INFLUÊNCIA DA AMAMENTAÇÃO NO DESENVOLVIMENTO NEUROPSICOMOTOR DE BEBÊS PRÉ-TERMO Josy Paula Souza Vieira 1,4 ; Martina Estevam Brom Vieira 2,4 ; Patrícia D Angelles Pereira 2,4 ; Cibelle Kayenne Martins Roberto Formiga 3,4,5 ; Maria Beatriz Martins Linhares 5. 1 Bolsista PBIC/UEG 2 Voluntário Iniciação Científica PVIC/UEG 3 Pesquisadora Orientadora 4 Curso de Fisioterapia, Unidade Universitária de Goiânia, ESEFFEGO, UEG. 5 Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da Universidade de São Paulo, USP. RESUMO - O presente estudo visou comparar o desenvolvimento neuropsicomotor de recém-nascidos pré-termo quanto ao tipo de amamentação: leite materno exclusivo (LME) e leite artificial (LA). Foram selecionados 116 bebês pré-termo que freqüentaram o Ambulatório do Hospital Materno Infantil de Goiânia. Foram coletados dados do nascimento, tipo de amamentação e avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor de 5 a 6 meses de idade corrigida. Os lactentes foram divididos em grupo LME e grupo LA. Aplicou-se o Teste de Triagem de Denver II, que avalia quatro áreas: linguagem, pessoal-social, motricidade ampla e motricidade fina-adaptativa. Os bebês foram classificados em normal ou risco. Os dados foram analisados em termos descritivos. Verificou-se que as crianças do grupo LME obtiveram menor freqüência de risco no desenvolvimento em relação ao grupo LA nas seguintes áreas: pessoal-social (3% no LME e 7% no LA), motricidade ampla (40% no LME e 73% no LA) e avaliação global (43% no LME e 23% no LA). Quanto à motricidade fina e linguagem não houve diferença. Neste sentido, pode-se observar que o grupo de lactentes que foi nutrido com LME atingiram melhores resultados no teste de triagem quanto aos comportamentos motores, sociais e de forma global. Apesar dos limites quanto à generalização destes resultados, a pesquisa destaca a importância do incentivo dos profissionais de saúde para a prática do aleitamento materno a fim de prevenir atrasos no desenvolvimento destas crianças. Palavras-chaves: desenvolvimento neuropsicomotor; bebês pré-termo; tipo de amamentação. 1
Introdução Diversos são os benefícios da prática do aleitamento materno. A mãe, a criança, a família e a sociedade são beneficiadas com a promoção do aleitamento materno, pois este é um importante fator de redução da morbimortalidade infantil no primeiro ano de vida (Giugliani et al., 1995; Souza et al., 1991). E essa afirmação é confirmada por inúmeros estudos. Segundo Giugliani (1994), uma dessas pesquisas demonstrou que crianças não amamentadas apresentaram um risco 14,2 vezes maior de morrer por diarréia e 3,6 vezes mais chance de falecer por complicações respiratórias quando comparadas com crianças que foram alimentadas com leite materno exclusivo pelo menos até o seis meses de idade. A superioridade do leite materno deve-se a sua composição rica em nutrientes essenciais e em quantidade adequada para a criança, e por isso recomenda-se a alimentação exclusiva com o leite materno até os seis meses. Enfim, é um alimento perfeitamente adaptado ao metabolismo da criança e que proporciona proteção afetiva e imunológica necessárias (Costa et al., 1993; Leone et al., 1994). O recém-nascido pré-termo (RNPT) é aquele que nasceu com menos de 37 semanas gestacionais completas e, por isso, é mais propenso a apresentar complicações e seqüelas decorrentes dessa condição. Segundo Leone et al. (1994), pode-se aumentar o controle das intercorrências neonatais e a sobrevida dos RNPT fornecendo uma nutrição adequada aos mesmos nas primeiras semanas de vida. Por conseguinte, o leite materno de mães que tiveram bebês pré-termo apresenta maior adequação de composição para o seu bebê, com maior concentração de proteínas, gorduras e imunoglobulinas do que o de mães de RN a termo. A amamentação pode influenciar todos os sistemas da criança, agindo sobre o desenvolvimento motor, psicológico e neurológico da criança. Neste sentido, o objetivo do presente estudo foi descrever e comparar o desenvolvimento neuropsicomotor de bebês prétermo que foram amamentados exclusivamente com leite materno e daqueles amamentados apenas com leite artificial até os seis meses de idade cronológica. Material e Método a) Amostra: Inicialmente, foram selecionados 161 bebês pré-termo que freqüentaram o serviço ambulatorial do Hospital Materno Infantil de Goiânia-GO (HMI). Todas essas crianças foram consideradas de risco para atraso no desenvolvimento. Dessa amostra inicial, 119 (73,9%) das mães relataram que seus bebês eram amamentados com leite materno exclusivo (LME), 22 (13,7%) somente com leite artificial (LA) e 20 (12,4%) com leite materno e artificial associado (alimentação mista). Para o presente estudo foram excluídas as 2
crianças que tiveram a amamentação mista, aquelas com anomalias congênitas e síndromes genéticas e os bebês que não compareceram para a avaliação agendada no ambulatório ou que não puderam ser avaliados por motivos secundários. Portanto, a amostra final constituiu-se de 116 bebês com média de idade gestacional de 32 semanas e cinco dias (± 2 semanas) e média de peso ao nascer de aproximadamente 1.661g (± 442g), ou seja, baixo peso ao nascer. Esses lactentes foram divididos em dois grupos: grupo LME (leite materno exclusivo) e grupo LA (leite artificial). c) Local do Estudo: A coleta de dados foi realizada em um consultório do Ambulatório de alto Risco do HMI. A análise dos dados foi realizada no Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa (NIPE) da ESEFFEGO/UEG. b) Aspectos Éticos: A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do referido hospital e os pais ou responsáveis pelos menores autorizaram a participação dos mesmos por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e esclarecido. d) Materiais: Para a coleta dos dados foram utilizados os seguintes materiais e instrumentos: 1)Roteiro de anamnese para reunir informações sobre o período pré, peri e pósnatal de cada criança; 2) Prontuários para coleta de informações adicionais sobres os dados biológicos dos recém-nascidos; 3) Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, com informações necessárias para a compreensão do estudo e para autorização dos pais; 3) Fichas de Registro do Teste de Triagem do Desenvolvimento de Denver II (Frankenburg & Dodds, 1992) para a pontuação do desenvolvimento neuropsicomotor. O teste é um instrumento de avaliação norte-americano utilizado como procedimento de triagem para acompanhar o desenvolvimento de crianças de zero a seis anos de idade; 4)Equipamentos necessários para a avaliação: mesa com colchão de espuma firme para a colocação dos bebês e brinquedos maleáveis coloridos de diferentes tamanhos e alguns que emitam sons para aplicar e verificar a performance das crianças no teste. Para armazenamento e análise dos dados foi usado o programa Excel. e) Procedimentos: Após a orientação aos pais ou responsáveis sobre a pesquisa e o seu consentimento iniciaram-se as entrevistas com os mesmos a fim de colher dados biológicos sobre o bebê, sua mãe e o parto. Nessa anamnese a mãe ou responsável foi questionado em relação à lactação do bebê, e dos prontuários foram retiradas informações adicionais. O lactente foi avaliado, considerando sua idade corrigida, por um examinador treinado na aplicação do Teste de Triagem do Desenvolvimento de Denver II. Este teste avalia a criança em quatro áreas: linguagem, comportamento pessoal-social, motricidade ampla e 3
motricidade fina-adaptativa. Ao final da avaliação os bebês foram classificados em normal ou risco considerando a avaliação global e de acordo com cada área. Após a fase de coleta, os dados foram transformados em códigos e armazenados em planilhas do Excel onde foram analisados de acordo com a freqüência de risco ou normalidade nos dois grupos de bebês: grupo LME e grupo LA. Resultados e Discussão A amostra de 116 crianças foi dividida de acordo com o tipo de amamentação em dois grupos: grupo LME, constituído de 101 (87,1%) lactentes amamentados por leite materno exclusivo, e grupo LA, composto por 15 (12,9%) bebês alimentados por leite artificial. A Tabela 1 apresenta as características clínicas dos dois grupos. Tabela 1 Caracterização descritiva dos grupos caso (LA) e controle (LME) Variáveis Grupo LA Grupo LME Média DP Média DP Idade gestacional 31 semanas e 1 dia 2 semanas e 6 dias 33 semanas 2 semanas e 1 dia Peso ao nascer 1258 g 331g 1720,8 g 425,5 g Idade cronológica 7 meses e 13 dias 29 dias 6 meses e 21 dias 1 mês e 1 dia Idade corrigida 5 meses e 14 dias 17 dias 5 meses e 3 dias 20 dias De acordo com a avaliação do neuropsicomotora, os bebês foram classificados como apresentando desenvolvimento normal ou de risco. A distribuição das freqüências das classificações em normal e risco encontra-se apresentada na Tabela 2 (grupo LME) e Tabela 3 (grupo LA). Tabela 2 Freqüência das classificações nas áreas do Teste Denver II no grupo LME Freqüência da classificação do Grupo LME (n=101) Normal % Risco % Pessoal-social 98 97,0 3 3,0 Motor-fino 93 92,1 8 7,9 Linguagem 100 99,0 1 1,0 Motor-amplo 61 60,4 40 39,6 Total 57 56,4 44 43,6 Pela observação da Tabela 2, verifica-se que a maior freqüência de risco pelo teste de triagem Denver II foi na área do motor-amplo, com 39,6%. Quanto à avaliação global dos bebês do grupo LME 56,4% obtiveram classificação como normal e 43,6% como risco. 4
Tabela 3 Freqüência das classificações nas áreas do Teste Denver II no grupo LA Freqüência da classificação do Grupo LA (n=15) Normal % Risco % Pessoal-social 14 93,3 1 6,7 Motor-fino 14 93,3 1 6,7 Linguagem 15 100,0 1 0,0 Motor-amplo 4 26,7 11 73,3 Total 4 26,7 11 73,3 Como pode ser observado na Tabela 3, a área classificada com maior freqüência de risco pelo teste de triagem Denver II foi o motor-amplo, com 73%. Já as demais áreas foram mais freqüentes com desempenho normal, sendo 93% para o pessoal-social, 93% para o motor-fino adaptativo e 100% para linguagem. No entanto, quando analisada a avaliação global dos bebês deste grupo os mesmos foram considerados como risco com 73%. Comparando-se as freqüências dos dois grupos (LME e LA), verifica-se que o grupo LME obteve menor freqüência de risco no desenvolvimento em relação ao grupo LA nas seguintes áreas: pessoal-social (3% no LME e 7% no LA), motricidade ampla (40% no LME e 73% no LA) e avaliação global (43% no LME e 23% no LA). Quanto à motricidade fina e linguagem não houve diferença entre os dois grupos. Os resultados do presente estudo são concordantes com os resultados de uma recente pesquisa realizada nos Estados Unidos (Dee et al., 2007), na qual foram realizadas entrevistas com as mães sobre o desenvolvimento neuropsicomotor de seus filhos. Os resultados revelaram que as mães que não amamentaram seus bebês mostraram-se mais preocupadas em relação ao desempenho de suas crianças tanto no desenvolvimento da linguagem (expressiva e receptiva) quanto da motricidade ampla e fina. Portanto, os autores afirmam que esses achados, assim como os do presente estudo, sugerem que a amamentação pode estar relacionada a um melhor desempenho global da criança de tenra idade. Conclusões Os resultados mostraram que a não amamentação exclusiva no seio da mãe até seis meses de vida pode estar relacionada a atrasos no desenvolvimento da criança, principalmente em aspectos como a relação pessoal-social, habilidades manipulativas e grosseiras. E isso se torna mais preocupante quando se trata de bebês nascidos pré-termo e com baixo peso, os quais são considerados bebês risco e necessitam de maior atenção dos profissionais da saúde. 5
Apesar dos limites quanto à generalização destes resultados, a pesquisa aponta para os cuidados que devem ser tomados no acompanhamento de recém-nascidos de risco, principalmente os prematuros, em que os profissionais de saúde devem incentivar a prática do aleitamento materno para prevenir atrasos no desenvolvimento motor e mental destas crianças. Referências Bibliográficas Costa, M.C.O.; Figueiredo, E.C.; Silva, S.B. 1993. Aleitamento Materno: Causas de Desmame e Justificativa para Amamentar. Jornal de Pediatria, v.69, n3, pp.176-178. Dee, D.L.; Li, R.; Lee, L.; Grummer-Strawn, L.M. 2007.Associations Between Breastfeeding Practices and Young Children s Language and Motor Skill Development. Pediatrics, v.119, n.1, pp.92-98. Frankenburg, W.K; Dodds, J.; Archer, P.; Shapiro, H. & Bresnick, B. 1992. The Denver II: A Major Revision and Restandartization of the Denver Development Screening Test. Pediatrics, v.89, n.1, pp.91-97. Giugliani, E.R.J. 1994. Amamentação: Como e Por Que Promover. Jornal de Pediatria, v.70, n.3, pp.138-151. Giugliani, E.R.J.; Rocha, V.L.L.; Neves, J.M.; Polanczyk, C.A.; Seffrin, C.F.; Susin, L.O. 1995. Conhecimentos maternos em amamentação e fatores associados. Jornal de Pediatria, v.71, n.2, pp.77-81. Leone, C.R.; Ramos, J.L.A.; VAZ, F.A.C. 1994. O Recém Nascido Pré-termo. In: Marcondes, E. Pediatria Básica. 8.ed. São Paulo: Savier, pp.333-338. Souza, L.S.F.; Souza, E.L.S.; Barretto, M.R.R.; Ramos, R.T.T.; Macedo, J.J.B.; Serra, C.R.; Fernandes, C.E. 1991. Determinantes do Êxito do Aleitamento Natural. Jornal de Pediatria. v.67, n1/2, pp.42-50. 6