com 10 4 oocistos esporulados. b Animal livre de coccídios. sendo esta a sua patência. Tanto os dados da patência como os da quantidade de oocistos eliminados para bursa de Fabricius não foi constatado por ter sido o seu período pré-patente tardio. Fato este, elucidado pela presença de hipnozoítas nos órgãos das aves infectadas aos 28 e 351º DAI. Mesmo tendo como semelhança a mesma via de infecção e ainda levando-se em consideração o fator comportamental, carnivorismo, na comparação da eficiência da forma de desenvolvimento do parasito estudado. De acordo com os hipnozoítas pelos dados obtidos por Oliveira et al. (2001b), os parâmetros biológicos não puderam ser comparados com os encontrados no presente estudo, pois a inoculação dos cães com cada órgão retirado dos camundongos cronificados não foi feito separadamente. Fato este ocorrido na inoculação de órgãos individuais dos frangos cronificados a diferentes cães, que não permitiu correlacionar o desenvolvimento biológico pela forma de hipnozoíto, resultante do parasitismo pela mesma espécie de coccídio, C. ohioensis, nos hospedeiros intermediários distintos. O total de oocistos eliminados nas fezes dos cães infectados com baço e fígado de frangos cronificados foi de 312.261 e 164.472 oocistos respectivamente dando um total de 476.733 oocistos (Tabela 1) quando comparado ao cão que recebeu 10 4 oocistos esporulados por via oral que resultou num total de 4.061. Fato este que evidencia a eficiência do carnivorismo quando comparada com a forma de infecção por oocistos esporulados. Além disso, Oliveira et al. (2001b) observaram também a eficiência dos hipnozoítas desta espécie, quando infectaram cães com homogeneizado de vísceras contendo baço, fígado e linfonodos mesentéricos de camundongos albinos cronificados com C. ohioensis, também no 35º DAI, quando contrastada com a infecção por oocistos esporulados. A caracterização da espécie baseou-se na mensuração dos oocistos esporulados (Tabela 2). Apesar da variação entre as medidas dos DM e dm Tabela 2. Medidas de oocistos esporulados de Cystoisospora ohioensis recuperados das fezes de cães infectados por via oral com homogeneizado de vísceras de frangos infectados experimentalmente com 10 4 oocistos esporulados. Órgãos Número de Oocistos Esporocisto formas Diâmetros (μm) Índice mor- Diâmetros (μm) Índicemormensuradas Maior Menor fométrico Maior Menor fométrico Baço 90 23,45±1,38 a 21,29±1,77 b 1,11±0,08 c 17,10±1,13 d 11,84±1,05 f 1,45±0,11 g Fígado 90 23,52±1,72 a 21,14±2,07 b 1,12±0,10 c 17,05±1,66 d 12,04±1,22 f 1,42±0,14 g Bursa de Fabricius 90 23,73±1,56 a 20,95±1,93 b 1,14±0,09 c 16,16±1,44 e 11,83±0,82 f 1,37±0,11 g Letras diferentes na mesma coluna indicam pd 0,001 pelo teste t de Tukey. 78 dos oocistos e esporocistos e seus respectivos IM, isto pode ser justificado com base em Long & Joyner (1984) e Magi et al. (1986) onde os autores destacam que o tamanho dos oocistos podem variar, entretanto seu IM tende a se manter constante. Além disso, as variações dos oocistos e esporocistos podem estar relacionadas à imunidade do animal, ao grau de infecção e também ao período de patência. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COBEA, Legislação & ética. Disponivel em: < http:// www.cobea.org.br/ética.htm>. Acesso em: 14 Mar 2007. Dubey, J.P. Life cycle of Isospora rivolta (Grasssi, 1879) in cats and mice. J. Protozool., 26:433-443 1979. Dubey, J.P. Toxoplasma, Hammodia, Besnoitia, Sarcocystis and other tissue cyst-forming coccidia of man and animals. In. Kreier, J.P. Protozoa. New York: Acedemic Press, 3:102-2-19, 1992. Dubey, J.P. Pathogenicity of Isospora ohioensis in dogs. Parasitology, 77:1-11, 1978. Dubey, J.P. & Melhorn, H. Extraintestinal stages of Isospora ohioensis from dogs in mice, J. Parasitol., 19:89-92, 1978. Figueiredo, P.C.; Serra-Freire, N.M. & Grisi, L. Eimerias de bovinos leiteiros no Estado do Rio de Janeiro: Técnica de diagnóstico e espécies identificadas. Atas Soc. Biol. Rio de Janeiro, 24:3-10. 1984. Greene, C.E. Enfermedades infecciosas en perros y gatos. Interamericana, Mexico. 1993. 1020p. Lindsay, D.S. & Blagburn, B.R. Biology of mammalian Isospora. Parasitol. Today, 10:214-220, 1994. Rev. Bras. Med. Vet., 31(2):75-79, abr/jun 2009

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