Regulação do serviço de resíduos sólidos em Portugal

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Transcrição:

Regulação do serviço de resíduos sólidos em Portugal Regulation of solid waste services in Portugal Pedro Simões Doutor em Engenharia e Gestão pelo IST, CEG-IST, Universidade Técnica de Lisboa Lisboa, Portugal. Artigo Técnico João Simão Pires Master of Business Administration pela Universidade de Rochester (EUA), Universidade Católica Portuguesa Lisboa, Portugal. Rui Cunha Marques Doutor em Engenharia Civil pelo IST, CEG-IST, Universidade Técnica de Lisboa Lisboa, Portugal. Resumo O manejo dos serviços de resíduos sólidos em Portugal, de modo atípico no plano internacional, é objeto de regulação econômica por parte de uma agência reguladora autônoma (Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos ERSAR). Além de suas atribuições enquanto regulador econômico, o progressivo reconhecimento da ERSAR tem sido alcançado por via de sua atividade quanto à regulação da qualidade de serviço. Por meio da aplicação ao universo de prestadores de serviço regulados de um conjunto de indicadores de desempenho, são comparados e publicitados anualmente os resultados relativos a cada prestador (regulação sunshine). Apesar da ausência de sanções formais e materiais na eventualidade de os níveis de desempenho se situarem aquém dos valores de referência preconizados pela agência reguladora, a aplicação do sistema ao longo dos últimos anos tem gerado evidência dos esforços dos prestadores na melhoria do seu desempenho nas áreas em que se apresentam mais frágeis. Consequentemente, este mecanismo de name and shame tem sido amplamente reconhecido pelos stakeholders do setor de resíduos português, bem como pela comunidade internacional, como um importante contributo para o desenvolvimento e melhoria contínua na prestação desses serviços públicos essenciais. Palavras-chave: Portugal; regulação econômica; resíduos sólidos; regulação sunshine. Abstract The management of solid waste services in Portugal, which is atypical at an international level, is subject to economic regulation by a regulatory agency (ERSAR). In addition to its responsibilities as economic regulator, the progressive recognition of ERSAR has been achieved through its role concerning the quality of service regulation. Through the application of a set of performance indicators to the universe of the regulated operators, the results are annually compared and publicized for each operator (sunshine regulation). Despite the absence of formal and material sanctions if performance levels are situated below the reference values recommended by the regulatory agency, over the past years the system has provided evidence of the efforts of the operators to improve their performance in fields that seem to be weaker. Consequently, this mechanism of name and shame has been widely recognized both by the stakeholders of the Portuguese waste sector and the international community as an important contribution to the development and continuous improvement in the provision of these essential public services. Keywords: Portugal; economic regulation; solid waste; sunshine regulation. Introdução No quadro dos serviços públicos essenciais, contrariamente a outras utilities (telecomunicações, eletricidade, distribuição de gás natural, saneamento...), são ainda raras as instâncias de nível internacional em que o serviço de manejo de resíduos sólidos é objeto de regulação explícita em matéria de preços e de qualidade de serviço. Entre os fatores explicativos para esse cenário contam-se: O fato de estes serviços serem tipicamente prestados por entidades públicas locais (municípios), cientes da sua autonomia legalmente consagrada (argumento da autorregulação ); O fato da adoção do princípio do usuário-pagador, principalmente no tocante à prestação deste serviço às famílias, ainda ser relativamente incipiente, sendo inclusive muito frequente a ausência de tarifação explícita deste serviço (sendo os seus custos cobertos por outras receitas locais). Endereço para correspondência: Rui Cunha Marques CEG-IST Avenida Rovisco Pais Código postal: 149-1 Lisboa, Portugal E-mail: rui.marques@ist.utl.pt Recebido: 13/2/12 Aceito: 27/5/13 Reg. ABES: 227 149

Simões, P.; Pires, J.S.; Marques, R.C. Assim, em um quadro no qual estes serviços são prestados diretamente pelos municípios (em conjunto com o exercício das suas demais competências), no qual não existe um apuramento autônomo dos custos incorridos com a sua prestação onde a sua prestação não é objeto de tarifação específica aos usuários, dificilmente se reúnem os fundamentos base para a introdução de mecanismos de regulação econômica sobre a sua prestação. No caso português, em uma primeira fase, a implementação de uma ambiciosa estratégia de infraestruturação do setor na vertente do tratamento, valorização e destino final iniciada nos anos 9 levou à constituição de prestadores de serviço em escala regional, os quais passaram a ter os municípios (que retiveram a responsabilidade pela vertente de coleta) como seus usuários, em uma relação de mútua exclusividade. A regulação dessa relação de monopólio de origem legal constituiu o primeiro mandato da agência reguladora portuguesa (Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos ERSAR). Em uma segunda fase, a evolução do quadro legislativo português veio a consagrar a aproximação da prestação do serviço de resíduos sólidos aos demais serviços de interesse econômico geral, materializada nos princípios de que a sua prestação deve ser objeto quer de apuramento autônomo dos custos com ela incorridos, quer da aplicação de tarifas aos usuários na medida certa do necessário para assegurar uma sustentável recuperação dos custos do serviço. É no quadro da implementação generalizada desses princípios que a agência reguladora viu o seu mandato recentemente alargado a todos os prestadores, independente de sua natureza administrativa. Após esta breve introdução, o presente artigo centra-se, na parte 2, na apresentação da organização do setor em Portugal. O item 3 descreve o modelo regulatório português aplicado ao serviço de manejo de resíduos sólidos. Por fim, são destacadas as principais conclusões. Organização do setor Na literatura internacional, os serviços de resíduos sólidos encontram-se estruturados em mercados primário, secundário e terciário (MASSARUTTO, 26). Enquanto o mercado primário refere-se aos serviços de coleta de resíduos sólidos, o mercado secundário compreende os serviços de tratamento, valorização e destino final desses resíduos. Por sua vez, o mercado terciário alude ao segmento de retoma e valorização de materiais aptos para reciclagem. No caso português, os serviços de resíduos sólidos têm sido classificados segundo as designações de serviços em alta (ou atacado) e serviços em baixa (ou varejo) (PÁSSARO, 23), consoante as atividades realizadas pelos vários prestadores. A componente no varejo abrange as atividades de coleta e transporte de resíduos (mercado primário), desempenhadas essencialmente pelos sistemas municipais. A componente no atacado é responsável pelo armazenamento, gerência, triagem, transporte, valorização e eliminação dos resíduos sólidos de origem doméstica, bem como outros resíduos que, por sua natureza e composição, sejam equiparados aos provenientes de habitações e cuja produção diária não exceda os 1.1 litros por produtor (mercado secundário). A maioria dos prestadores de serviços de resíduos sólidos no varejo é de âmbito municipal, sob a forma de gerência direta (serviços municipais ou serviços municipalizados) ou por meio de empresas municipais. Os serviços municipalizados são serviços municipais com alguma autonomia (administrativa e financeira). É nesse mercado que se tem observado a proliferação do setor privado, sobretudo por intermédio de contratos de curta duração. As associações de municípios e empresas intermunicipais são outro tipo de modelo de gerência com algum peso na prestação destes serviços. No Quadro 1, apresentam-se os prestadores de serviços de resíduos no varejo. Inicialmente, o mercado secundário em Portugal compreendia os lixões como único e exclusivo método de deposição de resíduos, cuja erradicação concluiu-se no início de 22. Assim, o destino final dos resíduos sólidos em Portugal passou a ser, preferencialmente, o aterro sanitário. Essa alteração de paradigma no nível do tratamento de resíduos suscitou, de igual modo, uma mudança do modelo de gerência por meio da criação de prestadores plurimunicipais (MARINHO; DIDELET; SEMIÃO, 26), com vista a permitir o aproveitamento de economias de escala na implantação de novas tecnologias e infraestruturas de manejo de resíduos, permanecendo na esfera municipal a responsabilidade pela sua coleta. Atualmente, operam em Portugal 12 sistemas multimunicipais, controlados pelo grupo estatal Águas de Portugal (AdP) por intermédio da sub- -holding Empresa Geral de Fomento (EGF), dedicada ao setor do ambiente, e 11 sistemas intermunicipais, integrados na Associação de Empresas Gestoras de Sistemas de Resíduos (EGSRA), uma associação de prestadores de serviço constituída em 29 para os representar. O Quadro 2 apresenta os prestadores de serviços de resíduos sólidos no atacado. A Figura 1 apresenta a distribuição geográfica dos prestadores de serviços de resíduos sólidos no atacado. A Figura 2 apresenta a dimensão em termos de resíduos sólidos tratados nos sistemas no atacado em Portugal. Em relação à valorização dos resíduos de embalagens (mercado terciário), encontra-se implantado o Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens (SIGRE), por meio do qual a Sociedade Ponto Verde (SPV), uma sociedade privada sem fins lucrativos, garante a retoma, valorização e reciclagem de resíduos de embalagem. Em termos de infraestruturas e equipamentos de manejo de resíduos sólidos, em 21, encontravam-se em exploração no país 38.154 ecopontos, 189 ecocentros, 29 estações de triagem, 81 estações de transferência, 9 unidades de valorização orgânica, 2 unidades de incineração com valorização energética e 34 aterros. Os prestadores concessionários contribuem com 6% das infraestruturas existentes, sendo que detêm 23.89 ecopontos, 89 ecocentros, 18 estações de triagem, 5 estações de transferência, 6 unidades de valorização orgânica, uma central de incineração com valorização energética e 22 aterros (ERSAR, 211). 15

Regulação de resíduos Regulação do setor dos resíduos sólidos Entidades com competências regulatórias Atualmente, o setor dos resíduos sólidos em Portugal encontra-se regulado por duas entidades distintas. A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) é a Autoridade Nacional de Resíduos e tem como competências desenvolver e acompanhar a execução das estratégias de manejo de resíduos. Exerce as competências próprias de licenciamento das operações de manejo de resíduos e dos prestadores com fluxos específicos de resíduos e de controle operacional e administrativo das transferências de resíduos. Segundo o Artigo nº 3, da portaria nº 29-B/98, os embaladores e/ou os responsáveis pela colocação de produtos no mercado nacional devem comunicar, anualmente, à APA os dados estatísticos referentes às quantidades de embalagens reutilizáveis e não reutilizáveis, às quantidades de embalagens usadas efetivamente recuperadas e reutilizadas e ainda às quantidades entregues a entidades que se responsabilizem por sua valorização ou eliminação. Segundo o Artigo nº 6 da mesma portaria, os responsáveis pela colocação de embalagens no mercado são responsáveis pela manejo e destino final dos seus resíduos de embalagens, podendo transmitir a sua responsabilidade a um prestador ou adotar um sistema de consignação que deverá ser aprovado pela APA. Qualquer prestador que tenha a seu cargo o manejo de resíduos de embalagens necessita de licença que é concedida por Quadro 2 Prestadores de serviços de resíduos sólidos no atacado em 211. Modelo de gerência Associações / Serviços intermunicipais Concessionárias multimunicipais Prestadores Coleta de indiferenciados Coleta seletiva AMCAL Não Não LIPOR Não Não RESITEJO Não Sim ALGAR Não Sim AMARSUL Não Sim BRAVAL Não Sim ERSUC Não Sim Empresas municipais e intermunicipais RESIESTRE- LA Não Sim RESINORTE Não Sim RESULIMA Não Sim SULDOURO Não Sim VALNOR Não Sim VALORLIS Não Sim VALORMI- NHO Não Sim VALORSUL Não Sim Concessionária municipal FOCSA Sim Não Empresas municipais e intermunicipais Fonte: ERSAR (211). AMBILITAL Não Sim AMBISOUSA Não Não ECOBEIRÃO Sim Sim Ecolezíria Não Sim GESAMB Não Sim Resialentejo Não Sim TRATOLIXO Não Sim Quadro 1 Prestadores de serviços de resíduos sólidos no varejo em 211. Modelo de gerência Associações/Serviços intermunicipais Serviço municipalizado Serviço municipal Fonte: ERSAR (211). Prestador Associação de Municípios do Douro Superior de Fins Específicos Coleta de indiferenciados Sim Coleta seletiva Não AGERE Sim Não Águas da Covilhã Sim Sim EAmb Esposende Ambiente, EEM Sim Não EMAC Sim Sim EMAR de Vila Real Sim Não EMARP Portimão Sim Não EPMAR Vieira do Minho Sim Não FAGAR Faro Sim Não HPEM Higiene Pública Sim Não INFRAMOURA Sim Não INOVA Sim Não Maiambiente Sim Sim Resíduos do Nordeste Sim Sim Tavira Verde Sim Não TROFÁGUAS Sim Não SM de Abrantes Sim Não SM de Aveiro Sim Não SM de Castelo Branco Sim Não SM de Loures Sim Sim SMAES de Santo Tirso Sim Não SMSB de Viana do Castelo Sim Não 23 Câmaras Municipais Sim Sim 28 Câmaras Municipais Sim Não 151

Simões, P.; Pires, J.S.; Marques, R.C. ALGAR AMARSUL AMBILITAL AMBISOUSA AMCAL BRAVAL ECOBEIRÃO ECOLEZÍRIA ERSUC GESAMB LIPOR RESIALENTEJO RESIESTRELA RESINORTE RESITEJO RESULIMA Resíduos do Nordeste/ FOCSA SULDOURO TRATOLIXO Associações/Serviços intermunicipais Concessionárias Multimunicipais Empresas Municipais e Intermunicipais VALNOR VALNORLIS VALORMINHO VALORSUL Fonte: ERSAR (211). Figura 1 Distribuição geográfica dos prestadores de serviços de resíduos sólidos no atacado. Sistemas plurimunicipais em Portugal Continental (211) Amcal Valorminho Resialentejo Resíduos do Nordeste/ FOCSA Ecolezíria Ambilital Resiestrela Gesamb Resitejo Valorlis Braval Ecobeirão Ambisousa Resulima Valnor Suldouro Tratolixo Resinorte (R s) Ersuc Algar Lipor Amarsul Valorsul 2 4 6 8 toneladas de resíduos tratados (24 29) Figura 2 Escala de operação dos sistemas de manejo de resíduos sólidos no atacado. 152 1. 1.2

Regulação de resíduos decisão conjunta dos Ministros da Economia e do Ambiente. A responsabilidade do prestador pela retoma e valorização de resíduos de embalagens é assumida por meio de contratos com os municípios ou com as empresas gestoras de sistemas multimunicipais ou intermunicipais às quais tenha sido atribuída a concessão da coleta seletiva e triagem e com as organizações de fornecedores e transformadores de materiais de embalagem criadas ou a criar para assegurar a retoma e valorização dos materiais recuperados. O prestador fica, assim, obrigado a entregar às entidades licenciadoras um relatório anual de atividade. Sob o ponto de vista da regulação da qualidade de serviço e econômica, a ERSAR tem um papel preponderante. Em uma primeira fase, a ERSAR, criada em 1998 pelo Decreto-Lei nº 362/98, de 18 de novembro, é constituída com atribuições limitadas a conceção, execução, manejo e exploração dos sistemas multimunicipais e municipais concessionados (considerando apenas 17 prestadores de serviços). Recentemente, o Decreto-Lei nº 277/29, de 2 de outubro, aprovou a nova orgânica da ERSAR, alargando o seu âmbito de intervenção a todas os prestadores destes serviços, independente do modelo de gerência, bem como uma maior uniformidade de procedimentos do organismo regulador. Todos os serviços municipais e municipalizados passam, assim, a ser regulados (economicamente) pela ERSAR por intermédio de um mecanismo de supervisão das tarifas (no caso das concessões, delegações e parcerias) e verificação tarifária por amostragem (nos serviços municipais e municipalizados). Para além das atribuições de regulador das áreas econômicas e da qualidade do serviço no setor de águas e resíduos, esse decreto prevê também como atribuições da ERSAR exercer as funções de autoridade competente para a qualidade da água para consumo humano junto de todos os prestadores do serviço de abastecimento de água, assegurar a regulação estrutural do setor e promover a comparação e divulgação pública por meio de relatórios periódicos. Qualidade de serviço Um dos principais objetivos (e resultados) da regulação praticada pela ERSAR consiste na melhoria da qualidade do serviço. A ERSAR recorre, para esse efeito, a um conjunto de indicadores de desempenho que publica no seu relatório anual. Esses indicadores medem a eficiência e eficácia dos prestadores relativas a aspectos específicos da atividade desenvolvida ou do comportamento do sistema (BAPTISTA; PÁSSARO; SANTOS, 23). A ERSAR implementou um conjunto de 2 indicadores de desempenho divididos em 3 grupos, nomeadamente, os relativos à defesa dos interesses dos usuários, à sustentabilidade do prestador e à sustentabilidade ambiental. A ERSAR, em adição ao que lhe compete e por meio do seu relatório anual, avalia-se e emite algumas observações relativas ao resultado de cada indicador por prestador (SIMÕES; WITTE; MARQUES, 21). Essa avaliação é exercida segundo um sistema de classificação que compara o valor obtido com o correspondente valor de referência. Os valores de referência são valores ótimos, ou próximo disso, que o regulador considera como razoáveis de atingir para os prestadores regulados. Por fim, a ERSAR classifica qualitativamente o desempenho de cada prestador, levando em conta a qualidade do serviço prestado, se insatisfatória, mediana ou boa (pela atribuição de uma bola vermelha, amarela ou verde, respetivamente), mediante a discrepância entre o resultado obtido pelo indicador e o intervalo de valores de referência (MARQUES & SIMÕES, 28). O Quadro 3 apresenta o resultado dos indicadores de desempenho utilizados pela ERSAR, bem como o respectivo patamar definido como desempenho mediano. A Figura 3 apresenta a evolução dos principais indicadores de desempenho da ERSAR. A ERSAR adotou a regulação sunshine como um dos seus instrumentos principais de regulação (MARQUES, 26). Para esse efeito, a ERSAR reúne em um relatório anual os resultados do desempenho dos prestadores. A elaboração desse documento inclui uma avaliação conjunta do desempenho, na qual são efetuadas comparações entre os prestadores e uma avaliação individual do desempenho de cada prestador qualitativa e quantitativamente. A consciencialização dos prestadores pretendida pela ERSAR (e o consequente sucesso do modelo adotado) é obtida por pressão dos usuários e dos cidadãos em geral, por seus grupos de defesa e representação, como os media, a classe política (Governo e partidos políticos) e as Organizações Não Governamentais (SIMÕES & MARQUES, 29). O fraco desempenho dos prestadores tem como consequência o seu constrangimento perante os diversos stakeholders e, por conseguinte, estas terão maior propensão a corrigir os desvios manifestados. Embora este método não fixe tarifas e o seu poder coercivo seja limitado, a exposição e a discussão pública do comportamento do regulado desencadeia efeitos bastante positivos, introduzindo competitividade entre os prestadores regulados e conduzindo a um aumento progressivo do desempenho no setor (MARQUES, 25). Paralelamente, a ERSAR promove prêmios de incentivo e divulga as melhores práticas com base em exemplos de prestadores de serviços no sentido de dinamizar e impulsionar a procura pela eficiência e excelência no setor dos resíduos sólidos. Preços e tarifas A regulação econômica é tomada como a mais importante forma de regulação dos comportamentos permitidos aos prestadores de serviços, tendo em conta que os preços de monopólio tendem a ser mais elevados do que os preços resultantes de mercados concorrenciais. As atribuições da ERSAR, nesta matéria, conforme salientado, foram recentemente alargadas a todos os modelos de gerência de resíduos. Todavia, toda essa reforma carece ainda de maturação, porque ainda subsistem distintos modos de estabelecimento de tarifas mediante o seu manejo e organização, a saber, gerência por 153

Simões, P.; Pires, J.S.; Marques, R.C. 12 Cobertura de serviço 1 Resposta a reclamações 9 8 6 6 3 4 2 24 25 26 27 28 29 21 RU1 (%) 14 1 1 1 1 1 1 dru12 (t) 3 353 216 2 985 354 3 267 755 3 248 821 3 246 149 3 31 648 3 541 389 dru8 (t) 3 243 4 2 986 917 3 268 867 3 249 516 3 246 288 3 31 65 3 541 389 EG 17 17 17 17 16 18 14 24 25 26 27 28 29 21 RU4 (%) 41 89 92 97 96 97 97 dru9 (n.º/ano) 175 144 175 425 419 413 566 dru1 (n.º/ano) 429 162 191 436 438 426 584 EG 13 13 13 14 13 13 12 1, Reciclagem 1 Deposição em aterro 8, 8 6, 6 4, 4 2, 2, 24 25 26 27 28 29 21 RU8 (%) 4,4 6, 6,4 7,3 7,7 8,5 8,5 dru14 (t) 14 149 179 438 195 348 223 234 25 236 265 689 296 73 dru12 (t) 3 353 216 2 985 354 3 267 755 3 248 821 3 246 149 3 31 648 3 483 82 EG 17 16 16 16 16 17 13 24 25 26 27 28 29 21 RU11 (%) 74 9 88 78 75 72 74 dru17 (t) 2 572 256 2 674 779 2 71 312 2 52 563 2 446 338 2 395 25 2 635 2 dru12 (t) 3 353 216 2 985 354 3 267 755 3 248 821 3 246 149 3 31 648 3 541 389 EG 17 17 17 17 16 18 14 Fonte: ERSAR (211). Figura 3 Exemplos de indicadores da Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos (ERSAR). Quadro 3 Indicadores de desempenho para o manejo de resíduos sólidos. Indicadores de desempenho Mediano 24 25 26 27 28 29 21 Defesa dos interesses dos usuários Cobertura do serviço (%) 9 95 1 1 1 1 1 1 1 Cobertura da coleta seletiva (%) 67 77 Preço médio do serviço ( /t) 2 35 26,6 24,6 26,6 26,7 25,1 25, 24,4 Resposta a reclamações escritas (%) 9 95 41 89 92 97 96 97 97 Sustentabilidade do prestador Rácio de cobertura dos custos operacionais (-),9 1,5 1,5 1,58 1,65 1,6 1,58 1,56 1,46 Custos operacionais unitários ( /t) 24 31 21,6 22,6 25,36 25,64 27,7 28,2 31,2 Rácio de solvabilidade (-),15,2,19,51,55,59,64,64,39 Reciclagem (%) 4,1 6 6,4 7,3 7,7 8,5 8,5 Valorização orgânica (%) 2,8 2,9 1,5 2,5 5, 7, 9, Incineração (%) 65 7 66,1 82 79 68 62 7,3 57, Deposição em aterro (%) 74,5 89,6 88 78 75 72 74 Utilização da capacidade de encaixe anual de aterro (%) 1 11 128 116 121 122 117 94 94 Avarias em equipamento pesado (nº/1 3 t/ano),5,8,17,16,14,15,15,16,17 Caracterização dos resíduos (-),5 1, 1,5 2,8 2,3 1,7 2,8 2, 2,5 Recursos humanos (nº/1 3 t/ano) Sustentabilidade ambiental,2,3 e,6,7,35,46,49,52,55,58,63 Análises realizadas nos lixiviados (%) 9 95 9 8 96 96 98 98 98 Qualidade dos lixiviados após tratamento (%) 75 95 86 79 87 89 88 89 84 Utilização de recursos energéticos (kwh/t) -66,5-9,4-87,9-73,9-84 -88,2-88,4 Qualidade das águas subterrâneas (%) 75 95 84 97 9 84 9 9 86 Qualidade das emissões para o ar (%) 75 95 99,8 99,5 1 1 1 1 99 154

Regulação de resíduos administração autárquica ou indireta (serviços municipais e serviços municipalizados) e por gerência delegada (empresas municipais e sistemas municipais) e prestadores concessionários (sistemas multimunicipais). Em relação aos serviços municipais, aos serviços municipalizados e aos diferentes modelos de empresas municipais, as atribuições da ERSAR encontram-se ainda em fase de implementação. Os sistemas tarifários são ainda aprovados pelo respetivo órgão municipal competente, neste caso a Assembleia Municipal. Esta é per si a principal razão pela grande variabilidade de sistemas tarifários do serviço de resíduos sólidos, não só pelo modo como são cobrados, mas também pelos correspondentes valores. O retorno do serviço permanece, usualmente, discriminado na fatura da água, sendo definido um tarifário bipartido (parcela fixa e parcela variável). Porém, também pode ser estabelecida em função da frequência da remoção, das características do município (e.g. área), do sistema de remoção (e.g. sistema de remoção porta a porta ou por pontos) ou das características dos fogos. Todavia, as recomendações tarifárias da ERSAR (apesar de não vinculativas) têm contribuído para uma uniformização dos sistemas tarifários em nível nacional. Na Figura 4 encontra-se ilustrada a distribuição nacional (38 municípios) do encargo para os usuários domésticos e não domésticos com o serviço de manejo de resíduos sólidos. Os tarifários dos serviços de manejo de resíduos sólidos (em 211) caracterizam-se assim por: Uma disparidade tarifária ainda bastante significativa. Por exemplo, nos municípios onde o serviço é cobrado, para uma utilização doméstica de 12 m 3 de água por ano, o encargo máximo (cerca de 1) é 3 vezes superior ao encargo mínimo (cerca de 3); Existem ainda 33 municípios onde o serviço não é cobrado. Apesar das dificuldades na definição de uma estrutura tarifária que incida sobre a utilização do serviço, nesses municípios deverá existir uma tendência para repercutir os custos incorridos com a prestação dos serviços sobre os usuários dos serviços de modo que fosse garantida a sua sustentabilidade. Nos sistemas municipais concessionados, as tarifas são definidas no contrato de concessão outorgado entre o concedente (Câmara Municipal ou Associação de Municípios) e o concessionário. A fixação de tarifas é estabelecida na proposta de licitação pública, tendo em conta o enquadramento legal. A ERSAR não pode interferir diretamente na fixação da tarifa, a não ser que o equilíbrio econômico-financeiro da concessão seja colocado em causa, por motivos não previstos, no momento da realização do contrato. Nessa circunstância, a ERSAR já pode ser chamada a se pronunciar. Nos sistemas multimunicipais, a ERSAR tem outros tipos de poderes, sendo solicitada para emitir pareceres sobre os sistemas tarifários propostos, apoiando-se em um programa de investimentos pré-definido à data da realização do contrato de concessão e revisto periodicamente, sobre o relatório anual das empresas e o respetivo orçamento. A formulação de definição do sistema tarifário proposto nos contratos de concessão dos sistemas multimunicipais consiste em uma metodologia híbrida, tendo sido assente no método de regulação por taxa de retorno estabelecido contratualmente e introduzindo-lhe um mecanismo de repartição de ganhos de produtividade à cabeça. Dessa forma, tomando como base os contratos de concessão já outorgados, a taxa de retorno é fixada pelo concedente pelo patamar de um indexante (sem risco) + 3%. O valor de 3% constitui o risco associado à exploração do empreendimento. A taxa de retorno, por conseguinte, só pode ser alterada se ocorrer variação da taxa base ou se for revisto o prémio de risco. A Figura 5 apresenta o atual processo de definição de tarifas pela ERSAR (RUIVO, 21). Em 211, a maioria dos prestadores de serviços de resíduos (de natureza supramunicipal) encontra-se em uma situação econômica e financeira muito robusta, com resultados superiores aos definidos nos contratos de concessão, acumulando resultados em excesso sobre a forma de resultados transitados que permitem atingir níveis de capitalização apreciáveis, conforme sintetiza a Figura 6. Os resultados em excesso representam mais de dois terços do capital acionista investido e o retorno dos acionistas encontra-se assegurado. Atendendo aos legítimos interesses dos usuários destes serviços prestados em regime de monopólio, no período 24 29, da intervenção do regulador têm resultado tarifas sempre significativamente inferiores às propostas pelos prestadores, conforme se observa na Figura 7. Nesse âmbito, a intervenção da ERSAR tem se focalizado na correção de práticas de sobreorçamentação e assegurar que os resultados em excesso são repercutidos em benefício dos usuários dos serviços. 16, 14, 12, 1, 8, 6, 4, 43,14 32,76 2, 23,59, 6 m 3.ano -1 12 m 3.ano -1 18 m 3.ano -1 Figura 4 Encargos dos usuários domésticos com o serviço de resíduos sólidos para vários níveis de consumo de água ( /ano). 155

Simões, P.; Pires, J.S.; Marques, R.C. Entidade titular (Ministro da área do Ambiente) Pedidos de parecer Pareceres não vinculativos Indiretamente Diretamente Pedidos de aprovação Acionistas Entidade reguladora (ERSAR) Prestadores concessionárias Consumidores e associações de consumidores Usuários Decisões Orgãos de comunicação social Figura 5 Processo de definição de tarifas. Milhares de euros 14 12 1 Resultados em excesso (+51,3) 124,6 122,2 8,% 6,% 8 6 4 2 73,3 Capital acionista remunerado R Situação líquida R Posição acionista R Figura 6 Situação dos prestadores de serviços de resíduos. 4,% 2,%,% 7,% tarifária proposta (%) Intervenção ERSAR (-5,3 p p) 1,7% tarifária autorizada (%) Média aritmética das taxas da inflação 24-9 1,9% Nota: As percentagens apresentadas correspondem À média aritmética das variações tarifárias Figura 7 Influência da Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos (ERSAR) nas tarifas dos prestadores de serviços de resíduos no atacado. Conclusões A intervenção da ERSAR no setor de manejo de resíduos sólidos tem sido preponderante na melhoria da qualidade de serviço prestado (no atacado) e na garantia da sustentabilidade econômico-financeira dos prestadores dos serviços. Além disso, a sua atipicidade e implementação do modelo de regulação sunshine tornam a sua atividade um caso de sucesso. Importa aqui salientar a importância vital da reintrodução de adequados mecanismos de incentivo à eficiência e melhoria contínua no quadro de regras aplicáveis a esses prestadores, como forma de alinhar os interesses do seu manejo com os legítimos interesses dos usuários destes serviços. No tocante ao sistema de regulação sunshine aplicado pela ERSAR ao universo dos prestadores de serviço no atacado por si regulados, tecem-se as seguintes conclusões: 156

Regulação de resíduos A sua aplicação ao longo dos últimos cinco anos tem constituído um importante estímulo à melhoria do desempenho dos prestadores, como evidencia a evolução dos resultados atingidos; As iniciativas complementares desenvolvidas, como a atribuição pública de prêmios de qualidade do serviço, feita anualmente ao prestador que, seja em termos absolutos ou em termos de melhoria evidenciada ao longo do tempo mereça ser distinguido, contribuem igualmente para o reforço da notoriedade pública do sistema; A universalização da aplicação deste sistema encontra-se em curso antevendo-se que em 212 seja já apurada e divulgada publicamente informação relativa a todo o universo de prestadores de serviços de manejo de resíduos sólidos a operar em Portugal. No tocante ao alargamento das suas funções de regulação econômica ao vasto universo de prestadores de serviço no varejo, o desafio em curso afigura-se substantivo atendendo: Ao número de prestadores de serviço abrangidos (quase 3); À incipiência de práticas de apuramento dos custos específicos incorridos com este serviço, principalmente por parte dos municípios que o gerem diretamente; À dificuldade na implementação de práticas universalizadas e sistemáticas de relato de informação tarifária e financeira à agência reguladora em moldes que permitam uma análise célere e eficaz. Por último, advoga-se que, mesmo em contextos em que não exista uma regulação econômica explícita da prestação destes serviços, a introdução de um sistema de regulação sunshine, protagonizado por entidade pública ou por uma associação de prestadores de serviço, constitui uma iniciativa de elevado retorno em termos da promoção da transparência e do estímulo a uma melhoria contínua na prestação destes serviços públicos essenciais. Referências BAPTISTA, J.; PÁSSARO, D.; SANTOS, R. (23). As Linhas Estratégicas do Modelo de Regulação a Implementar pelo IRAR. In: Entidade Reguladora de Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR). Lisboa, Portugal. PORTUGAL. Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR). Relatório Anual do Sector de Águas e Resíduos em Portugal. Lisboa, Portugal, 211. Disponível em: www.ersar.pt. MARINHO, A.; DIDELET, F.; SEMIÃO, V. (26) Municipal Solid Waste Disposal in Portugal. Waste Management, v. 26, n. 12, p. 1477-1489. MARQUES, R. (25). Regulação de Serviços Públicos. Lisboa: Edições Sílabo. MARQUES, R. (26) A yardstick competition model for Portuguese water and sewerage services regulation. Utilities Policy, v. 14, n. 3, p. 175-184. MARQUES, R.; SIMÕES, P. (28) Does the sunshine regulation approach work? Governance and regulation model of the urban waste services in Portugal. Resources Conservation and Recycling, v. 52, n. 8-9, p. 14-149. MASSARUTTO, A. (26). Waste management as a service of general economic interest: is the self-sufficiency principle still justified? Working Paper Series in Economics. Universitá di Udine and Iefe, Udine, Italy. PÁSSARO, D. (23) Report: waste management in Portugal 1996 and 22. Waste Management, v. 23, n. 1, p. 97-99. RUIVO, A. (21). A intervenção regulatória nas entidades gestoras concessionárias de sistemas multimunicipais de águas e resíduos vertente económica. In: Encontro Nacional de Saneamento Básico, 14ª, 26 a 29 de outubro de 21. Portugal. SIMÕES, P.; WITTE, K.; MARQUES, R. (21) Regulatory Structures and Operational Environment in the Portuguese Waste Sector. Waste Management, v. 3, n. 6, p. 113-1137. SIMÕES, P. & MARQUES, R. (29) Avaliação do desempenho dos serviços de resíduos urbanos em Portugal. Engenharia Sanitária Ambiental, v. 14, n. 2, p. 285-294. 157