AVALIAÇÃO E ANÁLISE DE ERROS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

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Transcrição:

In: II Jornada Nacional de Educação Matemática, 2008, Passo Fundo. Anais. CD-ROM. AVALIAÇÃO E ANÁLISE DE ERROS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA Helena Noronha Cury * RESUMO Neste texto, são apresentadas algumas considerações sobre a avaliação da aprendizagem escolar e a análise de erros cometidos por estudantes, enfatizando o fato de que não são processos semelhantes, pois é possível avaliar sem fazer uma pesquisa sobre os erros, bem como analisar os erros sem a preocupação com a avaliação do desempenho do estudante. A seguir, é destacada uma proposta de pesquisa realizada a partir de dados coletados em uma avaliação de aprendizagem de alunos de Análise Combinatória, enfocando a possibilidade de trabalho conjunto entre professor e pesquisador, cada um aproveitando os elementos desenvolvidos pelo outro. Após a análise quantitativa das respostas de cada questão escolhida para análise, são apresentados exemplos de resposta e, ainda, uma sugestão de elaboração de de material instrucional para auxiliar o professor e os estudantes a superarem dificuldades de aprendizagem dos conceitos. Palavras-chave: Avaliação. Análise de erros. Educação Matemática INTRODUÇÃO Quando mencionamos a análise dos erros cometidos por estudantes de Matemática, em qualquer nível de ensino, os ouvintes ou leitores, em geral, associam o termo à avaliação da aprendizagem. No entanto, é possível tratar separadamente cada tema ou apontar seus pontos de contato, sem, necessariamente, entender que analisar erros implica em avaliar o aluno. A produção em análise de erros já é bastante variada, tanto em nível internacional como nacional. Pesquisadores trabalham sobre erros cometidos por estudantes na resolução de questões de Matemática, porém muitas vezes não há indicação de que o objetivo específico da pesquisa é a análise desses erros. Em algumas vezes, há a preocupação com os procedimentos adotados pelos alunos, em outras, o professor está interessado em avaliar a utilização de uma nova metodologia, em outras vezes, ainda, o propósito é avaliar, especificamente, a aprendizagem de um determinado tópico. A análise de erros pode ser considerada uma metodologia de pesquisa, no sentido de que pode fornecer ao professor de sala de aula, especialmente ao que não está envolvido em * Professora aposentada da PUCRS

pesquisas na academia (ao professor da educação básica, que se preocupa com os erros dos alunos, ao licenciando em Matemática, que precisa se dar conta de que alguns erros são resistentes, etc) uma sistemática de investigação que se aproxima daquela usada em pesquisas acadêmicas, ou seja, ele vai ter as suas questões ( por que meu aluno comete tal erro? ), vai se preocupar em coletar os dados, em analisar e em buscar entender as causas, para poder replanejar suas aulas. De certa forma, essa idéia está próxima a do professor pesquisador da sua própria prática. Por outro lado, a análise de erros pode ser considerada uma metodologia de ensino, visto que, ao devolver para os alunos as questões analisadas detalhadamente, o professor lhes proporciona a oportunidade de se conscientizar das suas dificuldades e de discuti-las com ele ou com seus colegas. Além disso, o próprio professore pode, a partir dos erros mais freqüentes, elaborar materiais instrucionais que venham auxiliar os estudantes a superarem os problemas encontrados. Borasi (1996) aponta possibilidades para o trabalho com erros, em especial para aceitá-los e verificar se há casos em que os resultados incorretos se aplicam. Dessa forma o estudante é confrontado com o próprio erro e tem suas convicções desestabilizadas, o que é um primeiro passo para buscar novas formas de resolver um problema. A mesma autora, ao apresentar as alternativas para o uso dos erros eliminação ou exploração e descoberta, comenta as alternativas usuais empregadas por professores e pesquisadores ao se depararem com os erros cometidos pelos estudantes. Quando pensamos em avaliação, em geral estamos preocupados em analisar o desempenho dos alunos, para verificar se compreenderam os conceitos até então trabalhados. Ao devolver uma prova, por exemplo, assinalamos os erros, às vezes até indicamos a solução correta, mas raras vezes aproveitamos os resultados para desenvolver uma pesquisa sobre o tema. Efetivamente, as exigências institucionais nos pressionam para entregar as notas, ou seja, para mostrar à própria Instituição, aos alunos e aos pais o certificado de aproveitamento de nossas aulas. Temos programas a cumprir e assumimos, em geral, o papel esperado do professor que detém o conhecimento e deve repassá-lo aos alunos, às vezes sem tempo para nos fixarmos nas dificuldades específicas dos alunos ou nos engajarmos em propostas inovadoras para a avaliação. Assim, a idéia de usar a análise de erros como uma metodologia de pesquisa da nossa própria prática pode proporcionar a exploração do potencial dos alunos e a retomada de conceitos não compreendidos, visto que, ao classificarmos os erros e verificarmos as categorias que apresentam maior número de ocorrências, podemos

aproveitar os resultados para implementar estratégias de ensino que desafiem os estudantes e os levem a reconstruir seus conhecimentos. Portanto, tanto na visão da pesquisa como na do ensino, a análise de erros pode ser considerada um procedimento que não tem o propósito de atribuir notas aos alunos, mas também pode fazer parte da avaliação em seus aspectos formativos, já que, não tendo a finalidade de aprovar ou reprovar o estudante, é feita para apoiá-lo e orienta-lo na busca de soluções para os problemas detectados, permitindo ao professor regular o ritmo das atividades ou o tipo de estratégias. UM EXEMPLO DE ANÁLISE DE ERROS A PARTIR DE UMA AVALIAÇÃO DE APRENDIZAGEM Não é freqüente encontrar relatos de investigações sobre o ensino e a aprendizagem de Análise Combinatória no Ensino Médio. Apesar de ser um assunto muito utilizado em exames vestibulares, encontramos poucas referências a pesquisas sobre o tema. Pinheiro, Santos e Sá (2005) analisaram dificuldades apresentadas por professores e alunos de Belém do Pará, no ensino e aprendizagem de conteúdos de Análise Combinatória. Os estudantes mencionaram, principalmente, a diferenciação entre problemas de arranjo e de combinação; já os professores consideraram que a maior dificuldade está em mostrar a diferença entre os problemas que envolvem o produto das combinações e os problemas que envolvem a soma das combinações. (p. 8). Sturm (1999) investigou as possibilidades pedagógicas de um ensino de Análise Combinatória sob uma abordagem alternativa, em que foi enfatizada a predominância do pensamento combinatório ao invés da ênfase nas fórmulas. Nas conclusões da investigação, o autor salienta a importância do uso do Princípio Multiplicativo para as soluções apresentadas pelos alunos do Ensino Médio investigados. No ano de 2007, foi realizada uma pesquisa na PUCRS (CURY; KONZEN, 2007), com alunos de três disciplinas do curso de Licenciatura: Lógica, Álgebra e Oficinas de Análise Combinatória. Vamos relatar alguns dados referentes a essa última disciplina, cujos conteúdos programáticos coincidem com os de Análise Combinatória abordados no Ensino Médio. A pesquisa, desenvolvida com auxílio de bolsista de Iniciação Científica do mesmo curso, teve como objetivos: a) analisar e classificar erros cometidos pelos alunos em provas de avaliação de aprendizagem das disciplinas citadas; b) elaborar atividades de sala de aula, para explorar as dificuldades detectadas; c) avaliar a possibilidade de aplicação das atividades

elaboradas em outras turmas de estudantes de cursos superiores ou para alunos de Ensino Fundamental ou Médio, quando os conteúdos fossem os mesmos desses níveis. A professora de Oficinas de Análise Combinatória aplicou duas provas durante o semestre, além de outros instrumentos de avaliação, tais como trabalhos individuais e em grupo. Após a correção de cada prova pela docente ou seja, após seu uso como instrumento de avaliação da aprendizagem, escolhemos uma questão que, na opinião da professora, tinha gerado maiores dificuldades de resolução. As soluções de cada aluno foram escaneadas e obtivemos, assim, o corpus de análise. Aceitamos a correção da professora, visto que cada docente executa essa tarefa conforme os objetivos com os quais elaborou a questão; em seguida, foi feita a análise quantitativa, com a contagem do número de alunos que acertaram totalmente, acertaram em parte, erraram ou não responderam. Somente então foi iniciada a análise qualitativa, com a separação das respostas em classes, por semelhanças de procedimentos resolutivos. Ao final do processo de análise, foi elaborado um material instrucional para auxiliar a professora na revisão dos assuntos abordados ou para ilustrar, para os futuros professores, uma maneira de trabalhar com Análise Combinatória usando material manipulativo. Portanto, ao trabalhar sobre o conjunto de dados relativos a cada questão analisada, analisando os erros qualitativamente, discutindo-os com a professora, elaborando e divulgando os materiais, a análise de erros foi empregada, ao mesmo tempo, como metodologia de pesquisa e de ensino. Para exemplificar a análise feita, vamos apresentar alguns resultados quantitativos e qualitativos. Na primeira prova, a questão 3, escolhida para análise, tinha o seguinte enunciado: a) Calcule quantos números de 4 algarismos distintos podemos formar no Sistema Decimal de Numeração; b) dentre eles, quantos são maiores que 5000? às respostas: Quatorze estudantes realizaram a prova e o quadro 1 apresenta a atribuição de créditos Item Alunos que acertaram Alunos que erraram Alunos que não responderam nº % nº % nº % 3a 7 50 6 43 1 7 3b 10 71 4 29 0 0 Quadro 1 Distribuição de alunos que acertaram, erraram ou não responderam.

Vemos que a questão apresentou dificuldades apenas na parte a, pois mais do que 70% dos estudantes acertou a parte b e não houve acertos parciais. Um dos exemplos de erro na parte a se refere àqueles que imaginaram 10 possibilidades para o algarismo da dezena de milhar, neste caso incluindo o zero como uma possibilidade, o que faria com que o número não tivesse quatro algarismos, mas apenas três. É o que vemos na resposta de um aluno, apresentada na figura 1: Figura 1 Exemplo de resposta em que o zero é aceito na casa da dezena de milhar Outro erro, ocorrido na parte b, foi o cálculo da resposta pela fórmula de um arranjo de 4 elementos, 3 a 3, como vemos na figura 2: Figura 2 Resposta do item 3b usando fórmula de Arranjo Muitas vezes é difícil compreender o que o aluno teve em mente quando resolveu a questão, ou porque não foi possível entrevista-lo posteriormente, ou porque apenas foi indicada uma resposta final, incorreta. A segunda prova da disciplina Oficinas de Análise Combinatória foi realizada por 15 alunos e a questão escolhida para análise, também de número 3, tinha o seguinte enunciado: Qual o valor de k no desenvolvimento de 15? k ( x + ) x O quadro 2 indica a distribuição de créditos às respostas: 10, para que o coeficiente do termo x 4 seja

Questão Acertaram Acertaram em parte Erraram Não responderam nº % nº %º nº %º nº % 3 6 40 1 7 6 40 2 13 Quadro 2 Distribuição de alunos que acertaram totalmente, em parte, erraram ou não responderam. Nessa questão, vemos que os estudantes apresentaram maior dificuldade, pois apenas 40% acertaram. Efetivamente, há vários obstáculos para encontrar a solução e um deles é a letra k, usada na segunda parcela do binômio, que pode ser confundida com a letra usada muitas vezes na própria fórmula do binômio de Newton. Uma solução correta é apresentada na figura 3, em que o estudante substituiu a letra k por k : Figura 3 Solução correta da questão Um exemplo de resposta incorreta, mas que mostrou a compreensão do processo pelo aluno, é indicada na figura 4:

Figura 4 Questão parcialmente correta, com erro apenas no final. O aluno não se atrapalhou com a letra k, mas no final, abandonando as variáveis, chegou incorretamente à identidade 15=15, pois multiplicou 15 pelo produto de 8 pelo inverso de 8. Tanto nesta como nas outras figuras, pode-se ver que a professora, ao corrigir, procurou completar os elementos faltantes, para que o estudante pudesse entender o que é considerado correto, ao receber a prova de volta. A análise de erros e a avaliação da aprendizagem, neste exemplo, foram empregadas paralelamente, pois um mesmo conjunto de questões que serviu para a professora como instrumento de avaliação e lhe permitiu atribuir notas aos alunos, também foi utilizado pelas pesquisadoras para analisarem em profundidade as soluções, o que possibilitou a discussão com a docente sobre as dificuldades detectadas e o uso do material instrucional elaborado. Assim, um professor pode fazer análise de erros concomitantemente à avaliação da aprendizagem, como também pode se engajar em um grupo de pesquisa que faz a investigação das respostas dos alunos e prepara estratégias metodológicas para auxiliar a aprendizagem dos conteúdos envolvidos.

A partir da análise das respostas dos estudantes da disciplina Oficinas de Análise Combinatória, foi elaborado um material instrucional, sob forma de jogo, adaptado de um similar existente em um site de recursos didáticos 1. O jogo também foi disponibilizado no Laboratório de Matemática da Instituição, permitindo aos alunos de Licenciatura, futuros professores, um contato com um material manipulativo que é fácil de elaborar e que pode ser empregado em suas futuras práticas. O Jogo da Análise Combinatória consta de um baralho de 27 cartas, constituído de 9 trincas. Cada trinca é indicada por uma mesma letra no canto superior esquerdo. Em cada carta há três problemas sobre o assunto, um deles com a resposta numérica indicada e outros dois sem resposta. As cartas são embaralhadas e distribuídas para três ou quatro jogadores. Quando um dos jogadores já recebe uma trinca completa, ele a coloca de lado. O jogador sorteado para iniciar o jogo pergunta a um colega se este tem uma determinada carta que lhe falta para completar uma trinca. Se o colega responde afirmativamente, ocultando a carta, então o primeiro deve dizer qual é a resposta do problema que está na carta oculta. Se acertar, recebe a carta e continua perguntando aos jogadores pela última carta que lhe falta para completar a trinca; se errar, passa a vez ao colega. Na construção do baralho, foi utilizada, no verso das cartas, uma ilustração apresentada durante o Ano Mundial da Matemática 2, comemorado em 2000. A figura 5 mostra uma das cartas do baralho. A1 a1) Com os algarismos 1, 2, 3, 4, 5 e 7, quantos números de 3 algarismos, sem repetir, podemos formar? R: 120 a2) Determine a quantidade de números de 3 algarismos, maiores que 500, que podem ser formados com os algarismos 3,5,6,7 e 9? R: a3) De quantas maneiras diferentes podemos distribuir 4 frutas diferentes entre 4 pessoas, de modo que cada pessoa coma somente uma fruta? R: Figura 5 Frente e verso de uma carta do Jogo da Análise Combinatória 1 http://www.mungo-verlag.info/ 2 http://wmy2000.math.jussieu.fr/spanish.html

CONSIDERAÇÕES FINAIS A apresentação do exemplo de pesquisa em análise de erros, desenvolvida a partir de uma prova de avaliação da aprendizagem, mostra que é possível (e desejável) enfocar as respostas dos alunos com os dois objetivos. Dessa forma, entendemos que há intersecções entre os procedimentos de analisar soluções dos estudantes a uma determinada questão e os de avaliar os seus desempenhos naquela questão. Se um professor apenas atribui nota ao resultado final apresentado pelo aluno, sem avaliar o desenvolvimento, está privilegiando o produto em detrimento do processo, o que sem dúvida não faz parte de uma avaliação formativa. Se, por outro lado, aceita qualquer solução, mesmo errada, com a justificativa de que o estudante está mostrando seu esforço em resolver a questão, não está contribuindo para que ele se aproprie dos conhecimentos que são considerados necessários para a conclusão daquele nível de ensino. Assim, uma análise criteriosa das soluções faz parte de uma avaliação também criteriosa, mas pode ser realizada independentemente de qualquer intenção de atribuir notas. Em uma instituição de ensino, em qualquer nível de ensino, seria interessante se os professores pudessem discutir as soluções de seus alunos em questões de Matemática e, em um Laboratório de Matemática, na escola ou em uma Instituição de Ensino Superior da região, essas soluções fossem a fonte para a elaboração de materiais instrucionais, para uma renovação de métodos e técnicas de ensino que possam motivar os alunos e auxiliá-los na superação de suas dificuldades. Esperamos que os exemplos aqui apresentados, juntamente com a sugestão de construção de um jogo a partir das dificuldades detectadas na análise, possam proporcionar novas idéias para os professores qualificarem a avaliação da aprendizagem, processo que tantas dificuldades tem trazido a alunos, mestres, direções, pais e à própria sociedade. REFERÊNCIAS BORASI, Raffaella. Reconceiving mathematics Instruction: a Focus on Errors. Norwood, NJ: Ablex Publishing Corporation, 1996. CURY, H. N.; KONZEN, B. Uma aplicação de jogos na análise de erros em educação matemática. REVEMAT, v.2.6, p.107-117, 2007. PINHEIRO, C. A. M.; SANTOS, I. S. R.; SÁ, P. F. Da Análise Combinatória ensinada, o que ficou? In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE ENSINO DE MATEMÁTICA, 3., 2005, Canoas. Anais...Canoas: ULBRA, 2005. 1 CD-ROM.

STURM, W. As possibilidades de um ensino de Análise Combinatória sob uma abordagem alternativa. 1999. 132 f. Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, 1999.